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Acórdão
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Certificado digitalmente por: ROBERTO DE VICENTE APELAÇÃO CRIMINAL Nº. 1616097-3 DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE GRANDES RIOS APELANTE: GILBERTO BISCAIA DOS SANTOS APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ RELATOR: DES. ROBERTO DE VICENTE APELAÇÃO CRIMINAL CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DOS DELITOS DE EMBRIAGUEZ AO VOLANTE E DESACATO PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO ACOLHIDO EM PARTE COM RELAÇÃO AO CRIME DE EMBRIAGUEZ AO VOLANTE A AUTORIA E MATERIALIDADE ESTÃO DEVIDAMENTE COMPROVADAS TERMO DE CONSTATAÇÃO ALIADO A CONFISSÃO E DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS PROVAS SUFICIENTES A FUNDAMENTAR A CONDENAÇÃO, QUE É MANTIDA. COM RELAÇÃO AO CRIME DE DESACATO, PLEITO DE ABSOLVIÇÃO ACOLHIDO - CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE EXERCIDO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO RESP 1640084/SP - DECLARAÇÃO DE INCOMPATIBILIDADE DA PREVISÃO PENAL COM O PACTO DE SAN JOSÉ DA COSTA RICA, NORMA DE CARÁTER SUPRALEGAL ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE, COM FUNDAMENTO NO ARTIGO 386, INCISO III, DO CPP. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal nº. 1616097-3, da Vara Única da Comarca de Grandes Rios, em que é apelante GILBERTO BISCAIA DOS SANTOS e apelado MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ. GILBERTO BISCAIA DOS SANTOS foi denunciado como incurso nas sanções do artigo 306 da Lei nº.9.503/97 c/c artigo 331 do Código Penal, na forma do artigo 69 do Código Penal, em razão dos seguintes fatos (mov. 31.1): "Fato 01 No dia 15 de novembro de 2015, por volta das 21h00min, em via pública, localizada na Avenida São Paulo, s/n°, área central, no Município de Rosário do Ivaí, nesta Comarca de Grandes Rios/PR, o denunciado GILBERTO BISCAIA DOS SANTOS, dolosamente, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, conduzia o veículo FORD KA, de cor roxa, placas HVG-7747, com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool, que foi constatada por meio de sinais de embriaguez como 'sonolência, olhos vermelhos, agressividade, arrogância e exaltação'.
Fato 02 Ato contínuo, na mesma data, horário e local, o denunciado GILBERTO BISCAIA DOS SANTOS, agindo dolosamente, com consciência e vontade livres, desacatou os milicianos Evandro Dirceu Alegre e Thiago Henrique da Silva, no exercício de suas funções, proferindo-lhes os seguintes xingamentos "pau no cu", "cornos" e "filha da puta".
Finda a instrução, a MM. Juíza proferiu sentença (mov. 105.1), julgando procedente a denúncia para o fim de condenar o réu GILBERTO BISCAIA DOS SANTOS, devidamente qualificado nos autos, como incurso nas sanções do art. 306, caput, c/c § 1º, inciso II, da Lei nº 9.503/97 e artigo 331 do Código Penal, na forma do artigo 69 do Código Penal. A pena definitiva restou estabelecida em 01 (um) ano e 3 (três) meses de detenção, a ser cumprida em regime semiaberto, além de 11 (onze) dias- multa e proibição do direito de se obter habilitação para dirigir veículo automotor pelo período de 07 (sete) meses. Ainda, entendeu por bem o Juízo a quo em substituir a pena privativa de liberdade por 02 (duas) restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços a comunidade e prestação pecuniária.
GILBERTO BISCAIA DOS SANTOS apresentou recurso (mov. 120.1), afirmando: que "não foi oferecido a ele o teste do bafômetro, deste modo não pode ser atestado sua real embriagues"; que "temos que inexistente prova pericial a comprovar a fantasiosa ebriedade do réu, com o que resta comprometida a própria materialidade do delito, o qual exige e reclama como elemento compositivo do tipo, prova cabal e irretorquível da alcoolemia"; que "confessou que no dia dos fatos ingeriu bebida alcoólica, entretanto não estava dirigindo veículo automotor, além do mais não ficou comprovado nos autos que o recorrente estava praticando o ato, pois até mesmo em depoimento os policiais relatam que no momento da abordagem o veículo não estava em movimento, assoma imperiosa sua absolvição por ausente a prova da materialidade da infração"; que "sendo a denúncia não deveria ser aceita pois não ficou preenchido o verbo que é conduzir veículo automotor"; que "afirmou que no dia dos fatos ingeriu bebida alcoólica, entretanto na hora da abordagem pelos agentes policiais, o veículo estava parado e com o pneu furado, o mesmo foi categórico e peremptório em negar a imputação que lhe é irrogada pela peça portal coativa, ou seja, de que dirigia embriagado"; que "depoimento prestado, no caminhar da instrução judicial, pelo policial militar que participou das diligências que culminaram com a detenção do réu (aqui apelante), não poderá, operar validamente contra o recorrente, porquanto, constitui-se (o policial) em algoz e detrator do réu possuindo interesse direto e indisfarçável na êxito da ação penal, da qual foi seu principal mentor"; que "inexistindo prova segura, correta e idônea a referendar e estratificar a sentença, impossível resulta sua manutenção, assomando inarredável sua ab-rogação, sob pena de perpetrar-se gritante injustiça"; que "somente a prova judicializada, ou seja àquela depurada no inferno do contraditório é factível de crédito para confortar um juízo de reprovação"; que "todos os caminhos conduzem, a absolvição do réu".
O Ministério Público apresentou contrarrazões (mov. 123.1) manifestando-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso para o fim de manter-se a sentença condenatória. A Procuradoria Geral de Justiça, no parecer de fls. 11/21, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do apelo para o fim de manter inalterada a sentença recorrida. É o relatório. VOTO Trata-se de Apelação Crime interposta contra a r. sentença que, nos autos nº. 0001034-06.2015.8.16.0085 (mov. 105.1), julgou procedente a denúncia para condenar o réu GILBERTO BISCAIA DOS SANTOS, devidamente qualificado nos autos, como incurso nas sanções do art. 306, caput, c/c § 1º, inciso II, da Lei nº 9.503/97 e artigo 331 do Código Penal, na forma do artigo 69 do Código Penal. A pena definitiva restou estabelecida em 01 (um) ano e 3 (três) meses de detenção, a ser cumprida em regime semiaberto, além de 11 (onze) dias-multa e proibição do direito de se obter habilitação para dirigir veículo automotor pelo período de 07 (sete) meses. Ainda, entendeu por bem o Juízo a quo em substituir a pena privativa de liberdade por 02 (duas) restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços a comunidade e prestação pecuniária. O recurso merece parcial provimento. Com relação à embriaguez ao volante Primeiramente relevante destacar que, no caso em comento, o fato ocorreu na vigência da redação do artigo 306, do Código de Trânsito Brasileiro, dada pela Lei nº 12.760/2012, in verbis: Art. 306. Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência: (Redação dada pela Lei nº 12.760, de 2012)
Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. § 1o As condutas previstas no caput serão constatadas por: (Incluído pela Lei nº 12.760, de 2012) I - concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar; ou (Incluído pela Lei nº 12.760, de 2012) II - sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora. (Incluído pela Lei nº 12.760, de 2012) § 2o A verificação do disposto neste artigo poderá ser obtida mediante teste de alcoolemia, exame clínico, perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito à contraprova. (Incluído pela Lei nº 12.760, de 2012) § 3o O Contran disporá sobre a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo. (Incluído pela Lei nº 12.760, de 2012) Mediante mera leitura de aludido dispositivo legal, possível constatar que o delito nele previsto é de perigo abstrato, consumando-se com o ato de conduzir o veículo automotor "... com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência", não sendo aplicável o princípio da insignificância. Ainda, nos termos do referido dispositivo legal, a verificação "... poderá ser obtida mediante teste de alcoolemia, exame clínico, perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito à contraprova". Desse modo, evidente que a comprovação da alteração da capacidade psicomotora poderá ocorrer mediante utilização de qualquer dos meios de prova indicados no parágrafo 2º, dentre elas, o termo de constatação de estado de embriaguez e a prova testemunhal, conforme verificado in casu. Outrossim, o entendimento jurisprudencial desta 2ª Câmara Criminal sobre o tema, é o de que, mesmo com as modificações da Lei nº. 12.760/2012, o delito previsto no art. 306, do Código de trânsito Brasileiro, trata-se de crime de perigo abstrato, sendo desnecessária qualquer demonstração de ofensa à bem material juridicamente relevante para que a conduta seja coibida.
Nesse sentido, in verbis: EMENTA: APELAÇÃO CRIME- EMBRIAGUEZ AO VOLANTE- INDÍCIOS DE QUE O RECORRENTE ESTAVA CONDUZINDO O VEÍCULO SOB EFEITO DE BEBIDA ALCOÓLICA - FATO OCORRIDO JÁ SOB A ÉGIDE DA LEI 12.760/2012 - DESNECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA EFETIVA POTENCIALIDADE LESIVA DA CONDUTA - CRIME DE MERA CONDUTA E DE PERIGO ABSTRATO, SENDO DISPENSADA A PROVA DE QUALQUER RESULTADO NATURALÍSTICO - MATERIALIDADE E AUTORIA INCONTROVERSAS - DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS UNÍSSONOS - AUSÊNCIA DE QUALQUER INDÍCIO DE ACUSAÇÃO INVERÍDICA - INSURGÊNCIA RECURSAL NO TOCANTE À DOSIMETRIA DA PENA. CONCURSO ENTRE A AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA E A ATENUANTE DA CONFISSÃO - COMPENSAÇÃO - MATÉRIA PACIFICADA NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA POR OCASIÃO DO JULGAMENTO DO RESP N.º 1.154.752/RS. ENTENDIMENTO RECENTE - DOSIMETRIA QUE DEVE SER READEQUADA, COM A FIXAÇÃO DA PENA EM SEU MÍNIMO LEGAL- RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA. (grifei). (TJPR - 2ª C.Criminal - AC - 1299162-3 - São Miguel do Iguaçu - Rel.: Des. JOSÉ CARLOS DALACQUA - Unânime - - J. 11.12.2014)
EMENTA: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME DE EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. ARTIGO 306, CAPUT, C/C § 1º, INCISO I, DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 12.760/2012. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. SUPOSTA INÉPCIA. NÃO DESCRIÇÃO DA SITUAÇÃO DE PERIGO CONCRETO DECORRENTE DA CONDUTA NARRADA NA EXORDIAL ACUSATÓRIA.INSURGÊNCIA. ACOLHIMENTO. CRIME DE PERIGO ABSTRATO OU PRESUMIDO.DESNECESSIDADE DA DEMONSTRAÇÃO DA EFETIVA POTENCIALIDADE LESIVA DA CONDUTA À INCOLUMIDADE PÚBLICA. ESTADO DE EMBRIAGUEZ QUE RESTOU DEVIDAMENTE COMPROVADO NO CASO EM CONCRETO MEDIANTE A REALIZAÇÃO DO TESTE DO ETILÔMETRO. PRECEDENTES DO EXCELSO PRETÓRIO, DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTA CORTE. CONFIGURAÇÃO DOS REQUISITOS PREVISTOS NO ARTIGO 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.RECEBIMENTO DA DENÚNCIA QUE SE IMPÕE.DECISÃO REFORMADA. RECURSO PROVIDO. (grifei). (TJPR - 2ª C.Criminal - RSE - 1142931-3 - Cascavel - Rel.: Des. LAERTES FERREIRA GOMES - Unânime - - J. 20.03.2014). Assim, no caso em comento, tendo em conta as provas acostadas aos autos, possível constatar que a alteração da capacidade psicomotora da apelante restou devidamente comprovada, inclusive, ao contrário do alegado pela defesa, a prova testemunhal e a confissão do apelante demonstra, sem sombra de dúvida que o mesmo estava dirigindo após ingestão de bebida alcoólica. A materialidade do delito resta clara nos seguintes documentos Auto de Prisão em Flagrante (mov. 1.3), Boletim de Ocorrência
(mov. 1.10), Termo de Constatação de Sinais de Alteração de Capacidade Psicomotora (mov. 1.9), bem como na prova oral colhida. Inclusive, o termo de constatação foi elaborado em conformidade com a Resolução nº. 432/2013, do CONTRAN, sendo que nele foram registrados os sinais de alteração da capacidade psicomotora constatados no momento da abordagem, tais como: sonolência, olhos vermelhos, exaltação, dificuldade de equilíbrio, fala alterada, entre outros (mov. 1.9). A autoria igualmente é certa, inclusive, o próprio apelante confessou, em Juízo, que estava em ingeriu bebida alcoólica antes de conduzir o veículo no qual foi abordado, conforme trecho destacado na sentença recorrida (mov. 105.1): "ingeria bebidas alcoólicas em sua residência, quando recebeu uma ligação informando que seu irmão estaria "dando trabalho" na rua. Esclareceu que não encontrou seu irmão, e acabou encostando o carro, pois o pneu havia furado. Disse que o carro é de seu pai, e que o dirigiu porque seu pai sofre de Mal de Alzheimer, afirmando que os policiais chegaram e o abordaram. Aduziu que não se recorda de ter-lhe sido oferecido o teste do etilômetro, tampouco de ter desacatado os agentes públicos". Aludida confissão foi devidamente corroborada pelo depoimento dos policiais que atenderam a ocorrência, inclusive, todos são harmônicos em afirmar que o apelante, no momento da abordagem, apresentava sinais visíveis de embriaguez, bem como um dos policiais afirmou categoricamente em Juízo que viu o veículo do apelante em movimento, estacionando (mov. 105.1). Sobre a valoração do depoimento dos policiais, cito o seguinte precedente desta Câmara, de lavra do eminente Desembargador LÍDIO JOSÉ ROTOLI DE MACEDO, assim ementado: APELAÇÃO CRIMINAL. - PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO (ART. 16, DA LEI 10.826/03). - PROVAS APTAS A ENSEJAR NA CONDENAÇÃO. - CREDIBILIDADE DOS DEPOIMENTOS POLICIAIS. - PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. - CONDUTA TÍPICA NÃO
ALCANÇADA PELA ABOLITIO CRIMINIS TEMPORALIS. - LAUDO DE EXAME DE PRESTABILIDADE DE ARMA DE FOGO PRESENTE AS FLS. 56. - NECESSÁRIA MINORAÇÃO DO QUANTUM APLICADO EM RAZÃO DA AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA PENAL. - POSSIBILIDADE DE DETERMINAÇÃO DO REGIME SEMI-ABERTO PARA O CUMPRIMENTO DA PENA. - SENTENÇA REFORMADA. - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Não vislumbro qualquer razão plausível para se descrer de tais testemunhos, ainda mais não existindo nos autos um só elemento capaz de invalidá-lo. Ressalta-se que há muito a jurisprudência desta Segunda Câmara Criminal vem decidindo que, em face do sistema da livre convicção motivada, os testemunhos de policiais são aptos a serem valorados pelo Magistrado, em confronto com os demais elementos colhidos na instrução. Aliás, seria incoerente e contrário aos objetivos da ordem jurídica o Estado legitimar servidores públicos a prevenir e reprimir atividades delituosas e negar-lhes credibilidade no momento de convocá-los a depor em juízo. II. "Quanto ao depoimento de policiais, presume-se que agem eles no cumprimento do dever e nos limites da legalidade, havendo que se repudiar sua palavra somente quando em flagrante dissonância com os demais elementos de convicção trazidos ao processo". (RT 727/473). III. "Não se pode confundir posse de arma de fogo com o porte de arma de fogo. Com o advento do Estatuto do Desarmamento, tais condutas restaram bem delineadas. A posse consiste em manter no interior de residência (ou dependência desta) ou no local de trabalho a arma de fogo. O porte, por sua vez, pressupõe que a arma de fogo esteja fora da residência ou local de trabalho (Precedentes). II - Os prazos a que se referem os artigos 30, 31 e 32, da Lei nº 10.826/2003, só beneficiam os possuidores de arma de fogo, i.e., quem a possui em sua residência ou local de trabalho. Ademais, cumpre asseverar que o mencionado prazo teve seu termo inicial em 23 de dezembro de 2003, e possui termo final previsto até 31 de dezembro de 2008, tão somente para os possuidores de arma de fogo de uso permitido (nos exatos termos do art. 1º da Medida Provisória nº 417, de 31 de janeiro de 2008, convertida na Lei 11.706, de 19 de junho de 2008, que conferiu nova redação aos arts. 30 e 32 da Lei 10.826/03). (STJ. REsp 1103068/SP. Relator Ministro FELIX FISCHER. Quinta Turma. Julgado em 05/05/2009) IV. No que tange à pleiteada minoração da pena, observo exacerbado o quantum fixado para a majoração da pena em razão da incidência da agravante da reincidência, razão pela qual, a reduzo em 6 (seis) meses, restando a pena privativa de liberdade em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 16 (dezesseis) dias-multa. V. "É admissível a adoção do regime prisional semi-aberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a quatro anos se favoráveis as circunstâncias judiciais." (Ap.Crim. 592465-6 TJPR 2ª Câm.Cív., Rel. Des. LÍDIO JOSÉ ROTOLI DE MACEDO, julg.01.10.09). No mesmo sentido a orientação emanada do Supremo Tribunal Federal: "VALIDADE DO DEPOIMENTO TESTEMUNHAL DE AGENTES POLICIAIS. - O valor do depoimento testemunhal de servidores policiais - especialmente quando prestado em juízo, sob a garantia do contraditório - reveste-se de inquestionável eficácia probatória, não se podendo desqualificá-lo pelo só fato de emanar de agentes estatais incumbidos, por dever de ofício, da repressão penal. - O depoimento testemunhal do agente policial somente não terá valor, quando se evidenciar que esse servidor do Estado, por revelar interesse particular na investigação penal, age facciosamente ou quando se demonstrar - tal como ocorre com as demais testemunhas - que as suas declarações não encontram suporte e
nem se harmonizam com outros elementos probatórios idôneos." (STF. 1.ª Turma. Habeas Corpus n.º 73518-SP. Relator: MIN. CELSO DE MELLO. DJ: 18.10.1996, p. 39846). Corroborando o posicionamento ora adotado, destaco trecho do parecer da Douta Procuradoria Geral de Justiça no mesmo sentido (fls. 19/20: "(...). Conforme se pode dessumir então da prova testemunhal anteriormente colacionada, restou evidenciado nos autos que o réu, efetivamente, conduziu o veículo automotor com a capacidade psicomotora alterada, em razão da ingestão de álcool. Tal constatação, não se dá apenas pela palavra dos policiais militares que atenderam a ocorrência os quais afirmaram que o réu apresentava claros sinais de embriaguez , mas, principalmente, da confissão externada pelo réu que admitiu ter consumido bebida alcoólica e, logo após, conduziu o veículo automotor. Destarte, reitero, não merece guarida a alegação de ausência de provas, posto que a conduta do apelante é típica e as provas são suficientes para condenação." Correta, pois, a condenação pelo crime de embriaguez ao volante, sendo a sentença mantida neste ponto. Com relação ao crime de desacato O apelante pleiteou sua absolvição de ambas as imputações, mas não fundamentou o pedido com relação ao crime de desacato. Todavia, acerca do crime de desacato há que de ser observada a mudança jurisprudencial quanto ao tema. No final do ano de 2016 a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, entendeu pelo conhecimento do recurso e deu parcial provimento ao mesmo. Veja-se da ementa, in verbis: "DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. ROUBO, DESACATO E RESISTÊNCIA. APELAÇÃO CRIMINAL.
EFEITO DEVOLUTIVO AMPLO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. ROUBO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE ROUBO PARA O DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. TEMA NÃO PREQUESTIONADO. SÚMULAS 282 E 356 DO STF. DESACATO. INCOMPATIBILIDADE DO TIPO PENAL COM A CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE. 1. Uma vez interposto o recurso de apelação, o Tribunal, respeitando o contraditório, poderá enfrentar todas as questões suscitadas, ainda que não decididas na primeira instância, desde que relacionadas ao objeto litigioso recursal, bem como apreciar fundamentos não acolhidos pelo juiz (arts. 10 e 1.013, §§ 1º e 2º, do Código de Processo Civil, c/c art. 3º do Código de Processo Penal). 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça afasta a aplicabilidade do princípio da insignificância em crimes cometidos mediante o uso de violência ou grave ameaça, como o roubo. 3. O pleito de desclassificação do crime de roubo para o de constrangimento ilegal carece da indicação do dispositivo legal considerado malferido e das razões que poderiam fundamentar o pedido, devendo-se aplicar o veto da Súmula 284/STF. Além disso, o tema não foi objeto de apreciação pelo Tribunal de origem, nem a parte interessada opôs embargos de declaração para suprir tal omissão, o que atrai o óbice das Súmulas 282 e 356 do STF. 4. O art. 2º, c/c o art. 29, da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) prevê a adoção, pelos Estados Partes, de "medidas legislativas ou de outra natureza" visando à solução de antinomias normativas que possam suprimir ou limitar o efetivo exercício de direitos e liberdades fundamentais. 5. Na sessão de 4/2/2009, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar, pelo rito do art. 543-C do CPC/1973, o Recurso Especial 914.253/SP, de relatoria do Ministro LUIZ FUX, adotou o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 466.343/SP, no sentido de que os tratados de direitos humanos, ratificados pelo país, têm força supralegal, "o que significa dizer que toda lei antagônica às normas emanadas de tratados internacionais sobre direitos humanos é destituída de validade." 6. Decidiu-se, no precedente repetitivo, que, "no plano material, as regras provindas da Convenção Americana de Direitos Humanos, em relação às normas internas, são ampliativas do exercício do direito fundamental à liberdade, razão pela qual paralisam a eficácia normativa da regra interna em sentido contrário, haja vista que não se trata aqui de revogação, mas de invalidade." 7. A adequação das normas legais aos tratados e convenções internacionais adotados pelo Direito Pátrio configura controle de constitucionalidade, o qual, no caso concreto, por não se cuidar de convenção votada sob regime de emenda constitucional, não invade a seara do controle de constitucionalidade e pode ser feito de forma difusa, até mesmo em sede de recurso especial. 8. Nesse particular, a Corte Interamericana de Direitos Humanos, quando do julgamento do caso Almonacid Arellano y otros v. Chile, passou a exigir que o Poder Judiciário de cada Estado Parte do Pacto de São José da Costa Rica exerça o controle de convencionalidade das normas jurídicas internas que aplica aos casos concretos. 9. Por conseguinte, a
ausência de lei veiculadora de abolitio criminis não inibe a atuação do Poder Judiciário na verificação da inconformidade do art. 331 do Código Penal, que prevê a figura típica do desacato, com o art. 13 do Pacto de São José da Costa Rica, que estipula mecanismos de proteção à liberdade de pensamento e de expressão. 10. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos - CIDH já se manifestou no sentido de que as leis de desacato se prestam ao abuso, como meio para silenciar ideias e opiniões consideradas incômodas pelo establishment, bem assim proporcionam maior nível de proteção aos agentes do Estado do que aos particulares, em contravenção aos princípios democrático e igualitário. 11. A adesão ao Pacto de São José significa a transposição, para a ordem jurídica interna, de critérios recíprocos de interpretação, sob pena de negação da universalidade dos valores insertos nos direitos fundamentais internacionalmente reconhecidos. Assim, o método hermenêutico mais adequado à concretização da liberdade de expressão reside no postulado pro homine, composto de dois princípios de proteção de direitos: a dignidade da pessoa humana e a prevalência dos direitos humanos. 12. A criminalização do desacato está na contramão do humanismo, porque ressalta a preponderância do Estado - personificado em seus agentes - sobre o indivíduo. 13. A existência de tal normativo em nosso ordenamento jurídico é anacrônica, pois traduz desigualdade entre funcionários e particulares, o que é inaceitável no Estado Democrático de Direito. 14. Punir o uso de linguagem e atitudes ofensivas contra agentes estatais é medida capaz de fazer com que as pessoas se abstenham de usufruir do direito à liberdade de expressão, por temor de sanções penais, sendo esta uma das razões pelas quais a CIDH estabeleceu a recomendação de que os países aderentes ao Pacto de São Paulo abolissem suas respectivas leis de desacato. 15. O afastamento da tipificação criminal do desacato não impede a responsabilidade ulterior, civil ou até mesmo de outra figura típica penal (calúnia, injúria, difamação etc.), pela ocorrência de abuso na expressão verbal ou gestual utilizada perante o funcionário público. 16. Recurso especial conhecido em parte, e nessa extensão, parcialmente provido para afastar a condenação do recorrente pelo crime de desacato (art. 331 do CP)." (REsp 1640084/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 15/12/2016, DJe 01/02/2017) (grifei) No aresto em questão, os Ministros da Corte Superior compreenderam que a tipificação do crime de desacato presente no artigo 331, do Código Penal, atentaria contra o Pacto de San José da Costa Rica do qual o Brasil é signatário e internalizou como norma do sistema nacional. Restou consignado que o Supremo Tribunal Federal anteriormente já havia determinado a natureza supralegal do Pacto, o que o
colocaria em um patamar diferenciado dentro do arranjo legislativo nacional, acima das demais normativas e abaixo somente da Constituição Federal de 1988. Da mesma forma, por não se tratar de norma constitucional o controle seria de convencionalidade e não de constitucionalidade e poderia ser realizado pelo Superior Tribunal de Justiça. Segundo os componentes da Quinta Turma, o artigo 13, do Pacto, ao resguardar a liberdade de expressão encontraria óbice no Brasil no artigo 331, do Código Penal, e cercearia o discurso contra agentes públicos no exercício de sua função, o que tornaria a relação Estado e cidadãos desigual. A Corte Interamericana de Direitos Humanos já teria se posicionado dessa maneira com relação a outros países signatários do Pacto. Assim, os Ministros da Corte entenderam pela absolvição do recorrente. Não se pode deixar de observar precedente de tamanha importância formado recentemente na Instância Superior que altera radicalmente o panorama de aplicabilidade do tipo penal de desacato. Mesmo não tendo sido proferido em conformidade com as normativas que regem os recursos repetitivos, de aplicação cogente para os demais Tribunais, não se pode negar a função pacificadora e uniformizadora da legislação infraconstitucional realizada pelo Superior Tribunal de Justiça, a importância dos seus julgados e a alta probabilidade de modificação do entendimento contrário diante da interposição de recurso para a Corte Superior. Assim, em consonância com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça entendo seja o caso de se absolver o apelante quanto ao delito de desacato, pelos argumentos expostos acima. Conclusão
É mantida, pois, a condenação do réu apenas pelo crime de embriaguez ao volante, absolvendo-o da imputação de prática do crime de desacato. ANTE O EXPOSTO, voto no sentido de se conhecer conheço do recurso e dar-lhe parcial provimento, mantendo inalterada a sentença com relação ao crime de embriaguez ao volante, mas absolvendo-o com relação ao crime de desacato, com fundamento no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal. ACORDAM OS INTEGRANTES DA SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ, POR UNANIMIDADE DE VOTOS EM DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. Presidiu o julgamento o Excelentíssimo Desembargador Luis Carlos Xavier e dele participaram os Desembargadores José Carlos Dalacqua e Laertes Ferreira Gomes. Curitiba, 27 de abril de 2017. DES. ROBERTO DE VICENTE Relator
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