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Acórdão
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RECURSO CRIME EX OFFICIO Nº 869.651-7
VARA ÚNICA DA COMARCA DE IBAITI RECORRENTE: JUIZ DE DIREITO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE
IBAITI RECORRIDO: LEONILDO CORREA DA SILVA RELATOR: MACEDO PACHECO RECURSO CRIME EX OFFICIO EM RAZÃO DE CONCESSÃO DE SALVO-CONDUTO EM HABEAS CORPUS PREVENTIVO. INTERNAMENTO INVOLUNTÁRIO EM CLÍNICA PSIQUIÁTRICA. AUSÊNCIA DE DOCUMENTO COMPROBATÓRIO DE EVENTUAL INSANIDADE E DE DECISÃO JUDICIAL DE INTERDIÇÃO. SENTENÇA CONFIRMADA EM SEDE DE REEXAME. RECURSO DESPROVIDO. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Recurso Crime Ex Officio nº 869.651-7, da Vara Única da Comarca de Ibaiti, em que é remetente Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Ibaiti, e recorrido Leonildo Correa da Silva. Trata-se de recurso crime ex officio encaminhado pelo Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Ibaiti, decorrente de decisão concessiva de habeas corpus preventivo, pela qual restou determinada a expedição de salvo conduto em favor do interessado Leonildo Correa da Silva.
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Cuida-se de reexame necessário de sentença concessiva de habeas corpus preventivo, impetrado pelo advogado Leonildo Correa da Silva, em seu favor, com fundamento de que teve sua residência invadida por familiares, por duas vezes (em 2010 e 2011), sendo internado à força na Clínica Psiquiátrica de Londrina, consistindo tal atitude em conduta típica de cárcere privado.
O paciente aduziu que, no período em que esteve internado, foi obrigado a ingerir medicamentos de contenção química, mesmo sem necessidade, além de ter sido mantido com pessoas em recuperação de uso de drogas e álcool, idosos, doentes mentais e pessoas com outras enfermidades, sem qualquer cuidado específico. Asseverou, ainda, que a clínica reteve seus documentos pessoais sem autorização. Neste sentido, requereu a expedição de salvo conduto com o intuito de que lhe fosse assegurada sua liberdade, pois é advogado, possui residência própria e contra si não há qualquer ação de interdição capaz de permitir fosse internado contra sua vontade (fls. 02/14).
Acolhendo o parecer do ilustre representante do Ministério Público (fls. 24/28), o d. magistrado a quo concedeu a ordem e expediu o salvo conduto ao paciente por entender ilegais as internações sofridas, ressaltando a ausência de interdição judicial que as justificassem. Neste sentido, concedeu o salvo-conduto no intuito de evitar eventual novo constrangimento a liberdade do interessado (fls. 32/34)
Nesta instância, a douta Procuradoria Geral de Justiça, por meio de seu ilustrado representante, Dr. MILTON RIQUELME DE MACEDO, manifestou-se pelo conhecimento e improvimento do recurso ex officio (fls. 68/71).
É o relatório. 3
Impõe-se a confirmação da decisão submetida a reexame obrigatório.
Mostram os autos que o réu é capaz, não havendo em seu desfavor processo de interdição, não existindo indício algum de que sofra transtorno mental que possibilite a internação em clínica psiquiátrica, sem seu consentimento, sendo, portanto, ilegal a restrição de sua liberdade.
Diante dos fatos apresentados, o interessado requereu a concessão do salvo-conduto a fim de evitar a concretização de nova ameaça ao direito de locomoção.
O d. magistrado a quo, concedeu o salvo-conduto e, consoante dispõe o art. 574, inc. I, do Código de Processo Penal, remeteu os autos a reexame necessário.
Em que pese a titularidade recursal ser do Ministério Público, ad cautelam, conheço do recurso, pois não houve revogação do inc. I, do art. 574, do Código de Processo Penal e, muito embora parcela da doutrina entenda desnecessário o recurso ex officio entendo que se trata de condição de eficácia da sentença e não um recurso propriamente dito.
Conforme escólio de Guilherme de Souza Nucci (Código de Processo Penal Comentado, 11ª ed., Ed. RT: São Paulo, 2012. p. 1016):
"na hipótese de decisão concessiva de habeas corpus, se não for interposto recurso voluntário, cabe o denominado recurso de ofício, obrigando o reexame da decisão por instância superior, conforme art. 574, I."
Neste sentido é o entendimento dos Tribunais de Justiça pátrios: 4
"REEXAME NECESSÁRIO Concessão em Primeira Instância de salvo conduto, em "habeas corpus" preventivo, a membros da Guarda Civil Municipal da Cidade de Monte Alto para portar arma de fogo também fora do horário de serviço - Entendimento jurisprudencial acerca da inconstitucionalidade o inciso IV do artigo 6º da Lei 10.826/03 Decisão mantida Recurso improvido." (TJSP. RO nº 6675-25.2012.8.26.0368. 2ª Câm. Direito Criminal. Rel. Des. Almeida Sampaio. Julgado em 06.05.2013) "RECURSO CRIME EX OFFICIO EM HABEAS CORPUS. DECISÃO SINGULAR QUE CONCEDE A ORDEM. ART. 574, INC. I, DO CPP. REJEIÇÃO DA TESE DE QUE O DISPOSITIVO LEGAL NÃO TERIA SIDO ACOLHIDO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. PRECEDENTES DO STF E DO STJ, NO SENTIDO DE QUE O DISPOSITIVO SUBSISTE NO ATUAL ORDENAMENTO JURÍDICO NACIONAL. MÉRITO. EXCESSO DE PRAZO NA APREENSÃO DE ADOLESCENTE, EM DELEGACIA DE POLÍCIA, ENQUANTO AGUARDA REMOÇÃO PARA ESTABELECIMENTO ADEQUADO. FALTA DE VAGAS NESTE ÚLTIMO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO ADEQUADAMENTE RECONHECIDO E AFASTADO PELO JUIZ A QUO. DECISÃO CONFIRMADA. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. "O recurso de ofício ou necessário é providência imposta por lei para o reexame das decisões judiciais previstas no art. 574, incs. I e II, do Código de Processo Penal, pelos órgãos jurisdicionais superiores, para que se aperfeiçoe o trânsito em julgado da sentença. 5
Inteligência da Súmula nº 423, da Suprema Corte: "Não transita em julgado a sentença por haver omitido o recurso ex officio, que se considera interposto ex lege." (STJ-5ª Turma, RHC 17.143/SC, Rel. Min. Laurita Vaz, julg. 28.11.2007) 2. "Na linha de precedentes do Pretório Excelso, o reexame necessário previsto no art. 574 do CPP não foi tacitamente revogado pelo art. 129, inciso I, da Constituição Federal, devendo o juiz de primeiro grau remeter a decisão que conceder habeas corpus à apreciação da instância superior." (STJ-5ª Turma, REsp. 760.221/PA, Rel. Min. Felix Fischer, julg. 15.12.2005) 3. (...)" (TJPR. RO em HC nº 463.171-2. Rel. Des. Lilian Romero. Julgado em 04.09.2008, grifei). No mérito, nego provimento ao recurso eis que a decisão não merece reparos, pois restou demonstrado que o paciente foi levado à força por ambulância da Prefeitura Municipal de Ibaiti e internado na Clínica Psiquiátrica de Londrina, por duas vezes, contra sua vontade e sem que houvesse qualquer elemento indicativo de insanidade, ou processo judicial de interdição contra si. Ressalte-se que a internação forçada não é medida usual, devendo ser utilizada somente em casos excepcionais e devidamente comprovada sua necessidade, através de autorização do poder judiciário. Neste sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: "Habeas Corpus. Internação involuntária em clínica psiquiátrica. Ato de particular. Ausência de provas e/ ou indícios de perturbação mental. Constrangimento ilegal delineado. Binômio poder-dever familiar. Dever de cuidado e 6
proteção. Limites. Extinção do poder familiar. Filha maior e civilmente capaz. Direitos de personalidade afetados. - É incabível a internação forçada de pessoa maior e capaz sem que haja justificativa proporcional e razoável para a constrição da paciente. - Ainda que se reconheça o legítimo dever de cuidado e proteção dos pais em relação aos filhos, a internação compulsória de filha maior e capaz, em clínica para tratamento psiquiátrico, sem que haja efetivamente diagnóstico nesse sentido, configura constrangimento ilegal. Ordem concedida." (STJ. HC nº 35.301/RJ. Terceira Turma. Rel. Min. Nancy Andrighi. DJe 03.08.2004).
Neste sentido, por haver manifesta violação de garantia de liberdade de locomoção, forçosa a manutenção da decisão combatida por seus próprios fundamentos.
Ante o exposto, ACORDAM os Desembargadores integrantes da PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ, por unanimidade de votos, em negar provimento ao Recurso ex officio, para manter a decisão de primeiro grau que concedeu o habeas corpus em grau de reexame.
Participaram do Julgamento o Desembargador Telmo Cherem e o Juiz Substituto 2º Grau Marcos S. Galliano Daros.
Curitiba, 06 de junho de 2013.
Macedo Pacheco Relator
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