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Acórdão
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.055.184-7 DA 1ª VARA CÍVEL DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA. APELANTE 1: CLARO S/A APELANTE 2: BRUNA FERREIRA DA ROCHA APELADOS: OS MESMOS RELATOR: DES. ARQUELAU ARAUJO RIBAS APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. CONTRATAÇÃO FRAUDULENTA DE LINHAS TELEFÔNICAS NO NOME DA AUTORA. INSCRIÇÃO INDEVIDA. TENTATIVAS DE SOLUÇÃO ADMINISTRATIVA DO EQUÍVOCO. INÉRCIA. CONDUTA DESIDIOSA E ATENTATÓRIA À DIGNIDADE DO CONSUMIDOR. ATO ILÍCITO CONFIGURADO. DEVER DE INDENIZAR PRESENTE. "QUANTUM" INDENIZATÓRIO. MAJORAÇÃO. MEDIDA QUE SE IMPÕE. "VIA CRUCIS" DEMONSTRADA. PROTOCOLOS DE ATENDIMENTOS. VÁRIAS LIGAÇÕES. DETERMINAÇÃO PARA QUE AUTORA ENCAMINHASSE CORRESPONDÊNCIA COM PEDIDO DE BAIXA. INÉRCIA POR PARTE DA OPERADORA. DESVIO PRODUTIVO DO TEMPO. PERDA DO USO DO TEMPO LIVRE DO CONSUMIDOR. CAUSA DE MAJORAÇÃO DA INDENIZAÇÃO. APELAÇÃO 1 DESPROVIDA. APELAÇÃO 2 PROVIDA. VISTOS, relatados e discutidos, estes autos de apelação cível nº 1.055.184-7 da 1ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, em que figura como apelante 1 CLARO S/A, apelante 2 BRUNA FERREIRA DA ROCHA e apelados OS MESMOS. RELATÓRIO 1. Cuidam-se de recursos de apelação interpostos em face da decisão de primeiro grau que julgou procedentes os pedidos para reconhecer a inexigibilidade do débito, condenando a requerida no pagamento de indenização por danos morais arbitrados em R$ 10.000,00 (dez mil reais), corrigidos pelo INPC e acrescido de juros de mora arbitrados em 1% (um por cento) ao mês, contados a partir da data da prolação da sentença; custas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação. (fls. 100/103)
1.1. Aduz, resumidamente, a apelante, que sempre toma todas as medidas ao seu alcance para evitar que haja fraude, pois é, de fato, a principal vítima no caso de contratações fraudulentas; que é a maior prejudicada, visto que presta serviços sem receber a contraprestação; o "quantum" indenizatório está exacerbado. (fls. 106/111) 1.2. A autora pretende a majoração dos danos morais. (fls. 116/125) É o relatório. FUNDAMENTOS DE FATO E DE DIREITO BREVE RELATO DOS FATOS 2. Com a exordial os fatos foram assim descritos: "Ao tentar efetivar uma compra a crédito, a autora foi verdadeiramente surpreendida pela notícia de que a venda não poderia ser liberada pelo motivo de que seu nome estava incluso nos cadastros de inadimplentes da SERASA, fato este que lhe causou vexame e vergonha incalculável. Sendo assim, ao retirar a certidão expedida pela SERASA, a autora finalmente descobriu que foi a Operadora Claro que incluiu seu nome nos cadastros de maus pagadores, em face de um suposto débito no valor de R$ 798,63 (doc. anexo).
Ocorre que a autora nunca efetivou qualquer contrato com a ré que justificasse a emissão da referida dívida, sendo que, ao entrar em contato com a requerida, a requerente, foi surpreendentemente informada de que tal débito originou-se de uma suposta linha telefônica que foi aberta na cidade de Londrina PR (cidade nunca residida pela autora) e se, caso a requerente quisesse que seu CPF fosse excluído da SERASA, teria que, obrigatoriamente, arcar com o valor de R$ 798,63 cobrado pela ré. A autora, estando logicamente indignada pela situação absurda imposta pela ré, realizou inúmeras reclamações, pedidos e protocolos, até que, finalmente, a requerida orientou a consumidora a, então, protocolar uma carta de solicitação de baixa de restrição perante uma das lojas da Operadora Claro, procedimento este, que foi rigorosamente realizado pela autora (doc. anexo), sem, porém obter qualquer sucesso, haja vista que, conforme extratos em anexo, o nome da requerente, ainda permanecia incluído nos cadastros de maus pagadores da SERASA (doc. anexo). A requerente, estando totalmente inconformada com o descaso perpetrado pela ré, resolveu, então, registrar um Boletim de Ocorrência sobre o ocorrido (doc. anexo), isso tudo, na esperança de que a Operadora Claro tomasse alguma providência em relação aos danos que a autora vinha sofrendo. Entretanto, tal medida não foi suficiente para que a ré realizasse a baixa da restrição, sendo que, em que pesassem os vários contatos, pedidos e protocolos realizados pela autora ao longo desses anos, o CPF da consumidora
permanece incluso nos cadastros de inadimplentes desde 26.10.2007 (doc. anexo). (fls. 03/04) APELAÇÃO 3. Compulsando os autos, em análise das razões esposadas no recurso em apreço, confrontadas com o conjunto probatório produzido no presente caderno, verifica-se que não assiste razão à operadora de telefonia, senão vejamos: 3.1. Aduz a apelante, que se cerca de todos os cuidados no intuito de evitar fraudes, contudo, o alegado zelo não foi suficiente para evitar que uma linha telefônica fosse instalada no nome da autora, sem que esta sequer tivesse conhecimento, resultando inclusive na inscrição do seu nome no rol dos inadimplentes. (fatos incontroversos) 3.2. Anote-se que os contratos, objetos da questão posta, não foi trazido à colação pela requerida que, diga-se, não trouxe nenhum documento a corroborar sua versão, quedando- se no campo estéril das meras alegações. 3.3. Vem daí que o ato ilícito, negado pela requerida, reside justamente na contratação em nome da autora, com pessoa diversa, evidenciando-se a falha na
prestação do serviço, ensejador de reparação por responsabilidade civil. 3.4. Não bastasse tal alegação, a requerida ainda afirma que inexiste conduta capaz de ensejar reparação por danos morais, contudo, a autora descreveu sua "via crucis", que já dura anos, pois a inscrição ocorreu em 26.10.2007 (fls. 28). 3.5. Note-se que a autora afirma ter, em atendimento às determinações da requerida, com vários protocolos, enviado carta de solicitação de baixa da restrição, sem que lograsse êxito em resolver a questão administrativamente, o que não foi em momento algum impugnado pela requerida. 3.6. Mesmo assim, nada foi feito pela requerida para solucionar o problema, permanecendo seu nome incluso no rol dos inadimplentes durante anos, como dito alhures. 3.7. Ora, a requerida, mesmo em juízo, não envidou nenhum esforço no sentido de identificar as razões da sua conduta, dos motivos de nada fazer para dar solução a questão, não impugnando em nenhum momento os fatos postos em discussão.
3.8. Ao contrário, a requerida, além de causar todos os transtornos descritos na inicial (em nenhum momento impugnados), de inscrever indevidamente o nome da autora no rol de inadimplentes e só retirá-lo mediante determinação judicial. 3.9. Assim, é de se negar provimento ao recurso da requerida, passando-se à análise do "quantum" indenizatório. DO QUANTUM INDENIZATÓRIO 4. No que pertine ao "quantum" indenizatório, enquanto a requerida pretende sua redução, a autora recorreu, pleiteando seja majorado. 4.1. Em análise pormenorizada da situação fática que permeia o caso dos autos, verifica-se que a assiste razão a autora, na medida em que, o valor fixado em primeiro grau, não é suficiente para compensar os tormentos causados, nem sequer atender ao caráter punitivo da compensação e, também, compensar o desperdício do tempo, bem jurídico que deve também ser tutelado em casos como o em tela. 4.2. Como restou bastante claro na exordial que, diga-se, a requerida sequer se deu ao trabalho de impugnar, vez que sua peça de defesa parece cópia genérica para qualquer
caso que guarde alguma semelhança com o caso em tela. A autora durante dias pleiteava, mais do que isso, suplicava por uma solução para seu problema que, inegavelmente, foi causado pela falta de critério, de cuidado na contratação das suas linhas telefônicas, mas, principalmente, pela desídia com que atendeu as súplicas da sua consumidora. 4.3. Ora, já não é novidade para ninguém, a forma como os sistemas de telemarketing das operadoras de telefonia tratam seus consumidores, a dificuldade para lograr êxito em falar com uma operadora (telefonista), o tempo que se desperdiça com mensagens pré-gravadas, que direcionam o consumidor para as mais variadas operações, sempre no intuito desvelado de desestimular os pleitos e reclamações. 4.4. Pois bem, no caso da autora, além dos vários protocolos que afirma ter feito (sem impugnação), que indicam as muitas tentativas de solução, ainda lhe foi determinado que encaminhasse correspondência com solicitação de baixa, o que jamais lhe foi respondido. 4.5. Vem daí que, se foi solicitado da autora, envio de correspondência com pedido de baixa, nada mais natural do que, já em juízo, para demonstrar a lisura de conduta, deveria a requerida ter então colacionado ao menos os protocolos feitos
pela autora; contudo, além de não fazê-lo, sequer nega sua existência, limitando-se a alegar que age sempre com zelo no intuito de evitar prejuízos ao consumidor. 4.6. Explica-se: a requerida apresentou defesa genérica, que não se refere necessariamente ao caso da autora, o qual possui peculiaridades próprias, as quais não foram sequer avençadas. O recurso de apelação, da mesma forma, é tão genérico quanto e, para piorar, é raso e não trata de explicar as razões de seu agir, o que por si só, já demonstra-se suficiente para majorar o "quantum" indenizatório fixado em primeiro grau em R$ 10.000,00 (dez mil reais). 4.7. Outro fato que deve ser considerado para a majoração do valor da indenização, é o desperdício do tempo do consumidor, bem jurídico que passou a ser tutelado recentemente pelos nossos Areópagos, senão vejamos, a lição de Pablo Stolze sobre o tema: "Em perspectiva "estática", o tempo é um valor, um relevante bem, passível de proteção jurídica. Durante anos, a doutrina, especialmente aquela dedicada ao estudo da responsabilidade civil, não cuidou de perceber a importância do tempo como um bem jurídico merecedor de indiscutível tutela.
Sucede que, nos últimos anos, este panorama tem se modificado. As exigências da contemporaneidade têm nos defrontado com situações de agressão inequívoca à livre disposição e uso do nosso tempo livre, em favor do interesse econômico ou da mera conveniência negocial de um terceiro. E parece que, finalmente, a doutrina percebeu isso, especialmente no âmbito do Direito do Consumidor. (disponível: http://jus.com.br/revista/texto/23925/responsabilidade-
civil-pela-perda-do-tempo)
4.8. Do referido texto ainda se extraem as lições de Marcos Dessaune: "Mesmo que o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8,078/1990) preconize que os produtos e serviços colocados no mercado de consumo devam ter padrões adequados de qualidade, de segurança, de durabilidade e de desempenho para que sejam úteis e não causem riscos ou danos ao consumidor e também proíba, por outro lado, quaisquer práticas abusivas, ainda são `normais' em nosso País situações nocivas como: - Enfrentar uma fila demorada na agencia bancária em que, dos 10 guichês existentes, só há dois ou três abertos para atendimento ao público; - Ter que retornar à loja (quando ao se é direcionado à assistência técnica autorizada ou ao fabricante) para
reclamar de um produto eletroeletrônico que já apresenta problema alguns dias ou semanas depois de comprado; (...) - Telefonar insistentemente para o Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) de uma empresa, contando a mesma história várias vezes, para tentar cancelar um serviço indesejado ou uma cobrança indevida, ou mesmo pra pedir novas providências acerca de um produto ou serviço defeituoso renitente, mas repetidamente negligenciado; (...) - Levar repetidas vezes à oficina, por causa de um vício reincidente, um veículo que frequentemente sai de lá não só com o problema original intacto, mas também com outro problema que não existia antes; - Ter a obrigação de chegar com a devida antecedência ao aeroporto e depois descobrir que precisará ficar uma, duas, três, quatro horas aguardando desconfortavelmente pelo voo que está atrasado, algumas vezes até dentro do avião cansado, com calor e com fome sem obter da empresa responsável informações precisas sobre o problema, tampouco a assistência material que a ela compete." (DESSAUNE, Marcos. Desvio Produtivo do Consumidor O Prejuízo do Tempo Desperdiçado. São Paulo: RT, 2011, págs. 47-48.) idem. 4.9. Como se observa, a doutrina já se debruça em esmiuçar situações, em que não só a falha na prestação regular do serviço que resulta em inscrição indevida, mas o "modus operandi" das concessionárias de serviços de telefonia e seus
afamados sistemas de telemarketing, que resultam em horas desperdiçadas, devem ser considerados na fixação do valor da indenização por danos morais. 4.10. Assim, considerando as peculiaridades do caso concreto, no intuito de atender ao caráter punitivo/compensatório da condenação, assim como, aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, é de se majorar o valor da indenização para R$ 30.000,00 (trinta mil reais), que deverão ser corrigidos pelo INPC e acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, desde esta data, entendimento no sentido do qual, este relator vem reiteradamente julgando, vez que, assim como na correção monetária, não há falar em mora do devedor antes do arbitramento do valor da indenização. 5. Quanto à majoração da verba honorária, não assiste razão à autora, na medida em que já fixada em 15% (quinze por cento), ou seja, acima do mínimo legal, sendo que inexiste justificativa para sua fixação em grau máximo, considerando a inexistência de dilação probatório, a pouca complexidade da causa, o tempo, lugar e qualidade dos serviços, tudo nos termos do artigo 20º, §3º do CPC.
6. Diante do exposto, é de se negar provimento ao recurso de apelação 1 e dar provimento ao recurso 2 para majorar o valor da indenização por danos morais.
DECISÃO: ACORDAM os integrantes da 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos em negar provimento ao recurso de apelação 1 e dar provimento ao recurso 2, nos termos do voto relatado. Participaram do Julgamento: Des. Luiz Lopes (Presidente com voto) e Juíza Substituta em 2º Grau Elizabeth de F. N. Calmon de Passos. Curitiba, 07 de novembro de 2.013. ARQUELAU ARAUJO RIBAS Desembargador Relator
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