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Acórdão
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Certificado digitalmente por: SIGURD ROBERTO BENGTSSON
Tribunal de Justiça do Estado do Paraná AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1.425.244-7, DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA 10ª VARA CÍVEL. RELATOR : DES. SIGURD ROBERTO BENGTSSON AGRAVANTES : ARTHUR KRUGER E OUTROS AGRAVADA : BRUNHILDE KRUGER AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS EM PRIMEIRA FASE. IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA JULGADA IMPROCEDENTE. INSURGÊNCIA. PEDIDO GENÉRICO. IMPOSSIBILIDADE DE ESTABELECER O REAL VALOR ECONÔMICO DA AÇÃO NA PRESENTE FASE, QUE SE LIMITA A RECONHECER A EXISTÊNCIA, OU NÃO, DA OBRIGAÇÃO DE PRESTAR CONTAS. VALOR DA CAUSA QUE APENAS NA SEGUNDA FASE PODERÁ SER DEFINIDO. INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 286, INCISO III E 915 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. FIXAÇÃO POR ESTIMATIVA QUE NÃO FERE O DISPOSTO NO CPC. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I RELATÓRIO.
Trata-se de Agravo de Instrumento sob nº 1.425.244-7 interposto contra a decisão de fls. 210/213-TJ, proferida nos autos da Impugnação ao Valor da Causa sob nº 0003089-25.2014.8.16.0194, que rejeitou a impugnação interposta pelos ora agravantes, mantendo o valor atribuído à Ação de Prestação nº 0032569-45.2014.8.16.0194, de R$ 200.00,00 (duzentos mil reais).
Pretendem os recorrentes a reforma da decisão, sob os seguintes fundamentos: i) a agravada ajuizou Ação de Prestação de Contas (n° 0032569-45.2014.8.16.0194), atribuindo à causa o valor de R$
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200.000,00 (duzentos mil reais); ii) a fixação foi feita irregularmente, desatendendo o que estabelece o artigo 260 do Código de Processo Civil; iii) trata-se de manobra pensada, já que a agravada, beneficiária da assistência judiciária gratuita, está incólume do ônus da sucumbência; iv) com exceção de um imóvel que gera frutos (aluguel) no valor de R$ 8.201,40 (oito mil duzentos e um reais e quarenta centavos), que a agravada é titular de apenas 50% do usufruto, único digno de prestação de contas, haja vista que os demais imóveis não geram frutos; v) a concessão de efeito ativo e/ou suspensivo é necessária, já que existe possibilidade de dano e enriquecimento sem causa da advogada da agravada em caso do sucumbência, em decorrência da estimativa absurda do valor da causa. Afirmaram que os agravantes poderão ser penalizados em honorários excessivos, ou pior, se sair vitoriada, não haverá penalidade para agravada, já que é beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Indeferido o almejado efeito (fls. 222/222v-TJ).
Apesar de ter sido intimada, a agravada não apresentou resposta, conforme certidão de fl. 226-TJ.
É a breve exposição.
II - VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO.
Presentes os pressupostos de admissibilidade intrínsecos (legitimidade, interesse, cabimento e inexistência de fato impeditivo ou extintivo) e extrínsecos (tempestividade e regularidade formal), conheço do recurso.
Pretendem os agravantes a reforma da decisão, argumentando que o valor atribuído na Ação de Prestação de Contas, R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), é exorbitante e desatende o disposto no
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Código de Processo Civil.
Segundo preceitua o artigo 286 do CPC, o pedido realizado pelo autor deve ser certo e determinado, porém em algumas hipóteses poderá ser genérico:
Art. 286. O pedido deve ser certo ou determinado. É lícito, porém, formular pedido genérico: I - nas ações universais, se não puder o autor individuar na petição os bens demandados; II - quando não for possível determinar, de modo definitivo, as conseqüências do ato ou do fato ilícito; III - quando a determinação do valor da condenação depender de ato que deva ser praticado pelo réu.
Na hipótese do inciso III, encontra-se o pedido formulado nas ações de prestação de contas, conforme a lição de LUIZ GUILHERME MARINONI1:
"5. Dependência de Ato do Réu. É lícito ao autor formular pedido mediato genérico quando a determinação do valor da condenação depender de ato que deva ser praticado pelo réu. Exemplo clássico é o da ação de prestação de contas, em que é possível ao autor formular pedido para que o réu arque com o saldo que se apurar em sentença, após a apresentação das contas (art. 918, CPC). "
Assim, pode se admitir que ao ajuizar a Ação de Prestação de Contas, geralmente, a parte autora não possui elementos suficientes para estabelecer o valor representativo do proveito econômico
1 MARINONI, Luiz Guilherme. Código de Processo Civil comentado artigo por artigo / Luiz Guilherme Marinoni, Daniel Mitidiero. 2ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 296.
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consequente da ação, devendo ser levado em conta, ainda, que na primeira fase do referido procedimento é impossível definir um valor certo, já que o Juiz decidirá apenas se há, ou não, o dever de prestar contas.
Sobre a petição inicial da ação de prestação de contas, é a lição de JOSÉ MIGUEL GARCIA MEDINA2:
"Em ambos os casos indicados pelo art. 914 do CPC, a inicial deverá preencher os requisitos do arts. 282 e 283 do CPC. A indicação das provas será fundamental e não se limitará à prova pericial quando exista a necessidade de comprovar a relação jurídica que justifique a pretensão de exigir ou de prestar as contas. Na hipótese do art. 914, II, do CPC, o autor deverá oferecer, de plano, as contas como embasamento de sua causa de pedir. O valor da causa deverá refletir o bem economicamente perseguido. Esta solução é aplicável na inicial da ação de oferecimento das contas, pois, de antemão, o obrigado informa o saldo efetivo das contas sobre o qual pede a chancela judicial. Por outro lado, tratando-se de ação ajuizada para a exigência das contas, muda-se o panorama. O pedido poderá ser genérico (cf. art. 286, III, do CPC). "
Em outras palavras, é no mínimo inviável que a parte autora da Ação de Prestação de Contas possa definir, antes mesmo do fim da primeira fase, qual o proveito econômico que poderá ser consequência de um eventual julgamento de procedência, sendo-lhe facultado arbitrar um valor de alçada, porém com a ressalva de que não pode tal valor ser exorbitante.
2 MEDINA, José Miguel Garcia. Procedimentos cautelares e especiais: ações coletivas, ações constitucionais, jurisdição... / José Miguel Garcia Medina, Fábio Caldas de Araújo, Fernando da Fonseca Gajardoni. 5. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. (Processo Civil Moderno; v. 4), p. 275.
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Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VALOR DA CAUSA. PEDIDO GENÉRICO. 1. De acordo com o entendimento desta Corte, "a formulação de pedido genérico é admitida, na impossibilidade de imediata mensuração do quantum debeatur, como soem ser aqueles decorrentes de complexos cálculos contábeis, hipótese em que o valor da causa pode ser estimado pelo autor, em quantia simbólica e provisória, passível de posterior adequação ao valor apurado pela sentença ou no procedimento de liquidação. Precedentes. 2. No presente caso, o acórdão recorrido salienta a impossibilidade de imediata ponderação do efetivo conteúdo econômico decorrente da procedência da presente ação que dependem, necessariamente, de apuração em liquidação de sentença, por trazer discussão que envolve a fixação de base de cálculo de comissões de representação comercial, repetição de quantias pagas em excesso, indenização pelo fundo de comércio e clientela, entre outros. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 806928/RS, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, Julgado em 15/12/2015, DJe 01/02/2016)
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL - IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA - FORMULAÇÃO DE PEDIDO DE INDENIZAÇÃO GENÉRICO - ATRIBUIÇÃO DE VALOR SIMBÓLICO - DECISÃO QUE DEU PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. INSURGÊNCIA DO IMPUGNANTE. 1. O pedido de indenização formulado foi genérico, uma vez que a parte autora não tinha como aferir, de imediato, o conteúdo econômico da demanda. Sendo assim, legítima foi a atribuição de valor simbólico à causa, nos termos da
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jurisprudência do STJ. 2. A constatação de que houve a formulação de pedido genérico independe do reexame de fatos e provas, dependendo apenas da leitura dos requerimentos finais da petição inicial. 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 1294449/MG, Rel. Min. MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, Julgado em 02/10/2014, Dje 15/10/2014)
Não distoa o entendimento de outros Tribunais:
DECISÃO MONOCRÁTICA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. VALOR DE ALÇADA. Cuidando-se de ação de prestação de contas, via de regra, os autores não possuem qualquer elemento capaz de estabelecer o valor representativo do proveito econômico decorrente da ação, mormente considerando-se que, na primeira fase do procedimento, ostenta-se impossível definir um valor estimado, porquanto se cuida de decisão que define tão somente a obrigação de dar ou não contas. Igualmente, na segunda fase do procedimento, também não se observa valor econômico definido a ser fixado, uma vez que sequer se sabe se haverá saldo favorável aos autores. Daí por que possível ser atribuído à causa o valor de alçada. NEGADO SEGUIMENTO O RECURSO, EM DECISÃO MONOCRÁTICA. (Agravo de Instrumento Nº 70062813514, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Adriana da Silva Ribeiro, Julgado em 09/03/2015)
AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS - IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA - VALOR ESTIMATIVO - PREVALÊNCIA DO VALOR INDICADO PELO AUTOR. - O valor da causa em ações que têm conteúdo econômico deve corresponder à importância objetivada.
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Entretanto, em ações de prestação de contas, quando não se sabe na primeira fase exatamente o valor certo que se persegue, tem a jurisprudência se inclinado a fixar um valor estimativo, apenas para fins de alçada, que poderá ser aumentado ou reduzido, posteriormente, quando apurados os valores das contas apresentadas, se verificar a existência de eventual saldo devedor. Nessas situações, quando não há parâmetro legal para sua fixação, caberá ao demandante atribuir o valor da causa por mera estimativa. - Recurso não provido. (TJMG - Agravo de Instrumento-Cv 1.0707.13.008313-2/001, Relator (a): Des. (a) Anacleto Rodrigues (JD CONVOCADO), 12ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 12/11/2014, publicação da súmula em 20/11/2014)
Assim, é razoável concluir que a demanda principal ainda não tem valor certo, sendo possível que a parte autora, para cumprir o determinado na lei, atribua um valor à causa estimativo, desde que não se demonstre exorbitante, uma vez que impossível prever um valor certo e determinado no momento do ajuizamento da ação.
Porém, no presente caso, o montante arbitrado pela ora agravada não é irrisório (R$ 200.00,00 duzentos mil reais), e diante do conteúdo probatório produzido, o julgamento de procedência da impugnação é a medida de prudência, devendo o valor da causa ser fixado em R$ 4.100,70 (quatro mil, cem reais e setenta centavos), sendo imprescindível salientar que tal medida não causará às partes qualquer prejuízo.
Logicamente, como o valor atribuído pode não representar de maneira real o valor econômico da causa, não poderá este ser utilizado para a fixação dos honorários sucumbenciais, quando, posteriormente, se descobrirá o valor efetivo da pretensão econômica.
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Conclusão.
Diante do exposto, voto no sentido de conhecer e dar provimento ao recurso de agravo de instrumento, julgando procedente a impugnação ao valor da causa.
III - DECISÃO.
Acordam os Desembargadores da 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer e dar parcial provimento ao recurso de agravo de instrumento, nos termos do voto do Relator.
Participaram do julgamento os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Ruy Muggiati e Mario Nini Azzolini.
Curitiba, 16 de março de 2016.
Des. Sigurd Roberto Bengtsson Relator
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