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RECURSO EM SENTIDO ESTRITO N.º 1.114.022-8, DA COMARCA DE CASCAVEL 2ª VARA CRIMINAL RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ RECORRIDO: ELIEZER ROSA DIONATO RELATOR: DES. LAERTES FERREIRA GOMES RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME DE TRÂNSITO. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. ART. 306, CAPUT, C/C §1º, INC. II, DA LEI 9.503/97. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA POR FALTA DE JUSTA CAUSA. ATIPICIDADE DE CONDUTA POR AUSÊNCIA DE INDÍCIOS DE ALTERAÇÃO DA CAPACIDADE PSICOMOTORA. IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL. CABIMENTO. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. DESNECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DE POTENCIALIDADE LESIVA. POSSIBILIDADE DE AFERIÇÃO DO ESTADO DE EMBRIAGUEZ DO AGENTE POR MEIO DE TESTE DE ALCOOLEMIA (ART. 306, § 1º, I, DO CTB) OU DE SINAIS QUE DEMONSTREM ALTERAÇÃO NA CAPACIDADE PSICOMOTORA (ART. 306, § 1º, II, DO CTB), CUJA PROVA PODE SER PRODUZIDA NO DECORRER DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. DECISÃO CASSADA. RECURSO PROVIDO. I A Lei n.º 12.760/12, modificando o artigo 306, da Lei nº 9.503/97, com a inserção do seu §1º, inciso II, permitiu o entendimento de se considerar como despicienda a avaliação técnica de gradação alcóolica por litro de sangue ou por litro de ar alveolar, quando haja recusa do infrator, tornando possível o entendimento acerca da viabilidade da verificação da embriaguez mediante vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito à contraprova, de modo a corroborar a alteração da capacidade psicomotora. II Confirmado o entendimento de se tratar de delito de embriagues ao volante de perigo abstrato, exatamente porque o artigo 306, caput, está ligado ao parágrafo primeiro, incisos I e II, os quais possuem conjunção alternativa entre si, de forma tal que, para a caracterização do crime, o agente deve possuir concentração de álcool superior ao determinado no inciso I ou apresentar sinais de alteração de sua capacidade psicomotora, conforme inciso II do dispositivo legal, tem-se que é possível a prova da alteração da capacidade psicomotora do agente mediante outras provas que não os exames técnicos, não sendo viável a rejeição da denúncia quando não realizados os exames técnicos pertinentes. Precedentes: TJRJ, Apelação Criminal n. 0312580-69.2009.8.19.0001, da Capital, rel. Des. Luiz Zveiter, Primeira Câmara Criminal, j. 16-4-2013; TJSC, Recurso Criminal n. 2013.034356-0, de Chapecó, rel. Des. Marli Mosimann Vargas, j. 30-07-2013. III Por este motivo, tendo os fatos narrados na inicial acontecidos em data posterior à vigência da Lei n.º 12.760/12, e constatado existirem elementos indiciários suficientes para caracterizar, em tese, o crime previsto no art. 306 da Lei nº 9.503/97, deve ser cassada a decisão que recebeu a denúncia acusatória, com a determinação que o feito prossiga em seus ulteriores termos, inclusive com a proposta ao denunciado para usufruir dos institutos despenalizadores. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Recurso em Sentido Estrito n.º 1.114.022-8, da Comarca de Cascavel 2ª Vara Criminal, em que é recorrente MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ e recorrido ELIEZER ROSA DIONATO. O Ministério Público, no uso de suas atribuições legais, ofereceu denúncia em face de ELIEZER ROSA DIONATO, dando-o como incurso nas sanções do artigo 306, caput, c/c §1º, INC. II, da Lei 9.503/97, pela prática, em tese, do seguinte fato delituoso: "No dia 05 de janeiro de 2013, por volta da 02hs 10min, o denunciado ELIEZER ROSA DIONATO, agindo de forma livre e ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, conduzia o veículo VW/GOL, placas AHX-0792, pela Rua Olavo Bilac,
próximo ao numeral 789, nesta cidade e Comarca de Cascavel/PR, com sua capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool, apresentando sinais clínicos perceptíveis de embriagues e de falhas psicofísicas no seu comportamento, como `olhos vermelhos, odor alcóolico, dificuldade no falar e falta de coordenação motora, apresentando- se ainda com `sinais de sonolência, com vestes em desordem, irônico, falante, com dificuldade no equilíbrio e com a fala alterada' (cf. termos de declarações de fls. 09 a 12, certidão de fls. 13 e laudo de constatação de sinais de embriagues de fls. 14). Segundo consta dos autos, na data supra policiais militares abordaram o aludido veículo, quando constataram que o denunciado apresentava indicativos de alteração de sua capacidade psicomotora por ingestão de álcool. Contudo, solicitado a se submeter a teste de alcoolemia (bafômetro), o denunciado injustificadamente se recusou a fazê- lo, mas admitiu aos milicianos que havia ingerido bebida alcoólica (cf. auto de interrogatório de fls. 15/16), pelo que foi lavrado o competente laudo de constatação de sinais de embriaguez (cf. boletim de ocorrência de fls. 05, laudo de constatação de embriaguez de fls. 14, termo de depoimento de fls. 09 e 11)." Após oferecida a denúncia, o MM. Magistrado a quo através da decisão de fls. 72/77, entendeu por bem em rejeitá-la, com fundamento no artigo 395, inciso I, do Código de Processo Penal, e por não preencher os requisitos previstos no art. 41 da mesma legislação. Inconformado, o Ministério Público do Estado do Paraná interpôs Recurso em Sentido Estrito às fls. 81 e 85/91, afirmando que a decisão a quo deve ser reformada, pois há indícios suficientes tanto da materialidade quanto da autoria do delito praticado pelo denunciado. Refutou a conclusão do Magistrado de que a inicial é inepta, afirmando que o tipo legal previsto no art. 306 do Código de Trânsito é de perigo abstrato, e os fatos narrados confiram em tese o crime, cotejando- se o artigo 306 com seu §1º, inciso II, que prevê a constatação da embriagues mediante a concentração de álcool por litro de sangue ou por litro de ar alveolar, ou ainda, por "sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora". Invocou ainda a resolução nº 432 do Contran, em seu artigo 5º, que disciplina o referido inciso, atestando a possibilidade de constatação da
embriagues pelo agente da autoridade de trânsito, desde que haja sinais de alteração da capacidade psicomotora, levando em consideração o conjunto de sinais que comprovem a situação do condutor. Alegou ainda que por se tratar de crime de perigo abstrato é despicienda a demonstração efetiva da potencialidade lesiva de sua conduta, sendo que na situação houve injustificada negativa do recorrido em se submeter ao teste de alcoolemia, mas existindo, contudo, a própria confissão do réu aos militares que efetuaram a prisão em flagrante de que teria o denunciado ingerido bebida alcoólica naquela data. Propugnou assim pelo total provimento do apelo. Foram apresentadas contrarrazões pelo réu às fls. 99/104. Às fls. 105, a decisão foi mantida pelo julgador pelos seus próprios fundamentos. Nesta instância, a douta Procuradoria Geral de Justiça, através do parecer de fls. 113/122, opinou pelo conhecimento e provimento do recurso interposto. É o relatório. Conhece-se do recurso interposto, presentes seus requisitos de admissibilidade. Trata-se de Recurso em Sentido Estrito formulado pelo representante do Ministério Público contra a decisão do MM. Juízo a quo que, nos autos da Ação Penal nº 2013.000056-2, rejeitou a denúncia oferecida pelo órgão ministerial, sob o fundamento de se tratar de peça inepta. O recurso merece provimento. A decisão ora recorrida entendeu pela inépcia da peça acusatória sob a fundamentação de ter-se deixado de narrar situação de perigo concreto decorrente da situação narrada na exordial, não podendo a exordial limitar-se a sustentar que o denunciado conduzia seu veículo automotor com indicativos de que sua capacidade psicomotora estivesse alterada em razão da influencia do álcool, sem
indicação expressa dos percentuais de alcoolemia, o que desconfiguraria o ilícito penal. Pois bem. Não obstante a fundamentação trazida pelo douto Magistrado a quo, em atenta análise dos autos, vislumbra-se que o crime narrado na exordial (acometido em 05/01/2013) ocorreu já na vigência da Lei nº 12.760, de 20 de dezembro de 2012, que incluiu o §1º, inciso II, do artigo 306, da Lei 9.503/97, verbis:
Art. 306. Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência: (Redação dada pela Lei nº 12.760, de 2012). Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. § 1º As condutas previstas no caput serão constatadas por: (Incluído pela Lei nº 12.760, de 2012) I - concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar; ou (Incluído pela Lei nº 12.760, de 2012) II - sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora. (Incluído pela Lei nº 12.760, de 2012) § 2º A verificação do disposto neste artigo poderá ser obtida mediante teste de alcoolemia, exame clínico, perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito à contraprova. (Incluído pela Lei nº 12.760, de 2012) Deste modo, verifica-se que os fatos narrados na exordial ocorreram já na vigência das alterações realizadas no artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, pela Lei nº 12.760, de 20 de dezembro de 2012, sendo que referidas alterações, como se vê do artigo supratranscrito, permitem que haja a comprovação da alcoolemia diante a prática do crime que capitula, por outros meios que não o exame pela concentração de álcool por litro de sangue ou por litro de ar alveolar. Ou seja, permite o artigo 306, §1º, inciso II, da Lei 9.503/97, que haja a comprovação da alcoolemia por meio de "sinais que indiquem, na forma
disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora". E, nos termos da Resolução nº 432 do Contran, em seu artigo 5º, há a possibilidade de constatação da embriagues pelo agente da autoridade de trânsito, em razão de simples sinais de alteração da capacidade psicomotora, devendo ser levado em consideração o conjunto de sinais que comprovem a situação do condutor, como ocorreu no caso dos autos. Assim sendo, no caso em tela, a diligente Promotora de Justiça narrou na exordial os sinais indicativos de alteração da capacidade psicomotora, materializados na palavra dos Policiais Militares (fls. 12/13 e 14/15) e na própria confirmação do recorrido na Delegacia de Polícia de que "havia ingerido bebida alcoólica" (fls. 18/20). Deste modo, o tipo penal previsto no artigo 306 da Lei 9.503/97, a partir da vigência da Lei 12.760, de 20 de dezembro de 2012, passou a não mais ostentar natureza de crime de perigo concreto, mas abstrato, bastando que haja o mero indicativo comprovado da situação de embriagues, pelo que se permite que haja a configuração típica do crime capitulado pela mera presunção de que tal conduta gera um inequívoco risco e abalo ao bem jurídico tutelado, consoante bem delineou o escorreito parecer ministerial, citando a doutrina de Renato Marcão: "(...) Na redação original do Código de Trânsito (Lei 9.503, de 23- 9-1997), para a configuração do crime previsto no art. 306 exigia- se prova da ocorrência de perigo concreto, não sendo suficiente o perigo abstrato. A Lei n. 11.705, de 19-6-2008, deu nova redação ao caput do art. 306 do CTB e deixou de exigir a ocorrência de perigo concreto, sendo certo que as alterações introduzidas com a Lei n. 12.760, de 20-12-2012, não modificaram esta realidade jurídica. Conduzir veículo nas condições do art. 306, caput, do Código de Trânsito Brasileiro, é conduta que, por si, independentemente de qualquer outro acontecimento, gera perigo suficiente ao bem jurídico tutelado, de modo a justificar a imposição de pena criminal. Não se exige um conduzir anormal, manobras perigosas que exponham a dano efetivo a incolumidade de outrem. O crime é de perigo abstrato; presumido.
Necessário observar, por oportuno, que as disposições contidas no § 1º, I e II, do art. 306 não estão a indicar variantes da modalidade típica, mas tão somente formas pelas quais pode ser constatado o delito que está plenamente descrito no caput do mesmo art. 306. Isto está expresso no texto legal. Disso decorre não ser acertado afirmar que o §1º, II, do art. 306, - que se refere à presença de sinais que indiquem alteração da capacidade psicomotora regula hipótese em que se exige prova de perigo concreto para que se tenha por realidade conduta típica. São sinais que indicam a alteração da capacidade psicomotora: andar cambaleante; falta de equilíbrio; voz pastosa ou agressividade associada ao hálito com odor etílico, dentre outros. Para melhor compreensão, imagine-se o seguinte exemplo: o agente não é visto por policiais de transito ou quem quer que seja realizando manobras perigosas com o veículo que conduz, mas ao ser abordado, em razão da embriaguez, sai cambaleando de seu automóvel e mal consegue se expressar logicamente, de modo a evidenciar considerável e perigoso estado etílico. Na hipótese indicada, não nos animamos a sustentar que o delito do art. 306 do CTB não está configurado. É claro que o crime ocorreu e por isso se apresentam inafastáveis as providências de natureza criminal contra seu autor (...)" (MARCÃO, Renato. O art. 306 do Código de Transito Brasileiro conforme a Lei nº 12.760/2012. Jus Navigandi. Teresina, ano 18, n. 3477, 7 jan. 2013: Disponível: ). Ainda seguindo as ponderações do escorreito parecer ministerial, cita-se a doutrina de André Abreu de Oliveira: "(...) Outro aspecto relevante, que não pode ser deixado de lado, diz respeito à verificação da espécie de perigo presente no crime de embriaguez ao volante após a alteração operada por meio da Lei nº 12.760. No texto original do Código de Trânsito Brasileiro, o crime de embriaguez ao volante era um delito de perigo concreto, ou seja, era necessário se provar, no caso concreto, que o condutor havia gerado um perigo real de dano. Isto era comprovado, por exemplo, quando, além de se constatar que o motorista estava sob influência de álcool, ele conduzia o veículo ziguezagueando ou quase causava um atropelamento. Depois da Lei 11.705/2008, a antiga Lei Seca, o delito de embriaguez ao volante passou a ser uma infração penal de perigo abstrato ou presumido. Isto é, não havia mais necessidade de se provar o perigo na situação concreta, pois esse risco era presumido no comportamento do motorista que dirigisse com uma concentração alcoólica de seis ou mais decigramas por litro de sangue.
Atualmente, após a edição da Lei nº 12.760, acreditamos que o delito de embriaguez ao volante continua sendo um crime de perigo abstrato ou presumido. Note-se que, na redação dada pela Nova Lei Seca, em nenhum momento faz-se menção à exigência de demonstração de perigo, como geralmente acontece nos tipos penais de perigo concreto. Todavia, o que ocorreu, a nosso entender, foi uma mudança relativa à própria presunção do perigo existente na nova conduta do crime de embriaguez ao volante. Se antes o legislador havia presumido o perigo à segurança viária tão somente no fato do motorista estar com uma concentração de álcool igual ou superior a seis decigramas por litro de sangue, agora presumiu esse risco no comportamento do condutor que estiver com sua capacidade psicomotora alterada em razão do álcool ou substância de feitos análogos. Desse modo, ao ser selecionado em uma operação de fiscalização de trânsito, por exemplo, o condutor que, mesmo não tendo gerado uma situação concreta de perigo, demonstrar naquele instante uma alteração em sua capacidade psicomotora em virtude do álcool, terá cometido o delito de embriaguez ao volante. (OLIVEIRA, André Abreu. Nova Lei Seca: corrigiu-se afinal os equívocos da lei anterior? Disponível: http://www.ambito- juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=126 62, acesso: 12/12/2013).
Portanto, em atenta análise dos autos, tem-se que o crime previsto no art. 306 da Lei 9.503/97 se trata de um crime de perigo abstrato, e portanto, basta que haja as evidências do cometimento do delito de direção alcoolizada, para se presumir a lesividade ao bem jurídico tutelado, não sendo assim ao contrário da decisão recorrida, necessário a prova do perigo concreto. Pelo contrário, com a Lei 12.760, de 20 de dezembro de 2012, que alterou o art. 306 do Código de Trânsito, incluindo nele o § 1º, inciso II, do referido dispositivo legal, passou-se a exigir para a verificação da situação de embriagues, alternativamente, ou o exame de concentração de álcool por litro de sangue ou por litro de ar alveolar, ou a análise das provas que contenham "sinais" indicativos, na forma disciplinada pelo Contran, de "alteração da capacidade psicomotora", bastando, portanto como no caso, para o recebimento da exordial, que haja provas indiciárias da situação de embriaguez. A propósito, a jurisprudência pátria:
PENAL. HABEAS CORPUS. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. ART. 306 DA LEI N.º 9.503/97. (...). DOSAGEM ALCÓOLICA. AFERIÇÃO. LEI N.º 11.705/08. 3. FATO ANTERIOR À ALTERAÇÃO NORMATIVA CRISTALIZADA NA LEI N.º 12.760/12. 4. SUJEIÇÃO AO BAFÔMETRO. AUSÊNCIA. EXAME DE SANGUE. INEXISTÊNCIA. ÍNDICE APURADO DIANTE DOS SINAIS CLÍNICOS E MANIFESTAÇÕES FÍSICAS E PSÍQUICAS DO AVALIADO. (...) 1. É imperiosa a necessidade de racionalização do emprego do habeas corpus, em prestígio ao âmbito de cognição da garantia constitucional e em louvor à lógica do sistema recursal. In casu, foi impetrada indevidamente a ordem como substitutiva de recurso especial. 2. Com a redação conferida ao artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro pela Lei n.º 11.705/08, tornou-se imperioso, para o reconhecimento de tipicidade do comportamento de embriaguez ao volante, a aferição da concentração de álcool no sangue. 3. A Lei n.º n.º 12.760/12 modificou a norma mencionada, a fim de dispor ser despicienda a avaliação realizada para atestar a gradação alcóolica, acrescentando ser viável a verificação da embriaguez mediante vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito à contraprova, de modo a corroborar a alteração da capacidade psicomotora. (...) (STJ, HC 246553/MT, Rel. Min.(a) MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, 6ª T., julg. em 08/10/2013, DJe 17/10/2013).
RECURSO CRIMINAL. CRIME DE TRÂNSITO. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE (ART 306 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO). REJEIÇÃO DA DENÚNCIA POR FALTA DE JUSTA CAUSA. ATIPICIDADE DE CONDUTA POR AUSÊNCIA DE INDÍCIOS DE ALTERAÇÃO DA CAPACIDADE PSICOMOTORA. IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL. CABIMENTO. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. DESNECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DE POTENCIALIDADE LESIVA. POSSIBILIDADE DE AFERIÇÃO DO ESTADO DE EMBRIAGUEZ DO AGENTE POR MEIO DE TESTE DE ALCOOLEMIA (ART. 306, § 1º, I, DO CTB) OU DE SINAIS QUE DEMONSTREM ALTERAÇÃO NA CAPACIDADE PSICOMOTORA (ART. 306, § 1º, II, DO CTB), CUJA PROVA PODE SER PRODUZIDA NO DECORRER DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. DECISÃO CASSADA. "A Lei 12.760/12 somente confirmou a qualificação do delito como sendo de perigo abstrato, exatamente porque o artigo 306, caput está ligado ao parágrafo primeiro, incisos I e II, os quais possuem conjunção alternativa entre si, de forma tal que, para a caracterização do crime, o
agente deve possuir concentração de álcool superior ao determinado no inciso I ou apresentar sinais de alteração de sua capacidade psicomotora, conforme inciso II do dispositivo legal. A pretensão de exigir-se, para a configuração do delito, a necessária prova da alteração da capacidade psicomotora do agente é ir de encontro a ratio legis que motivou o legislador a excluir da redação original do caput do artigo 306 da lei 9.503/97 a expressão "dano potencial à incolumidade de outrem". O legislador, atento aos inúmeros acidentes de trânsito provocados pela ingestão de bebida alcoólica, entendeu por bem conferir tratamento mais severo, punindo criminalmente a conduta daquele que conduz embriagado veículo automotor, excluindo qualquer menção à exposição a dano. Se o legislador desejasse a efetiva comprovação de perigo, manteria a redação original do artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro" (TJRJ, Apelação Criminal n. 0312580-69.2009.8.19.0001, da Capital, rel. Des. Luiz Zveiter, Primeira Câmara Criminal, j. 16-4-2013). RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Recurso Criminal n. 2013.034356-0, de Chapecó, rel. Des. Marli Mosimann Vargas, j. 30-07-2013). Desta forma, merece ser cassada a decisão proferida, dando provimento ao presente RESE, para que a inicial acusatória seja recebida, com a determinação de se prosseguir o feito em seus ulteriores termos, notadamente com a análise do pedido ministerial feito na cota de fls. 68. Dispositivo. Diante o exposto, vota-se em conhecer e dar provimento ao Recurso em Sentido Estrito, para anular a decisão que rejeitou a denúncia, para que com o recebimento da exordial, determinar o retorno dos autos à origem, no fim de que seja dado prosseguimento ao feito em seus ulteriores termos. ACORDAM os integrantes da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento ao recurso, nos termos do voto.
Presidiu o julgamento o Desembargador José Carlos Dalacqua. Acompanharam o relator o Desembargador José Mauricio Pinto de Almeida e o Juiz Substituto em 2º Grau Marcio José Tokars. Curitiba, 27 de fevereiro de 2014.
DES. LAERTES FERREIRA GOMES Relator LFG/Rc
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