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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0844333-8, DA COMARCA DE MEDIANEIRA VARA CÍVEL E ANEXOS. Apelantes: RODOVIA DAS CARTARATAS S/A ECOCATARATAS e ITAÚ SEGUROS S/A Apelados: BORILLE TRANSPORTES LTDA. IRB BRASIL RESSEGUROS S/A Relator: DES. NILSON MIZUTA APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL. ACIDENTE DE TRÂNSITO CAUSADO PELA PRESENÇA DE OBSTÁCULO (MADEIRA) SOBRE A RODOVIA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. SERVIÇO DEFEITUOSO. FORÇA MAIOR. INOCORRÊNCIA. DANOS MATERIAIS ARBITRADOS COM BASE NO MENOR ORÇAMENTO. POSSIBILIDADE. DESCONTO DE FRANQUIA. CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA DA SEGURADORA. DENUNCIAÇÃO DA LIDE AO IRB- BRASIL RESSEGUROS S/A. INADMISSIBILIDADE. CONDENAÇÃO DOS HONORÁRIOS. LIDE SECUNDÁRIA. 1. É objetiva a responsabilidade da concessionária de serviço público por acidente provocado pela presença de obstáculo na pista (art. 14 CDC). 2. A indenização por dano material correspondente ao conserto do veículo é fixada com base no menor orçamento apresentado. 3. O desconto de franquia limita-se à lide secundária, entre a seguradora e a denunciante, de tal modo que não poderá trazer prejuízos aos apelados. 4. Se a seguradora comparece a Juízo aceitando a denunciação da lide feita pelo réu e contestando o pedido principal, assume ela a condição de litisconsorte passiva, formal e materialmente, podendo, em consequência, ser condenada, direta e solidariamente, com o réu. 5. Inexiste obrigação do IRB perante o segurado, mas apenas em relação à própria seguradora. 6. Devidos os honorários na lide secundária, quando a lidisdenunciada apresenta resistência à denunciação. APELAÇÃO NÃO PROVIDA Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação Cível nº 0844333-8, da Comarca de Medianeira Vara Cível e
Anexos, em que são apelante RODOVIA DAS CARTARATAS S/A ECOCATARATAS e ITAÚ SEGUROS S/A e apelados BORILLE TRANSPORTES LTDA. e IRB BRASIL RESSEGUROS S/A. RELATÓRIO Borille Transportes Ltda. e Junior José Borille ajuizaram a ação de reparação de danos contra a Rodovia das Cataratas S/A, alegando que, em 1º de junho de 2006, por volta das 2 horas, o motorista dos autores, Leo Angheben, trafegava com o caminhão Mercedes Benz placa ABO 6711, no sentido Medianeira a Curitiba, quando foi surpreendido por um "toco" de madeira sobre a pista. Sustenta que o evento causou prejuízos materiais de grande porte à empresa autora. Destaca a responsabilidade objetiva da concessionária. Busca a condenação da ré ao pagamento dos danos materiais, no valor de R$ 34.407,00, corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora. Em contestação a Rodovia das Cataratas S/A denunciou à lide a Itaú Seguros S/A. Defendeu a ausência de responsabilidade no evento danoso, já que caberia à autora a prova de que o dano foi causado por objeto de madeira que estava sobre a pista. Destacou a adequada prestação do serviço pela concessionária, que faz inspeção e fiscalização periódica pela rodovia. Registrou que no caso de omissão a culpa é subjetiva. Ressaltou como excludente de responsabilidade a existência de força maior. Impugnou o valor da indenização, com a fixação do termo inicial dos juros de mora a data da sentença.
Em contestação a Itaú Seguros S/A aceitou a denunciação no limite do contrato. Denunciou à lide a IRB Brasil Resseguros S/A. Alegou a ausência de responsabilidade da denunciante no evento danoso. Impugnou o pedido de indenização por danos materiais. Em contestação a IRB Brasil Resseguros S/A defendeu o indeferimento da denunciação da lide. Alternativamente, defende a intervenção como assistência simples. Busca a limitação da responsabilidade do IRB à proporção segurada, além de afastar o dever de indenizar os danos alegados. No mérito, alegou a ausência de culpa da ré no acidente, impugnando o valor da indenização. Pugnou pela fixação dos juros de mora e da correção monetária a partir da citação. Em saneador o MM Juiz manteve a denunciação da IRB Brasil Resseguros S/A como denunciada (fl. 330 e verso). Sobreveio a r. sentença que julgou procedente o pedido de indenização para condenar as rés, solidariamente, ao pagamento dos danos materiais no valor de R$ 34.407,00, corrigidos monetariamente desde a data do ajuizamento da ação e acrescidos de juros de mora de 1% desde a citação. Condenou os réus ao pagamento das custas processuais e dos honorários arbitrados em 20% sobre o valor da condenação. Contra a r. sentença a IRB Brasil Resseguros S/A opôs embargos de declaração, que foram rejeitados (fl. 547). Inconformada a Rodovia das Cataratas S/A apela para buscar a reforma da r. sentença, alegando a ausência de prova idônea da ocorrência do evento danoso. Destaca a adequação na prestação do
serviço pela concessionária. Registra que no caso de omissão a responsabilidade da concessionária deverá ser analisada sob a ótica subjetiva. Alega como excludente de responsabilidade o fato de terceiro ou força maior. Impugnou a indenização por danos materiais. A Itaú Seguros S/A também apela para buscar a reforma da r. sentença, alegando a ausência de nexo causal entre o acidente e a suposta má prestação de serviços. Impugnou a condenação por danos materiais, buscando o desconto do valor da franquia e a condenação solidária. Pugna pela condenação da IRB Resseguros Brasil S/A, além de afastar a condenação da denunciada ao pagamento da sucumbência. Foram apresentadas as contrarrazões. VOTO Trata-se de apelação interposta contra a r. sentença que julgou procedente o pedido de indenização interposta por Borille Transportes Ltda. e Junior José Borille contra a Rodovia das Cataratas S/A. Alega a apelante que no caso de omissão a responsabilidade da concessionária deverá ser analisada sob a ótica subjetiva. Registra a adequação na prestação do serviço pela concessionária. Na declaração junto ao Departamento da Polícia Rodoviária Federal, DAT nº 3590, o motorista dos autores, Leo Angheben, ressaltou: "Declaro que estava seguindo pela BR 277, sentido Cascavel Guarapuava, quando na altura do Km 418,2 encontrava-se um "toco" de madeira sobre a pista, o qual não pude desviar pois vinha outro veículo
em sentido contrário, ocasionando os danos ao veículo que eu conduzia" (fl. 27). LEO ANGHEBEN, motorista dos autores, ouvido na condição de informante, declarou: "(...) que no dia do acidente estava conduzindo o veículo da empresa pela Rodovia BR 277 em direção ao Município de Curitiba; que pouco após passar o Município de Canta Galo, nas proximidades de um posto desativado; o depoente foi surpreendido por um pedaço de pau de aproximadamente 50cm; que esse pedaço de pau estava no meio da sua pista de rolamento; que o referido objeto atingiu o veículo e causou diversos danos, destruindo o intercooler, radiador, tampa do carter, o que inclusive acarretou vazamento do óleo do motor; que não foi possível desviar do objeto porque em sentido contrário vinha outros veículos cujas luzes impediram o depoente de enxergar o objeto com a distância necessária para desviar; que após o ocorrido esteve no local uma viatura da Rodovia das Cataratas; que não sabe o nome dos funcionários que prestaram atendimento, mas pode informar que eles estavam em um veículo de cor verde; que tais funcionários tiraram fotos do veículo e do objeto; que esses funcionários ainda fizeram anotações sobre o acidente, sendo que o depoente inclusive forneceu a eles os documentos do veículo; que no dia seguinte o depoente comunicou o ocorrido à Polícia, não sabendo exatamente o local em que fez essa comunicação, mas acredita que ela foi feita em alguma cidade próximo ao local do acidente; que o veículo precisou ser guinchado, pois não tinha condições de trafegar; que foi o veículo da Rodovia das Cataratas que guinchou o veículo conduzido pelo depoente; que esclarece que o registro do acidente foi feito na Polícia Rodoviária; que o trajeto que estava fazendo era de Medianeira até Curitiba; que o veículo foi consertado no Posto Três Pinheiros pela Mecânica Marafon; que não
sabe informar o tempo exato que demorou o reparo; que não se recorda se chegou a dormir uma noite naquele local; que o caminhão estava carregado com produtos de frigorífico (...)" (fls. 340/341). JOSÉ ODERDENGE, testemunha devidamente compromissada, declarou: "que o depoente trabalha como caminhoneiro e estava conduzindo seu caminhão pela BR 277, nas proximidades de Cantagalo, quando foi chamado no rádio por Rafael, filho de Leo Angheben, o qual dizia que haviam passado por cima de um pau na pista, que havia estourado o Carter; que o depoente estava próximo e logo depois chegou ao local, onde pode constatar que efetivamente o caminhão em que estavam Rafael e Leo havia passado por cima de uma tora de lenha e estourado o Carter; que inclusive havia marca de óleo na pista, concluindo o depoente que a tora de lenha antes referida foi arrastada na rodovia pelo caminhão por aproximadamente cinquenta metros; que o depoente se comprometeu a solicitar auxílio aos "verdinhos", que são os veículos que limpam a estrada; que logo em seguida o depoente passou no local em que os "verdinhos" ficam, isto é, no local denominado SAL, em Laranjeiras do Sul e solicitou auxílio (...) que no dia seguinte passou pelo mesmo local e constatou que ainda existia no meio da pista de rolamento uma marca de óleo com pó branco em cima; que viu que a tora de madeira fez um estrago no veículo (...)" (fls. 355/357). RAFAEL ANGHEBEN, filho do motorista do caminhão da autora, ouvido na condição de informante, disse: "que estava junto de seu pai no momento do acidente; que estava dormindo e acordou com o barulho da batida; que nesse momento seu pai disse ter batido em um pedaço de pau, o qual estava bem ao meio da pista de rolamento; que
imediatamente acendeu a luz de óleo do caminhão; que o pedaço de pau ficou preso na parte de baixo do caminhão, sendo retirado apenas com o auxílio de um guincho; que o guincho conduziu o caminhão até o posto Três Pinheiros; que o para-choque, a tampa do carter, os três radiadores e o óleo foram trocados no posto (...) que a Rodovia das Cataratas foi acionada no momento do acidente, tendo atendido à ocorrência; que quem atendeu a ocorrência foi apenas um funcionário, que inclusive tirou fotos do ocorrido; que a ocorrência foi registrada na Polícia Rodoviária de Laranjeiras do Sul (...)" (fls. 458/459). Observa-se que em trecho de rodovia explorada pela apelante ocorreu um acidente, em decorrência da presença de um obstáculo (toco de madeira) sobre a pista. Independentemente da teoria do risco administrativo, as concessionárias que administram estradas e rodovias respondem objetivamente pelos danos que causarem a terceiros. Na qualidade de concessionária de serviço público, que explora rodovia, a apelante se sujeita aos riscos inerentes a tal atividade, respondendo pelos danos causados a terceiro, quando o defeito na prestação do serviço impõe essa obrigação. O dever de indenizar decorre da relação de consumo, uma vez que as partes se subsumem nos conceitos de consumidor e fornecedor de serviços dos artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor. "Art.2. º - Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário". "Art.3. º - Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como
os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção de montagem, criação, construção transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.". RUI STOCO adverte: "o pedágio é contraprestação por serviços, tanto que a Carta Magna prevê a instituição de taxas em razão do exercício do poder de polícia ou "pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição". E, sem o pagamento do valor estipulado unilateralmente pelo prestador a cada alguns quilômetros rodados, o veículo não transita na rodovia sob regime de cobrança ou pedágio. De modo que, desenganadamente, o usuário desses serviços é consumidor e assim deve ser considerado". (Tratado de Responsabilidade Civil. 6ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 1389). O art. 14 do Código de Defesa do Consumidor prevê a responsabilidade objetiva na reparação dos danos aos consumidores, por defeitos relativos à prestação de serviços: "Artigo 14 - O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos á prestação de serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequados sobre sua fruição e riscos."
Considera-se serviço defeituoso aquele que não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar. A responsabilidade civil objetiva, decorrente da relação jurídica de consumo, caracteriza-se pela existência de defeito do serviço prestado, a ocorrência do evento danoso e a relação de causalidade entre o defeito do serviço e o dano. Exclui-se da responsabilidade objetiva somente os acontecimentos comprovados de caso fortuito, força maior ou culpa exclusiva da vítima, que não é o caso dos autos. O consumidor não pode ficar desguarnecido, uma vez que tem o direito de reclamar da administradora o fornecimento da pista livre e sem obstáculos. Neste sentido, com fundamento na responsabilidade objetiva perante o usuário do serviço, detinha a apelante o dever contratual de manter a pista de rolamento desembaraçada. Na existência de defeito na prestação do serviço surge o direito de indenização, por inexecução contratual. O Superior Tribunal de Justiça corrobora o entendimento no sentido de reconhecer que a relação jurídica entre usuário e a prestadora de serviço é regida pelo Código de Defesa do Consumidor. Por essa razão deverá responder, objetivamente, pelos danos causados aos usuários. "RECURSO ESPECIAL. ACIDENTE EM ESTRADA. ANIMAL NA PISTA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTES. Conforme jurisprudência desta Terceira Turma, as concessionárias de serviços rodoviários, nas suas relações com os usuários, estão subordinadas à legislação consumerista.
Portanto, respondem, objetivamente, por qualquer defeito na prestação do serviço, pela manutenção da rodovia em todos os aspectos, respondendo, inclusive, pelos acidentes provocados pela presença de animais na pista. Recurso especial provido". (STJ - REsp 647.710-RJ - Terceira Turma - Min. Castro Filho Julg. 20.6.2006). Portanto, basta para procedência do pedido a demonstração de dano e do nexo causal entre a conduta da prestadora de serviços e o dano ocasionado ao consumidor, já que certa é a sua obrigação de manter a rodovia livre de qualquer obstáculo ao tráfego. Neste sentido esta Câmara já decidiu: "AÇÃO DE INDENIZAÇÃO RESPONSABILIDADE CIVIL - CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO RODADO DEIXADO SOBRE A PISTA RESPONSABILIDADE OBJETIVA DEVER DE INDENIZAR EXCESSO DE VELOCIDADE DO VEÍCULO DA AUTORA NÃO COMPROVADO - DANOS MATERIAIS DEMONSTRADOS ATRAVÉS DE NOTAS APRESENTADAS - AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE RECURSO PROVIDO. Tratando-se de rodovia para a qual são estabelecidas condições especiais de conservação e segurança e por cujo uso é cobrado preço público, responsável é a concessionária por omissão do dever de vigilância, permitindo o a permanência de rodado de caminhão sobre a pista de rolamento, que surpreende os usuários, aplicando-se à hipótese as regras da responsabilidade objetiva, prevista no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal". (TJPR - 10ª C.Cível - AC 689782-9 - Campo Mourão - Rel.: Domingos José Perfetto - Unânime - J. 18.11.2010).
Os danos materiais estão comprovados pelos documentos apresentados nos autos. É certo o dano sofrido pelo veículo em razão do acidente. Leo Angheben declarou: "(...) que o referido objeto atingiu o veículo e causou diversos danos, destruindo o intercooler, radiador, tampa do carter, o que inclusive acarretou vazamento do óleo do motor; (...) que o veículo precisou ser guinchado, pois não tinha condições de trafegar; (...)" (fls. 340/341). O exame das peças e serviços traduz a extensão das avarias sofridas pelo caminhão no acidente. O autor apresentou três orçamentos com a estimativa dos gastos, sendo o de menor valor equivalente a R$ 34.407,00 (fls. 29/30). Assim, deverá prevalecer o orçamento da empresa Marangoni & Seganfredo Ltda., que apresentou o menor valor. Observe-se, ademais, que a ré não apresentou outras provas para desconstituir o direito alegado pelos autores. Ressalte-se, ainda, que "a apresentação de orçamento idôneo, não elidido por elementos hábeis pela parte contrária, é suficiente para a comprovação dos danos alegados pelo autor" (STJ, Quarta Turma. REsp nº. 260742/RJ.Rel. Min. Barros Monteiro. D.J: 13. 8.2001). A Itaú Seguros S/A também apela para buscar o desconto do valor da franquia na condenação. Registre-se, contudo, que esta matéria limita-se à lide secundária, entre a seguradora e a denunciante, de tal modo que não poderá trazer prejuízos aos apelados. O valor da franquia é convencionado entre os contratantes, e representa a participação do segurado na cobertura do seguro. Logo, a quantia deverá ser cobrada pela Itaú Seguros diretamente contra a segurada, Ecocataratas.
Também não procede a impugnação da seguradora à condenação solidária. Independentemente de inexistir relação jurídica direta entre os autores da ação e a seguradora, não há óbice para esta responder diretamente pelos danos oriundos de acidente causado pelo seu segurado, porque o dever resulta da obrigação assumida no contrato originário de seguro. É notório que os efeitos da relação jurídica firmada em um contrato de seguro não se limitam às partes pactuantes, podendo atingir terceiros beneficiários, como acontece com os seguros de vida ou de acidentes pessoais. Sobre o tema, o Colendo Superior Tribunal de Justiça assim se manifestou: "CIVIL E PROCESSUAL. SINISTRO. VEÍCULO AUTOMOTOR. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. DENUNCIAÇÃO DA LIDE FEITA PELO RÉU. ACEITAÇÃO. CONTESTAÇÃO DO PEDIDO PRINCIPAL. CONDENAÇÃO DIRETA DA DENUNCIADA (SEGURADORA) E SOLIDÁRIA COM O RÉU. POSSIBILIDADE. 1 - Se a seguradora comparece a Juízo aceitando a denunciação da lide feita pelo réu e contestando o pedido principal, assume ela a condição de litisconsorte passiva, formal e materialmente, podendo, em consequência, ser condenada, direta e solidariamente, com o réu. Precedentes do STJ." (STJ. REsp 699680 / DF. T4. Rel. Ministro Fernando Gonçalves. DJ. 26.06.2006). "PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS. DENUNCIAÇÃO DA LIDE DA SEGURADORA. ACEITAÇÃO DA DENUNCIAÇÃO E CONTESTAÇÃO
DO MÉRITO. CONDENAÇÃO DIRETA E SOLIDÁRIA DA SEGURADORA. CABIMENTO. PRECEDENTES. Em demanda onde se busca a indenização de danos materiais, aceitando o litisdenunciado a denunciação feita pelo réu, inclusive contestando o mérito da causa, exsurge a figura do litisconsórcio anômalo, prosseguindo o processo entre o autor de um lado e, de outro, como litisconsortes, o denunciado e o denunciante, que poderão vir a ser condenados, direta e solidariamente, ao pagamento da indenização. Esta, nos termos da jurisprudência uníssona deste Tribunal, é a interpretação a ser dada ao preceito contido no artigo 75, inciso I, do Código de Processo Civil. Recurso especial provido." (STJ. REsp 686762 / RS. T3. Rel. Ministro Castro Filho. DJ. 18.12.2006). Também não merece guarida o apelo da seguradora para condenar a IRB Resseguros Brasil S/A. A alegação de que a denunciação da lide está amparada no contrato de resseguro (CPC, art. 70, III) não se mostra apropriada, porque o IRB não tem nenhuma obrigação perante o segurado, mas sim em relação à própria seguradora. O seguro foi firmado entre a seguradora e o segurado. Assim, o IRB trata- se de elemento estranho a relação negocial. Somente na hipótese de insolvência, de decretação de liquidação ou de falência da Seguradora, é permitido que o IRB promova o pagamento direto ao segurado, participante, beneficiário ou assistido, da parcela de indenização ou benefício correspondente ao resseguro, desde que o pagamento da respectiva parcela não tenha sido realizado ao segurado pela cedente nem pelo ressegurador à cedente.
ADA PELLEGRINI GRINOVER E OUTROS prescrevem: "A vedação de denunciação da lide ao instituto de Resseguros do Brasil e a dispensa de sua convocação para a ação, na condição de litisconsorte necessário, atendem ao objetivo de possibilitar aos consumidores e às vítimas de danos uma solução da lide mais rápida e sem os complicadores que, necessariamente, a intromissão na causa pelo Instituto de Resseguros do Brasil determinará, conforme experiência ordinária indica. O segurador poderá agir regressivamente contra o Instituto de Resseguros do Brasil, se for o caso, para dele haver a parte que lhe toca. Trata-se de uma relação entre o Instituto e o segurador, que nada tem com a relação jurídica existente, por disposição de lei, diretamente entre o segurador e os consumidores e as vítimas de danos." [in Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, 8ª ed., FORENSE UNIVERSITÁRIA, Rio de Janeiro, 2004, pp. 899/900]. JOÃO MARCOS BRITO MARTINS ensina: "Independentemente das relações entre ressegurador e companhia de seguros, determinadas por exigências técnicas, o fato é que o contrato de resseguro é estranho ao segurado (res inter alios acta). Como também é estranho ao ressegurador o contrato entre seguradora e segurado. Portanto, os contratos de seguro e de resseguros são autônomos, independem um do outro. A responsabilidade é da seguradora perante o seu segurado, pois aquele liame jurídico (ressseguro) caracteriza uma relação independente. O segurado não toma parte na escolha do ressegurador, à exceção de grandes riscos, onde o segurado, em geral, opina. Isto em nada altera a natureza jurídica referida. ... A Lei nº 8.078/90 do Código de Defesa do Consumidor, no seu art. 101, especifica que a réu que houver contratado seguro de responsabilidade poderá chamar ao processo o segurador, vedada a integração do contraditório pelo Instituto
de Resseguros do Brasil. Tal norma objetiva a celeridade processual e reconhecer a não-participação direta do ressegurador nas avenças entre segurado e seguradora. Aliás, preceito que já fazia parte do Decreto-lei nº 73/66." [in Direito de Seguro, 2ª ed., FORENSE UNIVERSITÁRIA, Rio de Janeiro, 2004, pp. 61/62] Este Tribunal já decidiu: "AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - DENUNCIAÇÃO DA LIDE - INSTITUTO DE RESSEGUROS DO BRASIL - IRB - MATÉRIA CONTROVERTIDA NOS TRIBUNAIS - DESCABIMENTO - VEDAÇÃO LEGAL - ART. 101, II, DO CDC - INSTITUTO QUE NÃO TEM QUALQUER OBRIGAÇÃO PERANTE O SEGURADO - RECURSO DESPROVIDO. 1. "Não mais prevalente a regra do artigo 68 do Decreto-Lei 73/1966, tem-se que o negócio entre a seguradora e o IRB não atingiu a segurada, que contratara apenas com a primeira, não podendo mais ser considerado o IRB como litisconsorte necessário porque tal condição já não mais é determinada por lei, não figurando como parte na relação processual" (extinto TAPR, Ac 14865, Anny Mary Kuss, j. 18.02.2003). 2. O Código de Defesa do Consumidor veda expressamente nos contratos de seguro de responsabilidade a integração do contraditório pelo Instituto de Resseguros do Brasil (art. 101, inciso II)." (TJPR, 10ª C.Cív., Ap. Cív. nº 0365091-5, Ac. 5236, Rel. Des. RONALD SCHULMAN, Julg.: 26/10/2006). Nessa mesmo sentido: TJPR - AC 0322103-6 - 10ª C.Cív. - Rel. Des. Wilde de Lima Pugliese - J. 09.02.2006; TJPR - AC 0273532-4 - Maringá - 14ª C.Cív. - Rel. Des. José Simões Teixeira - J. 01.02.2006; TJPR, Nona Câmara Cível, Acórdão n. 1416, Rel. Des. João Kopytowski, publ.: 04.11.2005; TJPR, Sexta Câmara
Cível, Acórdão n. 12875, Rel. Juiz Conv. Albino Jacomel Guerios, publ.: 20.09.2004. Também sem razão a apelante quando pretende afastar a condenação da denunciada ao pagamento dos honorários. A denunciação da lide é uma demanda secundária de natureza condenatória. Assim, havendo resistência da litisdenunciada, deverá ser condenada a suportar o pagamento de honorários advocatícios, que são devidos ao denunciante. Observe-se, neste caso, que a litisdenunciada não aderiu simplesmente ao pedido, mas apresentou resistência quanto à sua responsabilidade. A condenação dos honorários, portanto, é procedente. É entendimento pacífico no Superior Tribunal de Justiça: "PROCESSO CIVIL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. À vista da natureza condicional da denunciação da lide, a respectiva procedência só induz a condenação em honorários de advogado, quando for objeto de resistência; se aderiu, simplesmente, à defesa que o denunciante opôs ao autor da demanda, sem negar sua responsabilidade acaso procedente a ação, o denunciado não está sujeito ao pagamento de honorários de advogado. Recurso especial conhecido e provido". (STJ - REsp 285723 / RS - TERCEIRA TURMA - Relª. Ministra NANCY ANDRIGHI - DJ 08.04.2002). Do exposto, voto no sentido de negar provimento à apelação interposta por RODOVIA DAS CARTARATAS S/A ECOCATARATAS e ITAÚ SEGUROS S/A.
ACORDAM os Senhores Desembargadores integrantes da Décima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos em negar provimento à apelação interposta por RODOVIA DAS CARTARATAS S/A ECOCATARATAS e ITAÚ SEGUROS S/A. A sessão foi presidida pelo Desembargador NILSON MIZUTA, com voto, e participaram do julgamento os Senhores Juízes Substitutos em 2º Grau Albino Jacomel Guerios e Denise Antunes. Curitiba, 24 de maio de 2012. NILSON MIZUTA Relator
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