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Acórdão
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Agravo de Instrumento nº 1043844-7 2ª. Vara Cível Paranavaí. Agravante: Construtora Monte Cristo Ltda. Agravados: Presidente da Comissão de Licitação do Município de Paranavaí e outro. Relator: Des. Luiz Mateus de Lima.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. ANULAÇÃO DO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO NO QUAL O AGRAVANTE RESTOU VENCEDOR SOB O ARGUMENTO DE NEPOTISMO. PLEITO DE CONCESSÃO DA LIMINAR PARA CONSIDERAR A AGRAVANTE VENCEDORA DO CERTAME EM COMENTO. EXISTÊNCIA DE PARENTESCO DE SEGUNDO GRAU ENTRE O SÓCIO ADMINISTRADOR DA EMPRESA RECORRENTE COM O AGENTE POLÍTICO LICITADOR. SÚMULA VINCULANTE 13 DO STF. APLICAÇÃO POR ANALOGIA DO §3º, ARTIGO 9º DA LEI Nº 8.666/93. FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA NÃO CONFIGURADOS. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E DESPROVIDO. Ainda que a Lei de Licitações não traga vedação expressa à participação de empresas em processo licitatório por existência de parentesco entre o sócio administrador da empresa e o agente político licitador, aplica-se de forma analógica a vedação de participação indireta prevista no §3º do artigo 9º da referida lei. Isto porque, tal vínculo possibilita eventual influência que venha a macular a igualdade entre os concorrentes e a lisura do certame. É inafastável que um dos sócios administradores da empresa é parente de segundo grau (tio/sobrinho) do Vice- Prefeito do Município agravado, situação que justifica a aplicação da Súmula Vinculante nº 13 do Supremo Tribunal Federal, porquanto o objetivo de referido entendimento jurisprudencial é a proteção da moralidade pública, princípio basilar regente da Administração Pública, resguardado pelo artigo 37 da Constituição Federal.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 1043844-7, da Comarca de Paranavaí, 2ª Vara Cível, em que figura como agravante Construtora Monte Cristo LTDA e agravado Presidente da Comissão de Licitação do Município de Paranavaí e outro. Construtora Monte Cristo promoveu agravo de instrumento em face de decisão que indeferiu pedido de concessão de liminar em mandado de segurança.
2 Alega: a) "o feito envolve mandado de segurança, impetrado em face do ato do Prefeito do Município de Paranavaí e do Presidente da Comissão de Licitação de Paranavaí, que impediu o Impetrante vencedor de licitação para obra de pavimentação no município, ou seja, apesar de ter ganho, a Construtora/Agravante não poderia implementar o contrato público (...) a lesão de direito é clara, foi publicada no Jornal da Cidade de Paranavaí a anulação e inclusive outra LICITAÇÃO e, substituição já foi marcada para o dia..., urge o deferimento do efeito ativo. A construtora está impedida de trabalhar por um suposto e impossível "nepotismo"; b) a súmula refere-se a funcionários na Administração Pública e não alcança licitação, descabendo interpretação extensiva; c) a agravante está impedida de trabalhar por uma interpretação anômala e ilegal da súmula 13 do STF, não se respeitou a personalidade jurídica de uma empresa, os Agravados estão dando caráter particular ao certame, como se JOSÉ MARIA fosse quem estivesse participando. O impedimento legal da MONTE CRISTO trabalhar viola a livre iniciativa, pessoa jurídica não pode ser considerada parente de ninguém, juridicamente é impossível misturar tais direitos de personalidade (....) NADA CONSTA NO EDITAL, ou seja, NÃO HÁ NADA CONTRA A AGRAVANTE que a impeça de realizar seu trabalho da forma como sempre realizou (...) não cabe no presente caso a afirmação de nepotismo, uma vez que fora observado todas as regras do edital, bem como fora realizada todas as etapas da licitação, sendo a Agravante vencedora de maneira justa. (...) o efeito
3 ativo é extremamente necessário, a Agravante não pode esperar o processamento do mandado de segurança, para só em sentença lograr liminar, já está marcada outra licitação, é um contrato de valor alto para a pequena MONTE CRISTO de Paranavaí, comprou equipamentos para poder ganhar a licitação, preparou sua empresa para se adequar as exigências, ganhou o certame e foi excluída ilegalmente, os prejuízo são grandes e vão aumentar mais ainda, inclusive colocando indevidamente outras empresas no nova e também ilegal licitação. (f.12/13). Assim, requer o deferimento de efeito ativo e provimento do recurso. Em decisão monocrática, o pedido de liminar foi indeferido às fls. 383/386. A Douta Procuradoria-Geral de Justiça emitiu parecer (fls. 410/416), subscrito pelo ilustre Procurador de Justiça, Dr. Isabel Cláudia Guerreiro, manifestando-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso. É o relatório.
II VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO.
Presentes os pressupostos recursais de admissibilidade, conheço do recurso de agravo de instrumento e lhe nego provimento.
4 A hipótese dos autos versa sobre o deferimento da liminar para que a agravante seja considerada vencedora da licitação nº 02/2013, a qual foi anulada em decorrência da existência de suposto nepotismo. Para o correto deslinde do feito, faz-se necessário apreciar se estão presentes os requisitos autorizadores do deferimento da liminar, quais sejam: fumus boni iuris e periculum in mora. A respeito de tais requisitos, leciona Humberto Theodoro Junior:
"(...) Incertezas ou imprecisões a respeito do direito material do requerente não podem assumir a força de impedir-lhe o acesso à tutela cautelar. Se, à primeira vista, conta a parte com a possibilidade de exercer o direito de ação e se o fato narrado, em tese, lhe assegura provimento de mérito favorável, presente se acha o fumus boni iuris, em grau suficiente para autorizar a proteção das medidas preventivas.(...) Para a obtenção da tutela cautelar, a parte deverá demonstrar fundado temor de que, enquanto aguardar a tutela definitiva, venham a faltar as circunstâncias de fato favoráveis à própria tutela. E isto pode ocorrer quando haja o risco de perecimento, destruição, desvio, deterioração, ou de qualquer mutação das pessoas, bens ou provas necessários para a perfeita e eficaz atuação do provimento final do processo principal.(...) Receio fundando é o que não decorre de simples estado de espírito do requerente, que não se limita à situação subjetiva de temor ou dúvida pessoal, mas se liga a uma situação objetiva, demonstrável através de algum fato concreto.
5 Perigo de dano próximo ou iminente é, por sua vez, o que se relaciona com uma lesão que provavelmente deva ocorrer ainda durante o curso do processo principal, isto é, antes da solução definitiva ou de mérito. Por fim, o dano temido, para justificar a proteção cautelar, há de ser a um só tempo grave e de difícil reparação, mesmo porque as duas idéias se interpenetram e se completam, posto que para ter-se como realmente grave uma lesão jurídica é preciso que seja irreparável sua conseqüência, ou pelo menos de difícil reparação. (...)". ("Curso de Direito Processual Civil" 36ª edição vol. II - p. 361/362).
Assim, o fumus boni iuris tem como fundamento a plausibilidade do direito invocado, o qual se afere por meio da análise do caso concreto (fato), tendo como base a prova já carreada. O periculum in mora, por sua vez, consiste em uma situação objetiva, demonstrável através de algum fato concreto ou da existência de uma lesão que provavelmente deva ocorrer ainda durante o curso do processo principal, de difícil reparação ou irreparável.
Nesta linha, observa-se que os requisitos necessários à concessão de liminar não se encontram presentes no contexto.
Isto porque, ainda que a Lei de Licitações não traga vedação expressa à participação de empresas em processo licitatório por existência de parentesco entre o sócio administrador da empresa e o agente político licitador, aplica-se de forma analógica a vedação de participação indireta prevista no §3º do artigo 9º da referida lei. Isto porque, tal vínculo possibilita eventual influência que venha a
6 macular a igualdade entre os concorrentes e a lisura do certame. No presente feito, é inafastável que um dos sócios administradores da empresa é parente de segundo grau (tio/sobrinho) do Vice-Prefeito do Município agravado, situação que justifica a aplicação da Súmula Vinculante 13 do Supremo Tribunal Federal, porquanto o objetivo de referido entendimento jurisprudencial é a proteção da moralidade pública, princípio basilar regente da administração pública, resguardado pelo artigo 37 da Constituição Federal. Nesta linha, há que prevalecer o interesse público de proteção aos Princípios da Moralidade, Legalidade e Impessoalidade sobre o interesse do particular em ser vencedor da licitação, com vistas a evitar futuras declarações de nulidade em virtude do parentesco existente. Nesse mesmo sentido, transcreve-se a decisão do Tribunal de Contas da União:
REPRESENTAÇÃO. DNIT/BA. CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE SUPERVISÃO DAS OBRAS DE IMPLANTAÇÃO DE CONTORNO FERROVIÁRIO DE SÃO FÉLIX/BA. CONHECIMENTO. IDENTIFICAÇAO DE RELAÇÃO DE PARENTESCO ENTRE GESTOR DO DNIT E SÓCIO DE EMPRESA INTEGRANTE DO CONSÓRCIO VENCEDOR DO CERTAME LICITATÓRIO. PROCEDÊNCIA. FIXAÇÃO DE PRAZO PARA ANULAÇÃO DO CERTAME LICITATÓRIO. AUDIÊNCIA DOS
7 GESTORES DO DNIT. DELIBERAÇÃO MANTIDA EM GRAU DE RECURSO. ANULAÇÃO DO CERTAME LICITATÓRIO. INSUFICIÊNCIA DAS RAZÕES DE JUSTIFICATIVA APRESENTADAS PELO DIRETOR DE INFRAESTRUTURA FERROVIÁRIA DO DNIT. REJEIÇÃO. APLICAÇÃO DE MULTA. ACOLHIMENTO DAS RAZÕES APRESENTADAS PELOS MEMBROS DA COMISSÃO DE LICITAÇÃO. NOTIFICAÇÃO DOS RESPONSÁVEIS (TCU Representação nº 020.787/2007-5 Acórdão nº 1.893/2010 Plenário/ Rel: Min. Walton Rodrigues)
Por fim, o argumento de que referida Súmula somente é aplicável aos casos de contratação de funcionários para administração é incipiente, considerando a amplitude que se busca na proteção dos Princípios Constitucionais, mormente porque relacionados à proteção do erário. Assim, a decisão agravada não se ressente de ilegalidade e deve ser mantida, pois não se observa a verossimilhança das alegações, eis que escorreita a aplicação da Súmula Vinculante n° 13 do STF ao contexto. Dessa forma, conheço do presente recurso de agravo de instrumento e no mérito lhe nego provimento.
8 III DECISÃO.
Diante do exposto, ACORDAM os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso de agravo de instrumento e lhe negar provimento, nos termos do voto.
Participaram do julgamento os Senhores Desembargadores Paulo Roberto Hapner (presidente, com voto) e Luiz Mateus de Lima e o Juiz Substituto em 2º Grau Edison de Oliveira Macedo Filho.
Curitiba, 20 de agosto de 2013.
LUIZ MATEUS DE LIMA Desembargador Relator
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