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Acórdão
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AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1.004.893-2, DO FORO REGIONAL DE ARAUCÁRIA DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA - VARA CÍVEL. AGRAVANTES : MÁRCIO LESKO MAYER E OUTRA. AGRAVADOS : MARCELO CAVICHIOLO E OUTRA. RELATORA : JUÍZA SUBSTITUTA EM 2º GRAU ÂNGELA MARIA MACHADO COSTA, EM SUBSTITUIÇÃO AO DES. JOÃO DOMINGOS KUSTER PUPPI. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS CLÁUSULA DE CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM NULIDADE RELAÇÃO DE CONSUMO CONTRATO DE ADESÃO CONTRATO QUE NÃO OBSERVA OS REQUISITOS DO § 2º DO ARTIGO 4º DA LEI N. 9.307/1996 LEI DE ARBITRAGEM NULIDADE RECONHECIDA PELO JUÍZO "A QUO" MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E DESPROVIDO. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 1.004.893-2, do Foro Regional de Araucária da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - Vara Cível, em que são Agravantes MÁRCIO LESKO MAYER E OUTRO e Agravados MARCELO CAVICHIOLO E OUTRO. A irresignação dos agravantes se direciona contra a decisão de fls. 22/23-TJ, proferida nos autos de Ação de Indenização por Perdas e Danos c/c Indenização por Danos Morais e Antecipação dos Efeitos da Tutela n. 9495/2010, especificamente na parte que, reconhecendo a relação de consumo existente entre as partes, reconheceu a nulidade da cláusula de convenção de arbitragem aposta no contrato de prestação de serviços firmado entre as partes (contrato de fls. 99-TJ). Informam os agravantes que firmaram contrato de prestação de serviços de elaboração de projeto arquitetônico com os agravados, para edificação de uma residência com aproximadamente 70 m2. Alegam, também, que de comum acordo as partes elegeram a arbitragem como forma de resolução de qualquer conflito referente à prestação dos serviços contratados, cuja disposição contratual, segundo afirmam, foi reiterada quando da anotação de Responsabilidade Técnica ART (CREA/PR). Defendem que o simples fato de a relação contratual havida entre as partes ser de consumo, não enseja, automaticamente, o afastamento da cláusula de convenção de arbitragem, sobretudo porque asseveram que a assinatura observou o disposto no artigo 4º da Lei 9.307 de
1996. Fundamentando suas assertivas, requereram a concessão de efeito suspensivo à decisão agravada. E, no mérito, o provimento do recurso. Juntou documentos às fls. 21/77-TJ. O recurso foi conhecido, com a apreciação e deferimento da pretensão liminar de concessão de efeito suspensivo à decisão agravada, tendo sido determinado o processamento do recurso, através da decisão de fls. 88-TJ. Às fls.94/97-TJ os agravados apresentaram contrarrazões ao recurso de agravo de instrumento, requerendo, em suma, a manutenção da decisão agravada por seus próprios fundamentos. Alegam os agravados que são pessoas leigas no assunto, e que, quando da assinatura do contrato de prestação de serviços sequer tinham ciência do que se tratava a cláusula de convenção de arbitragem. Requereram o desprovimento do recurso de agravo de instrumento. Após, vieram-me os autos conclusos. É o relatório.
VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO Consigne-se, de início, que o juízo de admissibilidade do recurso de agravo de instrumento foi realizado através da decisão de fls. 88-TJ, que conheceu do recurso e deferiu o pedido de concessão de efeito suspensivo, com a determinação de processamento do recurso. A pretensão recursal dos agravantes se direciona contra a decisão de fls. 22/23-TJ, proferida nos autos de Indenização por Perdas e Danos c/c Indenização por Danos Morais e Antecipação dos Efeitos da Tutela n. 9495/2010, especificamente na parte que, reconhecendo a relação de consumo existente entre as partes, reconheceu a nulidade da cláusula de convenção de arbitragem aposta no contrato de prestação de serviços firmado entre as partes. De início, vale consignar que em compromissos negociais que envolvam Mediação e Arbitragem, há uma espécie de renúncia ao foro Estatal. Diante disso, cabe ao Poder Judiciário somente a análise sobre a validade da cláusula que instituiu referida renúncia. Deveras, é constitucionalmente vedado ao Poder Judiciário deixar de apreciar qualquer questão que possa configurar lesão ou perigo de lesão à direitos (art. 5º, XXXV, CF). Nessa linha, a fim de que não haja irregular privação do acesso à Justiça prestada pelo Estado é que deve ser devidamente analisada a cláusula de convenção de arbitragem firmada entre as partes. Por conta disso, passo a apreciar a eficácia da cláusula especial apresentada nos documentos de fls. 74 e 76-TJ destes autos.
Prefacialmente, destaca-se que o contrato de fls. 76- TJ pode ser considerado um contrato de adesão, sobretudo porque tudo indica que o esboço dos termos contratuais já estavam prontos quando da assinatura do aludido instrumento, bastando apenas o preenchimento das cláusulas efetivamente discutidas entre as partes. Ou seja, não se pode concluir que as partes tenham discutido e interpretado todas as suas cláusulas. Ora, uma vez não havendo discussão sobre as cláusulas contratuais, notadamente a cláusula de instituição da convenção de arbitragem, há que se falar em contrato de adesão já que, segundo a doutrina, estes: "se caracterizam pela inexistência da liberdade de convenção, porque excluem a possibilidade de debate ou discussão sobre os seus termos; um dos contratantes se limita a aceitar as cláusulas e condições previamente redigidas pelo outro, aderindo a uma situação contratual que já está previamente definida.1" Justamente pelo fato de as partes não terem a oportunidade de discutirem amplamente as cláusulas contratuais que já estavam previamente redigidas, é que firmo o entendimento no sentido de que há nulidade a ser reconhecida na espécie.
Consoante a previsão do § 2º do artigo 4º da Lei n. 9.307/1996, leia-se, Lei da Arbitragem2, é certo que, em se tratando de contrato de adesão, como o que está sob análise, a cláusula somente será eficaz quando preenchidos determinados requisitos, quais sejam, a iniciativa dos aderentes (in casu os agravados) em instituí-la ou, quando estes tenham anuído expressamente com a sua instituição. Conforme bem apresentado em trecho de acórdão proferido pelo Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais3, "Em se tratando de contrato de adesão, a cláusula compromissória somente terá eficácia se tiver sido do aderente a iniciativa de instituí-la, ou se ele concordar de forma expressa com a sua instituição. - A concordância expressa, prevista no §2º, do artigo 4º, da Lei nº 9.307/96, não se caracteriza pelo mero lançamento de uma assinatura em cláusula preparada pela estipulante do contrato de adesão, que não sugere ter sido informada a existência da cláusula compromissória e explicação dos seus efeitos." Isso significa que, o fato de os agravados terem assinado o contrato de fls. 76 não induz ao entendimento de que houve expressa anuência destes quanto a cláusula especial de que eventual litígio seria resolvido por arbitragem, quanto mais porque, da análise da forma do contrato de prestação de serviços indicado, é forçoso se concluir que não houve
assinatura dos agravados especialmente para a aludida cláusula, contrariando o disposto no §2º, do artigo 4º da Lei n. 9.307/1996. Além disso, a jurisprudência é assente no sentido de que a demonstração de que os agravados tinham efetiva ciência da aludida cláusula se daria com a assinatura destes ao lado da referida disposição contratual ou, através de documento em anexo, para igualmente dar expressa ciência dos termos da contratação, cujas situações, frise-se, não ocorreram na espécie. Sobre o tema, destacamos: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO ORDINÁRIA - CONTRATO DE ADESÃO - LITÍGIO - ARBITRAGEM - CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA INEFICAZ - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I - O §2º do artigo 4º da Lei nº 9.307/96 submete a eficácia da cláusula compromissória nos contratos de adesão à iniciativa ou à anuência expressa do aderente. II - Ausente destaque em escrito separado ou em negrito, com assinatura especialmente para essa cláusula, indevida a instituição da arbitragem. (TJMG - AC n.º 1.0024.08.176898-8/001 - Rel. Desembargador BITENCOURT MARCONDES - DJ 12.12.2008) No mesmo sentido segue a jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça do Paraná:
"APELAÇÃO CÍVEL AÇÕES DE RESCISÃO CONTRATUAL, OBRIGAÇÃO DE FAZER E CAUTELAR JUIZO SINGULAR QUE EXTINGUE O FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO ANTE A CLAUSULA COMPROMISSÁRIA DE ARBITRAGEM IMPOSSIBILIDADE CONTRATO DE ADESÃO QUE NÃO RESPEITAS OS TERMOS DO ART. 4º, §2º DA LEI 9307/96 (LEI DE ARBITRAGEM) REQUISITOS OBJETIVOS NÃO CUMPRIDOS AÇÃO POR VIA JUDICIAL QUE É POSSÍVEL PREVISÃO CONTRATUAL PARA TANTO SENTENÇA ANULADA RETORNO DOS AUTOS A ORIGEM PARA NOVO JULGAMENTO SOB PEBNA DE SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (TJPR - VII CCv - Ap Civel 0900404-6 - Rel.: Antenor Demeterco Junior - Julg.: 26/06/2012 - Unânime - Pub.: 26/07/2012 - DJ 913). APELAÇÃO CIVEL. CONTRATO DE ADMINISTRAÇÃO DE IMÓVEL. CONTRATO DE ADESÃO. CLÁUSULA DE ARBITRAGEM. AUSÊNCIA DE REQUISITO DE EFICÁCIA. SENTENÇA. ANULAÇÃO. Recurso 1 conhecido e não provido. Recurso 2 conhecido e provido. É ineficaz a cláusula arbitral aposta no contrato de adesão quando a parte aderente não dá iniciativa ao procedimento arbitral, ex vi do art. 4º, § 2º, da Lei 9.307/1996; não sendo cabível
assim a extinção do feito pelo art. 267, VII do CPC". (TJPR - 12ª C.Cível - AC 0385486-0 - Foro Central da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Des. Rafael Augusto Cassetari - Unanime - J. 01.08.2007) Diante desses fundamentos, a manutenção da decisão agravada é medida que se impõe, mesmo que a cláusula de convenção arbitral tenha sido ratificada quando da anotação de Responsabilidade Técnica ART (CREA/PR) fls. 74-TJ, na medida em que, o que de fato interessa no caso sob análise é o contrato de prestação de serviços firmado entre as partes, que, como dito, não observa os requisitos da Lei de Arbitragem. Nessa linha, considerando que o contrato de prestação de serviços de fls. 76-TJ ofende regra normativa da lei que rege a matéria, aliado ao fato de que os agravados defendem que embora tenham assinado o contrato sequer tinham conhecimento do que se tratava uma cláusula de convenção de arbitragem (argumento de fls. 95-TJ último parágrafo), necessário o afastamento da aludida disposição contratual, sob pena de se ferir, inclusive, o Princípio da Autonomia da Vontade. É certo que o juízo a quo se fundamentou nos elementos de convicção ora expostos para proferir a decisão atacada, devendo ser mantida a decisão em todos os seus termos, eis que nulo o compromisso arbitral (cláusula compromissória de fls. 76-TJ), leia-se, a convenção de arbitragem que o embasou. Conclusão
Por todo o exposto, voto pelo conhecimento e desprovimento do presente recurso de agravo de instrumento.
DISPOSITIVO
ACORDAM os Desembargadores integrantes da Décuma Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao presente recurso de agravo de instrumento, nos termos do voto da Relatora. Presidiu o julgamento o senhor Desembargador JOÃO DOMINGOS KUSTER PUPPI, sem voto, e dele participaram o senhor Desembargador MÁRIO HELTON JORGE e a senhora Juíza Substituta em 2º Grau DENISE ANTUNES, ambos acompanhando a Relatora. Curitiba, 24 de julho de 2013; ÂNGELA MARIA MACHADO COSTA Juíza Substituta em Segundo Grau Relatora.
-- 1 BACIOTTI, Rui Carlos Duarte. Contratos Conceito e Espécies.. Disponível em: http://www.advogado.adv.br/artigos/2000/ruibaciotti/contratos1.htm. Consultado em: 25 de junho de 2013.
-- 2 A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato. (...) § 2º. Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula. 3 TJ-MG. Proc. 1.0024.08.183073-9/001(1). Rel. LUIZ CARLOS GOMES DA MATA. Julg. 30.04.2009.
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