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Acórdão
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 1117690-8, DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA - 19ª VARA CÍVEL APELANTE :INSTITUIÇÃO ADVENTISTA SUL BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO APELADO : JOÃO VICTOR CÉ STEIL RELATOR : DES. JORGE DE OLIVEIRA VARGAS EMENTA. I - AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS. BULLYING. AMEAÇA E AGRESSÃO. ATOR QUE CONTAVA COM 6 ANOS DE IDADE À ÉPOCA. CONDUTA OMISSIVA DA INSTITUIÇÃO DE ENSINO. QUEBRA DO DEVER DE CUIDADO. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE. II AGRAVOS RETIDOS NÃO CONHECIDOS POR AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO DE APRECIAÇÃO PELO TRIBUNAL, NOS TERMOS DO § 1º DO ARTIGO 523 DO CPC. III AGRAVO RETIDO SOBRE A ILEGITIMIDADE ATIVA DO AUTOR PARA PLEITEAR DANOS MATERIAIS. PREJUDICADO. IV APELAÇÃO CÍVEL. REQUERIMENTO DE NULIDADE DA SENTENÇA POR INSUFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO QUANTO À CONDENAÇÃO EM INDENIZAÇÃO PELOS DANOS MATERIAIS. PREJUDICADO. V GASTOS COM MENSALIDADE, CONDUÇÃO, UNIFORME E MATERIAL ESCOLARES. RESSARCIMENTO INDEVIDO DIANTE DA UTILIZAÇÃO DOS SERVIÇOS PELO AUTOR. SENTENÇA MODIFICADA QUANTO AO PONTO PARA EXCLUIR E REFERIDA INDENIZAÇÃO. VI RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA RÉ. NEXO DE CAUSALIDADE E DANO DEMONSTRADO. INDENIZAÇÃO PELOS DANOS MORAIS DEVIDA, CUJO VALOR É DE SER MANTIDO ESPECIALMENTE DIANTE DO CARÁTER PEDAGÓGICO E PREVENTIVO DA MEDIDA. VII REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA, DIANTE DO AUTOR TER DECAÍDO EM PARTE DE SEU PEDIDO. VIII RECURSO DE APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDO. CONCLUSÃO: RECURSOS DE AGRAVOS RETIDOS DE FLS. 110/111 (APENSO) E 223 NÃO CONHECIDOS. AGRAVO RETIDO DE FLS. 180/184 PREJUDICADO E RECURSO DE APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDO. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1117690-8, de Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - 19ª Vara Cível, em que é Apelante INSTITUIÇÃO ADVENTISTA SUL BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO e Apelado JOÃO VICTOR CÉ STEIL. I RELATÓRIO: Insurge-se a ré/apelante frente a r. sentença de fls. 257/261 que, em ação de reparação de danos morais e materiais, julgou parcialmente procedente o pedido inicial, condenando-a ao pagamento dos danos materiais no importe de R$ 1075,95, com correção monetária, desde 05 de abril de 2007, e incidência dos juros de mora de 1% ao mês, contados da citação; ao pagamento dos
danos morais, no valor de R$ 9.330,00, com correção monetária e juros de mora de 1% ao mês a partir da sentença; e, condenando-a integralmente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios em 15% sobre o valor da condenação, diante do autor ter decaído na parte mínima do pedido. Requer, preliminarmente, a análise do agravo retido de fls. 180/184, onde sustenta a ilegitimidade ativa para o pedido de reparação dos danos materiais. Além disso, alega a nulidade da sentença por carência de fundamentação em relação à condenação de indenização por danos materiais. No mérito, sustenta, que é indevida a reparação por danos materiais relativos às mensalidades escolares dos meses de fevereiro e março de 2007, bem como do serviço de transporte escolar e uniforme, uma vez que os mesmos foram efetivamente utilizados, além de que os pagamentos não foram demonstrados. Assevera também, que o autor não comprovou as ameaças ou eventual constrangimento por parte da administração escolar, não cabendo condenação de indenização por danos morais, pelo evento "quebra de unha", pois o mesmo teria ocorrido fora de suas dependências, quando do desembarque do transporte escolar para o interior da escola, cabendo a esta empresa a responsabilidade; que a fratura no braço deu-se em decorrência de caso fortuito, pois o autor teria colidido com outra criança e caído no pátio; que não há prova de agressão física ao autor; no caso, de ser mantida a condenação pelos danos morais, requer sua redução. Sem contrarrazões conforme certidão de fls. 287. Parecer da douta Procuradoria Geral de Justiça às
fls.297/299 pelo parcial provimento do recurso, para que se exclua da sentença recorrida a condenação no pagamento de indenização pelos danos materiais, com a ressalva de que, o valor da indenização por danos morais deve ser depositada em nome do mesmo, em conta poupança, a ordem do Juízo de Direito da Décima Nona Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba. É a breve exposição. II - VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO: Não conheço dos agravos retidos de fls. 110/111 (apenso) e 223, por ausência de requerimento de apreciação dos mesmos, nos termos do art. 523, § 1º do CPC. No mais, conheço do agravo retido de fls. 180/184 e da apelação, eis que ambos são tempestivos, estando devidamente preparado o de apelação. Agravo Retido de fls. 180/184 Sobre a ilegitimidade ativa do autor para pleitear os gastos havidos com as mensalidades, transporte, uniforme e materiais escolares, tal questão será analisada no recurso de apelação. Apelação Quanto aos danos materiais, comungo com o entendimento exarado pela douta Procuradoria Geral de Justiça, o qual faz parte integrante desta decisão, pois: "As mensalidades cobradas, conforme contrato firmado entre
as partes (fls. 95/97), dizem respeito aos meses em que o menor autor frequentou as aulas, conforme documento acostado às fls. 62, e planilha apresentada com a inicial às fls. 11. De igual forma, durante o período em que frequentou mencionada escola, o menor autor valeu-se do transporte escolar contratado, mediante o pagamento mensal de R$ 100,00, perfazendo o total de R$ 300,00, conforme recibo de fls. 63. Temos assim que, ao contrário do decidido pelo Meritíssimo Juiz `a quo', tais despesas, juntamente com a compra do uniforme escolar comprovado pela nota fiscal de fls. 64 e compra de material escolar, não comprovado nos autos, foram realizadas em proveito do menor autor durante o período em que o mesmo frequentou o estabelecimento de ensino da requerida. Além disso, não existe nos autos prova de que com a transferência de escola, motivada pelos fatos que deram origem ao processo, tenha o menor autor sofrido prejuízo no aproveitamento escolar durante o restante do ano letivo a justificar a pretendida indenização por danos materiais, visto que, `não há responsabilidade civil onde não existe prejuízo' (Henri Lalou, citado por Caio Mario da Silva Pereira in Responsabilidade Civil, 2ª ed., Editora Forense, 1990, pg. 34). Na verdade, o dano material passível de ressarcimento, seria as despesas com o tratamento médico a que o autor foi submetido, despesas essas, como bem disse o doutor Promotor de Justiça no parecer lançado às fls. 249/255 e reconheceu a sentença atacada, não comprovadas" (fls. 298/299). Portanto, tendo o autor usufruído dos serviços de transporte e educacional, bem como utilizando do uniforme e material
escolar que eram meios necessários para a atividade educacional, não é devida a reparação das despesas, uma vez que legítimas. Resta prejudicado assim, o agravo retido sobre a ilegitimidade ativa do apelado para pleitear os danos materiais, bem como a alegação de insuficiência de fundamentação na r. sentença quanto ao ponto. No que tange aos danos morais, os mesmos são devidos diante da prestação de serviço defeituosa por parte da ré, que se omitiu após o relato de perseguição por parte da mãe do autor, não tomando as providências adequadas ao caso perante aos alunos, dando azo a ocorrência de outro episódio de agressão que gerou a fratura no braço do autor. Saliente-se ainda que a responsabilidade da escola é objetiva, bastando a demonstração do dano e do nexo de causalidade, o que ficou evidenciado pela prova documental de fls. 43, 44, 51, 55 e 57 e pelos depoimentos colhidos, notadamente o prestado pela Sra. Edna Marli Ferreira Franco Machado, funcionária da ré/apelante, uma vez que a mesma afirmou desconhecer as comunicações feitas pela mãe do autor após o primeiro acontecimento, donde se denota que nenhuma providência em favor do aluno foi tomada, falhando a escola com seu dever de cuidado para com o autor. Sobre os fatos, vale transcrever o seguinte trecho da sentença, a qual também é parte integrante do voto: "O autor contava com 6 anos à época dos fatos, foram realizadas reclamações e pedidos de intervenção por escrito, mas a ré omitiu-se e aqui não demo0nstrou qualquer resposta
ao fato, a não ser agora, atribuindo a inevitabilidade, a normalidade e ao próprio aluno. Exemplo claro é a mensagem da Professora que se limitou a afastar o autor do convívio com os demais: `Profa. Vivian O João Victor está com um pouco de medo da volta à escola, se puder conversar c/ ele para acalmá-lo Peço que de a ele, o remédio que está na mochila às 16:s.Mari' (fls. 55) `Mãe conversei com ele, peço que mande um joguinho que ele possa sentar e brincar com seus colegas na hora do recreio p/ não se machucar. O remédio foi dado. Um abraço. Profa. Vivian'" Os fatos relatados e provados fogem a normalidade do cotidiano escolar e não podem ser tratados como simples desentendimentos entre alunos, remetendo o uso reiterado, imoderado e intencional da violência físico ou moral, que só cessou porque o autor foi retirado daquele estabelecimento escolar, embora a ré, pelas próprias condições, pudesse ter atuado antes para prevenir esse desfecho. A situação vivenciada pelo autor amolda-se aos padrões constatados em casos semelhantes: `Os estudos também identificam os locais onde esses atos agressivos mais ocorrem. O grande palco dessa tragédia é a própria sala de aula, seguido pelo pátio do recreio escolar, além das imediações da escola, durante o período de chegada e saída dos alunos. Basicamente os sintomas de bullying
podem ser divididos em quatro categorias: física, verbal, moral ou psicológica e sexual. Os sintomas de agressão física estão relacionados com atos violentos como bater, chutar, empurrar, derrubar, ferir e perseguir'. (TEIXEIRA, Gustavo, Manual antibullying: para alunos, pais e professores, BestSeller, 2011, p. 24/25) As lesões físicas sofridas são incontroversas. A relação de causalidade configura-se pelo fato de a instituição ter sido informada da existência e da progressão das ofensas proferidas contra o autor. Some-se a isso o comportamento negligente da ré, como requisito para sua responsabilização." (fls. 259) Não há reparos a serem feitos no valor de R$ 9.330,00, atribuído à indenização pelos danos morais, porque o mesmo é razoável e atende ao caráter pedagógico e preventivo da medida, diante do comportamento omissivo da apelante, bem como servem para reparar a ofensa sofrida pelo autor. Finalmente, quanto a observação da douta Procuradoria Geral de Justiça, no sentido de que a indenização seja depositada em conta poupança, a mesma deve ser requerida e apreciada pelo juízo de primeiro grau, oportunamente. Por essas razões, dou parcial provimento ao recurso, apenas para excluir da condenação a indenização pelos danos materiais. Finamente, em razão de o autor ter decaído em parte de seu pedido, redistribuo o ônus de sucumbência na proporção de 20% a cargo do autor e 80% para a ré, mantendo-se a fixação dos
honorários advocatícios em 15% sobre o valor da condenação, cabendo a compensação dos mesmos, nos termos do artigo 21 do CPC e Súmula 306 do STJ, com a observação do artigo 12 da Lei 1060/50 em relação ao autor, em relação as custas processuais. III - DECISÃO: Diante do exposto, acordam os Desembargadores da 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em não conhecer os agravos retidos de fls.110/111 e 223, julgar prejudicado o agravo retido de fls. 180/184, e dar provimento parcial à apelação, nos termos da fundamentação. Participaram da sessão e acompanharam o voto do Relator os Excelentíssimos Senhores Desembargadores JOSÉ SEBASTIÃO FAGUNDES CUNHA (PRESIDENTE COM VOTO) e JOSÉ LAURINDO DE SOUZA NETTO. Curitiba, 21 de agosto 2014.
Des. JORGE DE OLIVEIRA VARGAS Relator
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