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APELAÇÃO CÍVEL Nº 420.140-3 DA COMARCA DE PALOTINA VARA CÍVEL E ANEXOS. APELANTE1 Ministério Público do Estado do Paraná APELANTE2 Luiz Ernesto de Giacometti. 3 APELANTES Lílian de Oliveira Lisboa e Outro. APELADOS Os mesmos. RELATORA Desª. Lélia Samardã Giacomet. REVISORA Desª. Regina Afonso Portes. APELAÇÃO CÍVEL DIREITO ADMINISTRATIVO AÇÃO CIVIL DE RESPONSABILIDADE POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA PRATICADO POR EX-PREFEITO MUNICIPAL PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA REMESSA DE VERBAS DO MINISTÉRIO DA SAÚDE PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO, CERCEAMENTO DE DEFESA E ILEGITIMIDADE PASSIVA AFASTADAS - TERMO DE PARCERIA FIRMADO ENTRE MUNICÍPIO E ORGANIZAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL DE INTERESSE PÚBLICO OSCIP TRANSFERÊNCIA DA TOTALIDADE DOS SERVIÇOS DE SAÚDE PÚBLICA MUNICIPAL À INICIATIVA PRIVADA IMPOSSIBILIDADE VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL E INFRACONSTITUCIONAL APLICAÇÃO DAS PENALIDADES DA LEI 8.249/92 RECURSOS DE APELAÇÃO INTERPOSTOS PELO MINISTÉRIO (Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ (APELANTE 1), LUIZ ERNESTO DE GIACOMETTI (APELANTE 2) E LÍLIAN DE OLIVEIRA LISBOA E IBIDEC (APELANTE 3) DESPROVIDOS. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível sob nº 420.140-3 da Vara Cível e Anexos da Comarca de Palotina, em que são Apelantes : 1) Ministério Público do Estado do Paraná, 2) Luiz Ernesto de Giacometti, e 3) Lílian de Oliveira Lisboa e Instituto Brasileiro de Integração e Desenvolvimento Pró-cidadão IBIDEC e Apelados, os mesmos. I RELATÓRIO: O Ministério Público do Estado do Paraná ajuizou a presente ação civil pública (autos nº 544/05) em face de Luiz Ernesto de Giacometti, Lílian de Oliveira Lisboa, Instituto Brasileiro de Integração e Desenvolvimento Pró-cidadão IBIDEC e Município de Palotina. De acordo com a inicial, o IBIDEC é uma sociedade civil de interesse público (OSCIP), que firmou com o Município de Palotina, 03 (três) contratos com repasse global no valor de R$ 926.043,49 os quais, apesar de terem sido nominados de "Termo de Parceria", tratavam-se, na verdade, de terceirização de serviços públicos, sendo, portanto, absolutamente ilegais. Nos contratos administrativos e termos de parceria, o Município de Palotina foi representado por seu então prefeito municipal, Luiz Ernesto de Giacometti e o IBIDEC por sua presidente, Lílian de Oliveira Lisboa. Para atendimento dos programas, o IBIDEC contratou profissionais para
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) atividades abrangidas pelo plano de cargos do município de Palotina, típicos servidores como: enfermeira, cirurgião dentista e médico, configurando intermediação de mão-de-obra, eis que as funções deveriam ser exercidas por servidores públicos concursados ou, quando muito, empregados públicos, recrutados a partir de teste seletivo, para suprimento de necessidade temporária, como autorizado pela Constituição Federal, na medida em que se trata de verdadeira atividade-fim do ente público, de modo que os cargos de médico, dentista e enfermeiro não poderiam ser objeto de terceirização. Ademais, a contratação através do IBIDEC, fere a exigência constitucional de concurso público. O Município de Palotina repassava ao IBIDEC, além dos valores referentes aos salários e encargos, taxa de administração, evidenciando prejuízo ao erário, em razão da utilização de interposta pessoa para a contratação de pessoal, eis que implicou o emprego de maior quantidade de recursos do que os que seriam despendidos, se estes trabalhadores fossem funcionários públicos. Consta ainda na inicial, que nos termos de parceria firmados, não foi obedecido o disposto no parágrafo único, do artigo 3º, da Lei 9.790/99, tendo em vista que o IBIDEC não executa diretamente os serviços de saúde, sendo que o Município de Palotina, somente recebe em suas instalações, pessoal contratado e pago pelo IBIDEC. Desta forma, existia relação de subordinação entre todos os empregados terceirizados com o Município de Palotina, o que caracteriza relação funcional entre empregados e Administração Municipal, com mascaramento da relação de emprego, o que torna ilícita a terceirização e, por conseguinte, ilícitas e nulas as contratações. Afirma, ainda, o representante do Ministério Público, que as contratações através do IBIDEC, constituem intenção de violar a Lei de Responsabilidade Fiscal, eis que as despesas com pessoal foram contabilizadas sobre outra rubrica, "outros serviços de terceiros pessoas jurídicas código 3.3.90.39.00", o que ofende os princípios da legalidade e da
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) moralidade. A contratação decorrente de terceirização, no caso, ainda que lícita, deveria ser computada como despesa pessoal, conforme previsão do artigo 18, da Lei Complementar nº 101/00, computada, assim, no respectivo gasto. A contratação evidencia uma cessão de mão-de-obra subordinada, em verdadeira investidura de empregados no serviço público através de interposta pessoa, com burla à exigência de prévia aprovação em concurso público, o que gera nulidade do ato, a teor do disposto no artigo 37, II, da Constituição Federal. O contrato firmado teve como objetivo disfarçar atos de admissão de pessoal no serviço público, através de interposta pessoa, com violação do orçamento, o que caracteriza ato de improbidade administrativa, a teor do disposto no artigo 10, caput, e inciso XI, da Lei n.º 8.429/92, eis que o Município, além dos salários e encargos, arcou com a remuneração ao IBIDEC pelos serviços prestados, através da taxa de administração. Pelos mesmos motivos, os contratos constituem violação aos princípios da administração pública, tal como previstos no artigo 37, da Constituição Federal. Pleiteia, ainda, o autor da ação civil pública, que os danos causados ao erário valores pagos decorrentes dos termos de parceria e contratos administrativos impugnados sejam repostos na íntegra, a teor do disposto no artigo 12 da Lei nº 8.249/92, com atualização monetária e juros, desde o evento danoso. Com isso, pediu a declaração de nulidade dos contratos administrativos e termos de parceria celebrados entre o Município de Palotina e o IBIDEC, bem como a condenação de Luiz Ernesto de Giacometti, Lílian de Oliveira e IBIDEC, nas sanções estatuídas pelo artigo, II, da Lei nº 8.429/92, ou, em razão da eventualidade, nas sanções previstas no artigo III, do mesmo diploma. Após a apresentação das defesas preliminares dos requeridos, a inicial foi recebida (fls. 2149/2164), oportunidade em que houve deferimento da liminar requerida, tornando indisponíveis os bens dos réus.
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) Após instrução do feito, sobreveio a r. sentença de fls. 3675/3695, através do qual o d. juiz "a quo" julgou parcialmente procedente o pedido inicial, para: "...condenar os réus Luiz Ernesto de Giacometti, Lílian de Oliveira Lisboa, Instituto Brasileiro de Integração e Desenvolvimento Pró- Cidadão IBIDEC, nas penas previstas no artigo 12, II, da Lei nº 8.429/92, em razão da prática de ato de improbidade administrativa que causou dano ao erário, consoante artigo 10, da mesma Lei, notadamente, para condená-los: a) a ressarcir integralmente o dano consoante fixado na fundamentação, de forma solidária; b) a pagar multa, individual, única para cada qual, e não solidária, no importe correspondente ao dobro do valor a ser ressarcido ao erário, em favor do Município de Palotina; E, ainda: a) suspendendo os direitos políticos de Luiz Ernesto de Giacometti e Lílian de Oliveira Lisboa pelo prazo de 08 anos; b) proíbo Luiz Ernesto de Giacometti, Lílian de Oliveira Lisboa e Instituto Brasileiro de Integração e Desenvolvimento Pró- Cidadão IBIDEC de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos." (fl. 3694) Por fim, condenou os réus, solidariamente, ao pagamento de ¾ das custas processuais e honorários. Deixou de condená-los ao pagamento de honorários diante do que dispõe o artigo 128, 5º, II, a, da Constituição Federal. Deixou, ainda, de condenar o Ministério Público ao pagamento das custas e honorários advocatícios, tendo em vista que não foi comprovada qualquer espécie de lide temerária ou má-fé. O Ministério Público e os réus IBIDEC e Lílian de Oliveira Lisboa interpuseram embargos de declaração às fls. 3698/3700 e 3716/3722, sendo os mesmos julgados, respectivamente, às fls. 3704/3705 e
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) 3799/3800, havendo acolhimento dos primeiros embargos, suprindo a omissão apontada em relação à decretação de nulidade dos termos de parceria firmados entre o IBIDEC e o Município de Palotina. Inconformado com a r. decisão, o Ministério Público do Estado do Paraná interpôs recurso de apelação (fls. 3707/3714) alegando que o valor a ser ressarcido, não pode limitar-se apenas à taxa de administração que o Município de Palotina pagou ao IBIDEC, devendo ser reparado integralmente o dano sofrido pela municipalidade, de acordo com o artigo 59, parágrafo único, do Código de Processo Civil. Por sua vez, Luiz Ernesto de Giacometti também apelou (fls.3733/3794), sustentando, preliminarmente, que houve cerceamento de defesa, na medida em que não lhe foi oportunizada a produção de provas. Afirmou, para tanto, que no presente caso deve-se aplicar a culpa subjetiva e, assim, torna-se imprescindível a produção de prova oral, com depoimento pessoal das partes e oitiva de testemunhas. No mérito, afirma que: (a) a terceirização dos serviços de saúde tem amparo legal, de acordo com a Resolução nº 9117/2001 do Tribunal de Contas do Estado do Paraná; (b) o apelante agiu com autorização legislativa, com parecer favorável do Tribunal de Contas do Estado e, ainda, com orientação do Ministério da Saúde, confirmado pela auditoria realizada. Desta forma, agiu sem culpa e com boa-fé; (c) o apelante ao autorizar a publicação do Edital de Tomada de Preços nº 10/2002, cumpriu com todas as formalidades legais inerentes ao certame, bem como ao fiel cumprimento da Lei Municipal nº 1653/2002; (d) A Lei Municipal nº 1681/2002 autorizou o Executivo Municipal a proceder a contratação de entidade para implementar o programa "Pronto Atendimento 24h" através de procedimento licitatório e, assim, a Tomada de Preço nº 12/03, tem autorização legislativa;
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) (e) os serviços licitados foram executados e, assim, os pagamentos efetuados são devidos, não havendo se falar em devolução dos mesmos; (f) os profissionais que executaram os serviços, foram contratados pelo IBIDEC, e não sendo servidores municipais, desnecessária a realização de concurso público; (g) o artigo 199 da Constituição Federal, admite a terceirização de serviços de saúde de forma complementar. Todos os serviços licitados eram de forma complementar, pois o Município prestava o atendimento básico nos Postos de Saúde; (h) o apelante ao promover os processos licitatórios, tendo por objeto a complementação dos serviços prestados na área de saúde, além de ter sido decorrente do entendimento de ser a opção atualmente mais conveniente e econômica, veio ao encontro das reiteradas recomendações do Tribunal de Contas da União e do Ministério Público; (i) a terceirização não implicou no emprego de quantidade maior de recursos do que despediria o Município, caso as pessoas contratadas fossem servidores públicos; (j) não tendo o Município de Palotina efetuado o pagamento de despesas de pessoal, não poderia contabilizar os valores pagos como sendo "outras despesas de pessoal", tanto que as Lei Municipais que autorizaram os procedimentos licitatórios estava consignada a dotação orçamentária; (k) o apelante não causou nenhum prejuízo ao erário público, pois os pagamentos efetuados decorreram da prestação de serviços e, assim, não são cabíveis as punições previstas na Lei nº 8.429/92; (l) O Supremo Tribunal Federal, vem reiteradamente decidindo, no que tange a lei de improbidade administrativa, que somente bens adquiridos após o suposto ato irregular é que podem sofrer a constrição de indisponibilidade;
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) (m) o apelante é servidor público municipal concursado e recebe mensalmente o salário através de depósito em conta corrente. A doutrina e a jurisprudência determinam que o salário é impenhorável, uma vez que se tratam de alimentos. Portanto, o ofício ao Banco Central do Brasil para bloqueio de valores na conta corrente deve ser reformado, uma vez que, verbas de natureza alimentar, salário, não podem ser objeto de penhora; (n) a pena de perda dos direitos políticos, multa e proibição de contratar com o poder público, fere o princípio constitucional previsto no artigo 5º, LIV, da Constituição Federal, além do que, priva o apelante da liberdade de candidatar-se a cargo público, a perda da função pública já que exerce a função de médico concursado do município e de contratar com o poder público. O STJ tem entendido que as penas previstas no artigo 12 da Lei nº 8.429/02 não são cumulativas e devem ser aplicadas com observância no princípio da proporcionalidade; (o) o apelante agiu de boa-fé, tanto que estava amparado em lei aprovada pela Câmara Municipal, por parecer do Tribunal de Contas do Estado, e orientação do Ministério da Saúde, depois confirmada por auditoria; assim, se existe alguma penalidade a ser aplicada, seria a de devolver o valor pago a título de taxa de administração, sem qualquer outra penalidade, isto é, sem perda dos direitos políticos, multa e proibição de contratar com o poder público. Já por seu turno, Lílian de Oliveira Lisboa e Instituto Brasileiro de Integração e Desenvolvimento Pró-Cidadão IBIDEC, pleiteiam a reforma da decisão, alegando preliminarmente (3809/3859): (a) houve cerceamento de defesa, tendo em vista que o julgamento antecipado da lide não permitiu que os apelantes comprovassem suas alegações através de provas testemunhais e outros meios processuais;
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) (b) os contratos administrativos firmados entre o IBIDEC e o Município de Palotina, referem-se a programas ligados à área de saúde, financiados diretamente pelo Ministério da Saúde. Aplica-se no caso a súmula 208/STJ, segundo à qual compete à Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por desvio de verba sujeita à prestação de contas, perante órgão federal; (c) o IBIDEC é parte ilegítima passiva na presente lide, tendo em vista que por ser uma OSCIP, não pode ser sujeito ativo de atos ímprobos, mas apenas e tão somente vítima; No mérito, afirmam que as atividades do IBIDEC, por intermédio de seus profissionais, deu-se de forma complementar e suplementar aos serviços públicos e demais atividades desenvolvidas pelo parceiro público (município). Afirmam que as metas traçadas nos termos de parceria foram atingidas, o que afastaria a imputação de prejuízo ao erário. Entendem que a forma de contratação e todos os programas desenvolvidos estão estribados na legislação municipal e acórdão do Tribunal de Contas do Estado, além do que não houve qualquer afronta à Lei Complementar nº 101/2000. Aduzem que inexiste dolo ou culpa em suas condutas, o que impediria a imputação de prática de ato de improbidade administrativa; da mesma forma, não houve qualquer fundamentação na decisão de primeiro grau, ao aplicar as sanções da Lei nº 8.429/1992. Por fim, sustentam que inexiste fumus boni iuris e periculum in mora a fundamentar a liminar de indisponibilidade de bens. Contra-razões às fls. 3728/3752, 3907/3937 e 4214/4218. A Douta Procuradoria (fls. 4235/4270) manifestou-se pelo provimento do apelo interposto pelo Ministério Público do Estado do Paraná, para o fim de que os réus sejam condenados ao ressarcimento integral dos valores despendidos na execução dos referidos contratos. Ainda, pelo desprovimento dos recursos interpostos por Luiz Ernesto de Giacometti, IBIDEC e Lílian de Oliveira Lisboa.
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) No dia 06/10/2009 a Excelentíssima Desª. Revisora Regina Afonso Portes pediu dia para julgamento (fls. 4484). Em 13/10/2009 os réus apresentam a petição constante às fls. 4487/4488, onde requerem a análise do acórdão da 2ª Câmara Criminal que não recebeu a denúncia crime nos autos nº 523078-6-01. Os requeridos em 09/12/2009 novamente se manifestam (fls. 4544/4599) pleiteando em sede de tutela antecipada o desbloqueio de bens, face à existência de coisa julgada material. Os réus em 11/02/2010 pugnam pela redistribuição do feito à magistrada convocada, nos termos do art. 462 e 513 do CPC (fls. 4626/4651). Na data de 31/03/2010 os recorrentes Luis Ernesto de Giacometti e Outros pleitearam a inclusão do processo na pauta de julgamento (fls. 4654/4658). Os autos foram encaminhados a Excelentíssima Desª. Revisora, com a ressalva que já se encontravam inclusos na pauta de julgamento (fls. 4659). Iniciado o julgamento, este foi suspenso com a determinação pelo Colegiado da remessa dos autos à Procuradoria, pois o último parecer do Ministério Público ocorreu no ano de 2008, sendo que, desde então, houve a juntada de diversos documentos (fls. 4662/4663). A Procuradoria Geral de Justiça reiterou a manifestação já apresentada, pugnando pelo provimento do recurso de apelação do Ministério Público e desprovimento do recurso e manifestações dos requeridos (fls. 4667/4674). Os réus peticionaram em 14/07/2010, manifestação esta juntada aos autos em 16/08/2010, pleiteando a análise da questão prejudicial de mérito argüida em dezembro de 2009 (fls. 4676/4682). É o sucinto relatório.
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II VOTO: Conheço dos todos os recursos de apelação porque presentes os pressupostos processuais. Num primeiro momento, cumpre analisar as preliminares prejudiciais ao mérito, quais sejam, a incompetência do juízo, o cerceamento de defesa e ilegitimidade passiva. I INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO: Analisando a preliminar de incompetência da Justiça Estadual, argüida pelos apelantes IBIDEC e Lílian de Oliveira Lisboa, temos que, nos termos da Súmula nº 209 do Superior Tribunal de Justiça: "Compete à Justiça Estadual processar e julgar Prefeito por desvio de verba transferida e incorporada ao patrimônio municipal". É o caso dos autos, pois os contratos firmados tinham por objetivo fomentar o Programa Saúde da Família (PSF), que teve início em 1994, com um dos programas propostos pelo governo federal aos municípios, para implementar a saúde básica. Os Estados e os Municípios, interessados nas vultosas quantias destinadas ao PSF pelo Governo Federal, firmavam convênios com o Ministério da Saúde e com a FUNASA para fins de implantação deste Programa. Todos os envolvidos no PSF visam um pleno, eficiente e satisfatório sistema de saúde pública, pelo que unem esforços em suas atuações e diretrizes estratégicas. As responsabilidade e atribuições dos envolvidos no PSF estão elencadas na Portaria nº 1886/GM, de 18 de dezembro de 1997, do Ministério da Saúde, que trata da matéria de forma detalhada. Isso caracteriza a mútua colaboração entre os partícipes e a existência de finalidade institucional comum e relacionada com o objeto do convênio, requisitos próprios e inerentes aos convênios administrativos.
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) Todavia, independente do repasse de valores da União para o Município de Palotina, estes incorporam ao patrimônio municipal, cujo suposto dano atinge, diretamente, o Município de Palotina. Nesse sentido: "1-A verba que a União Federal entrega a Município, mediante convênio, incorpora-se ao patrimônio municipal. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. 2- Incorporada a verba federal ao patrimônio municipal e ocorrendo desvio, a competência para processar e julgar o prefeito acusado é do Tribunal de Justiça do Estado (CF, art. 29, X)" (HC 63.941/PE, 5ªT, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJe 08/09/08). O suposto dano, portanto, foi causado ao Município, pela utilização inadequada ou ineficiente da verba recebida, atribuindo-se aos réus, na época os gestores do dinheiro, a prática de ato de improbidade administrativa. Vê-se, pois, que a competência para processar e julgar a demanda é mesmo da Justiça Estadual. Vejamos o respectivo entendimento do Colendo Tribunal Superior de Justiça: "CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. DESVIO DE VERBAS DO FUNDO DE DESENVOLVIMENTO DO ENSINO FUNDAMENTAL E VALORIZAÇÃO DO MAGISTÉRIO - FUNDEF. RECURSOS ORIGINÁRIOS DE RECEITAS ESTADUAIS E MUNICIPAIS. AUSÊNCIA DE COMPLEMENTAÇÃO DA UNIÃO, NOS TERMOS DA LEI N.º 9.424/96. AUSÊNCIA DE VERBA FEDERAL. COMPETÊNCIA JUSTIÇA COMUM ESTADUAL.
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) 1. Compete à justiça estadual processar e julgar o desvio de verbas oriundas do FUNDEF que não tiveram complementação por parte da União. Precedentes: (CC 64749/PR, Rel. Ministra ELIANA CALMON, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/03/2007, DJ 16/04/2007 p. 155; CC 87985/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2008, DJe 03/06/2008; CC 39.514/RS, 3.ª Seção, Des. Convocada do TJ/MG JANE SILVA, DJ 21/02/2008.; CC 36288/MG, Rel. Ministro FONTES DE ALENCAR, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/06/2003, DJ 02/02/2004 p. 268). 2. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo de Direito da 2ª Vara Cível de Apucarana/PR." (STJ, CC 79033 - PR, 1ª Seção, Rel. Min. LUZ FUX, julgado em 26/11/2008) Portanto, afasta-se a alegada incompetência do juízo, de acordo com a Súmula 209 do Superior Tribunal de Justiça. II CERCEAMENTO DE DEFESA: Preliminarmente, os apelantes 2) Luiz Ernesto de Giacometti e 3) IBIDEC e Lílian de Oliveira Lisboa, pugnaram pela declaração de nulidade da sentença por cerceamento de defesa, sob o argumento de que não foi oportunizada a produção de provas orais e testemunhais, as quais eram indispensáveis à apuração da culpa subjetiva. Em que pesem as alegações dos apelantes, é de se ver que não houve qualquer infringência às regras constitucionais de defesa, pois entendeu corretamente o juiz "a quo" que trata de matéria de exclusivamente de direito, cujos fatos independem de prova oral, bastando à prova documental, as quais foram produzidas nos presentes autos. O Código de Processo Civil consagra no artigo 125,
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) que ao Juiz incumbe dirigir o processo, decidindo, inclusive, sobre os atos a ser praticados, visando a rápida solução do litígio. Outrossim, é o Juiz o destinatário das provas, cabendo a ele deferir a produção da prova requerida, assim como determinar de ofício outras provas ou diligências que entenda necessárias, buscando elementos para formar o seu convencimento. O art. 130 do Código de Processo Civil dispõe claramente sobre uma faculdade do juiz, no sentido de determinar a produção de provas necessárias, ou indeferir aquelas que tenha como inúteis ou protelatórias, destacando que suas decisões devem sempre obedecer ao princípio do livre convencimento motivado (artigo 131, do CPC). Por derradeiro, insta observar que, diante do poder de iniciativa e do livre convencimento, seria impertinente que o Tribunal substituísse o entendimento manifestado pelo julgador, sob pena de interferir no próprio poder de iniciativa a ele conferido, ao efeito de sedimentar o seu exclusivo senso de julgamento. Tal entendimento já foi objeto de análise nesse Tribunal de Justiça: I. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EXIGÊNCIA DE VANTAGEM ECONÔMICA DE DESPACHANTES E PARTICULARES JUNTO À 13ª. CIRETRAN. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. DEPOIMENTO PESSOAL E OITIVA DE TESTEMUNHAS. PROVAS DESNECESSÁRIAS Não constitui cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide quando o processo oferece condições para o Juiz formar sua convicção. (...)
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) (TJPR, Apelação Cível 619.317-1, Quarta Câmara Cível, Relator Des. Abraham Lincoln Calixto publicado 26/01/2010) EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIDADE POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA MANEJADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. DECISÃO QUE CONDENOU SOLIDARIAMENTE OS APELANTES COM BASE NO ARTIGO 11 DA LEI N.º 8.429/1992. ARGUIÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA POR JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE SUPERADA. NÃO HÁ CERCEAMENTO DE DEFESA QUANDO EXISTE FARTA PROVA DOCUMENTAL NOS AUTOS E A MATÉRIA É EXCLUSIVA DE DIREITO. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO DO JUIZ. PRECEDENTES. OS PAGAMENTOS FORMULADOS PELO PREFEITO DA COMUNA AO CHEFE DE GABINETE EM DECORRÊNCIA DE ACORDO PACTUADO NOS AUTOS DE AÇÃO MONITÓRIA MANEJADA PELO SEGUNDO OFENDE A INDISPONIBILIDADE DO INTERESSE PÚBLICO, A LEGALIDADE E A MORALIDADE. EVIDENTE DESRESPEITO AO PROCEDIMENTO DE PRECATÓRIO REQUISITÓRIO IMPOSTO À FAZENDA PÚBLICA. LESÃO AOS PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS CONTIDOS NO ARTIGO 11 DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DANO AO ERÁRIO DEMONSTRADO. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. (TJPR Apelação Cível 418.002-7 4ª Câmara
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) Cível Relator Des. Maria Aparecida Blanco de Lima publicado 28/09/2009) Diante destes fatos, não se caracteriza o cerceamento de defesa apontado pelos apelantes nas razões dos recursos de apelação, eis que os documentos acostados aos autos foram suficientes, mostrando-se desnecessária a produção de outras provas. III ILEGITIMIDADE PASSIVA: Por seu turno, o IBIDEC afirma ser parte ilegítima passiva na presente lide, ao fundamento de que sendo uma OSCIP, não pode ser sujeito ativo de atos ímprobos, mas apenas e tão somente vítima. Diversamente do que afirma o apelante, ao IBIDEC Instituto Brasileiro de Integração e Desenvolvimento Pró-Cidadão é aplicável a Lei nº 8.429/92, a qual disciplina sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional, pois há previsão expressa do art. 3º, que assim dispõe: "Art. 3° As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta." Ademais, a Lei 9.790/1999, que disciplina o termo de parceria das pessoas jurídicas de direito provado, sem fins lucrativos, como o IBIDEC, prevê, expressamente, em seu artigo 13, a aplicação das medidas consubstanciadas na Lei 8.429/1992, nos casos de enriquecimento ilícito e de dano ao patrimônio público.
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina)
Portanto, o IBIDEC é parte legítima para figurar no pólo passivo da presente ação. Afastadas as preliminares, passo a análise do mérito. Discute-se, como questão meritória, a legalidade dos termos de parceria firmados entre o Município de Palotina e o IBIDEC, cujo objeto foi a execução de programas de trabalho na área de Saúde PSF. Não se nega que a Constituição Federal de 1988, após instituir em seu art. 198, o Sistema Único de Saúde SUS, a ser organizado mediante algumas diretrizes expressamente indicadas no texto constitucional, e financiado com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes, permitiu, em seu art. 199, § 1º, a participação no sistema único de saúde de entidades privadas, porém, de forma complementar, ou seja, a atividade principal deve ser diretamente exercida pelo Estado, que poderá socorrer-se de entidades privadas para, havendo necessidade, complementar o atendimento à saúde da população, senão vejamos: "Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: I descentralização, com direção única em cada esfera de governo; II atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízos dos serviços assistenciais;
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III participação da comunidade. § 1º O sistema único de saúde será financiado, nos termos do art. 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes. (...) Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada. § 1º As instituições privadas poderão participar de forma complementar do sistema único de saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos " José Afonso da Silva, em sua obra "Curso de Direito Constitucional Positivo", ao comentar a atuação do Estado e das entidades privadas no sistema único de saúde, afirma que, em regra, os serviços públicos de saúde devem ser prestados pelo Estado, cabendo à iniciativa privada, no que diz respeito ao sistema único de saúde, atividades complementares, verbis: "O sistema único de saúde, integrado de uma rede regionalizada e hierarquizada de ações e serviços de saúde, constitui o meio pelo qual o Poder Público cumpre seu dever na relação jurídica de saúde que tem no pólo ativo qualquer pessoa e comunidade, já que o direito à promoção e à proteção da saúde é também um direito coletivo. O sistema único de saúde implica ações e serviços federais, estaduais, distritais (DF) e municipais, regendo-se pelos princípios da descentralização, com direção única em cada esfera de governo, do atendimento integral, com prioridade para as
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina)
atividades preventivas, e da participação da comunidade, que confirma seu caráter de direito social pessoal, de um lado, e de direito social coletivo, de outro. É também por meio dele que o Poder Público desenvolve uma série de atividades de controle de substâncias de interesse para a saúde e outras destinadas ao aperfeiçoamento das prestações sanitárias. Responsável, pois, pelas ações e serviços de saúde é o Poder Público, falando a Constituição, neste caso, em ações e serviços públicos de saúde, para distinguir da assistência à saúde pela iniciativa privada, que ela também admite, e cujas instituições poderão participar complementarmente do sistema único de saúde, sendo vedada a destinação de recursos públicos para auxílios ou subvenções às instituições privadas com fins lucrativos. O § 3º do art. 199 contém uma regra praticamente inócua, ao vedar a participação direta ou indireta de empresas ou capitais estrangeiros na assistência à saúde no País, salvo nos casos previstos em lei; como a lei pode prever todos os casos, não há limitação alguma. Talvez não fosse mesmo o caso de proibir a participação de empresa ou de capitais estrangeiros, mas apenas a remessa de lucros provenientes de serviços de assistência à saúde." (in "Curso de Direito Constitucional", 11ª Edição, 1996, Editora Malheiros, pág.762). No mesmo sentido é a lição de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, que foi citada tanto pelo autor como pelo réu, verbis:
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"É importante realçar que a Constituição, no dispositivo citado, permite a participação de instituições privadas `de forma complementar', o que afasta a possibilidade de que o contrato tenha por objeto o próprio serviço de saúde, como um todo, de tal modo que o particular assuma a gestão de determinado serviço. Não pode, por exemplo, o Poder Público transferir a uma instituição privada toda a administração e execução das atividades de saúde prestadas por um hospital público ou por um centro de saúde; o que pode o Poder Público é contratar instituições privadas para prestar atividades-meio, como limpeza, vigilância, contabilidade, ou mesmo determinados serviços técnico-especializados, como os inerentes aos hemocentros, realização de exames médicos, consultas, etc.; nesses casos, estará transferindo apenas a execução material de determinadas atividades ligadas ao sistema de saúde, mas não sua gestão operacional. A Lei nº 8.080/90, de 19.9.90, que disciplina o Sistema Único de Saúde, prevê, nos arts. 24 a 26, a participação complementar, só admitindo-a quando as disponibilidades do SUS `forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinada área', hipótese em que a participação complementar deverá `ser formalizada mediante contrato ou convênio, observadas, a respeito, as normas de direito público' (entenda-se, especialmente, a Lei nº 8.666, pertinente a licitações e contratos). Isto não significa que o Poder Público vai abrir mão da prestação do serviço que lhe incumbe para transferi- la a terceiros; ou que estes venham a administrar uma entidade pública prestadora do serviço de saúde; significa
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que a instituição privada, em suas próprias instalações e com seus próprios recursos humanos e materiais, vai complementar as ações e serviços de saúde, mediante contrato ou convênio". (in "Parcerias na Administração Pública", 4 ª ed., Editora Atlas, 2002, pág. 186). Resta certo, assim, que, no âmbito do sistema único de saúde, os serviços devem ser prestados diretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, sendo lícito que a iniciativa privada, mediante contrato de direito público ou convênio, participe do sistema único de saúde, desde que tal participação dê-se de forma complementar. É incontroverso nos autos que no ano de 2002, após procedimento licitatório, o Município de Palotina, então representado pelo réu Luiz Ernesto de Giacometti, firmou termos de cooperação com a ré IBDEC Instituto Brasileiro de Integração e Desenvolvimento Pró-Cidadão (representado pela ré Lilian Lsiboa), tendo por fim a execução de serviços afetos à área de saúde. Tais contratações, embora precedidas de procedimento licitatório, configuram, de fato, ato ímprobo, que causa lesão ao erário, porquanto os serviços objeto dos termos de parceria tratavam exclusivamente de serviço essencial, que deveria ser prestado pelo poder público, ao qual é vedada a terceirização, implicando, assim, em burla à regra da contratação de pessoal, eis que os serviços para os quais os funcionários da OSCIP foram contratados em razão dos termos de parceira (saúde) fogem daquelas previsões excepcionais do artigo 37, IX da Constituição Federal, ou seja, não são de necessidade temporária do poder público.
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) Vale dizer, a execução dos serviços de saúde pela OSCIP IBDEC, mediante os três termos de parceria objeto da presente ação, não era complementar àqueles que deveriam ser exercidos pelo poder público (atividade-fim do Estado), mas sim configuravam serviços essenciais que tinham por fim substituir o Município de Palotina, em afronta ao disposto no artigo 196, § 1.º da Constituição Federal. No caso em apreço, entretanto, o termo de parceria que o Município de Palotina firmou com uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público OSCIP, não tem por finalidade a complementação dos serviços de saúde prestados diretamente pelo mencionado município, mas sim, a integral transferência desses serviços a uma entidade privada, o que não encontra amparo nem na Constituição Federal nem da legislação infraconstitucional, as quais, como antes demonstrado, permitem que a iniciativa privada atue no Sistema Único de Saúde, apenas e tão-somente de forma complementar aos serviços prestados pelos entes públicos. Tanto é assim, que através dos termos de parceria firmado entre as partes, a IBIDEC assumiu a responsabilidade pela contratação e pagamento pessoal pelas atividades médicas, odontológicas e de enfermagem, sem qualquer vínculo empregatício com o Município de Palotina. Desta forma, em ofensa ao disposto no artigo 37, inciso II da Constituição Federal a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração - o IBIDEC, de comum acordo com o Município de Palotina, além de deixarem de prestar assistência a saúde, de forma direta, terceirizaram, por completo, a prestação desses serviços, sem que houvesse a realização de concurso público.
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) Há exceção a regra de contratação por meio de concurso público, qual seja, que a contratação seja por tempo determinado, a fim de atender a necessidade temporária de excepcional interesse público (art. 37, inciso IX da CF). Todavia, não é a situação dos autos, pois as atividades para as quais os funcionários foram contratados (médico, dentista e enfermeiro) não configuraram necessidade temporária de excepcional interesse público, pelo contrário, são atividade básicas, de cunho permanente, que só poderão ser prestadas pela iniciativa privada de forma complementar, como acima constou. As atividades diretamente ligadas à prestação de atividades de saúde, como serviços desempenhados por médicos, dentistas, enfermeiros e auxiliar de enfermagem, como determinado pelos termos de parceria, não podem ser considerados como atividade-meio, pois os serviços de saúde, como dito, não são serviços acessórios do Poder Público, mas serviços ligados à atividade normal, eis que a prestação de serviços de saúde é obrigação do Estado por imposição constitucional. Corroborando com este entendimento, vê-se o Decreto 2271/1997, artigo 1º, § 2º, o qual dispõe: "Art . 1º No âmbito da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional poderão ser objeto de execução indireta as atividades materiais acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de competência legal do órgão ou entidade. § 1º As atividades de conservação, limpeza, segurança, vigilância, transportes, informática, copeiragem, recepção, reprografia, telecomunicações e manutenção de prédios, equipamentos e instalações serão, de preferência, objeto de execução indireta.
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§ 2º Não poderão ser objeto de execução indireta as atividades inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou entidade, salvo expressa disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal. Dessa forma, a atuação dos réus não atende às normas constitucionais (artigos 37, inciso II e IX, 196 e 199, §1º da Constituição Federal) e infraconstitucionais aplicáveis à espécie (artigo 1º, §2º do Decreto 2271/1997). Em situação assemelhada, o Órgão Especial, que julgou recurso de agravo regimental interposto contra a decisão do Presidente do Tribunal de Justiça, que indeferiu o pedido para que os efeitos da medida liminar deferida fossem suspensos, também adotou o entendimento de que, no caso, o Município de Palotina, através do termo de parceria que pretendia firmar com uma OSCIP, transferiria à iniciativa privada todos os serviços públicos municipais de saúde. Do acórdão, mostra-se oportuna a transcrição da seguinte passagem: "Segundo o que consta da decisão liminar, a participação de entidades privadas na prestação de serviços de saúde, na forma do disposto no artigo 199 da Constituição, tem caráter complementar. Não está aberto ao gestor celebrar termos de parceria com Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público em que, na prática, ocorra transferência da prestação do serviço público de saúde para entidades privadas. Na situação dos autos, o Município de Palotina publicou Edital de Concurso de Projetos n.º 01/2006, cujo objeto é a celebração de Termo de Parceria com entidade de direito privado sem fins lucrativos, qualificada como
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Organização da Sociedade Civil de Interesse Público - OSCIP - para cooperação técnico-administrativa visando à formatação de unidade hospitalar na rede municipal, para a implementação, em caráter suplementar, dos serviços médicos hospitalares em unidade pública (Hospital Municipal Quinto Abrão Delazari), incluindo a obtenção de bens materiais, equipamentos e correlatos, e a realização de programas de prevenção, promoção e conscientização na área de saúde. Do contido no objeto da licitação emerge a convicção de que o Município contratante, na prática, transfere para as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público toda a estrutura do serviço público de saúde a ser prestado à população. O caráter complementar da participação das entidades privadas na prestação de serviços de saúde a que se refere a Constituição é deixado de lado para prevalecer a gestão do Sistema Único de Saúde pelo particular a ser contratado. No Termo de Parceria a ser celebrado, conforme o que consta do documento de fls. 87, compete ao Município contratante apenas a supervisão e a fiscalização da execução dos serviços de saúde, de acordo com o Programa de Trabalho aprovado. No Sistema Único de Saúde, segundo o disposto no artigo 199 da Constituição, o Poder Público não pode limitar- se a supervisionar e a fiscalizar a execução de serviços prestados por entidades privadas. É necessário que o próprio Poder Público desenvolva atividades de execução do serviço de saúde, que podem ser complementadas por entidades privadas. A transferência da execução global dos serviços de
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saúde para entidades privadas, no Sistema Único de Saúde, não se coaduna com o caráter complementar a que se refere o texto constitucional. Daí a pertinência do que consta da decisão liminar em torno da análise da constitucionalidade do ato administrativo. Conforme o que ficou assentado na decisão agravada, o exame da constitucionalidade dos atos da administração pública não pode ficar a salvo do controle jurisdicional, conforme o entendimento do Supremo Tribunal Federal. Neste sentido, a decisão liminar não chegou a interferir na esfera de discricionariedade do gestor. A liminar limitou-se a tratar da constitucionalidade do ato administrativo praticado. A tutela jurisdicional em torno do cumprimento das disposições constitucionais não alcança deliberação do administrador, com o que não ocorre espécie de interferência do Poder Judiciário na área de atuação do Poder Executivo Municipal. O objetivo da decisão liminar foi o de preservar o interesse público em vista de possível violação da Constituição na prática de atos administrativos, especificamente no que diz respeito, no artigo 199, ao caráter complementar dos serviços prestados por entidades privadas no Sistema Único de Saúde." (Suspensão de Liminar nº 389.013-3, Órgão Especial, Rel. Des. Tadeu Marino Loyola Costa, DJ 26/01/2007).
Portanto, configurado o ato de improbidade previsto no artigo 10, XI da Lei 8429/92, praticado pelos réus, pois houve liberação de verba pública sem a devida observância às normas pertinentes, valendo esclarecer
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) que não só o ex-Prefeito praticou o ato, mas também a OSCIP, representada pela ré Lilian, contribuiu ativamente para a prática do ato ilegal, na medida em que não adotou a mesma cautela e diligência que cabia ao administrador público e, assim, deixou de agir de acordo com a ordem constitucional e os princípios administrativos, pois firmou contratos objetivando a prestação de serviço essencial do Município, o que é vedado constitucionalmente, implicando, por consequência, em intermediação ilegal de mão-de-obra (contratação fraudada de funcionários públicos). No que se refere à aplicação das sanções previstas na Lei 8.429/1992, faço, nesse primeiro momento, comentários sobre a referida lei. A Lei 8.429/92, ao disciplinar as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional, previu três modalidades de ato de improbidade administrativa, quais sejam: a) os que importem enriquecimento ilícito, em seu art. 9º; b) os que causam prejuízo ao erário, com previsão no art. 10; c) e, por último, os que atentam contra os princípios da Administração Pública, de acordo com o disposto no art. 11. O artigo 9º da Lei nº 8.429/92 aborda os atos de improbidade administrativa que importam em enriquecimento ilícito. No caput do artigo está o núcleo central do tipo, qual seja, a obtenção "de qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida no exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1º". Considera-se "vantagem patrimonial indevida" a obtenção, o recebimento, direta ou indiretamente, de qualquer "interesse" que
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) afronte o padrão jurídico de probidade administrativa, como suficiente para incidência do referido dispositivo. A vantagem indevida é fruto da utilização imprópria da função pública, voltada para busca de benefícios privados, que se constituem em valor, presente ou futuro, monetário ou não. Assim, todo o enriquecimento que esteja relacionado ao exercício da atividade pública e que não corresponda à contraprestação paga ao agente por determinação legal, constitui vantagem indevida. Note-se, inclusive, que, na maioria dos casos previstos no art. 9º, a vantagem patrimonial conferida ao agente público não provem dos cofres públicos, mas sim de terceiros. Incidirá na hipótese do art. 10 o agente público que causou, conscientemente, prejuízo ao erário em razão de sua conduta, e, aquele outro que, mesmo não tendo previsto o dano ao erário, agiu de forma imprudente ou negligente. A distinção entre a conduta dolosa e culposa aproveita, apenas para fins de aplicação das sanções, incidindo para o segundo caso sanções menos severas, dentre as arroladas no art. 12, II, observando, também, o seu parágrafo único. O prejuízo ao erário, característico deste artigo, se revela pela perda, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação. Perda é o extravio de uma coisa que se possuía. O desvio é o destino ou aplicação errada. A apropriação caracteriza-se pelo apoderamento, inversão de posse, permitindo que outrem transforme em seu, bem que não lhe pertence. Malbaratamento, por sua vez, seria o emprego ou aplicação indevida, ou seja, o gasto de forma inconveniente, com prejuízo. Por fim, a dilapidação é reconhecida como o esbanjamento, desperdício. Por fim, o art. 11, caput, da referida lei se refere à ação ou omissão que atenta contra os princípios administrativos, violando os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições. Esses deveres são arrolados exemplificativamente, a eles se podem
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) acrescentar a boa-fé, a impessoalidade, igualdade, proporcionalidade, dentre outros contidos nos princípios que norteiam a atividade administrativa. Pois bem. Ao nos atermos ao caso concreto, configuradas estão as imputações de atos de improbidade administrativa previstos nos artigos 10 e 11 da Lei 8.429/1992. O dano ao erário público, como bem entendeu o d. juiz "a quo", não corresponde à totalidade dos valores repassados pelo Município ao IBIDEC, pois ainda que irregular a prestação de serviços, os prestadores (médicos, dentista e enfermeiros) prestaram o serviço contratado, e, portanto, devem ser remunerados. Devolver aquilo que foi pago aos prestadores, à título de remuneração dos trabalhos prestados, representaria enriquecimento indevido da Municipalidade, a qual se beneficiou com os serviços prestados. Portanto, considera-se dano aquilo que o Município não teria gasto se tivesse contratado os funcionários de forma regular. O valor repassado à maior, que corresponde ao dano ao erário, é a taxa da administração, valor pago à IBIDEC, como forma de compensação pelos seus serviços. Neste sentido, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONTRATAÇÃO DE SERVIDORES PÚBLICOS SEM A REALIZAÇÃO DE CONCURSO. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. TRIBUNAL A QUO QUE CONSIGNOU A PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS CONTRATADOS.
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) EXEGESE DO ART. 12, III, DA LEI 8.429/92. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO RECURSAL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 E 356 DO STF. AUSÊNCIA DE COTEJO ANALÍTICO. MERA TRANSCRIÇÃO DE EMENTAS. 1. É inadimissível o cabimento do apelo extremo pela alínea "a" do permissivo constitucional quando os dispositivos tidos pelo recorrente como vulnerados (arts. 458 e 469 do CPC) não foram devidamente prequestionados pelo acórdão recorrido. 2. A despeito da oposição de embargos de declaração pelo recorrente, infere-se que o recurso integrativo não versou sobre o dispositivo supra, razão pela qual inarredavelmente incidem as Súmulas n. 282 e 356 do STF. 3. À demonstração da dissidência pretoriana é necessário que o aresto combatido e o paradigma tenham partido de premissas fáticas e jurídicas idênticas, o que impõe ao recorrente a transcrição dos trechos dos acórdãos confrontados e a demonstração da similitude de circunstâncias, não bastando, para isso, a mera transcrição de ementas (Precedentes: AgRg no Ag 1.026.612/RJ, Relator Ministro Fernando Gonçalves, Quarta Turma, DJ de 3 de novembro de 2008; AgRg no Ag 1.036.279/RJ, Relator Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, DJ de 3 de novembro de 2008; REsp 1.049.666/SP, Relatora Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ de 10 de novembro de 2008). 4. A leitura atenta do inciso III do art. 12 da Lei 8.429/92 não deixa pairar qualquer dúvida de que a imposição de ressarcimento em decorrência de ato improbo
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) perpetrado por agente público só é admita na hipótese de ficar efetivamente comprovado o prejuízo patrimonial. 5. Deveras, é ressabido que o dano material reclama a prova efetiva de sua ocorrência, porquanto é defesa condenação para recomposição de dano hipotético ou presumido. Ademais, à mingua de prova respeitante ao prejuízo, o eventual ressarcimento caracteriza locupletamento indevido (Precedentes: EREsp 575551/SP, Relatora Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, DJ de 30 de abril de 2009; REsp 737279/PR, Relator Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJ de 21 de maio de 2008; e REsp 917.437/MG, Relator Ministro Francisco Falcão, Relator para acórdão Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ de 1 de outubro de 2008). 6. No caso sub examinem, o Tribunal a quo, soberano na análise do arcabouço fático-probatório dos autos, consignou que [...] "é irrelevante se os serviços foram efetivamente prestados para o Município" [...] (fl. 1.937), bem como que, [...] "mesmo que os serviços tenham sido efetivamente prestados, estará o Município se locupletando" [...] ( fl. 1.938). Logo, ressoa evidente que os servidores, apesar de terem sido contratados sem a devida realização de concurso público, prestaram os serviços que lhes foram designados, de modo que inexiste prejuízo a ser reparado. 7. Recurso especial conhecido parcialmente e, nessa parte, provido. (STJ - REsp 1113843 / PR T1 Primeira Turma - Ministro Benedito Gonçalves - DJe 16/09/2009)
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) No que se refere à ofensa aos princípios administrativos, em especial, aos princípios da legalidade, da lealdade, da imparcialidade, da honestidade, da boa-fé e da probidade, da mesma forma restou caracterizado. Os réus, de forma livre e consciente, contrariando as normas estabelecidas na Constituição Federal e desvinculando-se do dever de preservar o interesse público, contrataram profissionais da área de saúde, sem a realização de concurso público, por meio de terceirização desenvolvida pelo IBIDEC, e, sem que estes prestassem os serviços de forma complementar, mas diretamente, como se da administração pertencessem. Neste sentido: ADMINISTRATIVO. CONTRATAÇÃO DE SERVIDOR SEM CONCURSO PÚBLICO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LESÃO A PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. AUSÊNCIA DE DANO AO ERÁRIO. 1. A lesão a princípios administrativos contida no art. 11 da Lei nº 8.429/92, em princípio, não exige dolo ou culpa na conduta do agente nem prova da lesão ao erário público. Basta a simples ilicitude ou imoralidade administrativa para restar configurado o ato de improbidade. Caso reste demonstrada a lesão, o inciso III do art. 12 da Lei nº 8.429/92 autoriza seja o agente público condenado a ressarcir o erário. 2. A conduta do recorrente de contratar e manter servidores sem concurso público na Administração amolda- se ao caput do art. 11 da Lei nº 8.429/92, ainda que o serviço público tenha sido devidamente prestado. 3. Não havendo prova de dano ao erário, não há que se falar em ressarcimento, nos termos da primeira parte do inciso III do art. 12 da Lei 8.429/92. As demais
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) penalidades, inclusive a multa civil, que não ostenta feição indenizatória, são perfeitamente compatíveis com os atos de improbidade tipificados no art. 11 da Lei 8.429/92 (lesão aos princípios administrativos). 4. Acórdão reformado para excluir a condenação ao ressarcimento de danos e reduzir a multa civil de dez para três vezes o valor da última remuneração recebida no último ano de mandato em face da ausência de prejuízo ao erário. 5. Recurso especial provido em parte. (STJ - REsp 737279 / PR T2 Segunda Turma - Ministro Castro Meira - DJe 21/05/2008) Por outro lado, restando demonstrado que o termo de parceria é contrário à ordem constitucional, não há que se falar em invasão do Poder Judiciário ao juízo de conveniência e oportunidade do administrador público, até porque este não tem liberdade para praticar atos contrários à Constituição Federal e às leis. No tange à indisponibilidade de bens, referida medida foi tomada a fim de assegurar a efetividade de uma eventual condenação dos réus, o que é exaustivamente aceito pela jurisprudência dos Tribunais Superiores, se não vejamos: "PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. LIA. INDISPONIBILIDADE DE BENS. MULTA CIVIL. INCLUSÃO. 1. Considerando-se que a multa civil integra o valor da condenação a ser imposta ao agente ímprobo, a decretação da indisponibilidade de bens deve abrangê-la, já que essa medida cautelar tem por objetivo assegurar futura execução da sentença condenatória proferida na ação civil por
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) improbidade administrativa. 2. Ainda que não haja previsão literal no art. 7º da Lei nº 8.429/92 para a decretação da indisponibilidade de bens em relação à multa civil, o magistrado tem a faculdade de determinar a efetivação da medida com base no poder geral de cautela consubstanciado nos artigos 797 e 798, do Código de Processo Civil. 3. Aferida a razoabilidade da medida, o valor dos bens tornados indisponíveis deve ser suficiente para o pagamento do valor total da condenação, abrangida a multa civil. 4. Recurso especial provido." (REsp 1.023.182/SC, 2ª. Turma, Relator Ministro CASTRO MEIRA, DJ 23/10/08). Vale mencionar que é irrelevante, in casu, a situação financeira dos apelantes, porquanto a decretação da medida cautelar mostra-se prudente e vem a assegurar, como acima mencionado, uma prestação jurisdicional mais efetiva. No mesmo sentido, é o entendimento desta Corte: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INDISPONIBILIDADE DE BENS. FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA. PRESSUPOSTOS PRESENTES. PROVA DA INTENÇÃO DE DILAPIDAR O PATRIMÔNIO. DESNECESSIDADE, SOB PENA DE INEFICÁCIA DA MEDIDA. RECURSO DESPROVIDO O "fumus boni iuris" e o "periculum in mora" são indispensáveis à concessão da indisponibilidade de bens do agente político acusado de ato de improbidade administrativa, estando o autor dispensado de demonstrar a intenção do réu em dilapidar ou desviar o patrimônio, com o
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina) objetivo de livrar-se à reparação do dano, sob pena de ineficácia da medida. (TJPR Agravo de Instrumento 627.999-8 4ª Câmara Cível Relator Des. Abraham Lincoln Calixto publicado 30/06/2010). Por fim, quanto às sanções previstas na Lei nº 8.429/92 e impostas por meio de sentença impugnada, da mesma forma, não há reparo a ser feito. A douta Procuradoria Geral de Justiça, em seu parecer nº 9355, afirmou, cujas razões ratifico nesta oportunidade: "(...) O ex-prefeito Luiz Ernesto de Giacometti privatizou parcela relevante dos serviços públicos de saúde devidos pelo Município, entregando-os aos empregados do Instituto Brasileiro de Integração e Desenvolvimento Pró-Cidadão, mediante ilegal e inconstitucional terceirização de mão-de-obra e abdicação, pelo Município, do seu papel de manter e prestar diretamente os serviços públicos essências de saúde à população, conforme estabelece o artigo 196 da CF. Merece o réu não apenas as sanções de ordem econômica, como é caso do ressarcimento dos prejuízos ocasionados pelos ilegais contratos ou termo de parceria, a multa civil e a proibição de contratar com o Poder Público, como também a sanção de suspensão dos direitos políticos, de maneira que esse administrador possa ser mantido, ao menos por alguns anos, longe do Estado e da Administração Pública. O IBIDEC e seu Presidente, a Senhora Lílian de Oliveira Lisboa, também devem ser sancionados na forma como consignado na sentença, com a obrigação de reparar os danos sofridos pelos cofres do Município de Palotina, diante dos ilegais contratos firmados por essa novel
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entidade, que jamais prestou serviços de saúde complementar, conforme estabelece o artigo 199 da Constituição Federal. Não é nunca foi entidade filantrópica e sem fins lucrativos na área de saúde. Foi o Instituto montado para ganhar dinheiro público, numa relação parasitária, ilegal e inconstitucional com o Poder Publico, terceirizando mão de obra na área de saúde. O ressarcimento, a multa civil e a proibição de contratar com o Poder Público são medidas salutares e proporcionais aos graves acontecimentos relatados neste processo, cujos atores principais são exatamente o IBIDEC,a Presidente da OSCIP e o ex-Prefeito, cujos comportamentos, naturalmente dolosos, estão impregnados de ilegalidade vitandas e da violação do princípio da moralidade administrativa. (...) Portanto, há que se manter as penalidades impostas pela sentença impugnada, e o pedido de reforma do Ministério Público não merece acolhida, pois tal qual considerou a sentença, o dano ocasionado ao erário corresponde ao valor repassado a maior pelo Município à OSCIP, que no caso é a taxa de administração, valor este que não seria pago pelo Município acaso tivesse procedido à contratação direta do pessoal necessário, por meio de concurso público. A pretensão de ressarcimento do valor total dos termos de parceria implicaria, inversamente, em enriquecimento indevido do Município.
Por todo o exposto, voto no sentido de negar provimento a todos os recursos de apelação cível interpostos: 1) pelo Ministério Público do Estado do Paraná, 2) por Luiz Ernesto de Giacometti e 3) por Lílian de Oliveira Lisboa e IBIDEC , mantendo, integralmente, a sentença impugnada.
(Apelação Cível nº 420.140-3 - Palotina)
III - DECISÃO: ACORDAM os integrantes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento a todos os recursos de apelação cível interpostos : 1) pelo Ministério Público do Estado do Paraná, 2) por Luiz Ernesto de Giacometti e 3) por Lílian de Oliveira Lisboa e IBIDEC, nos termos do voto da Desembargadora Relatora. Presidiu o julgamento a Excelentíssima Senhora Desembargadora Regina Afonso Portes, com voto, e dele participou a Excelentíssima Desembargadora Maria Aparecida Blanco de Lima. Curitiba, 23 de agosto de 2.011.
LÉLIA SAMARDÃ GIACOMET Desembargadora Relatora
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