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Apelação Cível nº 750.381-9, de Laranjeiras do Sul, Vara Cível e Anexos. Apelante (1): Tractebel Energia S/A. Apelante (2): Município de Rio Bonito do Iguaçu. Apelados: Os mesmos. Interessada: União Federal. Relator: Des. Luiz Mateus de Lima. Revisor: Des. Adalberto Xisto Pereira. APELAÇÃO CÍVEL 1. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL. PLEITO DE RECOMPOSIÇÃO DA MATA CILIAR NO ENTORNO DO RESERVATÓRIO DE SALTO SANTIAGO. PRELIMINARES DE IMPOSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER EM PERDAS E DANOS, DE PAGAMENTO DE VALOR AO APELADO E DE ILEGITIMIDADE DE PARTE AFASTADAS. DESNECESSIDADE DE FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO COM A UNIÃO. OCORRÊNCIA DE JULGAMENTO ULTRA PETITA. DESNECESSIDADE DE ANULAÇÃO DA SENTENÇA. ADEQUAÇÃO AO PEDIDO FORMULADO. RECURSO PROVIDO NESTE TÓPICO. ADEQUAÇÃO DA ÁREA DE RECOMPOSIÇÃO AO ART. 62 DA LEI FEDERAL Nº 12.651/12 (LEI FLORESTAL). MITIGAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROTEÇÃO AO DIREITO ADQUIRIDO, DO ATO JURÍDICO PERFEITO E DA COISA JULGADA EM MATÉRIA DE MEIO AMBIENTE. POSSIBILIDADE DE REVISÃO DAS LICENÇAS AMBIENTAIS. ADEQUAÇÃO À LEGISLAÇÃO VIGENTE. DANO PRESUMIDO. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO À PROPRIEDADE DE TERCEIROS. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARCIALMENTE. (MAIORIA) Não há impossibilidade na conversão da obrigação de fazer em perdas e danos, vez que não sendo efetivada a recomposição do dano ambiental, objetivo maior a ser alcançado com a ação civil pública, que ao menos seja viável a execução das obras de reflorestamento por meio de recursos financeiros. A pretensão inicial tem por objetivo o reflorestamento, sendo que o pedido de entrega de recursos apenas tem a finalidade de viabilizar a execução da obra, não se tratando de pedido indenizatório, como quer fazer crer o apelante, mas de obrigação de fazer, destinando-se o aporte financeiro à execução da obra. Afigura-se a apelante (1) parte legítima na demanda, vez que usufruiu de atividade que implicou em danos ao meio ambiente, sendo o seu dever repará-los. Ainda que caiba a todos os entes federados adotar medidas para a preservação do meio ambiente, há que se considerar que a matéria discutida nos autos não versa sobre o contrato de concessão de energia elétrica firmado com a União, mas sim sobre os danos ambientais causados em virtude da formação do reservatório da Hidrelétrica de Salto Santiago, sendo que o desmatamento para a formação do reservatório se deu por culpa da empresa apelante, razão pela qual lhe cabe a recomposição dos danos. Ante a ocorrência de julgamento ultra petita é perfeitamente possível que seja feita uma adequação entre o pedido formulado e o proferido na sentença monocrática, a fim de adequar-se aos limites exatos do que fora postulado na inicial, não sendo necessária a anulação da decisão proferida. Por mais que o artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal garanta que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, tal princípio deve ser ponderado, ainda mais em relação a questões de interesse público, inclusive as relativas ao meio ambiente ecologicamente equilibrado a que todos têm direito. As licenças inicialmente conferidas, por se tratarem de atos não definitivos, conferem ao poder público à possibilidade de revisão quando presentes indícios de danos ou ameaça de danos ao meio ambiente, como é o caso dos autos. O simples fato de não ter havido reflorestamento em área de preservação permanente, aliada a questão da área atingida e da atividade instalada (área do reservatório da hidrelétrica localizada no município apelado) ser de grande extensão e de alto potencial lesivo ao meio ambiente, não há falar em necessidade de perícia, vez que o dano é presumido. Para que o direito de propriedade de terceiros não seja violado caberá à apelante, quando da elaboração de seu projeto de reflorestamento, arrolar tais propriedades, suas áreas e a porção que deverá ser recomposta, sendo que a efetivação de tais atividades ficará a cargo do juízo de primeiro grau, cabendo a ele dispor sobre a forma como as atividades serão realizadas. Com o advento da Lei Federal nº 12.651/2012 (Lei Florestal), a qual entrou em vigor em maio de 2012, restou alterada a Lei nº 6.938/81, bem como revogadas a Lei nº 4771/65 (antigo Código Florestal) e a Medida Provisória nº 2166-67/2001. Motivo pelo qual não caberá mais à apelante recompor a área devastada nos moldes fixados na sentença, ou seja, na faixa de 100 (cem) metros no entorno na área do reservatório localizado nas delimitações do município apelado. Merece provimento parcial o presente recurso, a fim de que a recomposição dos danos se dê na área de preservação permanente relativa à distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum (art. 62, da Lei nº 12.651/12), no entorno do reservatório Salto Santiago, restringindo-se, apenas, aos limites do município apelado e não a toda a extensão do reservatório, dentro de um prazo de 12 (doze) meses, prazo dilatado de ofício, tempo que se mostra suficiente para a implementação de projetos de reflorestamento, vez que o prazo de 60 (sessenta) dias fixado em sentença mostra- se por demais exíguo. APELAÇÃO CÍVEL 2 E AGRAVO RETIDO. PRETENSÃO DE FIXAÇÃO DE VERBA HONORÁRIA COM BASE EM VALOR ENTENDIDO COMO CORRETO PARA A CAUSA. IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA. VALOR ATRIBUÍDO À DEMANDA JÁ DECIDIDO EM SEDE DE AGRAVO INTERPOSTO EM IMPUGNAÇÃO. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. IMPOSSIBILIDADE DE REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA. OBSERVÂNCIA AOS PARÂMETROS DA EQUIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE RESISTÊNCIA INJUSTIFICADA PARA O CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DA TUTELA PRETENDIDA. RECURSO DE AGRAVO RETIDO CONHECIDO E DESPROVIDO. APELO CONHECIDO E PROVIDO PARCIALMENTE. (MAIORIA) Tendo em vista que a questão referente ao valor atribuído à causa já havia sido decidida em sede de agravo, não cabe mais discussão a respeito da matéria, tendo em vista a ocorrência de preclusão consumativa, perecendo, assim, o direito do ente municipal de se insurgir contra questão já analisada. O valor dos honorários advocatícios arbitrados mostra-se desproporcional em relação ao alto valor atribuído a causa, bem como no tocante a sua natureza e importância, ainda que não tenha havido maiores intervenções no feito. Tal valor, também não remunera dignamente o ilustre trabalho prestado pelo Procurador do apelante, ainda mais se levado em conta a complexidade da matéria discutida e a repercussão ensejada, bem como o tempo decorrido para o deslinde do feito. Razão pela qual, entendo pela sua majoração. Ao contrário do entendimento do apelante, a pena de multa diária por descumprimento da obrigação, com a conversão em perdas e danos serve como instrumento de coação para o cumprimento da obrigação de fazer. Ademais, não existem provas constantes dos autos que indiquem que a empresa deixará de cumprir o determinado em sentença ou que tenha oferecido resistência para o cumprimento da obrigação, não havendo justificativa, portanto, para que seja deferida a tutela nos moldes postulados pelo ente municipal. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 750.381-9, de Laranjeiras do Sul, Vara Cível e Anexos, em que é apelante Tractebel Energia S/A., apelado Município de Rio Bonito do Iguaçu e interessada União Federal. Município de Rio Bonito do Iguaçu ajuizou Ação Civil Pública Ambiental em face de Tractebel Energia S/A., alegando, em síntese, que: (a) a ré foi responsável pela formação do Reservatório de Hidrelétricas de Salto Osório e Salto Santiago, sendo que as águas atingiram áreas de influência do município (2.036,43 hectares de terras); (b) a inundação das represas atingiu terras férteis e habitações, havendo submersão de leitos de estradas e pontes,
desaparecimento de fundos de vales e matas ciliares, bem como prejuízo na circulação de veículos, sendo que a empresa ré deixou dolosamente de replantar as matas ciliares na extensão do perímetro da barragem; (c) foram expedidas pelo Instituto Ambiental do Paraná em favor da ré duas licenças (nºs 04952 e 08315) em 21/12/2003; (d) a Resolução 302/02 do Conama prevê a restauração das margens com 100 (cem) m de matas ciliares, sendo que "A simples implantação de uma barragem impõe compulsoriamente o plantio de matas ciliares em toda a extensão da represa, no perímetro de sua margem, com largura de 100 metros." (fl. 09); (e) o artigo 2º do Código Florestal define como sendo de preservação permanente as florestas e demais formas de vegetação situadas ao redor dos reservatórios artificiais; (f) há necessidade de reflorestar toda a extensão da represa como exigido pelo Código Florestal e pela Resolução do Conama nº 303/2002, sendo independente de ter havido ou não florestas; (g) pouco importa a obtenção de licenciamentos provisórios ou definitivos, vez que se a atividade das hidrelétricas estiver em desacordo com as normas ambientais tal fato não gera o direito de permanecer degradando o ambiente; (h) não há notícias de que a ré tenha obedecido o decreto nº 97.632/89 o qual prevê a recuperação de áreas degradadas, o qual deve ser apresentado na mesma ocasião que o EPIA (Estudo Prévio de Impacto Ambiental); (i) a transformação da obrigação de fazer em indenização é de rigor diante da conduta ilegal e omissiva da ré. Assim, postulou pela concessão de liminar para que fossem suspensas as licenças ambientais concedidas à ré em relação à Hidrelétrica Salto Osório para que fosse
implantado o reflorestamento, bem como a entrega de recursos ao Município para que este pudesse instalar os trabalhos de reflorestamento, sob fixação de multa diária. Ao final, requereu pela procedência da ação. A liminar postulada foi indeferida (fls. 197/201). A contestação e documentos de fls. 209/525 foram desentranhados em razão da intempestividade. Foi oferecida manifestação (fls. 742/805). Sobreveio a r. sentença (fls. 1059/1067), tendo a Doutora Juíza julgado parcialmente procedente a ação "(...) para o fim de condenar a requerida na obrigação de recompor a mata ciliar em toda a extensão da represa, no perímetro de sua margem, com largura de 100 metros, nos termos da fundamentação sentencial, dentro do prazo de 60 dias, prazo este necessário para a implementação de projetos de reflorestamento, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 por dia de descumprimento da ordem e conversão da obrigação em perdas e danos. Por conseqüência, julgo extinto o presente feito, com fulcro no artigo 269, I, do CPC." (fl. 1067) Fundamentou sua decisão nos seguintes termos: (a) entendeu pelo julgamento antecipado da lide; (b) afastou as preliminares de impossibilidade jurídica do pedido, de impossibilidade de pagamento de indenização diretamente ao autor e de existência de decisão administrativa sobre o processo de reflorestamento, vez que caso não haja reposição da mata ciliar a requerida deverá promover a reparação do dano; (c) afastou a inépcia da inicial; (d) a lei permite o pedido subsidiário de conversão em perdas e danos caso seja
impossível o cumprimento de obrigação específica; (e) não há qualquer ilegalidade no fato de o valor ser pago diretamente ao município; (f) é irrelevante o fato de haver decisão administrativa de reflorestamento ambiental; (g) é desnecessária a denunciação da lide, ante a competência concorrente dos entes federados na preservação do meio ambiente; (h) não há necessidade de inclusão do IAP no pólo passivo da demanda, vez que referido órgão limitou a conceder as licenças; (i) não houve prescrição, pois o dever de indenizar dano ambiental é direito público indisponível e imprescritível; (j) houve dano ambiental, vez que o réu não atendeu o disposto no artigo 2º do Código Florestal; (k) "Em matéria ambiental, a garantia do direito adquirido e do ato jurídico perfeito deve ser mitigada, pois na hipótese de atividade que, posteriormente ao seu licenciamento, tornou-se lesiva ao meio ambiente, não podem prevalecer tais garantias." (fl. 1065); (l) a área de 100 (cem) metros em torno de lagos formados por hidrelétricas é considerada de preservação permanente por força de lei; (m) a condenação pelo valor equivalente em dinheiro ensejaria a produção de prova pericial, sendo que no presente caso há urgência pela solução do litígio para que seja implementado o projeto de reflorestamento. Por fim, em razão da sucumbência mínima do autor, condenou a requerida ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$ 10.000,00 (dez mil reais), nos termos do artigo 20, § 4º, do CPC.
Foram interpostos embargos declaratórios (fls. 1068/1072) pelo Município de Rio Bonito do Iguaçu e pela empresa Tractebel Energia S/A. (fls. 1074/1087), os quais foram julgados improcedentes (fls. 1092/1093). Inconformada com a r. decisão, Tractebel Energia S/A., interpôs o presente recurso de apelação (fls. 1095/1160) alegando, em síntese, que: (a) não é aceitável a conversão de obrigação de fazer em indenização por perdas e danos; (b) da impossibilidade de pagamento de indenização diretamente ao apelado, vez que tal valor deveria ser revertido ao Fundo a que se refere o artigo 13 da Lei nº 7.347/85; (c) a apelante não é parte legítima, vez que o Código Florestal no ano de 1972 (concessão de outorga da Usina Salto Santiago) dispunha que competia aos proprietários de área de terras no entorno no reservatório da usina responder pela necessidade de reflorestamento, sendo que apenas a partir de 2001 é que se passou a atribuir ao concessionário a obrigação de adquirir área de preservação permanente; (d) há necessidade de formação de litisconsórcio com a União Federal, vez que a apelante é concessionária do uso de bem público federal de produção de energia elétrica; (e) houve omissão em relação ao fato de que a norma que estabeleceu a largura da APP em reservatórios foi criada após a implantação e o início da operação das UHE Salto Santiago e Salto Osório, bem como em relação ao fato da área envolvida pertencer à terceiros ; (f) não houve análise da questão referente à inexistência de lei determinando o reflorestamento de uma área de preservação no entorno do reservatório no momento da implantação da usina; (g) não houve análise de faixa variável com o mínimo de
30 (trinta) metros na Resolução nº 302/2002; (h) da falta de análise referente à questão da impossibilidade de intervenção em áreas pertencentes à terceiros; (i) a decisão prolatada em embargos de declaração é obscura, vez que não esclarece a forma como a apelante deverá adimplir a obrigação de intervir em áreas pertencentes à terceiros; não apreciou a Resolução nº 425 de 25/05/2010; não dispôs sobre a abrangência do reflorestamento, bem como se este exclui as áreas em que há matas preservadas e áreas de vegetação natural; (j) a decisão é nula por ser extra petita, vez que o pedido constante da inicial se refere ao reflorestamento de mata ciliar de área nos limites de seu território e não em toda a extensão da represa, o que envolveria áreas de outros municípios; (k) a máxima proteção ao meio ambiente não pode autorizar a desprezar os princípios mais basilares do direito, tais como a irretroatividade, o respeito ao direito adquirido e o ato jurídico perfeito; (l) da inexistência de obrigação da apelante, vez que as obras das Usinas Hidrelétricas foram feitas e concluídas pela Eletrosul; (m) o Código Florestal ao ter definido a largura da faixa lindeira, não o fez em relação às lagoas, lagos ou reservatórios, o que foi suprido com a Resolução do Conama nº 302/2002; (n) o artigo 5º da Resolução nº 302/2002 do Conama determinou que em caso de privatização deverão ser observadas as exigências ambientais da época dos fatos, sendo que em referido momento a legislação nada dispunha sobre a obrigatoriedade da implantação da faixa de 100 (cem) metros de APP; (o) as Resoluções nºs 302/2002 e 303/2002 do Conama são inconstitucionais, vez que este é órgão consultivo e deliberativo, não podendo editar norma que implique na
intervenção da liberdade ou propriedade do cidadão; (p) a apelante já apresentou ao IAP um projeto de reflorestamento, o qual já está em execução, conforme comprova relatório de atividades acumulado até julho de 2008; (q) não há qualquer dano ambiental, vez que a vegetação existente no entorno do lago artificial já cumpre a finalidade prevista na legislação; (r) não há como mensurar os danos existentes se não houve perícia para verificar a sua extensão; (s) nem toda a área de preservação permanente precisa ser formada por florestas, sendo que a ausência de vegetação não é sinônimo de devastação ambiental; (t) "(...) a extensão da faixa de APP para 100m atingirá propriedades pertencentes à particulares, não havendo lei ou condicionante que a obrigue a Apelante a reflorestá-las." (fl. 1157); (u) "(...) o apelado sonegou a informação de que já recebeu da Apelante, desde 1993 até outubro de 2008, a título de Compensação Financeira pela Utilização de Recursos Hídricos referentes à Usina Salto Santiago, o valor total de R$ 13.598.144,60 (treze milhões, quinhentos e noventa e oito mil, cento e quarenta e quatro reais e sessenta centavos) (doc. 10 na manifestação), e referente à Usina Salto Osório o valor de R$ 3.304.081,18 (três milhões, trezentos e quatro mil, oitenta e um reais e dezoito centavos) (doc. 10, na manifestação), informação essa que pode ser confirmada por acesso ao sítio da Aneel..." (fl. 1158); (v) não é razoável a aplicação de multa diária por descumprimento da ordem de reflorestar área pertencente à terceiros. A Douta Procuradoria-Geral de Justiça emitiu parecer (fls.1173/1191), subscrito pelo Procurador de
Justiça Saint Clair Honorato Santos manifestando-se pelo desprovimento do recurso. O Município de Rio Bonito do Iguaçu apresentou recurso de agravo retido (fls. 1204/1205), aduzindo que o juízo a quo foi induzido em erro ao dizer que acatou o valor da causa com base no valor do projeto de reflorestamento mencionado pela contestação. Argumentou que o projeto diz respeito a pequenas áreas de propriedade da Tractebel, que não representam praticamente nada do entorno a ser reflorestado. Afirmou que o valor atribuído à causa mostra-se pequeno em relação a grande área a ser reflorestada. Posteriormente, o Município de Rio Bonito do Iguaçu também apelou (fls. 1211/1235), alegando, em síntese, que: (a) deve ser reiterado o agravo retido, a fim de que a verba honorária seja fixada em face do vulto econômico da demanda; (b) a verba honorária foi fixada em R$ 10.000,00 (dez mil reais) sem levar em conta a intensidade do trabalho e representando 1% (um por cento) do valor da causa (o qual supera o valor de R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais), o que pode ser considerado como valor ínfimo; (c) "(...) a decisão aceitou ingenuamente (data vênia) a alegação da poluidora de que o reflorestamento seria aquele do `projeto aprovado' pela Tractebel, atinente não a todo o entorno da represa, mas às áreas de sua propriedade particular." (fl. 1215); (d) a área a ser reflorestada refere-se a todo o entorno da represa e não aos pequenos lotes de propriedade da Tractebel; (e) Há dados objetivos e aritméticos para o cálculo do custo do reflorestamento, não havendo razão para dizer
que o valor da causa seria inestimável; (f) tendo em vista que o conteúdo econômico da demanda é muito superior a vinte milhões de reais, este deve ser levado em conta para a fixação da verba honorária, a qual deve se ater ao percentual de 10% (dez por cento) a 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa; (g) o apelo deve ser provido para que esta Corte "(...) diante da condenação proferida, antecipe a tutela no corpo da própria decisão, no sentido de que, se não forem cumpridos os seus termos (da condenação), com efetivo início (e meio, e prosseguimento) do replantio no prazo determinado, será devolvido ao Município, sem prejuízo da multa, o mister e direito de apresentar os projetos, orçamentos e planos para a medida (reflorestamento), pois tem elementos e pessoa técnico para tanto, acrescido de aporte financeiro no valor dos custos já apresentados a serem detalhados oportunamente." (fls. 1234/1235). Assim, postula pelo provimento ao apelo "(...) para o fim de considerar o valor da causa como sendo de R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de Reais), estipulando os honorários advocatícios com base nesse conteúdo econômico da causa, num percentual de 10 a vinte por cento sobre tal valor, em obediência ao art. 20, §§ 2º e 3º do CPC. Requer-se, também, o provimento da apelação para o fim de que seja deferida a antecipação de tutela no interior da decisão do Tribunal..." (fl. 1235). Foram oferecidas contrarrazões às fls. 1255/1273. A Douta Procuradoria-Geral de Justiça emitiu parecer (fls. 1282/1287), subscrito pelo Procurador de Justiça, Doutor Saint-Clair Honorato Santos, manifestando-se
pelo provimento do agravo retido e do recurso de apelação do ente municipal. Foram juntados memoriais pela empresa Tractebel Energia S/A. (fls. 1305/311), nos quais postulou pela extinção do feito ante a ausência superveniente de interesse de agir, tendo em vista a promulgação da Lei Federal nº 12.651/2012. O Município de Rio Bonito do Iguaçu apresentou resposta aos memoriais (fls. 1447/1506). A Procuradoria Geral de Justiça emitiu parecer (fls. 1514/1519), proferido pelo Procurador de Justiça, Doutor Saint-Clair Honorato Santos, manifestando-se pelo desprovimento do apelo interposto pela Tractebel Energia S/A., e pelo provimento dos recursos de apelação e de agravo retido interpostos pelo Município de Rio Bonito do Iguaçu. É o relatório.
II - VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO. Presentes os pressupostos recursais de admissibilidade, conheço do recurso de apelação da Tractebel Energia S/A., e lhe dou provimento parcial, bem como conheço dos recursos de agravo retido e de apelação interpostos pelo Município de Rio Bonito do Iguaçu, nego provimento ao agravo e dou provimento parcial ao apelo. Vencido o Desembargador Paulo Roberto Hapner, que entende pelo provimento do apelo da Tractebel Energia S/A. e reconhece a carência da ação em
relação ao Município de Rio Bonito do Iguaçu, com declaração de voto em separado. Trata-se de ação civil pública proposta pelo Município de Rio Bonito do Iguaçu em face da empresa Tractebel Energia S/A., visando à recomposição dos danos causados em terras do Município em razão da formação do reservatório da Hidrelétrica de Salto Santiago.
Do Recurso de Apelação interposto pela Tractebel Energia S/A. Das Preliminares Da impossibilidade imediata de conversão da obrigação de fazer em indenização por perdas e danos. Aduz o apelante a total impossibilidade de conversão da obrigação de fazer em perdas e danos, o que não merece guarida. Como se observa do artigo 3º, da Lei nº 7.347/85 este é expresso ao dispor que: "A ação civil pública terá por objeto a condenação em dinheiro ou cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer.", do que se conclui que é possível a cumulação dos pedidos. No presente caso, visa o apelado que a apelante efetue o reflorestamento da área atingida pela formação do reservatório da Hidrelétrica de Salto Santiago, sendo perfeitamente possível a conversão do pleito de
obrigação de fazer em perdas e danos, caso a apelante não venha a efetuar a recomposição. Dessa forma, a conversão em perdas e danos será possível caso a apelante não cumpra com a obrigação de reflorestar a área em questão, constituindo-se numa forma de viabilizar a realização dos projetos e a execução do reflorestamento necessário. A possível conversão em indenização por perdas e danos somente tem por finalidade a obtenção de meios financeiros para a realização da recomposição ao meio ambiente, sendo aplicável ao caso o disposto no artigo 461, do Código de Processo Civil, verbis: Art. 461 - "Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento". § 1º - A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente".
Neste sentido, tem-se o seguinte entendimento jurisprudencial: "PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. OBRIGAÇÃO DE FAZER. CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS. POSSIBILIDADE. A teor do art. 461, caput, § 1º, do CPC, na ação em que se controverte o "cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer", quando inviável a obtenção da "tutela específica" ou o "resultado prático correspondente" [hipótese
aqui configurada], a "obrigação se converterá em perdas e danos". AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO." (TJRS, 22ª Câmara Cível, Agravo de Instrumento Nº 70032668758, Relator: Mara Larsen Chechi, Julgado em 27/05/2010) Portanto, não há impossibilidade na conversão da obrigação de fazer em perdas e danos, vez que não sendo efetivada a recomposição do dano ambiental, objetivo maior a ser alcançado com a ação civil pública, que ao menos seja viável a execução das obras de reflorestamento por meio de recursos financeiros, tratando-se, portanto, de pedido sucessivo. Da impossibilidade de pagamento de indenização diretamente ao apelado. Aduz a apelante que não há possibilidade de que o pagamento de indenização seja feito diretamente ao apelado, devendo ser revertido ao Fundo a que se refere o artigo 13 da Lei nº 7.347/85. No entanto, tal argumento não prospera, pois o Município é legitimado ativo e tem o dever de zelar, restaurar e preservar o meio ambiente. Demais disso, há que se considerar que o pagamento de referida quantia somente deverá ocorrer caso a apelante não cumpra com a obrigação primordial de recompor os danos ambientais havidos. Ou seja, referido montante somente deverá ser pago caso não haja o descumprimento da
obrigação de fazer, razão pela qual a discussão de tal questão não se mostra necessária. Ad argumentandum tantum, a pretensão inicial tem por objetivo o reflorestamento, sendo que o pedido de entrega de recursos apenas tem a finalidade de viabilizar a execução da obra, não se tratando de pedido indenizatório, como quer fazer crer o apelante, mas de obrigação de fazer, destinando-se o aporte financeiro à execução da obra. Da Ilegitimidade de Parte da Apelante. Assevera a apelante que não é parte legítima para figurar na demanda, sob a alegação de que o Código Florestal no ano de 1972 (concessão de outorga da Usina Salto Santiago) dispunha que competia aos proprietários de área de terras no entorno do reservatório da usina responder pela necessidade de reflorestamento, sendo que apenas a partir de 2001 é que se passou a atribuir ao concessionário a obrigação de adquirir área de preservação permanente. Tal alegação não merece guarida. Ainda que parte das terras possam pertencer a terceiros estes não se beneficiam das atividades desenvolvidas pela empresa, vez que lhes cabe apenas a preservação da mata que fica ao redor da represa, nada podendo fazer a respeito sob pena de estarem prejudicando o meio ambiente. No entanto, a apelante, em razão do contrato de concessão firmado com a União Federal, é quem
obtém vantagem em razão da exploração da energia elétrica, valendo dizer, ainda, que a responsabilidade para a reparação de danos ambientais é objetiva, cabendo a quem está explorando as atividades a reparação dos danos causados. Neste sentido, oportunas as palavras de Paulo Affonso Leme Machado in "Direito Ambiental Brasileiro", 17ª ed, Malheiros: "A responsabilidade objetiva ambiental significa que quem danificar o ambiente tem o dever jurídico de repará-lo. Presente, pois, o binômio dano/reparação. Não se pergunta a razão da degradação para que haja o dever de indenizar e/ou reparar. A responsabilidade sem culpa tem incidência na indenização ou na `"reparação dos danos causados ao meio ambiente e aos terceiros afetados por sua atividade'" (art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/81). Não interessa que tipo de obra ou atividade seja exercida pelo que degrada, pois não há necessidade de que ela apresente risco ou seja perigosa. Procura-se quem foi atingido e, se for o meio ambiente e o home, inicia-se o processo lógico-jurídico da imputação civil objetiva ambiental..." (pg. 351)
Dessa forma, é da apelante a responsabilidade em reparar o dano ambiental, ou seja, a sua legitimidade passiva decorre do fato de ter efetuado atividades que tenham causado danos ao meio ambiente, cabendo-lhe a obrigação de repará-los. Neste sentido, vale a pena citar parte do acórdão proferido pelo Juiz Substituto de 2º Grau Rogério Ribas: "(...)
Outro aspecto importante é quanto às possíveis áreas de propriedade privada existentes no entorno e a autorização para que a ré promova lá o reflorestamento. Nesse caso, tais áreas deverão simplesmente constar do novo projeto, o qual deverá especificar o tamanho e a quantidade de mudas que deverão nelas ser plantadas, ficando a cargo do Juízo de Primeiro Grau deferir, quando for o caso, os respectivos alvarás para a efetivação dos trabalhos, tudo conforme cronograma a ser ostentado no próprio projeto. Anote-se que não há qualquer necessidade de que tais proprietários (que são indeterminados até o momento) sejam intimados ou chamados nesta demanda, pois seu objeto é, como visto, o reflorestamento como obrigação de fazer, atinente somente à obrigação da empresa ré, titular da atividade danosa (poluidor pagador). Os possíveis proprietários do entorno do alagamento poderiam ser considerados, no máximo, vítimas da desídia da responsável em replantar a área --- mas vítimas de danos ambientais, somos todos --- pois, como já sustentado, trata-se de direito difuso, sendo assim meramente tumultuária a participação no processo de outras pessoas, só dificultando a tutela do meio ambiente e, portanto, descabida. Ademais, tratando-se de entorno do lago artificial, como áreas de proteção permanente que são, os proprietários não possuem sobre elas livre arbítrio, de forma que não poderão criar entraves injustificados ao reflorestamento, sob pena de passarem a ser co-obrigados, posto que o reflorestamento vem em seu benefício e não em seu prejuízo." (TJPR, 5ª Câmara Cível, Ai nº 476.907-7, DJ 26/09/2008)
"AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ROMPIMENTO DE POLIDUTO. VAZAMENTO DE ÓLEO NA SERRA DO MAR. DANO AMBIENTAL. 1) COMPETÊNCIA. FORO DE DOMICÍLIO DO AUTOR. DANO AMBIENTAL QUE ATINGE TAMBÉM A REGIÃO DE PARANAGUÁ. 2) POSSIBILIDADE JURÍDICA DO
PEDIDO. O FATO DE HAVER TRANSAÇÃO NÃO IMPEDE A PARTE DE POSTULAR DIREITOS NÃO ABRANGIDOS POR ELA, BEM COMO DE DISCUTIR SE HOUVE OU NÃO A INTEGRAL REPARAÇÃO. 3) CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. FATO NOTÓRIO. DESNECESSIDADE DE PROVA. LAUDOS E DOCUMENTOS ANEXADOS SUFICIENTES PARA O DESLINDE DA QUESTÃO. LEGITIMIDADE ATIVA RECONHECIDA PELA PRÓPRIA REQUERIDA. 4) CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR. IRRELEVÂNCIA, VISTO TRATAR-SE DE RESPONSABILIDADE OBJETIVA BASEADA NA TEORIA DO RISCO INTEGRAL. AGENTE CAUSADOR ASSUME A RESPONSABILIDADE PELOS RISCOS DE SUA ATIVIDADE (...)" (TJPR, Câmara Cível, Ap nº 477717-7, Rel. Eugenio Achille Grandinetti, DJ 10/10/2008) [Grifos nossos]
Desse modo, afigura-se a apelante parte legítima na demanda, vez que usufruiu de atividade que implicou em danos ao meio ambiente, sendo o seu dever repará-los. Da necessidade de formação de litisconsórcio com a União Federal. Afirma a apelante a necessidade de formação de litisconsórcio com a União Federal ao argumento de que é concessionária do uso de bem público federal de produção de energia elétrica, razão pela qual a competência para julgamento da demanda seria da Justiça Federal. Ainda que seja inconteste ser cabível a todos os entes federados adotar medidas para a preservação
do meio ambiente, primeiramente, há que se considerar que a matéria discutida nos autos não versa sobre o contrato de concessão de energia elétrica firmado com a União, mas sim em relação aos danos ambientais causados em virtude da formação do reservatório da Hidrelétrica de Salto Santiago, danos estes afetos a interesses locais. Em segundo lugar, o desmatamento para a formação do reservatório da Hidrelétrica de Salto Santiago se deu por culpa da empresa apelante, razão pela qual ainda que preste serviço de competência da União foi ela quem deu causa aos danos havidos, cabendo-lhe a recomposição dos mesmos. Neste sentido, tem-se o seguinte entendimento jurisprudencial: "PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AO MEIO AMBIENTE. COMPETÊNCIA TERRITORIAL DELIMITADA PELO LOCAL DO DANO (ART. 2º DA LEI 7347/85). AUSÊNCIA DE INTERESSE DA UNIÃO, SUAS AUTARQUIAS OU EMPRESAS PÚBLICAS. COMPETÊNCIA FUNCIONAL DA JUSTIÇA FEDERAL NÃO CARACTERIZADA. VIOLAÇÃO DO ART. 535, I e II, DO CPC. NÃO CONFIGURADA. 1. A regra mater em termos de dano ambiental é a do local do ilícito em prol da efetividade jurisdicional. Deveras, proposta a ação civil pública pelo Município e caracterizando-se o dano como local, impõe-se a competência da Justiça Estadual no local do dano, especialmente porque a ratio essendi da competência para a ação civil pública ambiental, calca-se no princípio da efetividade, por isso que, o juízo do local do dano habilita- se, funcionalmente, na percepção da degradação ao meio ambiente posto em condições ideais para a obtenção dos
elementos de convicção conducentes ao desate da lide. Precedente desta Corte: REsp 789513/SP, DJ de 06.03.2006. 2. A competência cível da Justiça Federal, a teor do art. 109, I, da Constituição Federal, é definida ratione personae, e, por isso, absoluta, determinada em razão das pessoas que figuram no processo como autoras, rés, assistentes ou oponentes. Nesse sentido confiram-se, à guisa de exemplo, julgados desta Corte: CC 47.915/SP, DJ de 02.08.2005; CC 45475/SP, DJ de 16.05.2005 e CC 40.534/RJ, DJ de 17.05.2004. 3. Na hipótese sub examine a ausência de manifestação da União ou de quaisquer das pessoas elencadas no art. 109, I, da Constituição Federal acerca do interesse de ingresso no feito em que seja parte empresa privada concessionária de serviço público federal e município, revela a competência Justiça Estadual para processar e julgar a ação. 4. Por fim, consigne-se, o Tribunal local, com ampla cognição sobre o contexto fático probatório, consignou que: "o alegado dano ambiental, que ensejou a propositura da demanda, em princípio, afeta exclusivamente os habitantes da comuna (cf. Petição inicial - fls.18/58), não tendo sido demonstrado o interesse jurídico da União na espécie." (fl. 146). 5. Sobre o thema, sobreleva notar, julgado desta Corte no sentido de que: "A competência para processar e julgar a ação civil pública por prejuízos ao meio ambiente é a do foro do local onde ocorrer o dano (Lei 7347/85, art. 2.º), ou seja, da Justiça Federal ou da Justiça Estadual que exerça jurisdição sobre aquele foro. Não evidenciado o interesse da União, de suas autarquias ou de suas empresas públicas, não se caracteriza a competência da Justiça Federal, cujas hipóteses são taxativamente enumeradas na Constituição da República. Assim sendo, a ação civil pública deve ser julgada pela Justiça do Estado onde ocorrido ou venha a ocorrer o dano." (REsp 789513/SP, DJ de 06.03.2006)
6. Inexiste ofensa ao art. 535, I e II, CPC, quando o Tribunal de origem pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos, cujo decisum revela-se devidamente fundamentado. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão. Precedente desta Corte: RESP 658.859/RS, publicado no DJ de 09.05.2005. 7. Recurso especial desprovido" (STJ, 1ª Turma, REsp 811773 / SP, Min. Luiz Fux, DJ 31/05/2007) Portanto, não há falar em formação de litisconsórcio passivo necessário com a União Federal. Da Decisão Extra Petita Nulidade. Entendo que merece provimento parcial o presente recurso ante a ocorrência de decisão ultra petita, vez que o pedido constante da inicial se refere ao reflorestamento de mata ciliar de área nos limites do território do município apelado e não em toda a extensão da represa. Aduz o apelante que a sentença deve ser declarada nula ante a ocorrência de julgamento extra petita, sob a alegação de que o pedido constante da inicial se refere ao reflorestamento de mata ciliar de área nos limites do território do município apelado e não em toda a extensão da represa, conforme concedido em sentença. No entanto, embora o apelante alegue que o julgamento da decisão proferida se deu extra petita, ante o
fato do juízo a quo ter imposto condenação além do que foi postulado, na verdade trata-se de hipótese de julgamento ultra petita. Para que reste configurada a ocorrência de julgamento extra petita, a prestação judicial concedida precisa ser diversa da solicitada pela parte, ocorrendo dissonância entre o pedido pretendido na inicial e o concedido na sentença, o que acaba por gerar nulidade da decisão, ou seja, a decisão acaba por solucionar causa diversa da que fora pedido. Neste sentido, tem-se o seguinte entendimento jurisprudencial: "A sentença 'extra petita' é nula, porque decide causa diferente da que foi posta em juízo (ex.: a sentença 'de natureza diversa da pedida' ou a que condena em 'objeto diverso' do que fora demandado). O tribunal deve anulá-la." (RSTJ 79/100, RT 502/169).
Por sua vez, a sentença ultra petita consiste em dar ao autor benefício maior do que fora por ele postulado, indo além do que foi pleiteado. Dessa forma, a nulidade do decisum acaba sendo parcial, não indo além do excesso praticado, de sorte que, não será necessário a anulação de toda a decisão, mas apenas que seja declarado aquilo que ultrapassou o pedido.
Nas lições de Humberto Theodoro Júnior: "O defeito da sentença ultra petita, por seu turno, não é totalmente igual ao da extra petita. Aqui o juiz decide o pedido, mas vai além dele, dando ao autor mais do que fora
pleiteado (art. 460). A nulidade, então, é parcial, não indo além do excesso praticado, de sorte que, ao julgar o recurso da parte prejudicada, o tribunal não anulará todo o decisório, mas apenas decotará aquilo que ultrapassou o pedido." (in Curso de Direito Processual Civil, Vol. I, 47ª ed. Forense, 2007, pg. 577)
Como se pode observar da inicial da ação civil pública, autor/apelado assim requereu: "(...) O que se colima com a presente ação é o reflorestamento da área de 100 metros de largura em todo o entorno da represa na área impactada pelo reservatório. relativamente à área de mata ciliar (2.,063,43 hectares)" (fl. 28)
Dispôs ainda que: "(...) As águas da represa no Município autor ocupam, conforme o anexo levantamento efetuado pelo Dr. Franco Amato, 2.034,43 hectares, estendo-se por 405,13 km., o que equivale dizer que a área de preservação permanente a ser criada (como reflorestamento ciliar) no município, em razão da legislação citada é de 2.036,43 hectares..." (pg. 11)
Por sua vez, o julgador monocrático julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais nos seguintes termos, extraídos (fl. 1067): "(...) Julgo parcialmente procedentes os pedidos iniciais, para o fim de condenar a requerida na obrigação de recompor a mata
ciliar em toda a extensão da represa, no perímetro de sua margem, com largura de 100 metros, nos termos da fundamentação sentencial"
Dessa forma, restou evidente que o juízo de primeiro grau extrapolou os limites do pedido formulado na peça inicial, o que configura o julgamento ultra petita, devendo ser adequada a condenação para que o apelante seja condenado à obrigação de recompor à mata ciliar apenas nos limites das áreas afetas ao município apelado e não em relação a toda a extensão da represa. Portanto, é perfeitamente possível que seja feita uma adequação entre o pedido formulado e o proferido na sentença monocrática, a fim de se adequar aos limites exatos do que fora postulado na inicial, não sendo necessária a anulação da decisão proferida. Neste sentido, tem-se o seguinte entendimento jurisprudencial adotado pelo Superior Tribunal de Justiça, verbis: "Processual Civil. Julgamento ultra petita. Redução. O juiz não poderá conceder mais do que o pedido pelo autor, sob pena de o julgamento ser ultra petita. A sentença que decide ultra petita atribuindo ao promovente mais do que o formulado na inicial não é nula, devendo apenas ser reduzida. Assim, sendo deferida como foi no caso uma indenização acima do pedido na inicial, que foi certo e determinado, consubstanciado no valor que indica, deve-se reduzi-la aos limites do pedido. Recursos parcialmente conhecidos e, nessa parte, providos." (STJ, 4ª Turma, Resp 113.355/RS, Rel. Min. César Asfor Rocha)
Dessa forma, o presente apelo merece provimento neste tópico, a fim de que da decisão monocrática passe a constar que o apelante deverá recompor à mata ciliar apenas nos limites das áreas afetas ao município apelado e não em relação a toda extensão da represa, dentro de um prazo de 12 (doze meses) meses, prazo dilatado de ofício, tempo que se mostra suficiente para a implementação de projetos de reflorestamento, vez que o prazo de 60 (sessenta) dias fixados em sentença mostra-se por demais exíguo Do Mérito Sabe-se que o meio ambiente, por ser uma prerrogativa fundamental, é um direito de todos e dever do Poder Público e da coletividade, dos quais se exige atitudes com o fim de protegê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Sobre a matéria leciona Dirley Da Cunha Júnior: "O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, reconhecido pela Constituição Federal em capitulo situado no titulo da ordem social, é um direito fundamental, na categoria direito social, qualificado pela doutrina como direito de terceira geração. Nem por isso se lhe negue caráter, também, individual. Cuida-se, pois, de um direito simultaneamente considerado direito social e individual, uma vez que a realização individual deste direito fundamental está intrinsecamente ligado à sua
realização social, por isso mesmo considerado transindividual. Com efeito, o principio da defesa do meio ambiente, previsto no art. 170 da Carta Magna, surge no art. 225 como direito fundamental. De principio conformador da ordem econômica, tem seu conteúdo ampliado, quando é reconhecido que, além de um fator da produção, é a proteção do meio ambiente uma condição essencial para o livre desenvolvimento das potencialidades do individuo e para melhoria da convivência social. Assim, inobstante não inserido no rol do art. 5° da Constituição Federal, deve-se considerar que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, consagrado no art. 225 daquela Carta, é, sem sombra de dúvida, um direito fundamental, porque é uma prerrogativa individual, cuja realização envolve uma série de atividades públicas e privadas, produzindo não só a sua consolidação no mundo da vida como trazendo, em decorrência disto, uma melhoria das condições de desenvolvimento das potencialidades individuais, bem como uma ordem social livre." (in "Curso DE Direito Constitucional". 2ª ed. Salvador: Juspodivm, 2008, p. 1095) Assim, cabe ao Poder Judiciário, quando provocado, analisar se o disposto no artigo 225, caput, da Constituição Federal está sendo observado, podendo, inclusive, caso este não esteja, suspender as atividades extrativas nocivas ao meio ambiente, ainda que para isso reduza o alcance de outros direitos fundamentais, como o da propriedade e do livre exercício da atividade econômica. O artigo 225 "caput" e § 1º, inciso III, da Constituição Federal dispõe que:
Art. 225 - "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações." § 1º - "Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: (...) III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção".
No entanto, ainda que a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), dispusesse sobre " A criação de espaços territoriais especialmente protegidos pelo Poder Público Federal, estadual e municipal, tais como áreas de proteção ambiental, de relevante interesse ecológico e reservas extrativistas" (art. 9º, inciso VI), tratando-se de competência do Conama a normatização de questões referentes à preservação ambiental, as Resoluções nºs 302/02 e 303/02 de referido órgão, que dispunham sobre parâmetros e limites das áreas de preservação permanente de reservatórios artificiais, não podem mais prevalecer. Tais resoluções dispunham, respectivamente, sobre os parâmetros, definições e limites de Áreas de Preservação Permanente, bem como sobre os parâmetros, definições e limites de áreas de preservação permanente de reservatórios artificiais e o regime de uso do entorno. Razão pela qual, as áreas localizadas até 100 (cem)
metros no entorno dos reservatórios artificiais de usinas hidrelétricas em áreas rurais seriam de preservação permanente, o que se amoldaria ao caso em tela, conforme entendimento da sentença monocrática. Ocorre que, com a promulgação da Lei Federal nº 12.651/2012 (Lei Florestal), a qual entrou em vigor em maio de 2012, restou alterada a Lei nº 6.938/81, bem como revogadas a Lei nº 4771/65 (antigo Código Florestal) e alterações posteriores, e a Medida Provisória nº 2166-67/2001. Motivo pelo qual não caberá mais à apelante recompor a área devastada nos moldes fixados na sentença, ou seja, na faixa de 100 (cem) metros no entorno na área do reservatório localizado nas delimitações do município apelado, conforme resoluções do Conama. Isto porque, o artigo 62 da Lei Federal nº 12.651/2012 (Lei Florestal) passou a dispor que: Art. 62 "Para os reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória no 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, a faixa da Área de Preservação Permanente será a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum"
Ou seja, deverá a apelada efetuar a recomposição da área do entorno do reservatório, nos limites do município apelado, conforme a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum, vez
que, como mencionado pelo apelante em seu memorais, o Decreto Federal nº 70.747/72, de outorga da concessão relativo a Usina Hidrelétrica de Salto Santiago, se deu anteriormente a edição da Medida Provisória nº 2166-67/2001. Razão pela qual, ainda que a apelante aduza ter cumprido integralmente a recomposição da área, somente em fase de execução tal averiguação será possível. Dessa forma, caem por terra as alegações de omissão em relação ao fato de a norma que estabeleceu a largura da APP em reservatórios ter sido criada após a implantação e o início da operação das UHE Salto Santiago e Salto Osório, que não houve análise da questão referente a inexistência de lei determinando o reflorestamento de uma área de preservação no entorno do reservatório no momento da implantação da usina, bem como que a máxima proteção ao meio ambiente não pode autorizar e desprezar os princípios mais basilares do direito, tais como a irretroatividade, o respeito ao direito adquirido e o ato jurídico perfeito, alegações, estas, que não podem prosperar. Isto porque, por mais que o artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal garanta que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, tal princípio deve ser ponderado, ainda mais em relação a questões de interesse público, inclusive as relativas ao meio ambiente ecologicamente equilibrado a que todos têm direito. Em outras palavras, não há como falar em direito adquirido contra o interesse público, o qual prevalece sobre o interesse privado, sendo que em se tratando de meio
ambiente impõe-se tanto ao Poder Público quanto à coletividade a preservação e defesa tanto no momento presente quanto para as futuras gerações. Ou seja, ainda que a Constituição Federal tenha reservado ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito e a coisa julgada a posição de garantias constitucionais, não se pode deixar de levar em conta que o direito ao meio ambiente equilibrado trata-se de direito fundamental e autônomo, e que tem o poder de regular a ordem econômica e o direito de propriedade, razão pela qual a garantia disposta no artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal deve ser mitigada. Neste sentido, oportunas as palavras do Professor Marco Aurélio Bortolin, extraídas do sítio http://ambientalecaeconsumidor.pro.br/ambiental/aulas5e6am b10.htm, acessado em 28/01/2010, o que adoto por reportação: "2. Direitos e garantias fundamentais - direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada. Estabelece o artigo 5o, inciso XXXVI, da Constituição Federal que "a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada". Mas o que tal previsão na verdade significa? Considerando que direito adquirido é aquele "definitivamente incorporado ao patrimônio de alguém", que ato jurídico perfeito é na verdade "uma situação jurídica definitivamente constituída por reunir todos os elementos necessários ao seu perfazimento, ou seja, agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei", e, por fim, que a coisa julgada é o "efeito emanado de decisão judicial da qual não caiba mais nenhuma espécie de recurso", observa-se que
a Constituição Federal reserva certas garantias em um patamar tão elevado do ordenamento jurídico, que até mesmo a lei posterior não poderá contra as mesmas atentar. Esse conceito é realmente importantíssimo, pois é claro que em um Estado Democrático de Direito, o respeito à lei, e a supremacia da lei, são indiscutíveis. Na verdade, como sabemos, o que excepciona esse império da lei é o fato de estarmos diante de garantias constitucionais, que resguardam elementos de nossa soberania individual frente ao próprio Estado, ou seja, o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada são protegidos pela Constituição Federal até mesmo da lei posterior, com o objetivo claro de conferir segurança às relações jurídicas, que por sua vez adquirem a condição de ser formalizadas, gerarem direitos e eventualmente serem julgadas sob a égide uma determinada norma, sem que se possa correr o risco de uma lei posterior casuística de algum Governo retroagir para modificar completamente aquela situação consolidada no passado. Devemos reconhecer aqui proteções contra o próprio poder do Estado, e de sua atuação sob o veículo da lei infraconstitucional posterior. Ora, se o direito adquirido, a coisa julgada e o ato jurídico perfeito representam garantias constitucionais, é possível considerar que a lei ambiental posterior também não possa atingir o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada? Em outras palavras, alguém pode adquirir um direito em respeito ao ordenamento jurídico da época, e depois sofrer alguma restrição ou até mesmo supressão desse mesmo direito, em razão da entrada em vigor de uma nova lei ambiental? Ou firmar contrato perfeitamente adequado com a legislação aplicável (até mesmo a legislação ambiental) da época, e posteriormente uma nova lei ambiental vir a alterar a geração de efeitos desse ato jurídico? Evidentemente, se a Constituição Federal
reserva para o direito adquirido, para a coisa julgada e para o ato jurídico perfeito, posição de garantias constitucionais, vimos que também a Constituição Federal estabelece que o direito do ambiente é autônomo e fundamental, além de regulador da ordem econômica e limitador do direito de propriedade (que não mais existe dissociado de uma função ambiental). Portanto, não se adquire direito de poluir, pois esse direito individual jamais suplantará o interesse coletivo de todos a um ambiente ecologicamente equilibrado. A norma ambiental não retira da esfera jurídica de alguém um direito já adquirido. Na verdade, o indivíduo é que nunca adquiriu direito em seu patrimônio jurídico particular contra o interesse coletivo, daí porque o correto é vislumbrar que o Direito Ambiental não retira aquilo que nunca teve o indivíduo. A lei ambiental nova, por regular interesses de todos a um meio ambiente equilibrado, tem sempre caráter de ordem pública, e por essa razão, não retroage para fulminar contratos firmados sob a égide de lei anterior (atos jurídicos perfeitos), ou fulminar direitos adquiridos. Apenas, por sua supremacia, incidem sobre os efeitos vigentes que estão ainda pendentes de ocorrer por parte daquele ato ou direito individual, a partir de sua entrada em vigor, preservando um direito difuso que se sobrepõe ao interesse exclusivamente particular. (...) Dessa forma, se houver divergências entre o direito obtido por meio de licença ambiental e o interesse da coletividade, este último deve prevalecer. Isto porque a lei ambiental posterior tem condão de modificar as licenças anteriormente deferidas sem falar em violação do direito adquirido, não liberando o agente causador dos danos do
dever de reparar os prejuízos gerados com a atividade, como bem leciona Paulo Affonso Leme Machado, verbis: "A licença ambiental não libera o empreendedor licenciado de seu dever de reparar o dano ambiental. Essa licença, se integralmente regular, retira o caráter de ilicitude administrativa do ato, mas não afasta a responsabilidade civil de reparar. A ausência de ilicitude administrativa irá impedir a própria Administração Pública de sancionar prejuízo ambiental; mas nem por isso haverá irresponsabilidade civil." (Direito Ambiental Brasileiro, 17ª ed. Malheiros, 2009, pg 367.) Neste sentido, tem-se a seguinte orientação jurisprudencial: "APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO LIMINAR. LICENÇA AMBIENTAL PARA CORTE DE ARAUCÁRIAS. ATO NÃO DEFINITIVO. PASSÍVEL DE REVISÃO. DÚVIDA INSTAURADA QUANTO À ESPÉCIE NATIVA. TUTELA ANTECIPADA. REVOGAÇÃO A QUALQUER TEMPO. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE EM SEDE DE MANDADO DE SEGURANÇA. SENTENÇA MANTIDA. 1. A expedição da licença ambiental não resultou, em favor do impetrante, ato jurídico perfeito ou mesmo direito adquirido, eis que é ato administrativo sempre revogável e ninguém adquire direitos contra o interesse público que prevalece sempre sobre o interesse privado e pode a administração pública, a todo tempo, fazer cessar as atividades nocivas ao meio. 2. Na antecipação de tutela, uma vez ampliada a cognição do juiz, a qualquer tempo se faz possível sua revogação, quando se convencer da inverossimilhança do pedido. 3. Diante da dúvida instaurada quanto à possibilidade de serem as árvores nativas, o respectivo abate requer dilação probatória, o
que não se admite em sede de mandado de segurança. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E DESPROVIDO." (TJPR, 5ª Câmara Cível, Ap nº 424135-8, Rel. Jurandyr Reis Junior, DJ 29/02/2008) Portanto, as licenças inicialmente conferidas, por se tratarem de atos não definitivos, conferem ao poder público a possibilidade de revisão quando presentes indícios de danos ou ameaça de danos ao meio ambiente, como é o caso dos autos. Dessa forma, irrelevante o fato de não haver norma estabelecendo as dimensões da APP quando da implantação da Usina Salto Santiago e Salto Osório, bem como de não haver a obrigatoriedade de reflorestamento de uma área de preservação no entorno do reservatório no momento da implantação da usina, vez que em matéria de meio ambiente a garantia do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da irretroatividade das leis deve ser ponderada. Por fim, inóquoa a alegação de inexistência de obrigação da apelante de reparar do dano ao argumento de que as obras das Hidrelétrica Salto Santiago foi feita pela Eletrosul, vez que a apelante a sucedeu, devendo arcar com a responsabilidade de reparar os danos anteriormente causados por outra empresa. Assevera a apelante que não há como mensurar os danos existentes se não houver perícia para verificar a sua extensão, bem como que não há qualquer dano a ser reparado, ao argumento de que a vegetação existente no
entorno do lago artificial já cumpre a finalidade prevista na legislação, o que também não procede. Isto porque os danos decorrentes da não recuperação da mata ciliar são evidentes e presumidos, como ensina Paulo Affonso Leme Machado: "(...) A responsabilidade objetiva ambiental significa que quem danificar o ambiente tem o dever jurídico de repará-lo. Presente, pois, o binômio dano/reparação. Não se pergunta a razão da degradação para que haja o dever de indenizar e/ou reparar. A responsabilidade sem culpa tem incidência na indenização ou na reparação dos "danos causados ao meio ambiente e aos terceiros afetados por sua atividade" (art. 14, § III, da Lei 6.938/81). Não interessa que tipo de obra ou atividade seja exercida pelo que degrada, pois não há necessidade de que ela apresente risco ou seja perigosa. Procura-se quem foi atingido e, se for o meio ambiente e o homem, inicia-se o processo lógico-jurídico da imputação civil objetiva ambienta!. Só depois é que se entrará na fase do estabelecimento do nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o dano. É contra o Direito enriquecer-se ou ter lucro à custa da degradação do meio ambiente. O art. 927, parágrafo único, do CC de 2002, dispõe: "Haverá obrigarão de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem". Quanto à primeira parte, em matéria ambiental, já temos a Lei 6.938/81, que instituiu a responsabilidade sem culpa. Quanto à segunda parte, quando nos defrontarmos com atividades de risco, cujo regime de responsabilidade não tenha sido especificado em lei, o juiz analisará, caso a caso, ou o Poder Público fará a classificação dessas atividades. "É a responsabilidade pelo
risco da atividade." Na conceituação do risco aplicam-se os princípios da precaução, da prevenção e da reparação. Repara-se por força do Direito Positivo e, também, por um princípio de Direito Natural, pois não é justo prejudicar nem os outros e nem a si mesmo. Facilita-se a obtenção da prova da responsabilidade, sem se exigir a intenção, a imprudência e a negligência para serem protegidos bens de alto interesse de todos e cuja lesão ou destruição terá conseqüências não só para a geração presente, como para a geração futura. Nenhum dos poderes da República, ninguém, está autorizado, moral e constitucionalmente, a concordar ou a praticar uma transação que acarrete a perda de chance de vida e de saúde das gerações (...)" (op cit, pgs. 351/352) No mesmo sentido, tem-se o seguinte julgado: "AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DO MEIO-AMBIENTE. EDIFICAÇÃO DE IMÓVEL EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL - JUÍZA QUE DISPENSA QUESITOS ACERCA DA OCORRÊNCIA DO DANO - RECORRENTE QUE DEFENDE QUE TAIS QUESITOS SERIAM IMPRESCINDÍVEIS À COMPROVAÇÃO DO DANO AMBIENTAL. Mérito. EDIFICAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL - DANO AMBIENTAL PRESUMIDO PELA AMPLITUDE DO DISPOSTO NO ARTIGO 3º DA LEI Nº 6.938/81 - QUESITOS TOTALMENTE DISPENSÁVEIS - DECISÃO JUDICIAL CORRETA. RECURSO DESPROVIDO." (TJPR, 4ª Câmara Cível, Ai nº 365653-5, Rel. Marcos de Luca Fanchin, DJ 18/05/2007) Portanto, o simples fato de não ter havido reflorestamento em área de preservação permanente, aliado a questão da área atingida e da atividade instalada (extensão da
área do reservatório da hidrelétrica localizada no município apelado) ser de grande extensão e de alto potencial lesivo ao meio ambiente, não há que se falar em necessidade de perícia, vez que o dano é presumido. Ademais, ao contrário do mencionado pela apelante não basta a existência de qualquer tipo de vegetação para que a área seja tida como de preservação permanente. É imprescindível que a vegetação seja adequada ao meio em que está inserida para que possa cumprir a função de preservar a qualidade dos recursos hídricos, evitar a ocorrência de erosões e enchentes, bem como preservar a fauna e a flora. Valendo dizer ainda que somente quando da apresentação de estudo para o reflorestamento, tudo de acordo com a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum, é que o apelante poderá mensurar a área a ser reflorestada, devendo listar todas as áreas que deverão ser recompostas, as vegetações nativas delas constantes, as áreas pertencentes a terceiros e etc. Dessa forma, ainda que, como mencionado pela apelante, nem todas as áreas de preservação permanente precisem ser formadas por florestas, vez que a ausência de vegetação não é sinônimo de devastação ambiental, é necessário que a vegetação delas constantes seja adequada ao local, conforme as razões acima mencionadas. Por fim, não há qualquer omissão na decisão combatida em relação a abrangência do reflorestamento.
Isto porque, como já dito, o apelante somente poderá mensurar a extensão do dano e, por conseqüência, da área a ser recomposta com a realização de estudo ambiental nas dimensões constantes do artigo 62 da Lei Federal nº 12.651/12. De tal estudo deverão constar as matas nativas/florestas existentes, as vegetações plantadas e a sua adequação ou não com o meio, sendo que obviamente apenas as áreas que estiverem desmatadas, ou com vegetação/plantação não adequadas ao meio é que deverão ser recompostas. Insiste a apelante ao falar que encontra óbice no cumprimento da obrigação de reflorestar a área atingida, em virtude de algumas propriedades serem pertencentes a terceiros. Para tanto aduz que não fora analisada a questão da impossibilidade de intervenção em áreas pertencentes à terceiros, a forma como deverá adimplir com a obrigação de intervir em áreas pertencentes à terceiros, que não há lei que a condicione a reflorestar área pertencente a terceiro dentro da faixa da área de preservação permanente, bem como que não é razoável a aplicação de multa diária por descumprimento da ordem de reflorestar área pertencentes à terceiros. No entanto, novamente, tais alegações não prosperam. A respeito da impossibilidade de recomposição de áreas pertencentes terceiros, entendo que a questão não procede. Como já mencionado é fato inconteste que deve a apelante recompor a faixa relativa à distância
entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum no entorno da área do reservatório localizado nas delimitações do município apelado, em virtude de danos causados com a atividade. É fato também que dentro de referida área possam existir propriedades pertencentes a terceiros os quais, no entanto, não se constituem em óbice para que a apelante não se esquive do dever de efetuar o reflorestamento, vez que não se trata de invadir propriedade privada, mas sim de recompor a faixa de terra que deveria ter sido preservada por lei. Dessa forma, para que o direito de propriedade de terceiros não seja violado caberá à apelante, quando da elaboração de seu projeto de reflorestamento arrolar tais propriedades, suas áreas e a porção que deverá ser recomposta, sendo que a efetivação de tais atividades ficará a cargo do juízo de primeiro grau, cabendo a ele dispor sobre a forma como as atividades serão realizadas. Neste sentido, bem decidiu o Juízo Substituto de 2º Grau Rogério Ribas no Agravo de Instrumento nº 476907-7: "(...) Outro aspecto importante é quanto às possíveis áreas de propriedade privada existentes no entorno e a autorização para que a ré promova lá o reflorestamento. Nesse caso, tais áreas deverão simplesmente constar do novo projeto, o qual deverá especificar o tamanho e a quantidade de mudas que deverão nelas ser plantadas, ficando a cargo do Juízo de Primeiro Grau deferir, quando for o caso, os respectivos alvarás para a
efetivação dos trabalhos, tudo conforme cronograma a ser ostentado no próprio projeto. Anote-se que não há qualquer necessidade de que tais proprietários (que são indeterminados até o momento) sejam intimados ou chamados nesta demanda, pois seu objeto é, como visto, o reflorestamento como obrigação de fazer, atinente somente à obrigação da empresa ré, titular da atividade danosa (poluidor pagador). Os possíveis proprietários do entorno do alagamento poderiam ser considerados, no máximo, vítimas da desídia da responsável em replantar a área --- mas vítimas de danos ambientais, somos todos --- pois, como já sustentado, trata-se de direito difuso, sendo assim meramente tumultuária a participação no processo de outras pessoas, só dificultando a tutela do meio ambiente e, portanto, descabida. Ademais, tratando-se de entorno do lago artificial, como áreas de proteção permanente que são, os proprietários não possuem sobre elas livre arbítrio, de forma que não poderão criar entraves injustificados ao reflorestamento, sob pena de passarem a ser co-obrigados, posto que o reflorestamento vem em seu benefício e não em seu prejuízo." (TJPR, 5ª Câmara Cível, DJ 26/09/2008) Dessa forma, ante a obrigatoriedade de a apelante reparar a área relativa à distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum (art. 62, da Lei nº 12.651/12) no entorno do reservatório localizado no município, ainda que esta abranja propriedade de terceiros, perfeitamente possível a aplicação da multa por descumprimento. Por fim, quanto a alegação de inobservância da Resolução nº 425 de 25/05/10 esta não procede, pois ainda que a resolução defenda sobre "(...) casos
excepcionais de interesse social em que o órgão ambiental competente pode regularizar a intervenção ou supressão da vegetação em áreas de preservação permanente, ocorridas até 24 de julho de 2006, para empreendimentos agropecuários consolidados dos agricultores familiares e empreendedores familiares rurais." (art. 1º), caberá à apelante, como já dito, elaborar o seu plano de reflorestamento, incluindo as área de terceiros, cabendo ao juízo a quo dispor sobre a sua aplicabilidade ou não, questão a ser verificada caso a caso.
Da inconstitucionalidade das Resoluções nºs 302/2002 e 303/2002 do Conama. Não obstante a promulgação da Lei Federal nº 12.651/2012 (Lei Florestal), a qual acabou por revogar o antigo Código Florestal e, consequentemente, as Resoluções nºs 302/02 e 303/02 do Conama, no que diz respeito aos parâmetros e limites das áreas de preservação permanente de reservatórios artificiais, tais resoluções, à época, não se afiguravam inconstitucionais. Isto porque, possuía o Conama autorização legal para editar resoluções que visassem à proteção do meio ambiente e dos recursos naturais, inclusive mediante a fixação de parâmetros, definições e limites de Áreas de Preservação Permanente, razão pela qual as resoluções nºs 302/2002 e 303/2002 não eram inconstitucionais.
Da Apresentação de Projeto de Reflorestamento. Ainda que haja projeto de reflorestamento já aprovado junto ao IAP, referido projeto não retira a obrigação de fazer, isto porque o reflorestamento a ser feito ainda se encontra pendente, o que se verifica do ofício de fl. 1507, do Instituto Ambiental do Paraná, o qual dispõe a respeito das áreas supostamente reflorestadas. Neste sentido, bem decidiu o juízo a quo, o que adoto por reportação: "No tocante a alegação de que há decisão administrativa que aprovou o projeto de reflorestamento ambiental apresentado pela ré, tal circunstância não implica na impossibilidade de se pleitear, em Juízo, a imposição da obrigação imediata de fazer o reflorestamento. Sobretudo porque o fundamento da demanda é justamente o fato de a requerida ter deixado de observar e cumprir a determinação legal consistente no replantio imediato das matas ciliares." (fl. 1062)
Ademais, não há qualquer decisão administrativa sobre o assunto, ou seja, não há qualquer cópia de procedimento administrativo ou até mesmo de termo de ajustamento de conduta firmado. Vale dizer, ainda, que mesmo que haja projeto este acabou por perder a sua validade em decorrência de todas as alterações ambientais que possam ter ocorrido desde a data em que fora elaborado até o presente momento, razão pela qual a necessidade de elaboração de novo plano de
reflorestamento adequado ao contexto atual continua existindo. Por fim, vale dizer que mesmo que a apelante tenha iniciado suas atividades antes de normas exigindo um estudo prévio de impacto ambiental há necessidade de adequação às novas normas impostas, vez que, como bem mencionado pelo Parquet: "(...) o órgão público ambiental não fica vinculado eternamente a condições de funcionamento de uma atividade que se tenha revelado danosa ao ambiente e que haja possibilidade de correção no momento da nova autorização. Portanto, as modificações de padrões ambientais trazido pela Lei 6.938/81 são exigíveis para que a ré prossiga com suas atividades. Logo, considerando que inexiste direito adquirido na manutenção de uma regulamentação, a aplicação da legislação a situações antigas é absolutamente necessária..." (fl. 734)
Dessa forma, necessária a elaboração de novo plano de reflorestamento adequado ao contexto atual e de acordo com as dimensões constantes do artigo 62 da Lei Federal nº 12.651/2012. Ad argumentandum tantum, vale dizer que somente será possível a verificação do que fora ou não realizado em termos de reflorestamento quando da liquidação da sentença, vez que no presente momento não há nos autos subsídios suficientes para saber se de fato já ocorreu o reflorestamento na área de preservação permanente a ser
recomposta, nas dimensões constantes do artigo 62, da Lei nº 12.651/2012.
Da Compensação Financeira pela Utilização dos Recursos Hídricos. Aduz a apelante que "(...) o Apelado sonegou a informação de que já recebeu da Apelante, desde 1993 até outubro de 2008, a título de Compensação Financeira pela Utilização de Recursos Hídricos referentes à Usina Salto Santiago, o valor total de R$ 13.598.144,60 (doc. 10 na manifestação), e referente à Usina Salto Osório o valor de R$ 3.304.081,18 (doc. 10, na manifestação), informação essa que pode ser confirmada por acesso ao sítio da Aneel..." (fl. 1158) , o que não procede. Isto porque, como bem observado pelo Ministério Público de 1º Grau, mencionada compensação financeira refere-se apenas a compensação de energia elétrica não tendo qualquer relação com os danos ambientais causados, os quais deveriam ter sido reparados pela apelante. Portanto, merece provimento parcial o presente recurso, a fim de que a recomposição dos danos se dê na área de preservação permanente relativa à distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum (art. 62, da Lei nº 12.651/12), no entorno do reservatório Salto Santiago, restringindo-se, apenas, aos limites do município apelado e não a toda a extensão do reservatório, dentro de um prazo de 12 (doze) meses, prazo
dilatado de ofício, tempo que se mostra suficiente para a implementação de projetos de reflorestamento, vez que o prazo de 60 (sessenta) dias fixados em sentença mostra-se por demais exíguo.
Do Apelo e do Agravo Retido interpostos pelo Município de Rio Bonito do Iguaçu.
Tanto o recurso de agravo retido, quanto o recurso de apelação merecem ser conhecidos, no entanto, nego provimento ao agravo retido e dou parcial provimento ao apelo, apenas no tocante à majoração da verba honorária. Passarei a análise conjunta do recurso de agravo retido e do apelo, vez que as matérias deles constantes se confundem. Entende o ente municipal, em suma, que há dados objetivos e aritméticos para o cálculo do custo do reflorestamento, não havendo razão para dizer que o valor da causa seria inestimável, vez que é superior a R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais), o que deve ser levado em conta para a fixação da verba honorária. No entanto, não se pode deixar de considerar que a questão atinente ao valor da causa já foi decidida no Agravo de Instrumento nº 698464-5, de relatoria do Juiz Substituto em 2º Grau Rogério Ribas, conforme assim ementado:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA VISANDO REFLORESTAMENTO NO ENTORNO DE LAGOS DE USINAS HIDRELÉTRICAS. VALOR DA CAUSA. REDUÇÃO PELO JUIZO DE 1º GRAU. PRETENSAO RECURSAL DE REDUÇÃO AINDA MAIOR. IMPOSSIBILIDADE. ESTIMATIVA TOMADA PELO JUÍZO DE ORIGEM QUE BEM ATENDE A `RAZOABILIDADE'. ADEMAIS, NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DO `PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO'. DECISÃO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO." (DJ 26/10/2010) Referido agravo entendeu por bem manter o valor da causa, conforme fixado pelo juízo a quo em ação de impugnação ao valor da causa, em 1.500.000,00 (um milhão e meio de reais) sob o fundamento de que "(...) o valor fixado na decisão agravada está lastreado em um critério objetivo, referente ao custo (estimado) do reflorestamento no entorno dos dois reservatórios. Não se pode dizer que esse custo seja exato, mas é um parâmetro que se situa dentro da razoabilidade, sem dúvida." Ou seja, a questão referente ao valor atribuído à causa já foi devidamente decidida, não cabendo mais discussão a respeito da matéria, tendo em vista a ocorrência de preclusão consumativa, perecendo, assim, o direito do ente municipal de se insurgir contra questão já analisada. A respeito de preclusão consumativa, oportunas as palavras de Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero in "Código de Processo Civil Comentado Artigo por Artigo", RT, 2008, pg. 450, verbis:
"1. Preclusão. A preclusão consiste na perda, extinção ou consumação de uma faculdade processual em face do decurso do tempo (preclusão temporal), da prática de ato incompatível (preclusão lógica) e do efetivo exercício de determinada faculdade processual (preclusão consumativa). Se a parte discute essa ou aquela questão no curso do processo, a decisão a respeito faz precluir a possibilidade de a parte continuar a discutir questão já decidida, se, oportunamente, recorreu da decisão (...)"
Isto porque a decisão que decide a impugnação ao valor da causa é interlocutória, pois versa sobre questão incidente, dessa forma o recurso cabível é o agravo de instrumento, como corretamente interposto pelo Município de Rio Bonito do Iguaçu. Dessa forma, não poderia o apelante ter argüido a matéria novamente em sede de agravo retido, a qual foi reiterada em apelo, tendo em vista o Princípio da Unicidade Recursal, segundo o qual a parte pode opor apenas um recurso contra cada decisão judicial. Sobre esta questão leciona Nelson Nery Júnior em sua obra Princípios Fundamentais - Teoria Geral do Recursos, RT, 5ª ed. 93 p.:
"No sistema do CPC brasileiro vige o princípio da singularidade dos recursos, também denominado de princípio da unirrecorribilidade, ou ainda de princípio da unicidade, segundo o qual, para cada ato judicial recorrível há um único recurso previsto pelo ordenamento, sendo vedada a interposição simultânea ou cumulativa de mais outro visando a impugnação do mesmo ato judicial."
A respeito do tema, também ensina Luiz Orione em sua obra Recursos Cíveis: teoria geral, princípios fundamentais, dos recursos em espécie, tutela de urgência no âmbito recursal, da ordem dos processos no tribunal, Ed. Saraiva, 310 p.:
"Com efeito, tendo a parte autora interposto recurso principal, compete-lhe atacar todos os pontos da sentença que foram contrários aos seus préstimos, sob pena de ocorrência de preclusão consumativa. O ordenamento jurídico brasileiro não permite que a parte utilize de duas vias recursais em momentos diversos para atacar o mesmo pronunciamento judicial. A escolha da apelação principal implica necessariamente a impossibilidade de utilização da apelação adesiva. A apelação adesiva é instituto peculiar ao recorrido da apelação principal; jamais ao recorrente."
Neste sentido, tem-se o entendimento jurisprudencial:
"(...) O SISTEMA RECURSAL BRASILEIRO ASSIMILARA O PRINCÍPIO DA UNIRECORRIBILIDADE, DA UNICIDADE OU DA SINGULARIDADE DO RECURSO, TORNANDO ADMISSÍVEL A INTERPOSIÇÃO DE UM ÚNICO RECURSO EM FACE DA MESMA DECISÃO E OBSTANDO QUE, EXERCITADO O DIREITO AO RECURSO, O RECORRENTE ADITE, RENOVE OU INTERPONHA, AINDA QUE NÃO EXAURIDO O PRAZO RECURSAL E MANIFESTE DESISTÊNCIA QUANTO AO INCONFORMISMO PRIMEIRAMENTE INTERPOSTO, NOVO RECURSO. (...)" (TJDF, APL 285182120068070001 DF, Rel. TEÓFILO CAETANO, 4ª Turma Cível, 07/07/2010, DJ-e Pág. 91)
Dessa forma, improcedente a alegação de que deve ser levado em conta para a fixação da verba honorária o valor da causa relativo a $ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais). Isto porque, o valor atribuído à demanda já foi devidamente decidido em agravo de instrumento interposto em ação de impugnação ao valor da causa, operando-se, portanto, a preclusão consumativa. Aduz, ainda, que tendo em vista que o conteúdo econômico da demanda é muito superior a vinte milhões de reais, este deve ser levado em conta para a fixação da verba honorária, a qual deve se ater ao percentual de 10% (dez por cento) a 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa. Entendo que o apelo merece provimento neste tópico, no entanto, não na proporção sugerida pelo apelante. Conforme disposto no artigo 20, § 4º do Diploma Processual Civil: Art. 20 - "A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios. Essa verba honorária será devida, também, nos caso em que o advogado funcionar em causa própria. (...) § 4º - Nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável, naquelas em que não houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública, e nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas a, b e c do parágrafo anterior".
A respeito de mencionado dispositivo legal, Nelson Nery e Rosa Maria Andrade Nery lecionam: "Os critérios para fixação dos honorários são objetivos e devem ser sopesados pelo juiz na ocasião da fixação dos honorários. A dedicação do advogado, a competência com que conduziu os interesses de seu cliente, o fato de defender seu constituinte em comarca onde não resida, os níveis de honorários na comarca onde se processa a ação, a complexidade da causa, o tempo despendido pelo causídico desde o início até o término da ação, são circunstâncias que devem ser necessariamente levadas em conta pelo juiz quando da fixação dos honorários de advogado. (...) O critério da equidade deve ter em conta o justo não vinculado à legalidade, não significando necessariamente modicidade". ("Código de Processo Civil Comentado" - 4ª edição - p. 435) Logo, a apreciação equitativa dar-se-á por meio da análise dos critérios objetivos fixados no § 3º do art. 20 do Código de Processo Civil, quais sejam, o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. No caso em apreço, o valor dos honorários advocatícios arbitrados em R$ 10.000,00 (dez mil reais), mostra-se desproporcional em relação ao alto valor atribuído a causa R$ 1.500.000,00 (um milhão e meio de reais), bem como no tocante a sua natureza e importância, ainda que não tenha havido maiores intervenções no feito. Tal valor, também não remunera dignamente o ilustre trabalho prestado pelo
Procurador do apelante, ainda mais se levado em conta a complexidade da matéria discutida e a repercussão ensejada, bem como o tempo decorrido para o deslinde do feito. Ademais, é preciso salientar que a verba honorária não pode ser fixada ao ponto de contribuir para o enriquecimento desmedido daquele que a recebe, tendo a função de remunerar dignamente o trabalho do causídico, mas não enriquecê-lo indevidamente. Razão pela qual, entendo que a verba honorária deve ser majorada para o montante de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais) por se mostrar mais proporcional e razoável em relação a todos os fatores acima analisados. Também, não há falar em vinculação da fixação dos honorários aos parâmetros previstos no § 3º do artigo 20, CPC. Isto porque, é perfeitamente admissível a vinculação tão somente aos limites qualitativos impostos por tal artigo, em observância ao Princípio da Equidade. Este é o entendimento jurisprudencial: "PROCESSO CIVIL HONORÁRIOS DE ADVOGADO BASE DE CÁLCULO POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO EM RECURSO ESPECIAL. 1. O STJ não pode alterar o valor dos honorários, fixados em consideração ao que se devolveu no processo, pela impossibilidade de reexaminar fatos em sede de recurso especial - Súmula 7/STJ. (Precedentes AgRg no EResp 685.976/SC, rel. Min. Felix Fischer, Corte Especial) 2. Em especialíssimas situações, a mesma Corte Especial tem afastado a Súmula 7/STJ para alterar, para mais ou para menos, o valor dos honorários, quando evidenciada na tese
abstraída do recurso a condenação ínfima ou exorbitante. (Precedentes AgRg na Pet 4.408/SP, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, Corte Especial; EResp 388.597/SP, rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, Corte Especial) 3. A hipótese antecedente não admite que o STJ exerça juízo de eqüidade em sede de recurso especial, como permitido pelo legislador no art. 20, § 4º, do CPC, levando em consideração as alíneas do § 3º, do mesmo artigo do CPC. 4. A fixação de honorários, com base no art. 20, § 4º, do CPC, não encontra limites nos percentuais mínimo e máximo de que fala o § 3º, art. 20, do CPC, podendo ser superior a 10% (dez por cento). (Precedentes EResp 599.796/DF, rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Seção; EResp 516.621/RN, rel. Min. Gilson Dip, Terceira Seção) 5. Quando os honorários são fixados tomando como parâmetro o juízo de eqüidade do art. 20, § 3º, alíneas "a", "b" e "c", do CPC, pode o julgador estabelecer como base de cálculo o valor da causa , o valor da condenação ou, ainda, arbitrar valor fixo. 6. Recurso especial da empresa improvido, e improvido o recurso adesivo da Fazenda Nacional." (STJ, 2ª Turma, Relª Eliana Calmon, REsp 542249/ SC, DJ 04/12/2006 Por fim, vale dizer que em relação ao quantum fixado a título de honorários em ação envolvendo a empresa Tractebel Energia S/A., e o Município de Porto Barreiro (para a recomposição da mata ciliar no entorno dos Reservatórios de Salto Santiago e Salto Osório) já há precedente desta Corte, de Relatoria do Desembargador Paulo Roberto Hapner (Ap nº 762349-2). Em mencionado recurso a verba honorária também fora fixada em R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), tendo o ora relator presidido o
julgamento ocorrido em 27/09/2011 e acompanhado o voto do Desembargador Paulo Roberto Hapner. Assim, entendo que a verba honorária deve ser majorada para o montante de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), mostrando-se mais condizente com a natureza e importância da causa, o trabalho efetuado e o zelo profissional, o tempo despendido e o local da prestação do serviço. Por derradeiro, o apelante aduz que apelo deve ser provido para que esta Corte "(...) antecipe a tutela no corpo da própria decisão, no sentido de que, se não forem cumpridos os seus termos (da condenação), com efetivo início (e meio, e prosseguimento) do replantio no prazo determinado, será devolvido ao Município, sem prejuízo da multa, o mister e direito de apresentar os projetos, orçamentos e planos para a medida (reflorestamento), pois tem elementos e pessoa técnico para tanto, acrescido de aporte financeiro no valor dos custos já apresentados a serem detalhados oportunamente." (fls. 1234/1235) No entanto, tal argumento não procede. Isto porque, ao contrário do entendimento do apelante fora fixada pela juíza de primeiro grau pena de multa diária por descumprimento no valor de R$ 1.000,00 (um mil reais), com a conversão da obrigação em perdas e danos. Ou seja, tais medidas servem como instrumento de coação para o cumprimento da obrigação de fazer. Ademais, não existem provas constantes dos autos que indiquem que a empresa Tractebel Energia S/A., deixará de cumprir o determinado em sentença ou que tenha
oferecido resistência para o cumprimento da obrigação, não havendo justificativa, portanto, para que seja deferida a tutela nos moldes postulados pelo ente municipal. Portanto, conheço dos recursos de agravo retido e de apelação interpostos pelo ente municipal, sendo que nego provimento ao agravo e dou parcial provimento ao apelo, apenas para que a verba honorária seja majorada. Razão pela qual, em síntese, conheço do recurso de apelação da Tractebel Energia S/A., e lhe dou provimento parcial, a fim de que a recomposição dos danos se dê na área de preservação permanente relativa à distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum (art. 62, da Lei nº 12.651/12), no entorno do reservatório Salto Santiago, restringindo-se, apenas, aos limites do município apelado e não a toda a extensão do reservatório, dentro de um prazo de 12 (doze) meses, prazo dilatado de ofício, tempo que se mostra suficiente para a implementação de projetos de reflorestamento, vez que o prazo de 60 (sessenta) dias fixados em sentença mostra-se por demais exíguo. E, conheço dos recursos de agravo retido e de apelação interpostos pelo ente municipal, sendo que nego provimento ao agravo e dou parcial provimento ao apelo, apenas para que a verba honorária seja majorada. Vencido o Desembargador Paulo Roberto Hapner, que entende pelo provimento do apelo da Tractebel Energia S/A. e reconhece a carência da ação em relação ao Município de Rio Bonito do Iguaçu, com declaração de voto em separado.
III DECISÃO. Diante do exposto, ACORDAM os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por MAIORIA de votos, em conhecer do recurso de apelação da Tractebel Energia S/A. e lhe dar provimento parcial e conhecer dos recursos de agravo retido e de apelação interpostos pelo Município de Rio Bonito do Iguaçu, negar provimento ao agravo e dar provimento parcial ao apelo, nos termos do voto. Vencido o Desembargador Paulo Roberto Hapner, que entende pelo provimento do apelo da Tractebel Energia S/A. e reconhece a carência da ação em relação ao Município de Rio Bonito do Iguaçu, com declaração de voto em separado. Participaram do julgamento os Senhores Desembargadores Paulo Roberto Hapner (presidente, com voto), Luiz Mateus de Lima e Adalberto Jorge Xisto Pereira.
Curitiba, 29 de outubro de 2013.
LUIZ MATEUS DE LIMA Desembargador Relator
PAULO ROBERTO HAPNER Des. Vencido que declara voto em separado.
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