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Acórdão
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APELAÇÃO CÍVEL N.º 1094778-7, DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA, 7ª VARA CÍVEL APELANTE: UNIMED CURITIBA SOCIEDADE COOPERATIVA DE SERVIÇOS HOSPITALARES APELADO: OTAVIO ORSOLIN RELATOR: DES. JOSÉ ANICETO APELAÇÃO CÍVEL AÇÃO DE INDENIZAÇÃO C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER E REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS PLANO DE SAÚDE REQUERIMENTO DE RADIOTERAPIA POR FEIXE IMRT NEGATIVA DA UNIMED COM BASE NA AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL E NO ROL DA ANS IRRELEVANTE TRATAMENTO PREVISTO NO CONTRATO DE FORMA GERAL SEM PREVISÃO DE EXCLUSÃO DO TIPO DE RADIOTERPIA REQUERIDO CONTRATO DE ADESÃO APLICAÇÃO DO CDC CLÁUSULAS CONTRATUAIS LIMITATIVAS E RESTRITIVAS REDAÇÃO CLARA E EXPRESSA - INOCORRÊNCIA NO CASO CONCRETO RECURSO DESPROVIDO VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1094778-7, Do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, 7ª Vara Cível, em que é apelante UNIMED CURITIBA SOCIEDADE COOPERATIVA DE SERVIÇOS HOSPITALARES, e apelado OTAVIO ORSOLIN. 1. Relatório: Trata a espécie de recurso de apelação manejado por UNIMED CURITIBA SOCIEDADE COOPERATIVA DE SERVIÇOS HOSPITALARES, contra a r. sentença proferida em Ação Indenizatória cumulada com Obrigação de Fazer e Reparação por Danos Morais e Materiais, na qual o Dr. Juiz a quo julgou procedente o pedido inicial, confirmando a
liminar inicialmente concedida, determinando que a Ré/Apelante autorize a realização de todos os procedimentos necessários ao tratamento do Autor/Apelado, em especial da Radioterapia com Intensidade Modulada do feixe IMRT, nos termos da recomendação médica apresentada nos Autos, bem como condenando a Apelante no pagamento de reparação moral no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), valor devidamente acrescido de correção monetária (INPC/IGP/DI) a partir da data da sentença e de juros de mora de 1% ao mês desde a data do evento danoso, ou seja, da negativa, na forma da súmula 54 do Superior Tribunal de Justiça. Ainda, diante do princípio da sucumbência, ainda, condenou a Apelante no pagamento das custas e despesas processuais, bem como de honorários advocatícios devidos ao patrono da Apelada, que fixou em R$ 1.000,00 (um mil reais), com força no art. 20, § 4º do Código de Processo Civil. Alega a operadora de saúde Ré, ora Apelante, em síntese, a ausência de cobertura contratual da Radioterapia na sua forma requerida, qual seja com Intensidade Modulada de Feixe IMRT, defendendo que a não cobertura do referido procedimento pelo contrato em
discussão não é abusiva, ou indevida, haja vista que a Radioterapia requerida pelo segurado não encontra-se contemplada no Rol de procedimentos estabelecidos pela Agência Nacional de Saúde ANS. Defende em resumo que sendo que desta forma a apelante não se obriga a cobertura do procedimento pleiteado pelo apelado, justificando que não se encontra especificado na lei, bem como que o Código de Defesa do Consumidor não prevalece a Lei especifica que regulamente a matéria, Lei 9.658/98. Requer o provimento do presente recurso. Contrarrazões às fls. 165/178. É o relatório, em síntese. 2. Voto: Presentes os pressupostos recursais de admissibilidade intrínsecos (legitimidade, interesse, cabimento e inexistência de fato impeditivo e extintivo), e
extrínsecos (tempestividade e regularidade formal), conheço do recurso. Trata-se de ação de Ação de Indenização c/c Obrigação de Fazer e Reparação de Danos Materiais e Morais proposta por Unimed de Curitiba Sociedade Cooperativa de Serviços em face de Otávio Orsolin. Insurge-se a Ré, ora Apelante, em face da r. sentença, alegando que a demanda verifica-se improcedente ante a ausência de cobertura contratual para o tipo de procedimento solicitado pelo Apelado, bem como pela ausência de previsão deste procedimento no Rol da ANS. Todavia, tenho que razão não assiste razão, visto que se extrai claramente dos autos que o tratamento prescrito pelo médico assistente do Recorrido está absolutamente em conformidade com a obrigação contratada. A apelante insiste em alegar que o plano de saúde contratado se limita a oferta de serviços e procedimentos constantes do rol de procedimentos
instituídos pela ANS, suscitando previsão da Lei Regulamentadora dos Planos de Saúde, Lei 9656/98, e que não consta deste rol o procedimento de Radioterapia com Intensidade Modulada de Feixe IMRT, indicado ao segurado Apelado, por estes motivos requerendo a reforma do decisum proferido em primeiro grau para que seja a demanda julgada improcedente. Contudo, a apelante ignora completamente o fato de que o próprio contrato de plano de saúde firmado entre as partes prevê cobertura ao tratamento de Radioterapia, conforme se observa no capítulo II, seção I, art. 37, alínea "c", do regulamento (fls. 98) do plano, proposta de migração (fl. 35), conforme transcrição a seguir: "CAPÍTULO II DA SEGMENTAÇÃO HOSPITALAR SEM OBSTETRÍCIA SEÇÃO I DA COBERTURA ART. 37. Estão incluídos na cobertura os seguintes procedimentos considerados especiais, cuja necessidade esteja relacionada à continuidade da assistência prestada em nível de internação. (...)
c. radioterapia, incluindo radiomoldagem, radioimplantes e braquiterapia; (...)" Desta forma, de nada adianta que o mesmo regulamento disponha a previsão de cobertura contratada exclusivamente aos procedimentos constantes no rol de procedimentos editado pela ANS, na forma das Cláusulas 1, 2 e 32 daquele (fls. 90/97), aplicando-se o dispositivo mais favorável ao consumidor, na forma do art. 47, do CDC, ou seja, da Cláusula 37, "c", do referido regulamento. Logo, tem-se a ilegalidade da negativa da apelante, Unimed, que não quis custear o tratamento do apelado. É preciso observar que o objeto ou finalidade do contrato de prestação de serviços médicos é a saúde do consumidor. CLÁUDIA LIMA MARQUES sobre o assunto leciona: "Nesse sentido, a relação contratual básica do plano de saúde é uma obrigação de resultado, um
serviço que deve possuir a qualidade e a adequação imposta pela nova doutrina contratual. É obrigação de resultado porque o que se espera do segurador ou prestador é um "fato", um "ato" preciso, um prestar serviços médicos, um reembolsar quantias, um fornecer exames, alimentação, medicamentos, um resultado independente dos "esforços" (diligentes ou não) para obter os atos e fatos contratualmente esperados." (in Contratos no Código de Defesa do Consumidor, 4ª ed., RT, São Paulo: 2004, p. 414). Ressalvo a inconsistência da tese levantada pela Apelante em suas razões recursais quanto à inaplicabilidade das Normas Consumeristas ao caso em tela, apontando que a aplicação da legislação especifica que regulamenta a matéria se sobressai no caso em discussão, qual seja Lei 9.656/98. Isto porque, não obstante, o Código de Defesa do Consumidor somente ter vindo a ser publicado no ano de 1990, é certo que a proteção à massa consumerista data da promulgação da atual Constituição Federal, razão pela qual não se fala na inaplicabilidade da
Norma Consumerista nem mesmo aos contratos anteriores a sua vigência. Logo, os contratos de plano de saúde devem ser amparados pelo Código de Defesa do Consumidor, ainda quando celebrados anteriormente a sua vigência (11 de março de 1991), em face da hierarquia constitucional de garantia à defesa dos interesses dos consumidores. Nesse sentido, leciona Cláudia Lima Marques: "Ao garantir aos consumidores a sua defesa pelo Estado criou a Constituição uma autonomia necessária em relação a muitas de suas próprias normas, flexibilizando-as, impondo em última análise uma interpretação relativizada dos princípios em conflitos, que não mais podem ser interpretados de forma absoluta ou estaríamos ignorando o texto constitucional." (Contratos no Código de Defesa do Consumidor, 3ª edição, revista, atualizada e ampliada, 2ª tiragem, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 1999, p. 271)
Portanto não há como afastar a incidência das disposições nele previstas, ao contrário do que tenta convencer a Apelante. Neste interim, no que pertine ao art. 47 do CDC que edita que as cláusulas contratuais serão interpretadas de mais favorável ao consumidor, NELSON NERY JUNIOR, em sua obra "Código de Processo Civil Comentado", analisando o art. 47 do Código de Defesa do Consumidor ensina: "Aplica-se na espécie o principio constitucional da isonomia (CF art. 5º), devendo dar-se ao contrato de consumo interpretação mais favorável ao consumidor, para que se tenha por reequilibrada a relação jurídica de consumo". grifou-se Ainda, a Norma Consumerista em seu art. 54, §4°, conforme alega a própria apelante, preconiza que as cláusulas restritivas de direito do consumidor devem ser escrita de forma clara para melhor compreensão, conforme a seguir: "§.4°:As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com
destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão." Portanto, se o tratamento de Radioterapia com Intensidade Modulada de Feixe IMRT fosse excluída da cobertura oferecida pela ré, ora Apelante, na cláusula deveria constar expressa exclusão, pois se trata de limitação do direito do apelado. Ao contrário, a Cláusula 37, "c" do contrato apenas prevê a cobertura da Radioterapia, sem que haja restrição a este procedimento na forma como prescrita pelo médico assistente do segurado, ora Apelado, ou seja, com Intensidade Modulada de Feixe IMRT. Outrossim, mesmo não havendo previsão no Rol da ANS da cobertura de Radioterapia com Intensidade Modulada de Feixe IMRT, há que se ressaltar sua irrelevância ao presente caso, importando observar que nenhuma Resolução da ANS deve se sobrepor à lei, aplicação do Código de Defesa do Consumidor, que nesse caso se mostra bem clara, vedando cláusula abusiva ou restritiva do direito do consumidor.
Além do mais, deve-se destacar que sendo o contrato mais abrangente que a norma especial, não há dúvidas que se aplica o contrato. Desta forma, especificamente neste caso, tem entendido e julgado esta C. Corte: "APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. DIAGNÓSTICO DE ADENOCARCINOMA DE PRÓSTATA, GLEASON 7.NEGATIVA DE COBERTURA DE TRATAMENTO DE RADIOTERAPIA DE INTENSIDADE MODULADA TRIDIMENSIONAL (IMRT - 3D) POR AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL E POR SER EM CLÍNICA NÃO CREDENCIADA. SENTENÇA JULGANDO PROCEDENTE O PEDIDO DE REEMBOLSO DAS DESPESAS COM O TRATAMENTO. PREVISÃO CONTRATUAL DE COBERTURA PARA RADIOTERAPIA. CLÁUSULA QUE DEVE SER INTERPRETADA DA MANEIRA MAIS BENÉFICA AO CONSUMIDOR. ART. 47 CDC. CONTRATO ANTIGO, CUJA
IMPRECISÃO E DESATUALIZAÇÃO DOS TERMOS E PROCEDIMENTOS NÃO PODEM SER IMPUTADOS AO CONSUMIDOR. ESCOLHA DO TRATAMENTO MAIS EFICAZ QUE É PAPEL DO MÉDICO, E NÃO DA OPERADORA DE SAÚDE.INAPLICABILIDADE DA LEI 9656/98 QUE NÃO EXCLUI A APLICAÇÃO DO CDC. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE QUE O CONSUMIDOR FOI INFORMADO CORRETAMENTE ACERCA DA EXISTÊNCIA DE ESTABELECIMENTO CONVENIADO APTO A REALIZAR O TRATAMENTO RADIOTERÁPICO REQUERIDO. VIOLAÇÃO AO DEVER DE INFORMAÇÃO. ART. 6º, III DO CDC.RECURSO DESPROVIDO." (TJPR, Acórdão 35205, AC 0860771-8, 8ª Câmara Cível, Rel. Des. Jorge de Oliveira Vargas, 10/10/2012) (grifou-se) "OBRIGAÇÃO DE FAZER - APELAÇÃO CÍVEL RELAÇÃO DE CONSUMO - APLICAÇÃO DO CDC (SÚMULA 469, DO STJ) - PLANO DE SAÚDE - NEGATIVA DE
LIBERAÇÃO DE PROCEDIMENTO DE RADIOTERAPIA IMRT (INTENSITY MODULATED RADIOTHERAPY) PROCEDIMENTO NÃO EXCLUÍDO, EXPRESSAMENTE, DO PLANO DE SAÚDE RECUSA INJUSTIFICADA DA SEGURADORA PRÁTICA ABUSIVA PROCEDIMENTO INDICADO POR PROFISSIONAL MÉDICO RESPONSÁVEL COBERTURA DEVIDA PACIENTE PORTADOR DE CÂNCER DE PRÓSTATA REALIZAÇÃO DA RADIOTERAPIA DE INTENSIDADE MODULADA TRIDIMENSIONAL EM CLÍNICA NÃO CREDENCIADA OPERADORA DO PLANO DE SAÚDE QUE NÃO COMPROVOU A EXISTÊNCIA DE CLÍNICA CREDENCIADA PARA A REALIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO CARÁTER EMERGENCIAL EVIDENCIADO DEVER DA SEGURADORA CUSTEAR O TRATAMENTO SENTENÇA MANTIDA RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO." (TJPR, Acórdão 30501, AC 0793764-2, 9ª Câmara Cível, Rel. Des. Francisco Luiz
Macedo Junior, DJ 17/01/2012) (grifou- se) Por conseguinte, averigua-se que inconsistente a alegação da apelante neste sentido, fazendo improcedente de forma a examinar-se acertada a sentença guerreada. Consigna-se, ainda, que a mera negativa da apelante a cobertura do tratamento expressamente previsto no contrato e prescrito pelo médico assistente do segurado, ora Apelado, é suficiente para se presumir o abalo psicológico e agravamento do quadro do paciente, tratando-se de uma enfermidade que se agrava progressivamente em curto período de tempo. Desta forma, verifica-se que se o contrato cobre o tratamento de forma generalizada, e sem prever clara e expressamente a restrição e exclusão ao procedimento necessário ao tratamento da enfermidade do apelado não há motivo legal ensejador ao descumprimento judicial, e embora o inadimplemento contratual não configure conduta ilícita que gere a responsabilidade civil, examina-se que no caso em apreço particularmente verifica-se a ilicitude e o dano.
Quanto aos danos morais, para MARIA HELENA DINIZ, in "Teoria Geral do Direito Civil", Saraiva, 7ªed., pág.276: "Ato ilícito (CC, art.159) é o praticado em desacordo com a ordem jurídica, violando direito subjetivo individual". Com relação à prova dos danos morais causados, o entendimento da doutrina e jurisprudência caminha no seguinte sentido: "DANO MORAL - PROVA - Não há que se falar em prova do dano moral, mas, sim, na prova do fato que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos íntimos que o ensejam. Provado assim o fato, impõe- se a condenação sob pena de violação ao art. 334 do CPC."(STJ - Resp 86.271- SP - 3a T - Rel. Min. C. ª Menezes Direito - DJU 09.12.97) grifou-se
Cumpre consignar, que o entendimento é de que o simples fato de inadimplemento contratual não gera o dever de indenizar. No entanto, também é pacifico o entendimento jurisprudencial de que em se tratando de plano de saúde e havendo o risco inerente à saúde e a própria vida, a simples negativa é suficiente para configurar o abalo moral, entendendo-se que o descumprimento contratual neste aspecto só agrava, ainda mais as condições psíquicas do segurado. Conclui-se, por todos os fundamentos expostos, que não só se entende pela previsão de cobertura no contrato em questão para o procedimento indicado ao Apelado, como que neste caso existe dever de indenizar os danos morais alegados, não assistindo razão a pretensão de improcedência da demanda apresentada pela seguradora Recorrente. Deste modo tem entendido o Superior Tribunal de Justiça, veja-se: "Conforme precedentes da 3ª Turma do STJ, a recusa indevida à cobertura
pleiteada pelo segurado é causa de danos morais, pois agrava a sua situação de aflição psicológica e de angústia no espírito. Recurso especial conhecido e provido" (REsp nº 657.717 - RJ 2004/0064303-4, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 25.11.05)grifou-se "Agravo Regimental. Recurso Especial não admitido. Seguro Saúde. Recusa em custear tratamento de segurado regularmente contratado. Suspeita de câncer. Dano moral. A recusa em arcar com os encargos do tratamento da agravada, com suspeita de câncer, já definida nas instâncias ordinárias como indenizável por danos morais, constitui fato relevante, principalmente por ocorrer no momento em que a segurada necessitava do devido respaldo econômico e de tranqüilidade para realização de cirurgia e posterior recuperação" (STJ - AgRg no agravo de instrumento nº 520.390-RJ 2003/0077276-2) grifou-se.
Destarte, voto no sentido de negar provimento ao presente recurso de apelação. 3. ACORDAM os Desembargadores integrantes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso de apelação, nos termos do voto do Desembargador Relator. Participaram do julgamento os Senhores Desembargadores FRANCISCO LUIZ MACEDO JUNIOR e D'ARTAGNAN SERPA SÁ. Curitiba, 31 de outubro de 2013. DES. JOSÉ ANICETO Relator
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