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Acórdão
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APELAÇÃO CRIMINAL N.º 653.743-9, DA VARA CRIMINAL, DA COMARCA DE CRUZEIRO DO OESTE. APELANTE: FIDELCINO GONÇALVES. APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ. RELATOR: DES. OTO LUIZ SPONHOLZ. APELAÇÃO CRIMINAL HOMICÍDIO CULPOSO GESTAÇÃO DE GÊMEOS NÃO DETECTADA EM ULTRASSONOGRAFIA, CUJAS DIFICULDADES NO PARTO RESULTARAM NO ÓBITO DOS FETOS ERRO MÉDICO CONDENAÇÃO ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE NEXO DE CAUSA ENTRE A CONDUTA DO RECORRENTE E O RESULTADO MORTE. (1) NEGLIGÊNCIA: LAUDO INDICANDO GESTAÇÃO DE UM FETO, QUANDO NA VERDADE ERAM DOIS RECUSA DO PROFISSIONAL À REALIZAÇÃO DE OUTRO EXAME. (2) IMPERÍCIA: PARECER TÉCNICO NOS AUTOS CONCLUINDO PELA BAIXA QUALIDADE TÉCNICA DO EXAME REALIZADO TEORIA DA EQUIVALÊNCIA DOS ANTECEDENTES CAUSAIS OMISSÃO PENALMENTE RELEVANTE POSIÇÃO DE GARANTIDOR CONDUTAS DO APELANTE A INTEGRAR A CADEIA CAUSAL COMPROVAÇÃO DE CULPA DO ACUSADO PELAS PROVAS EXISTENTE NOS AUTOS. (3) INDEPENDÊNCIA DA INSTÂNCIA PENAL, SEM QUALQUER INFLUÊNCIA DE DECISÃO CÍVEL OU ADMINISTRATIVA. RECURSO DESPROVIDO. (1) Existe negligência quando o agente reconhece em laudo a existência de feto único, quando na verdade a gestação era de gêmeos, e recusa-se a realizar outro exame. (2) Já a imperícia se verifica quando o agente, mesmo tendo conhecimento técnico, confirma diagnóstico equivocado de gestação e não se utiliza de todos os meios de que dispõe para aferi-la com precisão, uma vez que de acordo com o estado gestacional de 08 (oito) meses aproximadamente, seria possível detectar a existência de dois fetos, o que foi constatado através de parecer idôneo, indicando a baixa qualidade técnica do exame realizado. (3) A demonstração da culpabilidade ao acusado, na seara penal, não depende de qualquer outra decisão, seja ela de instância cível ou administrativa oriunda do órgão classista do profissional de saúde. Recurso conhecido e desprovido. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Crime n.º 653.743-9, da Vara Criminal, da Comarca de Cruzeiro do Oeste, em que é apelante FIDELCINO GONÇALVES e apelado o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ. I RELATÓRIO: O Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor do apelante FIDELCINO GONÇALVES, imputando-lhe a prática do delito previsto no artigo 121, §3° (homicídio culposo), por duas vezes, do Código Penal, pela prática do seguinte fato (f. 02/04): "Em meados do mês de dezembro de 2001, Márcia Creusa dos Santos procurou o Dr. Fidelcino Gonçalves, por orientação do Dr. Helin Teologides Barbey, para que fosse feito o exame de ultra-sonografia naquela, tendo em vista que estava perto do oitavo mês de gravidez. O Dr. Fidelcino Gonçalves realizou tal exame e constatou que Márcia estava grávida de feto único. Diante de tal quadro (existência de feto único) o Dr. Helin Teologides Barbey optou por fazer o parto normal. No dia 21 de janeiro de 2002, Márcia foi internada para a realização do parto. Como o trabalho de parto estava muito demorado, o Dr. Helin Teologides Barbey resolveu fazer uma cesárea. Ocorre que, com tal procedimento, foi constatado que Márcia estava grávida de gêmeos, sendo que um já estava em óbito e outro ainda estava vivo, mas diante de sua situação delicada, veio a falecer cerca de dois dias depois. Conforme conta do incluso inquérito policial, caso o diagnóstico feito pelo Dr. Fidelcino Gonçalves fosse correto, teria sido adotado outro procedimento, e os gêmeos nasceriam com vida. Como o exame de ultra-sonografia pode, como certeza absoluta, apontar se a gravidez é de gêmeos ou não, o Dr. Fidelcino Gonçalves culposamente, ao analisar tal exame, o fez de forma negligente ou seja, de qualquer jeito e com total relaxo -, ciente de seus atos, dando causa de forma direta e irreversível para a morte dos fetos gêmeos."
A denúncia foi recebida em 16 de dezembro de 2005 (f. 139). A sentença, proferida em 07/08/2009, condenou o acusado nos termos da denúncia a uma pena privativa de liberdade de 02 (dois) anos e 11 (onze) meses de detenção, com aplicação do concurso formal, substituída nos termos dos artigos 44 e seguintes do Código Penal (f. 452/495). A defesa do acusado interpôs recurso à f. 500, o qual foi recebido à f. 501. Em suas razões (f. 504/513), alegou, em síntese, que a conduta do apelante não foi a causa do delito narrado na denúncia e que o apelante não acompanhou todo o período gestacional. Aduziu que não há provas robustas da negligência e muito menos ligação entre a conduta do apelante e o resultado morte, estando ausente, assim, o nexo de causalidade. Mencionou que decisão administrativa do Conselho Regional de Medicina do Paraná, por maioria de votos, absolveu o apelante e que o Ministério Público em primeiro grau, em sede de alegações finais, pediu a improcedência da ação penal, com a absolvição do acusado. Pugnou pelo provimento do recurso para absolver o apelante. O Ministério Público contra-arrazoou o apelo defensivo às f. 520/535, opinando pelo desprovimento do recurso. Instada a se manifestar no presente feito, a Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio de parecer lavrado pelo Procurador de Justiça, Dr. Celso Jair Mainardi, opinou pelo conhecimento e desprovimento do apelo defensivo (f. 541/552). É o relatório.
II O VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO: O presente recurso é de ser conhecido, visto que é tempestivo (interposto no prazo legal), formalmente regular (interposto por petição nos autos), adequado (serve para atacar sentença condenatória artigo 593, inciso I, do CPP), cabível e inexiste fato impeditivo ou extintivo do direito de recorrer. Outrossim, os defensores do acusado são partes legítimas para recorrer (artigo 577, do CPP) e demonstram interesse, em virtude da sucumbência de seu cliente ao pleito acusatório. De início, necessário consignar que a demonstração da culpa na esfera penal independe de qualquer outra decisão, seja ela administrativa ou proveniente do juízo cível. Desse modo, a decisão proferida pelo Conselho Regional de Medicina não tem o condão de vincular ou descaracterizar a decisão proferida nesta Instância, tal como tem reiteradamente decidido por esta Primeira Câmara Criminal: "ALEGAÇÃO DE ILEGALIDADE DA SENTENÇA CONDENATÓRIA POR SUPOSTA OCORRÊNCIA DE DUPLA PUNIÇÃO PELO MESMO CRIME - NÃO SE VISLUMBRA OFENSA AO PRINCÍPIO NE BIS IN IDEM QUANDO APLICADA SANÇÃO ADMINISTRATIVA PELO ÓRGÃO COMPETENTE E SANÇÃO PENAL (PENA) TENDO COMO BASE O MESMO FATO PUNÍVEL - PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DE INCOMUNICABILIDADE DAS INSTÂNCIAS PENAL E ADMINISTRATIVA - SENTENÇA CONDENATÓRIA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO." (TJPR - 1ª C.Criminal - AC 0442811-1 - Foro Central da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Juiz Subst. 2º G. Francisco Cardozo Oliveira - Unânime - J. 26.06.2008) Também é por demais sabido que o pedido formulado pelo Ministério Público em primeira instância, nas alegações finais, para absolver o acusado, não tem caráter determinante para o Judiciário. Ademais, nas contra-razões, o pedido foi pela manutenção da sentença condenatória e o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, nesta instância, pelo desprovimento do recurso. A materialidade dos fatos não é discutida e está "positivada na prova oral carreada nos autos, bem assim, nas certidões de óbito de fls. 164 e 166, no relatório de obstetrícia de fl. 14, no parecer técnico de fls. 96/99, no parecer médico-legal de fls. 133/135 e no relatório nº 189/03- DEJUR (fls. 266/269)." (f. 455/456). A autoria também é certa e recai sobre a pessoa do apelante, o qual admitiu ter realizado o exame de ultrassonografia que diagnosticou a existência de apenas um feto no útero da gestante. Sustenta o recorrente, contudo, inexistir nexo de causalidade entre sua conduta do médico e o resultado morte, razão pela qual pede sua absolvição. O apelante, por ocasião de seu interrogatório judicial (f. 147/148), afirmou o seguinte: "Que admite como verdadeiros os fatos narrados na denúncia; que fez a ultrassonografia na paciente e constatou que era apenas um feto; que já admitiu no Conselho Regional de Medicina que houve erro no exame; Que não viu o segundo feto, tomou conhecimento pelas enfermeiras de que eram gêmeos; que o aparelho utilizado na ultrassonografia era da prefeitura e de terceira categoria (marca Próxima); Que no Conselho Regional de Medicina, a conclusão foi de que o laudo era de péssima qualidade, mas a conduta do médico assistente não deve ser pautada no exame de ultrassom; Que outro médico já errou diagnósticos usando o mesmo aparelho; Que logo que adquirido o aparelho, convidou o médico Dr. Carlos Tapejara, já experiente, neste tipo de exame, para lhe dar algumas noções sobre o exame; Que fez curso de ultrassonografia no
fim de 1998, Que foi a única vez em que constatou a existência de apenas um feto. quando na verdade eram dois; Que acredita que os fetos estavam sobrepostos, em razão de não ter visto o segundo; Que nunca foi preso ou processado; (...)" (destacou-se). Ao tempo em que sua defesa técnica alega que o apelante não cometeu nenhum crime (f. 150), a versão apresentada pelo réu em seu interrogatório, tentando afastar qualquer responsabilidade pelo equivocado diagnóstico, não pode prosperar, porquanto se encontra isolada das demais provas trazidas aos autos. O "Relatório de Ultra-Sonografia Obstétrica" consta à f. 48, indicando a gestação de feto único, do sexo masculino, e gestação de 32 semanas, subscrito pelo Dr. Fidelcino Gonçalves, ora réu/apelante. O laudo técnico de f. 99, emitido pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS, diz o seguinte: 1. "O atendimento durante o pré-natal foi incompleto e não se fez o diagnóstico de risco fetal. 2. O exame de ultrassonografia realizado em 05.12.00, na gestante Márcia Creusa dos Santos, com diagnóstico de gestação de 32 semanas e feto único, deixando de ser diagnosticado gestação gemelar, demonstra a baixa qualidade técnica do exame, uma vez ser possível e obrigatório o diagnóstico de gestação gemelar nesta idade gestacional. Contudo, não deve ter influenciado diretamente na causa da morte de um dos fetos. Outros exames subseqüentes deveriam ter sido realizados para confirmação do diagnóstico. (...)" (f. 99). A conclusão do Parecer Médico-Legal, emitido pelo IML, não foi diferente. Vejamos:
"4. CONCLUSÃO Observa o perito, examinando todos os documentos contidos nos Autos e revisando a literatura específica, que a Sra. Márcia Creuza dos Santos, submeteu-se a exame ultrassonográfico da gestação em 05 de dezembro de 2000, onde foi constatado uma gestação com feto único de 32 semanas, aproximadamente. Que em 21 de janeiro de 2001, apresentou quadro de trabalho de parto, com quadro clínico de gestação de 38 semanas e 5 dias (tempo gestacional corrigido frente ao exame ultrassonográfico realizado em 05/12/2000). Por se tratar teoricamente de uma gestação com feto único, o Médico Assistente tentou submeter a paciente a um parto vaginal, sem sucesso. No entanto, se houvesse o diagnóstico de gestação gemelar a conduta provavelmente seria intervenção da gestação através de cirurgia cesariana, haja visto, tratar-se de uma gestação de 38 semanas ecográfica (maturidade fetal)." (f. 135) Como se observa, tanto o Conselho Regional de Medicina quanto o laudo emitido pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS atestam a baixa qualidade técnica do exame. O próprio recorrente afirma que o aparelho utilizado era "de terceira categoria", e que outro médico já havia errado diagnóstico utilizando aquele aparelho. Diante dessa configuração fática, começa a se delinear o comportamento negligente do autor. Afinal, mesmo diante de um diagnóstico impreciso, recusou-se a realizar novo exame na paciente. Com efeito, para se infirmar a confiabilidade do exame, além da baixa qualidade do equipamento, são necessárias evidências fáticas, que coloquem em dúvida o acerto do diagnóstico. Estas são evidenciadas pelas palavras da gestante, a qual afirmou em juízo:
"Que fez o pré-natal de sua gravidez com o Dr. Helin; Que fez apenas um exame de ultra-som; Que esse exame acusou gravidez de um feto; Que ia ao consultório duas vezes por semana, pois era sua primeira gravidez e estava muito preocupada; Que fez todo o pré-natal pelo SUS; Que chegou a conversar com o Dr. Helin porque desconfiava que havia ganho muito peso (cinqüenta e três quilos para pouco mais de noventa quilos) e não achava normal; que o Dr. Helin lhe disse que era normal; que a declarante pediu ao Dr. Helin para fazer outro exame de ultra-som e não lhe foi passado; Que a declarante conversou com o acusado e este disse que o resultado do exame em relação ao número de crianças não muda, porque só faria outro exame se fosse particular; Que a declarante não teve dinheiro para pagar outro exame; Que durante o parto, verificou-se que havia gêmeos; Que as crianças faleceram; Que um já estava morto na barriga da declarante; Que não conseguiu mais engravidar depois do ocorrido; Que tentou engravidar logo depois do parto e até hoje não teve sucesso; Que teve dois abortos depois dos fatos; Que fez tratamento de depressão depois do parto; Que até hoje faz tratamento de depressão; (...)" (f. 394) O médico que acompanhou o pré-natal da gestante, em juízo, disse: "(...); Que o depoente desconfiou do tamanho da barriga da Sra. Márcia, que estava maior do que o normal de se esperar em uma gestação de um feto apenas; Que pediu para a Sra. Márcia que comparecesse após quinze dias para avaliar melhor; Que a Sra. Márcia não compareceu; Que quando Márcia o procurou, já estava em trabalho de parto; Que a barriga em tamanho maior que o normal pode significar gravidez gemelar ou excesso de liquido aminiótico; Que verificou apenas um batimento cardíaco vindo da barriga da gestante; Que verificou que o feto já apresentava sinais de sofrimento fetal; Que até então, o procedimento seria parto normal, mas o depoente, a partir desta constatação, decidiu
levá-la à cesariana; Que durante a cesariana, foi retirado um feto macerado e outro estava vivo, em sofrimento fetal; Que o feto macerado sugere morte de aproximadamente quarenta e oito horas; Que o depoente usou dos procedimentos de socorro ao feto e em sequencia o encaminhou à UTI neonatal em Umuarama, local em que veio a falecer; que não teve outros problemas com o acusado no sentido de que tivesse diagnosticado alguma situação que não se verificava na realidade; Que a aparelhagem que o acusado usava era normal e adequada ao procedimento que empreendia; (...); Que o aparelho usado era particular do acusado e este prestava serviços para a prefeitura." (f. 393) (destacou-se). Ou seja, de acordo com as palavras da mãe e do médico que acompanhou seu pré-natal, havia uma desconfiança de que a gravidez pudesse ser gemelar, dado o tamanho da barriga e o considerável ganho de peso da gestante. Ainda assim, foi submetida a apenas um exame, de baixa qualidade técnica, que ensejou diagnóstico equivocado. A análise das provas dos autos indica, portanto, que o réu, na condição de médico responsável pelo exame e diagnóstico, não agiu adequadamente, na medida em que não detectou que a paciente estava grávida de gêmeos, sendo esse fato imprescindível ao médico obstetra para concluir pelo parto normal ou pela cesariana. Faltou o recorrente com o dever objetivo de cuidado, na medida em que não realizou o diagnóstico adequado e nem efetivou as providências necessárias para verificar a correta situação da gestação. Tal comportamento, conforme depoimento do Dr. Nelson Toth em juízo, não foi um fato isolado na vida profissional do réu: "Que na época dos fatos, era chefe do posto de saúde; Que por volta das 10:30/11 horas recebeu um
telefonema solicitando sua ajuda no hospital; Que a ajuda era para o caso agora em análise; (...); Que o acusado, em sua função de médico, era visto com rejeição pela população; Que a prefeitura colocava consultas a disposição e as pessoas não aceitavam ser atendidas pelo médico; Que em março de 2002, quando assumiu o cargo de Secretário de Saúde do município, diligenciou para que o acusado fosse transferido de regional, para que exercesse suas funções na regional de Cianorte; Que era complicado para o município colocar um médico à disposição da população e os populares não aceitarem ser consultados por ele; Que o acusado era um péssimo médico na visão do depoente; Que não se recorda de ter ouvido o acusado que pobre tinha um filho atrás do outro e por isso o caso em questão não demandava grande preocupação; (...); Que o acusado tem um aparelho de ultra-som particular e também usa o aparelho de ultra-som da prefeitura; Que não sabe se na época o acusado já tinha o seu aparelho particular; Que quando teve seu aparelho particular, ainda assim trabalhava para a prefeitura usando às vezes seu aparelho (em sistema de licitação); Que logo que o acusado comprou seu aparelho foi transferido para a regional de Cianorte; (...)" Da doutrina penal colhem-se os conceitos de negligência e imperícia, cujo preenchimento é necessário para se observar a existência de delito culposo: "A previsão legal do crime culposo restringe-se a estabelecer uma relação causal entre a violação do bem jurídico e a realização de condutas objetivas que são qualificadas pelas noções tradicionais de imprudência, negligência, imperícia. Por imprudência, entende-se a conduta comissiva (ação) que retrata uma manifestação exterior da postura subjetiva de incontinência diante dos deveres objetivos de cuidado. Em outras palavras, significa afoiteza, a precipitação do indivíduo que o leva a
produzir o resultado lesivo. Veja-se os exemplos do avanço de um sinal luminoso, de uma ultrapassagem indevida ou do excesso de velocidade quando da condução de veículos automotores. Por negligência, entende-se a conduta omissiva que retrata uma manifestação exterior da postura subjetiva de descumprimento dos deveres objetivos de cuidado. Ao contrário da imprudência, a negligência significa a omissão do agente quanto aos atos de cuidado que deveria praticar. Por exemplos de negligência temos a não realização de revisão nos equipamentos e a ausência de troca de pneus carecas do veículo. Por imperícia, entende-se a conduta, comissiva ou omissiva, que retrata uma manifestação exterior da postura subjetiva de desatenção aos deveres objetivos de cuidado próprios à prática de desatenção aos deveres objetivos de cuidado próprios à prática de determinada atividade profissional. A imperícia pressupõe um comportamento inserido no exercício da atividade profissional. Como exemplo temos os erros médicos, os erros na condução de aeronaves, etc." (GALVÃO, Fernando. DIREITO PENAL. Curso Completo. Parte Geral. 2.ª edição. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. P. 183) Tal fato, gravidez de gêmeos, era perfeitamente previsível, caso o profissional tivesse adotado as técnicas pertinentes. Tanto é assim que um dos médicos ouvido em juízo de plano relatou que o tamanho da barriga da gestante poderia indicar duas situações: gravidez de gêmeos ou excesso de liquido amniótico. Ou seja, não foram efetivadas outras providências para determinar a razão pela qual era grande demais a barriga da gestante. Note-se, ainda, a existência de outra vertente argumentativa, que afirma ser o aparelho de ultrassom de boa qualidade, e que nunca houvera problema semelhante. A enfermeira que acompanhou
o exame relatou em juízo, por exemplo, que nunca soube de outro problema com o equipamento de ultra-som (f. 405). Nem mesmo essa possível configuração fática elidiria a responsabilidade do recorrente. Afinal, diante de um exame seguro, seria possível e obrigatório fazer o diagnóstico correto, conforme apontado no laudo emitido pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS, já transcrito. Desse modo, se o aparelho não apresentava condições de ser utilizado, deveria o réu ter realizado outros exames na gestante com o fim de determinar quantos fetos estavam em gestação, bem como as condições de saúde de cada um deles para permitir que o outro profissional pudesse avaliar adequadamente qual procedimento adotar na realização do parto. A negligência consistiu em não realizar outro exame para aferir com a precisão necessária as condições dos fetos, se o aparelho de ultra-som realmente não fornecesse condições para um diagnóstico mais seguro. Já a imperícia restou configurada pelo diagnóstico equivocado da gestação de gêmeos, relatando o réu em seu laudo de que se tratava de feto único. Não se pode olvidar que o médico que realizou o parto disse, em juízo, que através do equipamento utilizado seria possível detectar a existência de mais de um feto em gestação (f. 393). A morte dos fetos era perfeitamente evitável se, com antecedência, a conclusão obtida no exame estivesse correta, uma vez que segundo o depoimento do médico que fez a cirurgia na gestante, um dos fetos morreu aproximadamente quarenta e oito horas antes do trabalho de parto. A despeito de alegar a inexistência de nexo causal entre sua conduta e o resultado morte, tal liame é inafastável. Inexistem nos
autos quaisquer outros elementos que possam excluir a conclusão de que a morte ocorreu porque o parto foi feito a destempo. Não existem, por exemplo, quaisquer indícios de má formação fetal, doença genética ou aborto espontâneo, que seriam causas capazes de afastar o nexo de causalidade. Aplica-se à espécie a Teoria da Equivalência dos Antecedentes, sem a qual o resultado não é possível sem uma conduta anterior. Essa teoria foi adotada pelo Código Penal, em seu artigo 13, que assim estabeleceu: "Relação de causalidade(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Superveniência de causa independente(Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) § 1º - A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou. (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Relevância da omissão(Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) § 2º - A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:(Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado. (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)" A doutrina penal, ao examinar o dispositivo, assim se pronuncia: "A teoria da condição simples, também conhecida como teoria da equivalência dos antecedentes causais ou da conditio sine qua non, é atribuída a Julius Glaser, sendo posteriormente, desenvolvida por Maximilian Von Buri. É a teoria acolhida pelo Código Penal brasileiro em vigor e a que obtém maior aceitação na doutrina para estabelecer o critério identificador da vinculação existente entre a conduta e o resultado material. (...) A fórmula da conditio sine qua non implica a aplicação do processo hipotético de eliminação, segundo o qual, eliminando-se mentalmente a ação, indaga-se sobre a produção do resultado, da forma como ocorreu. Nessa perspectiva, a conduta será considerada causa do resultado quando se puder afirmar que, sem ela, o resultado não teria acontecido. Isso significa dizer que a conduta não será considerada causa do resultado quando, suprimida mentalmente, não repercutir alterações na produção do resultado." (GALVÃO, Fernando. DIREITO PENAL. Curso Completo. Parte Geral. 2.ª edição. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. P. 216/218)
Para o direito penal, a omissão equivale à ação quando produzir resultado naturalístico, de forma a inserir-se na determinação do nexo de causalidade (omissão imprória).1
1 PRADO, Luís Regis. CURSO DE DIREITO PENAL. 6.ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. p. 303 e ss. Identifica-se no caso que o recorrente estava na posição de garantidor que, segundo a doutrina, "decorre do estreito vínculo existente a priori entre o omitente e o bem jurídico protegido." E mais: "Não basta, contudo, que o autor esteja na posição de garantidor, faz-se mister que tenha a capacidade de ação (possibilidade material de evitar o resultado). Em nível de tipicidade, faz-se mister a concorrência de uma situação típica; da não realização de uma ação evitadora do resultado; da capacidade concreta da ação (conhecimento da situação típica e do modo de evitar o resultado/possibilidade real de fazê-lo); da posição de garantidor do bem jurídico; da identidade entre a omissão e a ação, conforme o conteúdo do injusto. A lei penal brasileira disciplinou expressamente as fontes (genéricas) do especial dever de agir, isto é, a posição de garantidor decorre de fontes formais (teoria formal do dever jurídico). Assim, "a omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado" (art. 13, §2.º, CP)." (PRADO, Luís Regis. CURSO DE DIREITO PENAL. 6.ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. p. 311/312) Em outro sentido não concluiu a Procuradoria-Geral de Justiça: "Como bem se analisa dos depoimentos prestados pelas testemunhas em juízo, bem como da própria mãe dos fetos, de forma unânime e incontroversa afirmam que o apelante Fidelcino Gonçalves, ao interpretar o resultado da ultrassonografia, o fez de forma negligente uma vez que constatou apenas a gestação de um feto, enquanto, na realidade tratava- se de uma gravidez múltipla. Temos que diante desta conduta culposa, houve o sofrimento fetal que desencadeou o óbito intrauterino e, logo após, o
falecimento do outro feto, situação esta que poderia ter sido evitada caso fosse constatada a prévia gravidez gemelar. (...) Contudo, com relação a alegação da má qualidade do aparelho utilizado para o exame, temos que além de controversa, não se mostra como causa única capaz de isentar o réu de sua responsabilidade. Primeiramente temos o depoimento do Dr. Helin Teologides Barbey, o qual relata que a aparelhagem utilizada pelo réu era normal e adequada ao procedimento que empreendia, bem como que o aparelho utilizado pelo mesmo era particular do réu e, prestava serviços à prefeitura. Neste mesmo sentido, vem o relato do Dr. Nelson Toth, que perante a autoridade policial, afirmou ter ouvido do próprio apelante que o exame de ultrassonografia em questão fora realizado no aparelho particular do mesmo, situação esta que não coaduna com a alegação de que o aparelho utilizado era o da Prefeitura e este se mostrava em péssimas condições. Como bem manifesta o representante ministerial em suas contrarrazões, "Aliás, fosse mesmo de manifesta má qualidade a ultrassonografia, seria prudente ao médico aconselhar a gestante a realizar outro exame, ainda mais quando havia a desconfiança por parte da paciente de gravidez gemelar, dado o tamanho da barriga. Contudo CECILIA afirma que a apelante não orientou a gestante a fazer outro exame de ultra-som."
Ainda, a fim de demonstra o nexo de causalidade e a negligencia na conduta do apelante, importa em realizar uma análise dos Pareceres proferidos por especialista, no que se refere ao caso em apreço. Vejamos o que foi constatado na Analise do Óbito Infantil Comitê Municipal: "1. Analise do Óbito: Infecção neo-natal. Provavelmente devido ao óbito do 2º gemelar. Falha no pré-natal pela não detecção do 2º gemelar." (fls. 36) O Parecer Técnico SEAUD/PR 030/02, constata a situação narrada na exordial, concluindo que o exame
de ultrassonografia foi realizado com baixa qualidade técnica, tendo em vista que de acordo com a idade estacional, qual seja 08 (oito) meses, seria possível diagnosticar a presença de dois fetos. Destaca, ainda, o referido parecer que diante da situação, outros exames deveriam ter sido realizados a fim de confirmar o diagnostico, o que não foi feito. Desta maneira importa em destacar o contido: "(...) 3. O exame de ultrassonografia obstétrica realizado em 5 de dezembro de 2000, dá o diagnostico de GESTAÇÃO de 32 semanas, FETO ÚNICO, apresentação cefálica e peso fetal de aproximadamente 1900g. (...) III PARECER (...) 2.O exame de ultrassonografia realizado em 05.12.00, na gestante Márcia Creusa dos Santos, com diagnostico de gestação de 32 semanas e feto único, deixando de ser diagnosticado gestação gemelar, demonstra a baixa qualidade técnica do exame, uma vez ser possível e obrigatório o diagnostico de gestação gemelar nesta idade gestacional. Contudo, não deve ter influenciado diretamente na causa morte de um dos fetos. Outros exames subseqüentes deveriam ter sido realizados para confirmação do diagnostico.. (...)" (fls. 96/99) O Parecer do Instituto Médico Legal deixa bem delineado o nexo de causalidade entre a conduta do apelante, que diagnosticou a presença de apenas um feto na gestante e o falecimento dos fetos, vez que em ocasião diversa (constatação de gravidez gemelar), outra intervenção seria adotada no caso, submetendo-se a mãe das vítimas à cesariana. (...) Extrai-se dos autos que a constatação de feto único através do exame de ultrassonografia realizado pelo médico apelante foi realizada de forma negligente, tendo em vista que a paciente além de estar em uma idade gestacional bastante avançada, insistiu na realização de outro exame para a efetiva confirmação, já que esta suspeitava estar grávida de gêmeos. Contudo, o apelante não concordou com a
realização de novo exame, afirmando que não haveria alteração quanto ao numero de fetos e confirmando a gestação única e, ainda, que somente seria submetida a outro exame de ultrassom caso fosse realizado por consulta particular, ou seja, somente mediante pagamento; o que não foi feito ante a condição econômica de Márcia. Portanto, temos que o diagnostico de gestação de apenas um feto, bem como a não realização de novos exames para a sua confirmação, demonstram claramente a conduta negligente do especialista; levando-se em conta que na medicina a prudência deve imperar e, em caso de dúvidas, a mais exames deve ser submetida à paciente. Neste sentido já se manifestou a jurisprudência: TJPB: "O erro de diagnostico e terapia, provocado pela omissão de procedimentos recomendados ante os sintomas exibidos pelo paciente, acarreta a responsabilidade médica, nos termos do art. 13, § 2º, b, do CP, e só pode ser excluído da cadeia causal se houver prova plena de que não comprometeu as chances de vida e integridade física da vítima" (JTAERGS 87/143 e RT 710/334). No mesmo sentido TACRSP: RJDACRIM 5/108. Como fundamenta o MM Juiz, na r. sentença condenatória, "O dever de cuidado objetivo norteador da conduta médica foi descumprido pelo comportamento voluntário e omisso deste agente, que deixou de atestar a gravidez múltipla da paciente por desatenção, uma vez que é possuidor da técnica necessária que exigia a conduta assimétrica, perfazendo a culpa na espécie negligência."(fls. 465) Veja, ainda, que na própria r. sentença supramencionada, há a fundamentação através da literatura médica, a qual indica que a partir do quarto mês de gestação já é possível fazer a anatomia detalhada dos membros do feto por meio de tal exame, bem como revelar a pluralidade de fetos, o sexo do nascituro e também possíveis e eventuais problemas relacionados a sua funcionalidade. No presente caso, a paciente Márcia estava grávida de 08 (oito) meses, o que indica a possibilidade de um
exame ainda mais detalhado da formação do feto e, mais, a constatação satisfatória de uma gravidez múltipla, o que não ocorreu por erro de diagnóstico e analise mais atenciosa do apelante, consubstanciado em sua negligência. O MM Juiz deixa ainda mais claro a situação mencionada ao questionar, como seria possível a alegação de má qualidade do aparelho de ultrassonografia para a identificação de mais um feto, enquanto foi perfeitamente possível constatar que o único identificado seria do sexo masculino, indicando a presença do órgão sexual masculino, o qual é de tamanho infinitamente inferior ao feto não identificado. Veja que tal constatação aponta a uma situação altamente contraditória; que além de afastar a tese defensiva, indica o inequívoco descuido na conduta do apelante ao procedimento do diagnóstico da ultrassonografia a que fora submetida a gestante. O nexo causal esta evidenciado também, pelo provável tempo de falecimento do natimorto, já que, conforme relata o Dr. Helin, médico que realizou o parto de Márcia, a maceração sugere o óbito em 48 horas, e assim, caso houvesse a prévia constatação de gravidez múltipla nos exames realizados, teriam adotado as devidas providências antes do fatídico. Portanto, se o Dr. Fidelcino tivesse adotado os procedimentos adequados de análise e diagnóstico do exame, provavelmente o Dr. Helin adotaria procedimento diverso do realizado para o parto, já que a informação que lhe fora fornecida era a presença de feto único, podendo, inclusive salvar a vida de ambos ou pelo menos um deles. Assim, evidenciado o nexo de causalidade entre a conduta do apelante e o resultado lesivo, típica se mostra o fato a ele imputado e, por este deve ser responsabilizado, conforme sabiamente sentenciado pelo magistrado. Em síntese, o fato delituoso retratado, demonstra que o sentenciado violou o componente normativo do tipo objetivo culposo. Neste caso, omitiu a obligatio ad diligentian do homo medius, ou seja, a diligência, a atenção, o cuidado impostos pela ordem jurídico para proteger o bem jurídico. A adequação típica nos delitos culposos, determina-se
através da comparação entre a conduta do agente e o comportamento presumível que, nas mesmas circunstâncias teria a pessoa-referência (homo medius). O cuidado objetivo é exigível, vale dizer, então, que o evento típico (resultado, nos crimes culposos materiais) era previsível para efeitos de comparação com o padrão escolhido. Se era previsível e não houve a previsão teríamos a culpa inconsciente. Se era previsível e houve previsão, a discussão passaria para a indagação, no mínimo, da culpa consciente." (f. 545/551)
Neste sentido, já decidiu este órgão julgador: "PROCESSUAL PENAL - APELAÇÃO CRIMINAL - HOMICÍDIO CULPOSO - ERRO MÉDICO - CONDENAÇÃO - AUSÊNCIA DE NEXO DE CAUSA ENTRE A CONDUTA E O RESULTADO MORTE - TEORIA DA EQUIVALÊNCIA DOS ANTECEDENTES CAUSAIS - OMISSÃO PENALMENTE RELEVANTE - POSIÇÃO DE GARANTIDOR - INTEGRAÇÃO DA CONDUTA DO AGENTE NA CADEIA CAUSAL - COMPROVAÇÃO DE CULPA PELA PROVA EXISTENTE NOS AUTOS - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (1) De acordo com a teoria da equivalência dos antecedentes, adotada pelo Código Penal, na cabeça do artigo 13, qualquer intervenção humana capaz de provocar o resultado, seja jurídico ou naturalístico, entra como causa para a sua ocorrência. Por isso, é perfeitamente possível a imputação de um mesmo resultado a dois agentes, com ânimos diversos. (2) A omissão penalmente relevante é aquela capaz de provocar o resultado, tanto jurídico como naturalístico do crime, seja dolosa ou culposa. O apelante detinha a qualidade de médico plantonista e sobre ele incide a posição de garantidor (artigo 13, §2°, do CP), cujo dever legal é engendrar todos os esforços possíveis para exarar um diagnóstico preciso, a fim de dar cumprimento ao juramento prestado quando da entrega do diploma (alínea 'a'). (3) Há prova robusta de que a omissão do apelante foi penalmente relevante, visto que não determinou a
realização de radiografia torácica e abdominal na vítima, em flagrante negligência de seu dever legal. Por conseguinte, sua conduta omissiva preencheu os requisitos da tipicidade culposa (previsibilidade objetiva, nexo de causa, imprevisão do agente, quebra do dever de cuidado e relação de determinabilidade). Outrossim, ausentes causas de exclusão da antijuridicidade e da punibilidade, a manutenção da condenação é medida que se impõe." (TJPR - 1ª C.Criminal - AC 0404652-8 - Umuarama - Rel.: Des. Mário Helton Jorge - Unânime - J. 17.01.2008) Do Superior Tribunal de Justiça: "PENAL - RELAÇÃO DE CAUSALIDADE - RESULTADO DELITUOSO ELEMENTO SUBJETIVO EXISTÊNCIA TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL - IMPOSSIBILIDADE. - O Código Penal, ao adotar a conditio sine qua non (Teoria dos antecedentes causais) para a aferição entre o comportamento do agente e o resultado, o fez limitando sua amplitude pelo exame do elemento subjetivo (somente assume relevo a causalidade dirigida pela manifestação da vontade do agente - culposa ou dolosamente). - Dentro da ação, a relação causal estabelece o vínculo entre o comportamento em sentido estrito e o resultado. Ela permite concluir se o fazer ou não fazer do agente foi ou não o que ocasionou a ocorrência típica, e este é o problema inicial de toda investigação que tenha por fim incluir o agente no acontecer punível e fixar a sua responsabilidade penal. - Observando-se sob esse prisma, decorre a relação, ainda que tênue, de causalidade entre o comportamento da empresa, através de seu responsável e o resultado morte da vítima. - Recurso desprovido." (STJ - RHC 11.685/RS, Rel. Ministro Jorge Scartezzini, Quinta Turma, julgado em 05/09/2002, DJ 18/11/2002 p. 235)
"PENAL - RELAÇÃO DE CAUSALIDADE - RESULTADO DELITUOSO - ELEMENTO SUBJETIVO - EXISTÊNCIA. - O fato dos responsáveis de uma empresa não treinarem adequadamente seus profissionais, bem como utilizarem-se de materiais - cabos de aço - em situação precária, sem a devida manutenção, além de não fornecerem os instrumentos adequados para o isolamento da área de trabalho, de forma a impedir o acesso de pessoas estranhas, denotam a existência de negligência e conduzem à previsibilidade do resultado. - O Código Penal, ao adotar a conditio sine qua non (Teoria dos antecedentes causais) para a aferição entre o comportamento do agente e o resultado, o fez limitando sua amplitude pelo exame do elemento subjetivo (somente assume relevo a causalidade dirigida pela manifestação da vontade do agente - culposa ou dolosamente). - ANÍBAL BRUNO a esse respeito nos ensina que "Dentro da ação, a relação causal estabelece o vínculo entre o comportamento em sentido estrito e o resultado. Ela permite concluir se o fazer ou não fazer do agente foi ou não o que ocasionou a ocorrência típica, e este é o problema inicial de toda investigação que tenha por fim incluir o agente no acontecer punível e fixar a sua responsabilidade penal." - Observando-se sob esse prisma, decorre a relação, ainda que tênue, de causalidade entre o comportamento da empresa, através de seus responsáveis, ao não fornecer instrumento de trabalho em condições mínimas de segurança e o resultado morte da vítima. - Recurso desprovido." (STJ - RHC 9.389/SP, Rel. Ministro Jorge Scartezzini, Quinta Turma, julgado em 04/04/2000, DJ 05/06/2000 p. 182) Portanto, a tipicidade do delito culposo está plenamente delimitada no presente caso, com a existência de culpa do apelante na morte dos fetos, a qual foi demonstrada à saciedade pelo conjunto probatório existente nos autos e pela adequada e suficiente
fundamentação da sentença de primeiro grau, devidamente motivada com os dados colhidos durante a instrução criminal. Assim, nega-se provimento ao recurso para manter a sentença, em sua integralidade. III DECISÃO: ACORDAM os magistrados integrantes da Primeira Câmara Criminal, do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao presente recurso de apelação, nos termos do contido no voto e sua fundamentação. Participaram do julgamento e votaram acompanhando o voto do relator os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Telmo Cherem e Jesus Sarrão. Curitiba (PR), 04 de novembro de 2010. DES. OTO LUIZ SPONHOLZ Presidente da Primeira Câmara Criminal Relator
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