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Acórdão
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Apelação Cível nº 719.992-6, de Jaguariaíva, Vara Única. Apelante: José Fernando Rodriguez Rueda. Apelado: Prefeito Municipal de Jaguariaíva. Relator: Des. Luiz Mateus de Lima. Revisor: Des. José Marcos de Moura. APELAÇÃO CÍVEL MANDADO DE SEGURANÇA SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL REVOGAÇÃO DA CESSÃO. ATO DE CESSÃO PRECÁRIO E PROVISÓRIO. ATO DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, QUE SE DEU POR MOTIVOS DE CONVENIÊNCIA, OPORTUNIDADE E INTERESSE PÚBLICO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE QUALQUER ILEGALIDADE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Sendo o instituto da cessão de servidor sempre precário e provisório, bem como sendo um ato discricionário da Administração Pública, pode o mesmo ser revogado a qualquer momento, segundo os critérios de oportunidade, conveniência e interesse público. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 719.992-6, de Jaguariaíva, Vara Única, em que é
apelante José Fernando Rodriguez Rueda e apelado Prefeito Municipal de Jaguariaíva. José Fernando Rodriguez Rueda impetrou mandado de segurança com pedido liminar em face do Prefeito do Município de Jaguariaíva alegando, em síntese, que: (a) é servidor público estadual, estando lotado no Hospital Municipal Carolina Lupion desde 01.12.2004, em regime de 20 horas semanais; (b) é Diretor Clínico do referido hospital e recebe remuneração do Estado do Paraná; (c) na data de 21.12.2009 foi surpreendido com um ofício, o qual comunicava que não mais deveria prestar serviços no Hospital Carolina Lupion, bem como à Rede Municipal de Saúde; (d) o impetrado através do Ofício nº 673/09 GAB solicitou junto à Secretaria de Estado da Saúde a transferência com urgência do impetrante, haja vista existirem inúmeras reclamações de pacientes que afirmam descaso e desrespeito deste último; (e) referido ofício de transferência urgente do impetrante se deu em razão de abaixo- assinado realizado por munícipes solicitando a remoção do impetrante, somando-se ao fato de que o impetrante havia requerido junto à 3ª Regional de Saúde, sua transferência para o Hospital 18 de Dezembro na cidade de Arapoti; (f) nenhuma das duas justificativas são plausíveis a fim de que o impetrante deixe de prestar atendimento médico no hospital em que se encontra lotado; (g) é abusivo e ilegal o ato de remoção do impetrante, além da inobservância da legislação que dispõe sobre a escolha do Diretor Clínico; (h) como o impetrante era servidor público estadual, o afastamento do mesmo daquele corpo médico caberia única e exclusivamente ao Estado do Paraná através de realização de sindicância; (i) tem direito de ser mantido na direção clínica do hospital, haja vista que a decisão de modificação da direção
só pode se dar por decisão do corpo médico, assim como por decisão do Estado do Paraná, através da Secretaria Estadual de Saúde. Assim requereu a concessão da liminar e, ao final, a concessão da segurança, nos termos constantes à f. 11. Por meio do despacho de fls. 46/47 a liminar foi indeferida. Em sede de decisão monocrática (fls. 85/90), a Doutora Juíza afastou as preliminares de inépcia da inicial e ilegitimidade passiva e, no mérito, denegou a segurança e julgou extinto o processo, com resolução do mérito (art. 269, I, CPC), condenando o impetrante ao pagamento das custas processuais. Irresignado com a decisão monocrática, José Fernando Rodriguez Rueda, interpôs o presente recurso de apelação (fls. 92/109) alegando, em suma: a) não poderia ter sido revogada sua cessão pelo Prefeito Municipal de Jaguariaíva, já que era servidor público estadual, o qual foi cedido pelo Estado do Paraná àquele; b) se o apelado, discricionariamente não deseja mais que o apelante preste seus serviços médico na municipalidade, há que se considerar que as circunstâncias que motivaram a proibição deste último foram por isso arbitrárias e abusivas; c) a solicitação do apelado para a autoridade que julga competente para providenciar a remoção do apelante, através do ato de revogação, não pode impedir o exercício profissional na forma originalmente estabelecida; d) se os serviços estavam de maneira insatisfatória, não autoriza seja penalizado sem oportunidade de defesa; e) a proibição de continuidade do exercício das atividades médicas, como servidor cedido implicou em violação à legislação atinente ao corpo clínico. Ao final requer o provimento do recurso na forma disposta à f. 108.
O recurso foi contrarrazoado às fls. 115/123. A Douta Procuradoria-Geral de Justiça, emitiu parecer (fls. 141/146), por meio do ilustre Procurador de Justiça, Doutor Bruno Sérgio Galatti, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso. É o relatório. II - VOTO E SEUS FUNDAMENTOS Presentes os pressupostos recursais de admissibilidade, conheço do recurso e lhe nego provimento. Primeiramente vale ressaltar que, em razão do princípio da separação dos poderes, cabe ao Poder judiciário examinar os atos administrativos sob o ângulo da legalidade, sendo impossível o controle extralegal do mérito dos atos administrativos, vez que o juiz não é o destinatário dos juízos de conveniência e oportunidade, sendo destinatário exclusivo e final o administrador. Mesmo quando uma norma é discricionária não pode haver dúvidas quanto à necessidade de perseguição de sua finalidade pública.
Como se sabe, a cessão de servidores públicos ou qualquer ato que os coloca à disposição de qualquer entidade, pública ou privada, têm caráter precário e provisório, podendo ser desfeito a qualquer momento, por motivos de conveniência e oportunidade. Assim, a Administração Pública, evidenciado o seu interesse, pode, a qualquer tempo, revogá-la, sem que para isso necessite de ouvir o servidor. Em razão disso, cai por terra a alegação do apelante de que seu afastamento se deu sem a oportunização de ampla defesa.
Sobre o caráter precário e provisório da cessão do servidor público, tem-se a orientação do Superior Tribunal de Justiça: "(...) Administrativo - recurso ordinário - cessão de servidor estadual - revogação - legitimidade - inexistência de direito líquido e certo - decreto n. 32.974/88 do Estado do Rio Grande do Sul - precedente. 1. A cessão de servidor público é sempre precária, podendo ser revogada, a qualquer tempo, segundo os critérios da conveniência e oportunidade da administração, cujo mérito escapa ao exame pelo judiciário. 2. Não há direito líquido e certo de permanência do servidor no órgão ao qual foi cedido. 3. O Decreto nº. 32.974/88 do Estado do Rio Grande do Sul não se reveste de nulidade, nem caracteriza desvio de finalidade ou fraude a lei. 4. Recurso improvido." (ROMS 266/RS Fonte DJ DATA:30/08/1993 PG:17279 Relator Min. PEÇANHA MARTINS) Ainda, a cessão de servidor público é ato discricionário da Administração Pública, cuja revogação desse ato não é passível do controle do Poder Judiciário que fica adstrito a questões de observância ou não da legalidade do ato.
Tratando de discricionariedade do ato administrativo cita Marçal Justen Filho os ensinamentos de Hely Lopes Meirelles, verbis:
"(...) Poder discricionário é o que o Direito concede à Administração, de modo explícito ou implícito, para a prática de atos administrativos com liberdade na escolha de sua conveniência, oportunidade e conteúdo..." (Direito Administrativo Brasileiro, 29.ed.atual.por Eurico de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixo, José Emmanuel Burle Filho, São Paulo: Malheiros, 2004, p. 116). (Curso de Direito
Administrativo, Marçal Justen Filho, Ed. Saraiva, 2005, p. 153) De outro lado, a Administração Pública tem legitimidade para revogar seus atos, tendo em vista o poder de autotutela do Estado. Inclusive tal entendimento já se encontra sumulado pelo Supremo Tribunal Federal, vejamos: "Súmula nº 473: A administração pode anular os próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos, ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial." Ainda, o servidor cedido ficará administrativamente subordinado ao dirigente do poder beneficiário. Em sendo assim, o apelante encontrava-se subordinado administrativamente ao Prefeito do Município de Jaguariaíva, já que foi cedido pelo Estado do Paraná a tal ente público. Nesse sentido bem analisou o ilustre representante do Parquet de primeiro grau, o que faço de suas palavras minha fundamentação por reportação: "(...) Disposição funcional (também comumente tratada como cessão e não disponibilidade) nada mais é do que o servidor estável passar exercer sua atividade funcional em órgão ou ente diverso daquele em que se encontra originariamente lotado. No caso, do ente estadual para o ente municipal. Por certo que não decorre disso submissão do servidor estadual às normas estatutárias municipais. Por outro lado, é ínsita à própria cessão, a transferência de subordinação administrativa do
servidor, no caso, do Estado para o Município, posto que aquele não adquire autonomia funcional pelo só fato de estar à disposição de ente federativo diverso daquele para o qual originariamente prestou concurso público. Isto decorre do princípio da hierarquia administrativa, que não fica derrogado por conta da cessão do servidor para ente diverso. (...)" (fls. 79/80) Logo, se a Administração Pública praticou ato de cessão do apelante de um local de trabalho para outro, por motivo de conveniência e oportunidade, pode ela mesma revogá-lo por seus próprios meios, inclusive sem a necessidade de motivação. Sobre a desnecessidade de motivo é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: "RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. CESSÃO. REVOGAÇÃO. ATO DISCRICIONÁRIO. MOTIVAÇÃO. DESNECESSIDADE. - A cessão de servidor público, sendo ato precário, confere à Administração, a qualquer momento, por motivos de conveniência e oportunidade, a sua revogação, sem necessidade de motivação, cujo controle escapa ao Poder Judiciário, adstrito unicamente a questões de ilegalidade. - Precedente. - Recurso ordinário desprovido." (STJ, RMS 12312 / RJ ; RECURSO ORDINARIO EM MANDADO DE SEGURANÇA 2000/0075903-1, 6ª Turma, Min. Vicente Leal, DJ. 09.12.2002)
Na hipótese dos autos a permanência do apelante junto ao hospital em que se encontrava lotado, não se faz necessária, de acordo os documentos de fls. 63 e 73, cujo ato se deu pelo Chefe do Poder Cessionário, utilizando-se dos critérios de conveniência e oportunidade.
Além disso, não cabe levar em conta a necessidade do servidor, mais sim da Administração, pois deve prevalecer o interesse público sobre o particular, até porque, no presente caso, evidente o interesse público sobre o interesse do apelante, na medida em que diversos munícipes pleitearam, por meio de abaixo-assinado, o afastamento do apelante de suas funções do hospital em que se encontrava lotado, por considerarem o serviço prestado como inadequado. Ainda, levou-se em conta o pedido do apelante de transferência para outro hospital em município diverso.
Por fim, vale dizer que o servidor público está subordinado à lei, não se podendo levar em conta para o deslinde do presente caso as regras constante do Regimento Interno do Corpo Médico do Hospital Carolina Lupion, já que o Regimento Interno referido não possui natureza normativa, mas sim administrativa, ou seja, é ato produzido pela própria Instituição, possuindo natureza infra- legal, subordinando-se integralmente aos preceitos legais vigentes, isto é, deve obediência inicial a tudo o que esta prescrito na Lei.
Em assim sendo, não reveste o ato de qualquer ilegalidade o ato de afastamento do apelante de suas funções no Hospital Carolina Lupion, haja vista que o mesmo se deu em atendimento à conveniência, a discricionariedade dos atos do ente público, ao qual o apelante encontrava-se subordinado, e ao interesse público.
III DECISÃO. Diante do exposto, ACORDAM os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto. Participaram do julgamento os senhores Desembargadores Leonel Cunha (presidente, sem voto) e José Marcos de Moura e o Juiz Substituto 2º G. Rogério Ribas. Curitiba, 15 de fevereiro de 2011.
LUIZ MATEUS DE LIMA Desembargador Relator
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