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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
APELAÇÃO CÍVEL N.º 1.108.878-3, DA 20.ª VARA CÍVEL DE CURITIBA APELANTE 1: JOÃO ILDEFONSO MUNHOZ APELANTE 2: UNIMED CURITIBA SOCIEDADE COOPERATIVA DE MÉDICOS APELADOS: OS MESMOS RELAT. CONV.: ELIZABETH NOGUEIRA CALMON DE PASSOS (EM SUBSTITUIÇÃO AO EXMº. SR. DES. ARQUELAU ARAUJO RIBAS) REVISOR: O EXMO.º SR. DES. LUIZ LOPES APELAÇÃO 1 "AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, CUMULADA COM PEDIDO DE REPARAÇÃO DE DANOS E PEDIDO DE LIMINAR". PREJUDICIALIDADE DA ANÁLISE DO PLEITO DE MAJORAÇÃO DOS DANOS MORAIS, ANTE A EXCLUSÃO DO DEVER DE INDENIZAR MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. PROVIMENTO PARCIAL DA APELAÇÃO 2. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. APELAÇÃO 2 - PLANO DE SAÚDE - OBRIGAÇÃO DE FAZER - PACIENTE ACOMETIDO DE ANEURISMA CEREBRAL - NEGATIVA DE COBERTURA DOS MATERIAIS NECESSÁRIOS À REALIZAÇÃO DA CIRURGIA PRESCRITA PELO MÉDICO ASSISTENTE - PROCEDIMENTO NÃO EXCLUÍDO EXPRESSAMENTE PELO CONTRATO - AFRONTA AO DISPOSTO NO ART. 16, VI, DA LEI 9.656/98 - INTERPRETAÇÃO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Cível n.º 1.108.878-3 da 10.ª Câmara Cível. FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR - PLANO QUE PREVÊ COBERTURA PARA O TRATAMENTO DA DOENÇA. DANOS MORAIS. DESCABIMENTO. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. MERO DISSABOR. VERBA SUCUMBENCIAL READEQUADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.º 1.108.878-3, da 20.ª Vara Cível de Curitiba, em que figuram como apelantes, JOÃO ILDEFONSO MUNHOZ e UNIMED CURITIBA SOCIEDADE COOPERATIVA DE MÉDICOS, e apelados, OS MESMOS.
I. RELATÓRIO
Por brevidade, extrai-se da r. Sentença o seguinte relatório:
"(...) João Ildefonso Munhoz, qualificado nos autos, promoveu Ação de Obrigação de Fazer c/c Reparação de Danos, com Pedido de Antecipação de Tutela em face de UNIMED CURITIBA Sociedade Cooperativa de Médicos, também já qualificada, visando, em síntese, obrigar a empresa requerida ao cumprimento integral do contrato de prestação de serviços firmado entre as partes ora litigantes, mais especificamente quanto à cobertura do tratamento cirúrgico de embolização endovascular, com todos os materiais indispensáveis para tal procedimento, bem como condenar a ré ao pagamento de indenização por danos morais
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no importe de R$50.000,00 (cinquenta mil reais).
Sustenta a parte autora que contratou os serviços da empresa ré (contrato "UNIPLAN 2000 Pessoa Física Básico + Opcionais 1 e 3, plano 212", fls. 30/32 e 39/66), não estando inadimplente, bem como já superou todos os períodos de carência de seu plano.
Informa que em junho/2011 foi diagnosticado um aneurisma cerebral, necessitando o autor realizar uma "embolização endovascular", porém o material indispensável para tal procedimento não foi liberado pela ré, o que alega o autor estar em desconformidade com a cláusula 9.2, "f", do contrato firmado entre as partes ora litigantes.
Pugnou, liminarmente, seja a ré obrigada a cumprir o contrato de prestação de serviços de assistência à saúde, mais especificamente quanto à cobertura do tratamento cirúrgico de embolização endovascular, com todos os materiais indispensáveis para tal procedimento.
Ao final, requereu a confirmação da liminar, o reconhecimento da incidência da norma consumerista no caso em tela, a prioridade de tramitação do processo, o deferimento da gratuidade processual, bem como a condenação da requerida ao pagamento de indenização por danos morais, das custas processuais e honorários advocatícios, ainda, pugnou pela produção de todos os meios de prova admitidos. Carreou ao feito documentos (fls. 27/138).
A decisão de fls. 142/145 deferiu a liminar, sob pena de multa diária.
Devidamente citada (fl. 153), a parte ré deixou de apresentar defesa, assim, o decisório de fl. 155 declarou sua revelia.
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A requerida interpôs agravo, na forma retida, face à decisão supramencionada (fls. 157/161). O autor apresentou contrarrazões às fls. 198/202. À fl. 204 foi mantida a decisão hostilizada, bem como se entendeu pelo julgamento da lide no estado em que se encontra. (...)."
O r. Juízo julgou procedente o pedido inicial, tornando definitiva a antecipação da tutela então deferida, condenando a requerida no pagamento de R$3.000,00 (três mil reais) a título de danos morais, acrescidos de correção monetária anual pela média dos índices INPC/IGP- DI, e de juros de 1% (um por cento) ao mês, a partir da data da publicação da Sentença, julgando, com isto, extinto o processo, com resolução do mérito, nos termos do contido no artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil.
Em razão da sucumbência, condenou a requerida ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 20, §§ 1.º e 3.º do Código de Processo Civil.
Inicialmente, o autor JOÃO ILDEFONSO MUNHOZ apelou às fls. 223/231, requerendo a majoração dos valores arbitrados a título de indenização por danos morais, sugerindo a fixação de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), considerando o faturamento anual da empresa requerida, na ordem de R$1.000.000.000,00 (um bilhão de reais fl. 233).
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A requerida ofereceu Recurso Adesivo às fls. 238/247, preliminarmente pleiteando o conhecimento do Agravo Retido interposto às fls. 157 e s., no qual argui a nulidade da citação, haja vista que a carta por "A.R." foi recebida por pessoa diversa do presidente da Cooperativa, tratando-se, portanto, de ato nulo.
Acerca do meritum causae, ao pleitear a reforma da r. Sentença, para que todos os pedidos sejam julgados improcedentes, argumentou em suas razões recursais quê: não é obrigada a fornecer cobertura de órteses, cuja exclusão está regularmente prevista no contrato entabulado entre as partes; no que tange à condenação por danos morais, argumentou haver agido no exercício regular de direito, eis que de acordo com o estipulado no contrato.
Em sede de contrarrazões à Apelação 1, outrossim a empresa requerida afirmou ser ilegal a fixação de danos morais, vez que não se verifica ilicitude na conduta de negar pedido de cobertura com fundamento no contrato celebrado entre as partes; na hipótese de ser considerada a existência de danos morais, pleiteou a manutenção do quantum indenizatório, que observou os critérios da razoabilidade, prudência e bom senso.
Contra-arrazoado o recurso adesivo (fls. 263/266), a parte autora requereu a sua rejeição, ante a ausência de sucumbência recíproca, eis que a demanda foi julgada totalmente procedente, cuja insurgência recursal se
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volta apenas contra o valor da indenização, e não contra eventual pedido não concedido.
É o relatório.
II. DO VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO
Satisfeitos os pressupostos de admissibilidade extrínsecos (tempestividade; preparo; regularidade formal; inexistência de fato impeditivo ou extintivo do direito de recorrer) e intrínsecos (legitimidade para recorrer; interesse de recorrer; cabimento), impõe-se conhecer de ambos os Recursos, não merecendo prosperar o pedido de não conhecimento do Recurso Adesivo interposto pela UNIMED CURITIBA SOCIEDADE COOPERATIVA DE MÉDICOS, sob o argumento da inexistência de sucumbência recíproca, haja vista que a requerida foi responsabilizada pela cobertura do exame de "Angiotomografia Arterial Intracraniana", de que necessitou a parte autora, sendo condenada, outrossim, ao pagamento de R$3.000,00 (três mil reais) a título de danos morais, cuja importância o autor requereu fosse majorada, interpondo Recurso de Apelação.
Logo, recorrendo o autor, e sendo a requerida também parte vencida, torna-se possível a interposição de Recurso Adesivo, o que foi inclusive ressaltado nos Embargos Declaratórios opostos contra o r. despacho que deixou de receber o recurso, diga-se de passagem - com os mesmos fundamentos invocados nas
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contrarrazões da parte autora -, os quais foram acolhidos pelo douto Juízo a quo, exarando a decisão de fl. 261, que tornou sem efeito o despacho às fls. 256/257, recebendo o Recurso Adesivo às fls. 238/248, nos mesmos efeitos em que recebida a Apelação às fls. 223/234.
Do Agravo Retido:
A ora recorrente UNIMED CURITIBA SOCIEDADE COOPERATIVA DE MÉDICOS, interpôs agravo retido às fls. 157/161, em face da r. decisão à fl. 155, que validou a citação da empresa requerida, e diante da não apresentação de contestação, declarou os efeitos da revelia.
Apontou a recorrida a existência de vício na formalização do ato, porquanto a Carta de Citação foi dirigida à pessoa do representante legal da empresa, sendo recebida por pessoa diversa, tratando-se, portanto, de citação nula.
Contudo, revela-se a insubsistência da alegação, porquanto a pessoa que recebeu a citação detinha competência para tanto, pois na qualidade de funcionário da empresa requerida é responsável pelo recebimento de correspondências, o que se presume inclusive por não haver arguido a impossibilidade de receber a citação.
Nesse sentido, os seguintes precedentes:
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APELAÇÃO CÍVEL - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ENERGIA ELÉTRICA - AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE VALORES COBRADOS - CITAÇÃO PROMOVIDA NA AGÊNCIA DE ATENDIMENTO DA COMARCA - POSSIBILIDADE - FUNCIONÁRIO DA EMPRESA QUE RECEBE O MANDADO CITATÓRIO ENTREGUE PELO OFICIAL DE JUSTIÇA SEM QUALQUER RESSALVA - APLICAÇÃO DA TEORIA DA APARÊNCIA - PRECEDENTES DO STJ - RECURSO NÃO PROVIDO. (TJPR, 11.ª Câm. Cív., Ap. Cív. 1.015.648-4, Medianeira, Rel. Des. Gamaliel Seme Scaff, unânime, julg. 27.11.13)
ACIDENTE TRABALHO - AÇÃO INDENIZATÓRIA PROCEDENTE - SENTENÇA ANTERIOR À EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45 - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM ESTADUAL - CITAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA RECEBIMENTO POR FUNCIONÁRIO TEORIA DA APARÊNCIA - REVELIA CONFIGURADA - APELAÇÃO NÃO PROVIDA (TJSP, 33.ª Câm. de Dt.º Priv., CR 865.176.000 SP, Rel. Des. Luiz Eurico, julg. 14.08.08)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. ENSINO PARTICULAR. CITAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA. ENTREGA DO AR NO ENDEREÇO DA EMPRESA. PRESUNÇÃO DO RECEBIMENTO POR FUNCIONARIO DA EMPRESA. TEORIA DA APARÊNCIA. REVELIA. Desnecessária a renovação do ato citatório, tendo em vista a entrega da carta de citação no endereço da empresa-ré, devolvida com assinatura do recebedor. Presume-se que a empresa ré exerce atividades no endereço constante na carta AR e que a citação está perfectibilizada, diante da inexistência de oposição ao recebimento. Aplicação do art. 302 do CPC, submetendo a agravada aos efeitos da revelia. (TJRS, 6.ª Câm. Cív., AI 70.043.796.697 RS, Rel. Des. Artur Arnildo Ludwig, julg. 20.10.11)
DO DEVER DE COBERTURA
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Inicialmente, cumpre esclarecer que se há, por parte do consumidor, confusão, ou falta de compreensão a respeito das cláusulas contratadas, mormente em relação aos termos técnicos aos quais não está afeito, a interpretação do contrato deve ser feita da maneira que mais lhe favoreça, conforme o disposto no artigo 47 do Código de Defesa do Consumidor1.
Partindo-se dessa premissa, tem-se que a parte autora é beneficiária de plano de saúde junto à requerida, cujo contrato foi firmado em 11.03.98, conforme se vê na cópia à fl. 30.
Da descrição fática contida na inicial, verifica-se que no mês de julho de 2011, o autor foi acometido por fortes dores encefálicas, as quais demandaram a realização de exame de Ressonância Magnética Encefálica em 19.07.11, cuja conclusão foi a seguinte fl. 69 do Laudo médico às fls. 68/69:
"(...) Redução volumétrica do parênquima encefálico esperada para a faixa etária. São observados sinais de redução volumétrica dos hipocampos caracterizado por proeminências das fissuras hipocampais. A pequena formação arredondada descrita junto à circulação anterior do círculo de Wilis no nível da artéria comunicante anterior e compatível com pequena formação aneurismática sacular. Os focos de alteração de sinal na substância branca nas topografias
1 "(...) Art. 47. As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor. (...)."
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supracitadas possuem características inespecíficas, mas podem estar relacionados à lesões discais pregressas de pequenos vasos (leucoaraiose Fazekas grau I/II).
Diagnosticada a presença de aneurisma no cérebro do autor, na iminência de ruptura com sequelas irreversíveis e até mesmo de seu óbito, o seu médico assistente, Dr. Murilo Sousa de Meneses, prescreveu-lhe a realização de exame de "Embolização Endovascular", consistente na compactação de micromolas no interior do saco aneurismático, impedindo que o fluxo de sangue entrasse no aneurisma, evitando a sua ruptura.
No entanto, ao solicitar a liberação de guia de internação junto à requerida para a efetivação do procedimento cirúrgico, sobreveio o pedido de esclarecimentos à fl. 100, em que, antes de autorizar a sua realização, a parte requerida assentou a existência de dificuldades para a compreensão da grafia e borramento no fax e/ou scanner, devendo-se-lhe fornecer o telefone celular e e-mail para contato ético personalizado com o consultor cooperado, informando, por derradeiro, que a Unimed Curitiba aguardaria os documentos para proceder à autorização.
Não obstante, consignou o autor na inicial que a requerida teria negado verbalmente a liberação dos materiais necessários à realização de tal cirurgia, obtendo
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apenas a autorização para o procedimento propriamente dito (fl. 05, item 1.7 da inicial, às fls. 02/26)
Considerando o gravíssimo quadro clínico do autor, ao que consta idoso, à época com 75 (setenta e cinco) anos, a digna Magistrada a quo antecipou os efeitos da tutela pretendida, determinando liminarmente a expedição de ofício à Unimed Curitiba, para que tomasse as providências necessárias à liberação do procedimento de embolização endovascular com os materiais inerentes à sua realização, no prazo de 48:00h (quarenta e oito horas), sob pena de multa diária de R$10.000,00 (dez mil reais) por dia de descumprimento da ordem.
Logo, é incontroversa a cobertura por parte da requerida à realização da cirurgia, constituindo objeto de discussão a sua negativa quanto ao fornecimento dos materiais necessários, sob o argumento de que tais serviços estariam sem cobertura contratual.
Entretanto, como bem ponderou o r. Juízo a quo, a cláusula 9.2, f, do contrato entabulado entre as partes, prevê:
"9.2 A UNIMED CURITIBA assegurará aos usuários, durante a internação, os seguintes serviços hospitalares:
"(...) f) material de sala, de acordo com o porte cirúrgico; (...)."
Entretanto, à fl. 59, verifica-se que a
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cláusula n.º 3 especifica:
(...) Não se encontram amparadas por este Opcional as próteses e órteses de qualquer natureza, utilizadas na realização dos procedimentos acima descritos, ainda que imprescindíveis para a realização dos mesmos. (...)."
De plano, de se constatar que a cláusula em discussão é abusiva, sobretudo quando incontroversa a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso em tela, uma vez que se trata de contrato de adesão, tendo em vista que as condições contratuais são unilateralmente impostas pelo fornecedor dos serviços, ora apelante adesiva, cabendo ao consumidor, ora autor, simplesmente aceitá-las ou rejeitá-las, não havendo poder de discussão sobre as cláusulas, que são simplesmente impostas ao consumidor.
A doutrina, por sua vez, aponta três circunstâncias que caracterizam um contrato de adesão:
"1) a sua pré-elaboração unilateral; 2) a sua oferta uniforme e de caráter geral, para um número ainda indeterminado de futuras relações contratuais; 3) seu modo de aceitação, onde o consentimento se dá por simples adesão à vontade manifestada pelo parceiro contratual economicamente mais forte". (MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: O Novo Regime das Relações Contratuais. 3.ª ed. São Paulo: RT, 1998, p. 72.)
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Destarte, os contratos de planos de saúde são contratos de adesão, devendo ser analisados à luz do Código de Defesa do Consumidor, levando-se em consideração a hipossuficiência do consumidor.
A jurisprudência vem se firmando exatamente nesse sentido:
APELAÇÃO CÍVEL - PLANO DE SAÚDE - RECUSA DE COBERTURA DE "STENTS" - PRÓTESE NECESSÁRIA À CIRURGIA CORONARIANA, COBERTA PELO PLANO - ABUSIVIDADE - OFENSA À BOA-FÉ OBJETIVA - INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 51, IV, e § 1º, II, DO CDC - INTERPRETAÇÃO FAVORÁVEL À CONSUMIDORA - APLICAÇÃO DA LEI Nº 9.656/98 - RENOVAÇÕES SUCESSIVAS DO CONTRATO - ENTENDIMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - OPORTUNIDADE DE MIGRAÇÃO DE PLANO - NÃO COMPROVAÇÃO POR PARTE DA OPERADORA - OBRIGAÇÃO DE CUSTEIO DOS MATERIAIS - RECONHECIMENTO - DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS - AUSÊNCIA DE PROVA DE QUE A NEGATIVA TENHA AGRAVADO O QUADRO CLÍNICO DA USUÁRIA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. É de se declarar nula a cláusula contratual que afasta a cobertura de "stent" necessário para o bom termo de cirurgia coberta pelo plano de saúde, o que por certo fere o princípio da razoabilidade e a finalidade básica do contrato, e também, porquanto não propicia ao consumidor hipossuficiente ter imediato conhecimento de seu alcance, não se olvidando, ainda, que omisso o contrato, qualquer margem interpretativa deve ser resolvida em favor do consumidor, nos termos do que dispõe o art.47, do Estatuto Consumerista. 2. As circunstâncias do caso demonstram que a recusa da operadora do plano de saúde à cobertura do procedimento indicado à recuperação do quadro clínico
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apresentado pela autora, não ensejaram complicação no seu estado de saúde, não havendo, ademais, prova de que houve sofrimento psíquico intenso, donde, efetivamente, deve ser afastada a indenização por danos morais. (10.ª Câm. Cív., AC 1.066.672-9, Rel. Des. Luiz Lopes, unânime, julg. em 22.08.13 grifou-se)
AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. PLANO DE SAÚDE. CIRURGIA PARA IMPLANTAÇÃO DE STENTS. COBERTURA PARA TODOS OS TIPOS DE CIRURGIAS CARDÍACAS, INCLUSIVE OS PROCEDIMENTOS DE HEMODINÂMICA. CLÁUSULA QUE SE INTERPRETA FAVORAVELMENTE AO CONSUMIDOR. NULIDADE DE CLÁUSULA QUE AFASTA A COBERTURA PARA A IMPLANTAÇÃO DE PRÓTESES. PROCEDIMENTO COBERTO. CONTRATO ANALISADO DE ACORDO COM AS NORMAS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONDUMIDOR E NÃO DA LEI 9656/98, POSTERIOR AO CONTRATO. RECURSO DESPROVIDO. (9.ª Câm. Cív., AC 523.626-2, Rel. Des. Eugênio Achille Grandinetti, julg. em 15.05.08 grifou-se)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE NULIDADE DE CLÁUSULA CONTRATTUAL COMBINADA COM COBRANÇA PLANO DE SAÚDE PRETENSÃO DE COBERTURA DE PRÓTESE. PLANO FIRMADO EM 1984. AUSÊNCIA DE ADAPTAÇÃO DO CONTRATO A LEI QUE REGULAMENTA OS PLANOS DE SAÚDE INAPLICABILIDADE DA LEI 9656/98 CORRETAMENTE RECONHECIDA PELO JUIZ À QUO'. CONTRATO FIRMADO ANTES DA VIGÊNCIA DO CDC HIERARQUIA CONSTITUCIONAL DE GARANTIA À DEFESA DOS INTERESSES DO CONSUMIDOR APLICAÇÃO DO CDC AO CASO ALEGAÇÃO DE QUE A COBERTURA CONTRATUAL RESTRINGE- SE APENAS AO PROCEDIMENTO CIRÚRGICO, NÃO HAVENDO PREVISÃO DE COBERTURA DO APARELHO - CONTRATO DE ADESÃO CLÁUSULA ABUSIVA - COBERTURA DO PROCEDIMENTO CIRÚRGICO OBRIGAÇÃO DE COBERTURA DO ACESSÓRIO (APARELHO) SE O
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PRINCIPAL É ASSEGURADO PELO CONTRATO ART. 51, IV DO CDC RECURSO DESPROVIDO (9.ª Câm. Cív., AC 723.761-0, Jaguapitã, Rel. Des. José Augusto Gomes Aniceto, unânime, julg. em 24.03. 11 grifou-se)
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. PLANO DE SAÚDE. RECUSA DE FORNECIMENTO DE STENT PARA TRATAMENTO CARDIOVASCULAR. CONTRATO CELEBRADO ANTERIORMENTE À VIGÊNCIA DA LEI 9.656/98. POSSIBILIDADE DE AFERIÇÃO DE ABUSIVIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL A DESPEITO DA IRRETROATIVIDADE DO REFERIDO DIPLOMA LEGAL. PRECEDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.CLÁUSULA DA QUAL NÃO SE EXTRAI DIFERENÇA ENTRE PRÓTESE/ÓRTESE CARDÍACA E VASCULAR E QUE NÃO ATENDE AO PRECEITO DO ART. 51, IV, DO CDC, FORNEIMENTO DEVIDO. BEM COMO DE SEU § 1º. II. DANO MORAL. CARACTERIZAÇÃO. PRECEDENTES DO MESMO AREÓPAGO. VALOR DA INDENIZAÇÃO, R$ 10.000,00, QUE NÃO SE MOSTRA EXCESSIVO, POR ATENDER AO CARÁTER INIBITÓRIO DA SANÇÃO. RECURSO NÃO PROVIDO. (8. Câm. Cív., AC 1.022.194-2, Rel. Des. Jorge de Oliveira Vargas, julg. em 29.08.13 grifou-se)
Diante dos julgados acima colacionados, em se reconhecendo a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso em tela, a cláusula em questão é abusiva, em função de negar o fornecimento dos acessórios indispensáveis à realização do procedimento cirúrgico coberto pelo plano de saúde contratado.
Sob a égide do artigo 47 da Lei Consumerista, as cláusulas contratuais devem ser interpretadas em favor do consumidor, a parte mais
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vulnerável da relação.
Considerando-se que o ato cirúrgico é coberto pelo plano de saúde em questão, não se pode admitir a negativa de cobertura, reputando-se de abusiva a exclusão dos materiais necessários à cirurgia que foi autorizada pela requerida, meio elegido pelo médico responsável como essencial para o sucesso do tratamento, sem maiores riscos. É descabido cobrir uma cirurgia sem incluir os acessórios imprescindíveis à sua realização, inclusive conforme reconheceu o seguinte precedente:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INIBITÓRIA DE DANO. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA A IMPLANTE DE "STENT". DESCABIMENTO. CIRURGIA CARDÍACA. RELAÇÃO DE ACESSORIEDADE. RECURSO PROVIDO. I - SE O PLANO DE SAÚDE DÁ COBERTURA À CIRURGIA CARDÍACA, NÃO HÁ QUE SE FALAR EM EXCLUSÃO DE COLOCAÇÃO DO "STENT", NA MEDIDA EM QUE TAL PRÓTESE, EM LINHA DE ACESSORIEDADE, DECORRE DA REALIZAÇÃO DO ATO CIRÚRGICO PRINCIPAL.(GRIFO NOSSO) II - RECURSO QUE MERECE PROVIMENTO. A LIMITAÇÃO ESTABELECIDA PARA ESTA COBERTURA REFERIDA REVELA-SE AINDA MENOS ACEITÁVEL DIANTE DO FATO DE QUE O PROCEDIMENTO REVELA-SE INDISPENSÁVEL PARA A CURA DO PACIENTE, CONFORME INDICAM OS DOCUMENTOS TRAZIDOS PELA PARTE AUTORA, INDICADOS NO EXCERTO DA SENTENÇA TRANSCRITO AO INÍCIO DO VOTO. ASSISTE RAZÃO AO APELANTE, DE FATO, QUANDO DIZ QUE A LEI N. 9.650 NÃO É APLICÁVEL AO PRESENTE CASO. DE FATO, O CONTRATO ORA DISCUTIDO É DE TRATO SUCESSIVO - O QUE FAZ COM QUE O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR SEJA APLICÁVEL A PLANOS DE SAÚDE CELEBRADOS ANTES DA VIGÊNCIA DA REFERIDA LEI, MAS QUE SE PERPETRARAM NO TEMPO.(...)". (9.ª Câm. Cív.
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AC 430.006-9, Rel. Des. Tufi Maron Filho, j. 11.03.08 grifou-se)
Portanto, cabe ao plano de saúde cobrir todas as próteses necessárias para a cura do paciente, eis que o objeto ou finalidade principal do contrato de prestação de serviços médicos é a saúde do consumidor.
Sobre o assunto, a ilustre jurista Cláudia Lima Marques leciona:
"Nesse sentido, a relação contratual básica do plano de saúde é uma obrigação de resultado, um serviço que deve possuir a qualidade e a adequação imposta pela nova doutrina contratual. É obrigação de resultado porque o que se espera do segurador ou prestador é um "fato", um "ato" preciso, um prestar serviços médicos, um reembolsar quantias, um fornecer exames, alimentação, medicamentos, um resultado independente dos "esforços" (diligentes ou não) para obter os atos e fatos contratualmente esperados." (In Contratos no Código de Defesa do Consumidor, 4.ª ed. São Paulo: RT, 2004, p. 414).
Diante disso, impõe-se o reconhecimento do abuso da negativa, como bem sentenciou a douta Magistrada singular, não merecendo reparos a r. decisão.
DO DANO MORAL
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No tocante aos danos morais, assiste razão à requerida, e, de consequência, de se desprover o recurso de Apelação 1, quando a este particular, pois almeja o autor a majoração dos danos morais fixados em R$3.000,00 (três mil reais), para R$50.000,00 (cinquenta mil reais).
Porquanto é cediço que o mero inadimplemento contratual não gera a condenação por dano moral.
Sabe-se que a reparação, fundada no dano moral, tem reflexo diante da lesão a interesses que não possuem repercussão patrimonial, como a honra, a dignidade, a imagem, o nome, a intimidade ou a privacidade das pessoas.
Nesse sentido, Yussef Said Cahali destaca:
"(...) tudo aquilo que molesta gravemente a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais inerentes à sua personalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado, qualifica- se, em linha de princípio, como dano moral; não há como enumerá-los exaustivamente, evidenciando-se na dor, na angústia, no sofrimento, na tristeza pela ausência de um ente querido falecido; no desprestígio, na desconsideração social, no descrédito à reputação, na humilhação pública, no devassamento da privacidade; no desequilíbrio da normalidade psíquica, nos traumatismos emocionais, na depressão ou no desgaste psicológico, nas situações de constrangimento moral." (Dano Moral. 2.ª
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ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 20 - 21)
Ainda, conforme salientado pelo eminente Ministro do e. Superior Tribunal de justiça, Sálvio de Figueiredo Teixeira, no Recurso Especial 338.162/MG, julgado pela Quarta Turma e publicado em 18.02.02:
"O inadimplemento do contrato, por si só, pode acarretar danos materiais e indenização por perdas e danos, mas, em regra, não dá margem ao dano moral, que pressupõe ofensa anormal à personalidade. Embora a inobservância das cláusulas contratuais por uma das partes possa trazer desconforto ao contratante - e sempre o traz - trata-se, em princípio, de desconforto a que todos podem estar sujeitos pela própria vida em sociedade".
No mesmo sentido:
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - PLANO DE SAÚDE - QUIMIOTERAPIA - AUSÊNCIA DE COBERTURA - ILEGALIDADE - REVELIA - EFEITOS - DANOS MORAIS - AUSÊNCIA DE PROVA - MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL AUSÊNCIA DE PROVA EFETIVA DO DANO PSÍQUICO - MERO DISSABOR DO COTIDIANO - SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA - DISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - MANUTENÇÃO - APELO 1 DESPROVIDO. "Os efeitos da revelia não são absolutos, pois, em nome do princípio da livre apreciação das provas, permite-se que o magistrado afaste a presunção legal de veracidade, por entender que existem nos autos elementos probatórios
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contrários à pretensão do autor da ação contra o revel" (Apelação Cível n. 708.411- 9, 9ª Câmara Cível, Relatora Des. Rosana Amara Girardi Fachin). O inadimplemento contratual, por si só, não acarreta danos morais, visto que não ofende a qualquer dos direitos da personalidade do contratante, prejudicado pelo não cumprimento do avença. Constatada a sucumbência recíproca, e não sendo o caso de decaimento mínimo do pedido, deve a apelante arcar com parte dos ônus sucumbenciais, pouco importando o fato de haver sido reconhecida a revelia da apelada, visto que seu causídico participou de todas as fases processuais. O valor fixado a título de honorários advocatícios é condizente com o trabalho realizado pelos patronos das partes, estando também em sintonia com a legislação processual a respeito, não havendo que se falar em alteração. APELO 2 - NULIDADE DA SENTENÇA - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DA APELANTE PARA IMPUGNAR OS EMBARGOS DECLARATÓRIOS COM PEDIDO DE EFEITO MODIFICATIVO - INOCORRÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA, ANTE A AUSÊNCIA DE MODIFICAÇÃO DA SENTENÇA - AGRAVO RETIDO - CERCEAMENTO DE DEFESA - INOCORRÊNCIA - AGRAVO DESPROVIDO - AUTOR COM MOLÉSTIA GRAVE - INDICAÇÃO DE TRATAMENTO QUIMIOTERÁPICO - PREVISÃO CONTRATUAL DE COBERTURA - CONJUNTO DE MEDICAMENTOS - NEGATIVA DE PAGAMENTO SOB A JUSTIFICATIVA DE SER O MESMO EXPERIMENTAL - RECUSA INDEVIDA - NÃO CABE AO PLANO DE SAÚDE DECIDIR QUAL O PROCEDIMENTO MÉDICO MAIS ADEQUADO A PROPICIAR A SOBREVIDA DE SEU USUÁRIO - LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ - NÃO COMPROVAÇÃO - RECURSO NÃO PROVIDO. A restrição de tratamentos recém lançados no mercado, tende, com o tempo, a desamparar o segurado, sabendo-se que novas modalidades acarretam geralmente o abandono das antigas, analisando as particularidades de cada caso em concreto, pode o mesmo ser autorizado. (TJPR, AC 782.290-0, 10.ª Câm.
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Cív., Rel. Des. Domingos José Perfetto, DJ 18.07.12)
APELAÇÃO CÍVEL - PLANO DE SAÚDE - REAJUSTE DE MENSALIDADE PAUTADO EM MUDANÇA DE FAIXA ETÁRIA - PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE - APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E DO ESTATUTO DO IDOSO - FALHA NO DEVER DE INFORMAÇÃO - DISCRIMINAÇÃO DO IDOSO EM RAZÃO DA IDADE VEDADA - ABUSIVIDADE CONFIGURADA - CLÁUSULA NULA - PRECEDENTES DO STJ - RESTITUIÇÃO EM DOBRO INCABÍVEL - AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE MÁ-FÉ DO CREDOR - INTELIGÊNCIA DO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - DANOS MORAIS INDEVIDOS - MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL - INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO 1. Não se divisando do contrato cláusula expressa da qual se possa aferir, de forma clara e ostensiva, os índices de reajuste de mensalidade em caso de deslocamento de faixa etária, permitindo ao usuário que tivesse conhecimento do gravame que teria de suportar, quando atingisse as idades limítrofes, não há como acolher o aumento unilateral em quase 36% da contraprestação pecuniária, ante a flagrante onerosidade excessiva. 2. "Veda- se a discriminação do idoso em razão da idade, nos termos do art. 15, § 3º, do Estatuto do Idoso, o que impede especificamente o reajuste das mensalidades dos planos de saúde que se derem por mudança de faixa etária; tal vedação não envolve, portanto, os demais reajustes permitidos em lei, os quais ficam garantidos às empresas prestadoras de planos de saúde, sempre ressalvada a abusividade" (STJ, AgRg no REsp n.º 707286/RJ, Terceira Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti, j. 17.12.09). 3. A restituição em dobro dos valores pagos a maior, preconizada no art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, pressupõe a
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existência de má-fé do credor. 4. O inadimplemento contratual, por si só, pode acarretar danos materiais e indenização por perdas e danos, mas, em regra, não dá margem ao dano moral, que pressupõe ofensa anormal à personalidade. Precedentes. (TJPR, AC 690.099-6, 10.ª Câm. Cív., Rel. Des. Luiz Lopes, DJ 03.09.10)
De fato, a parte autora deve sim ter experimentado dissabores causados pela negativa de cobertura por parte da UNIMED, a qual, aliás, não foi sequer comprovada documentalmente, eis que o autor alega que a negativa com relação à cobertura dos materiais se deu de maneira verbal, deixando ainda de demonstrar que atendeu à solicitação da operadora à época, o que via de regra, não acontece, não existindo elementos de convicção suficientes a concluir pela ocorrência de abalo na psique, vez ajuizou a medida em 07.10.11 (fl. 02), obtendo a antecipação de tutela em 10.10.11 (fls. 142/145).
Afortunadamente, nada de grave ocorreu; o autor ajuizou a demanda, tendo o seu pedido de liminar acatado e resguardado o seu direito, não havendo que se falar em abalo na psique, destarte, ensejador de responsabilidade civil.
Tem lugar na espécie o seguinte precedente, de relatoria do Excelentíssimo Senhor Desembargador JURANDYR REIS JUNIOR:
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APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA À REALIZAÇÃO DE EXAME. APELO DA RÉ. 1. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE PREVISÃO DO PROCEDIMENTO EM RESOLUÇÃO DA ANS NA ÉPOCA DOS FATOS. IRRELEVÂNCIA. ROL NÃO EXAUSTIVO, QUE PREVÊ PROCEDIMENTOS OBRIGATÓRIOS. 2. COBERTURA CONTRATUAL DE SERVIÇOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓSTICO. AUSÊNCIA DE CLÁUSULA EXPRESSA EXCLUINDO A COBERTURA DO EXAME INDICADO À PARTE AUTORA. ESCOLHA DO PROCEDIMENTO ADEQUADO QUE CABE AO PROFISSIONAL MÉDICO. 3. CONDENAÇÃO AO RESSARCIMENTO DAS DESPESAS QUE NÃO IMPLICA NO DESEQUILÍBRIO ECONÔMICO- FINANCEIRO DO CONTRATO. 4. PRETENSÃO DE AFASTAMENTO DOS DANOS MORAIS ACOLHIDA. REALIZAÇÃO DO EXAME NA ÉPOCA DA INDICAÇÃO MÉDICA, EM DETRIMENTO DA RECUSA DE COBERTURA. ANGÚSTIA DECORRENTE DA POSSIBILIDADE DE NOVA NEGATIVA DO EXAME QUE CARACTERIZA MERO DISSABOR. 5. REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. 1. É plenamente possível a cobertura pelo plano de saúde de procedimentos não previstos no rol estabelecido pela Agência Nacional de Saúde, eis que tal rol não é exaustivo, e apenas especifica quais procedimentos devem ser obrigatoriamente cobertos pelas operadoras. 2. É devida a cobertura do exame indicado ao segurado quando o contrato não o excluiu expressamente, máxime porque compete aos profissionais médicos a análise da adequação dos procedimentos a serem utilizados para o tratamento de uma patologia. 3. Havendo cláusula contratual prevendo a cobertura de serviços complementares de diagnóstico, não há que se falar em despesa não prevista no orçamento do plano, nem em desequilíbrio econômico-financeiro do contrato. 4. Não é possível presumir que a recusa à cobertura de um exame tenha afetado de forma intensa e duradoura o equilíbrio psicológico da
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paciente, quando se constata que apesar disto, o exame foi realizado na época da indicação médica. A angústia decorrente da possibilidade de negativa de exames que seriam necessários no decorrer do tratamento médico não configura dano moral indenizável. 5. Faz-se necessária a redistribuição do ônus da sucumbência quando a reforma da sentença acarreta o desacolhimento de parte da pretensão inicial. (...). (AC 1.043.072-1, Rel. Des. Jurandyr Reis Júnior, unânime, j. 26.09.13)
Da verba sucumbencial:
Antes de analisar a adequação da verba honorária, cumpre observar que a reforma da Sentença implicou no decaimento do autor de parte da pretensão inicial, tornando necessária a redistribuição dos ônus sucumbenciais.
Portanto, tendo em vista o parcial provimento do recurso de Apelação 2, é de se reconhecer a sucumbência recíproca, haja vista que sendo dois os pedidos do autor e apenas um acatado, deve-se se ratear o valor das custas e despesas processuais na proporção de 50% (cinquenta por cento) para cada um dos litigantes, respectivamente.
Cumpre asseverar que para a fixação dos honorários advocatícios, outrossim, devem ser sopesados os critérios constantes das alíneas a, b e c, do § 3.º, do artigo 20 do Código de Processo Civil, as quais determinam
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que o Julgador observe: "a) o grau de zelo do profissional; b) o lugar da prestação de serviço; c) a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo Advogado e o tempo exigido para o seu serviço".
Assim, condena-se o autor ao pagamento dos honorários do Patrono da requerida, no importe de R$600,00 (seiscentos reais) e a requerida, ao pagamento de honorários advocatícios à Advogada do autor, estes fixados em R$1.000,00, com fulcro nos parágrafos 3.º e 4.º do artigo 20 do Código de Processo Civil, - considerando a magnitude da obrigação de fazer sobre o pedido de condenação em danos morais -, a ser atualizados pelos critérios da contadoria judicial, até o efetivo pagamento, vedada a possibilidade de compensação, ante o seu caráter alimentar e personalíssimo.
Diante do exposto, o voto é no sentido de conhecer do Apelo 1, do Autor, e negar-lhe provimento, e, por conhecer-se e dar-se parcial provimento ao Apelo 2, da UNIMED DO ESTADO DO PARANÁ FEDERAÇÃO ESTADUAL DAS COOPERATIVAS MÉDICAS LTDA., para o fim tão-só de excluir a indenização por danos morais e redistribuir-se a verba sucumbencial.
III. DECISÃO:
ACORDAM os integrantes da c. 10.ª Câmara Cível do e. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por
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unanimidade de votos em conhecer do Apelo 1, e negar-lhe provimento, e, por conhecer-se e dar-se parcial provimento ao Apelo 2, nos termos da fundamentação.
Participaram do julgamento os Excelentíssimos Senhores Desembargadores LUIZ LOPES e ÂNGELA KHURY MUNHOZ DA ROCHA.
Curitiba, 11 de abril de 2014.
DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE Elizabeth Nogueira Calmon de Passos Juíza de Direito Substituta em 2.º Grau - Relatora Convocada -
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