Íntegra
do Acórdão
Ocultar
Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.Recomenda-se acessar o PDF assinado.
Órgão Especial Desembargador Paulo Habith 21.05.12 MRJ AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 0803199-0, DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA. AUTORA: FEDERAÇÃO DAS EMPRESAS DE TRANSPORTE DE PASSAGEIROS DOS ESTADOS DO PARANÁ E SANTA CATARINA - FEPASC. INTERESSADA: CÂMARA MUNICIPAL DE FOZ DO IGUAÇU. RELATOR: DESEMBARGADOR PAULO HABITH. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE PROPOSTA EM FACE DE LEI MUNICIPAL. ALEGADA INCOMPATIBILIDADE PERANTE PRECEITOS DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL E FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE PERANTE A CARTA MAGNA. O CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE OBJETIVA EXCLUSIVAMENTE O EXAME DO CONFRONTO DIRETO E IMEDIATO DO ATO NORMATIVO EM FACE DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. TRANSPORTE COLETIVO. TRÁFEGO DE VEÍCULOS. ASSUNTO DE INTERESSE LOCAL. COMPETÂNCIA DO MUNICÍPIO. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 30, INCISO I, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. NÃO OCORRÊNCIA. ARTIGO 66 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PARANÁ. OBRIGATORIEDADE DA PRESENÇA DE COBRADOR NO INTERIOR DOS ÔNIBUS JÁ DETERMINADA PELA LEI MUNICIPAL Nº 3.523/09. AUSÊNCA DE INCONSTITUCIONALIDADE DA LEIS COMPLEMENTARES Nº 160/10 E 172/11, DO MUNICÍPIO DE FOZ DO IGUAÇU. AÇÃO IMPROCEDENTE. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 0803199-0, do Foro Central da Comarca da
1
Desembargador Paulo Habith 21.05.12 MRJ
Região Metropolitana de Curitiba, em que figura como Autora: a Federação das Empresas de Transporte de Passageiros dos Estados do Paraná e Santa Catarina - FEPASC, e como Interessada: a Câmara Municipal de Foz do Iguaçu.
RELATÓRIO.
Trata-se de Ação Direta de Inconstitucionalidade, com pedido de medida cautelar de suspensão da eficácia dos feitos da lei, proposta pela Federação das Empresas de Transporte de Passageiros dos Estados do Paraná e Santa Catarina - FEPASC, em desfavor da Câmara Municipal de Foz do Iguaçu. Requer a autora, inicialmente, a concessão de medida cautelar para a suspensão da eficácia dos dispositivos das Leis Complementares nº 160/10 e 172/11, do Município de Foz do Iguaçu, que se reportam às concessões do serviço de transporte coletivo público de passageiros de Foz de Iguaçu, instituindo, dentre outras normas, a obrigatoriedade da presença de cobradores no interior dos ônibus e microônibus em circulação. Ao final, a declaração de inconstitucionalidade dos dispositivos das Leis Complementares citadas. Para tanto, alega o autor que as Leis Municipais Complementares questionadas padecem de inconstitucionalidade formal, tendo em vista que, ao introduzirem na ordem jurídica municipal a obrigatoriedade de cobradores em todos os ônibus e microônibus em circulação, acabam acarretando usurpação de competência reservada à União, na medida em que legislam sobre direito do trabalho, nos termos do art. 22 da Constituição Federal e, igualmente, violam o preceituado nos artigos 15 e 17 da Constituição Estadual do Paraná, tendo em vista que exorbitam o campo dentro do qual o Município poderia traçar as diretrizes a respeito de assunto de interesse local, já que estabelecem normas sobre a relação empregador e empregado, em contrariedade ao sistema constitucional de repartição de competências. Aduz, ainda, que a iniciativa de deflagração dos respectivos processos legislativos deveria ter partido do Executivo e não do Legislativo de Foz do Iguaçu, conforme ocorreu na situação concreta, o que afronta o previsto ao previsto no art. 62 da Lei Orgânica daquele Município, bem como o artigo 7º, da Carta Estadual. Relata que os textos legais taxados de inconstitucionais também ocasionam a caracterização de vício material, eis que se mostram capazes de promover aumento de custos e o desequilíbrio na 2
Desembargador Paulo Habith 21.05.12 MRJ relação contratual firmada, em desrespeito ao disposto nos parágrafos 1º e 2º, do art. 58, da Lei nº 8.666/93, e art. 27, inciso XX, da Constituição Estadual. Ao final, aduz que o periculum in mora está presente na medida em que se enviou ofício às empresas concessionárias de transporte coletivo do Município de Foz do Iguaçu, determinando-lhes que adotassem providências para adaptarem-se ao normatizado pelas Leis indicadas como inconstitucionais. O Município de Foz do Iguaçu (fls. 175/178), a Câmara Municipal de Foz do Iguaçu (fls. 182/188) e o Estado do Paraná (fls. 202/203), apresentaram suas informações requerendo a improcedência da presente ação. Em parecer (fls. 208/222), a douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo indeferimento do pedido liminar. Instada a se manifestar novamente, agora a respeito do mérito, o Ministério Público em Segundo Grau, em pronunciamento de fls. 242/258, convergiu pela improcedência do pedido de declaração de inconstitucionalidade das Leis Complementares nº 160/2010 e 172/2011, do Município de Foz do Iguaçu. É, em síntese, o relatório.
VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO.
Consoante pacífico escólio doutrinário e entendimento jurisprudencial, o presente instrumento de controle concentrado de constitucionalidade objetiva exclusivamente o exame do confronto direto e imediato do ato normativo impugnado em face da Constituição Estadual. Nos termos da estrutura organizacional estabelecida pela Constituição Federal, a competência dos Tribunais Estaduais para apreciar a representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais cinge-se ao confronto com a Constituição Estadual. Ou seja, é cediço que o controle de constitucionalidade das leis e dos atos normativos municipais exercido pelos Tribunais de Justiça dos Estados tem como único parâmetro possível a Constituição do respectivo Estado membro. Trata-se de regra constante do art. 125, §2º, da Constituição Federal e dos arts. 101, VII, "f", 111 da Constituição do Estado do Paraná:
3
Desembargador Paulo Habith 21.05.12 MRJ
"Cabe aos Estados a instituição de representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais em face da Constituição Estadual, vedada a atribuição da legitimação para agir a um único órgão". (Art. 125, parágrafo 2º, da CF).
"Compete privativamente ao Tribunal de Justiça através de seus órgãos: (...) VII- processar e julgar originariamente: (...) f) as ações diretas de inconstitucionalidade e de constitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais e municipais contestados em face desta Constituição ..." (art. 101, VII, `f', da CE)
"São partes legítimas para propor a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo estadual ou municipal, em face desta Constituição (...)" (art. 111 da CE).
E ainda, dispõe o artigo 4º da Lei nº 9.868/99:
"Art. 4º A petição inicial inepta, não fundamentada e a manifestamente improcedente serão liminarmente indeferidas pelo relator."
Neste sentido:
"A ação direta de inconstitucionalidade de lei municipal somente pode estar fundamentada em afronta a preceito constante da Constituição Estadual; não, a preceito veiculado pela Lei Orgânica Municipal ou pela Constituição Estadual. Logo, a ação direta de inconstitucionalidade em tela não comporta conhecimento nos pontos em que pretende o confronto da norma impugnada frente a Constituição Federal, a Lei de Responsabilidade Fiscal,a Lei Orgânica do Município e, ainda, o Regimento Interno da Câmara Municipal. (Adin nº 261.83-4/01, Rel. Des. Pacheco Rocha)
"A ação direta de inconstitucionalidade de lei municipal somente pode estar fundamentada em afronta a preceito constante da Constituição Estadual; não, a preceito veiculado pela Lei Orgânica Municipal ou pela Constituição Federal". (TJPR, Acórdão 2343, Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.0026183-4/01, Rel. Des. Pacheco Rocha, j. 01/09/1995, DJ 09/10/1995).
4
Desembargador Paulo Habith 21.05.12 MRJ
Assim, as incompatibilidades com dispositivos da Constituição Federal estão fora do âmbito da apreciação em sede de controle concentrado de constitucionalidade realizado por este Tribunal de Justiça Estadual, uma vez que o paradigma é a Constituição Estadual. Em relação à alegada usurpação de competência reservada a União, ratifico o pronunciamento da douta Procuradoria Geral de Justiça ao mencionar que "as Leis Complementares nº 160/2010 e 172/2011, de Foz do Iguaçu, cuidam de assunto de interesse local, relativo ao tráfego de veículos, cuja competência legislativa é do Município, nos moldes do artigo 30, inciso I, da Constituição" (fls. 251 grifo meu):
"Art. 30 - Compete aos Municípios: I - legislar sobre assuntos de interesse local;" (grifo meu)
Assim, tendo o transporte coletivo natureza de serviço público de interesse local (e não de matéria trabalhista), sua competência para organização e prestação é reservada ao Município, conforme previsto no artigo 30, I, da Carta Magna. Também não há que falar em ofensa ao princípio da separação dos poderes, uma vez que não há demonstração satisfatória que as citadas leis complementares tenham tratado de alguma forma das matérias de iniciativa privativa do Governador do Estado, constantes no artigo 66 da Constituição do Estado do Paraná:
"Art. 66. Ressalvado o disposto nesta Constituição, são de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que disponham sobre: I - a criação de cargos, função ou empregos públicos na administração direta e autárquica do Poder Executivo ou aumento de sua remuneração; II - servidores públicos do Poder Executivo, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria, reforma e transferência de policiais para a reserva; III - organização da Defensoria Pública do Estado e das Polícias Civil e Militar; IV - criação, estruturação e atribuição das Secretarias de Estado e órgãos da administração pública."
Por fim, saliento que a obrigatoriedade da presença de cobradores no interior dos ônibus e microônibus em circulação, exigida pelo artigo 14, § 6º, da Lei Municipal Complementar nº 160/10, a partir
5
Desembargador Paulo Habith 21.05.12 MRJ da redação que lhe foi conferida pela Lei Complementar nº 172/11, já é imposta há mais de dois anos através da Lei Municipal nº 3.523/09 (fls. 115) em seu artigo 1º, parágrafo 2º, no qual consta que "a instalação da catraca eletrônica nos ônibus que integram o Transporte Coletivo Urbano, em hipótese alguma acarretará na dispensa de cobrador do interior do veículo." (grifo meu). E referida Lei Municipal (3.523/09) não é discutida na presente Ação Direta de Inconstitucionalidade. Nesta linha de raciocínio, ratifico o pronunciamento da douta Procuradoria Geral de Justiça (fls. 221):
"Aliás, corrobora essa afirmação, o fato de que, ainda que se compreenda justo suspender a eficácia dos `dispositivos das Leis Complementares nº 160/10 e 172/11', conforme postulado pela FEPASC (fl. 43), ainda assim, continuaria a persistir a necessidade da presença de cobradores nos veículos que executam o serviço de transporte coletivo público de passageiros de Foz do Iguaçu, pois assim explicitamente determina a Lei Municipal nº 3.523/2009 (fl. 115), repita-se, não questionada in casu." (grifo meu)
Destarte, não já qualquer inconstitucionalidade formal ou material nos dispositivos legais objeto da ação. Por fim, ressalto que o ilustre Des. Adalberto Jorge Xisto Pereira, em pedido de vista, apresentou suas razões, as quais foram por mim encampadas, e que as aqui transcrevo como parte integrante do presente Acórdão: "A norma impugnada tem caráter geral e abstrato, destinada àqueles que tiverem interesse em contratar com o Município de Foz do Iguaçu como permissionários ou concessionários do transporte coletivo urbano. Cuida-se, portanto, de norma de interesse local, já que dispõe, única e exclusivamente, sobre a forma de execução de serviço público permitido ou concedido. Não se legislou sobre matéria administrativa ou trabalhista (servidores públicos, carreira, vantagens, etc...), nem em relação à estrutura da Administração Pública Municipal, sua organização e funcionamento, de modo que, também por isso, não há ofensa à reserva de iniciativa. Quanto à alegada quebra do equilíbrio econômico- financeiro do contrato já firmado com a Administração Pública Municipal, como bem ponderou a Procuradoria-Geral do Estado,
6
Desembargador Paulo Habith 21.05.12 MRJ
`se imutável o equilíbrio, os atos legais ou administrativos que sobrecarreguem o concessionário não são considerados ilegais, mas apenas garantem-lhe o direito ao reequilíbrio. Por outras palavras, se demonstrado que a nova obrigação repercute na equação contratual, a administração terá o dever de reequilibrar o contrato'. Acompanho o Relator."
Ante o exposto, voto pela improcedência da presente Ação Direta de Inconstitucionalidade. ACORDAM os Desembargadores integrantes do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, pela IMPROCEDÊNCIA da presente Ação Direta de Inconstitucionalidade. Participaram do julgamento os Desembargadores Telmo Cherem, Jesus Sarrão, Regina Afonso Portes, Mendonça de Anunciação, Presidente eventualmente, Campos Marques, Guilherme Luiz Gomes, Sergio Arenhart, José Augusto Gomes Aniceto, Dulce Maria Cecconi, Miguel Pessoa, Denise Kruger Pereira, Lauro Augusto Fabrício de Mello, Prestes Mattar, Paulo Cezar Bellio, Jorge de Oliveira Vargas, Lídio José Rotoli de Macedo, Luiz Lopes, Paulo Roberto Hapner, Antonio Loyola Vieira, Nilson Mizuta e Adalberto Jorge Xisto Pereira. Curitiba, 03 de setembro de 2012.
PAULO HABITH Des. Relator
7
|