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DOCUMENTO 1
 
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Processo:
1197025-5
(Decisão monocrática)
Segredo de Justiça: Não
Relator(a): Guilherme Luiz Gomes
Desembargador
Órgão Julgador: Órgão Especial
Comarca: Curitiba
Data do Julgamento: Thu Mar 13 16:33:00 BRT 2014
Fonte/Data da Publicação: DJ: 1299 Tue Mar 18 00:00:00 BRT 2014

Decisão Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Decisão monocrática. Eventuais imagens serão suprimidas.

ÓRGÃO ESPECIAL
SUSPENSÃO DE LIMINAR Nº 1197025-5
Requerente: Município de Curitiba.
Interessado: Espólio de Elvira Helena Drulla Brandão Benedito e Luiz Antonio Bittencourt Teixeira e outros.

VISTOS.


1. Trata-se de pedido de suspensão dos efeitos da sentença (suspensão de segurança/ liminar inversa), formulado pelo Município de Curitiba, com fundamento no artigo 4º da Lei nº 8.437/1992 e artigo 12, §1º da Lei 7347/85, contra sentença proferida pela MM. Juiz de Direito Substituto da 1ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Curitiba que, na Ação Civil Pública nº 0000868-91.2013.8.16.0004, julgou a ação improcedente no que se refere às alegações de nulidade da citação ocorrida na ação de execução e de prescrição da pretensão executória; julgou a ação civil pública extinta sem a resolução de seu mérito no que tange às demais alegações veiculadas pelo Município de Curitiba; e revogou a liminar concedida nos autos (p. 201/209).
O Município de Curitiba ajuizou Ação Civil Pública com a finalidade de fazer cumprir a coisa julgada nos autos originários (36.501/97). Alegou que a pretensão é de "evitar o pagamento de precatório indevidamente majorado em aproximadamente R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais), quando o devido importa em R$ 933.486,60 (novecentos e trinta e três mil quatrocentos e oitenta e seis reais e sessenta centavos), os quais já foram pagos em dezembro de 2013; impedir o enriquecimento ilícito dos Requeridos em detrimento do erário; proteger o erário público, especialmente porque as verbas majoradas indevidamente - milhões de reais - têm natureza alimentar, de modo que são irrepetíveis ou de improvável repetição; a verba destinada ao pagamento indevido deixará de ser aplicada em políticas públicas, como saúde, educação, segurança, social, etc."
Ainda que perceba que a análise do mérito é incabível em sede de pedido de suspensão - o mérito será impugnado mediante recurso - diz ser imprescindível a demonstração das ilegalidades ocorridas no processo originário.
Questiona a sentença entender que não era cabível ação civil pública para a defesa do patrimônio público lesado por ato judicial, exceto se presente a querela nullitatis. Traz novamente em pauta que "a citação no processo de execução foi nula; no mandato de citação não constou prazo para defesa; não constou o valor da execução, não constou o nome de todos os credores, mas apenas de quatro; e o ato foi realizado por pessoa que não está investido no cargo de Oficial de Justiça", além de afirmar que sentença determinou a apuração do valor devido mediante liquidação de sentença, fato que não ocorreu. Por fim, reitera que os requeridos descumpriram a coisa julgada porque majoraram indevidamente o valor da execução.
O Município de Curitiba manifesta o cabimento do pedido de suspensão inversa alegando que "o dano decorrente do pagamento do valor controverso, sem trânsito em julgado, impossibilitará a efetivação de políticas públicas, bem como o cumprimento de obrigações já assumidas no âmbito, por exemplo, da saúde e da educação, causando prejuízos à população curitibana, de modo que fica configurada a imprescindibilidade de proteção do interesse público primário e secundário.".
Afirma que o valor devido pelo requerente foi indevidamente majorado, importando em enriquecimento ilícito, por este motivo sendo imperiosa a concessão desta medida a fim de impedir o dano à Fazenda Municipal.
Assevera, ainda, que caso não seja concedida a medida pleiteada, serão causados prejuízos ao interesse público primário e secundário.
Sendo assim requer que seja concedida a medida a fim de obstar o depósito, o pagamento e o levantamento da parcela controvertida referente ao Precatório nº 104.090/2009, expedido nos autos nº 36.501/1997, até o trânsito em julgado, isso porque a manutenção dos efeitos da sentença acarretará graves danos ao erário, às finanças e à ordem pública.
É o relatório.

2. Nos termos do artigo 4º da Lei nº 8.437/92 o Presidente do Tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, pode, para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, suspender a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público.
Eis o teor da mencionada norma legal: "Art. 4° Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, suspender, em despacho fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento do Ministério Público ou da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas".
Assim, vê-se que no exame do pedido de suspensão de liminar, analisa-se, do ponto de vista jurídico, a capacidade que a decisão atacada possui de causar lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, e não seu desacerto.
Nesse sentido é a lição de Marcelo Abelha Rodrigues:
"... o mérito do instituto, qual seja, o seu objeto de julgamento, não coincide com o da causa principal, não sendo lícito, pois, que o órgão jurisdicional competente para apreciar o instituo em tela possa pretender funcionar como órgão de duplo grau de jurisdição para reformar a decisão recorrida. (...) O que justifica, pois, a suspensão da execução da decisão não é a sua antijuridicidade (da decisão), ainda que tal possa ocorrer, porque, repito e repiso, o objeto de julgamento desse incidente é a verificação se há o risco potencial de grave lesão entre a decisão proferida e os interesses públicos tutelados pelo incidente." (Ed. RT, 2005, págs. 168/169).

Esse entendimento também é adotado pelo Supremo Tribunal Federal, para o qual "na suspensão de segurança não se aprecia, em princípio, o mérito do processo principal, mas tão-somente a ocorrência dos aspectos relacionados à potencialidade lesiva do ato decisório em face dos interesses públicos relevantes consagrados em lei, quais sejam, a ordem, a saúde, a segurança e a economia públicas". (SS nº 3.273 AgR - Rel. Min. Ellen Gracie - Pleno - DJe-112, de 19.06.08).
Portanto, no presente pedido será examinado se a manutenção dos efeitos da decisão liminar exarada nos autos de Ação Civil Pública nº 0000868-91.2013.8.16.0004 tem o condão violar o interesse público ou de causar lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas.
O Município de Curitiba ingressou com Ação Civil Pública com pedido de deferimento de tutela antecipada em face de servidores públicos municipais, requerendo, liminarmente: a) suspensão da execução e do precatório expedido, paralisando-se o pagamento dos valores pretendidos pelos réus, para que não sejam pagos até decisão definitiva da ação civil pública; b) seja determinado aos réus a obrigação de não fazer, ou seja, não receber nem levantar nenhum valor, em decorrência da execução nos autos 36.501/1997, até julgamento final da ação civil pública, sob pena de pagamento de multa diária.
A execução que o Município pretende suspender decorreu da Ação Declaratória nº 36.501/97 interposta pelos servidores públicos municipais contra o Município de Curitiba.
Esta ação declaratória foi julgada procedente (p. 22/27) para o fim de: a) declarar a vigência da Lei Municipal nº 6946/86; b) reconhecer, face a vigência da lei municipal nº 6946/86, o direito dos autores à jornada de 20 (vinte) horas semanais; c) condenar o Município ao pagamento em favor dos autores das horas extras laboradas excedentes a vinte horas semanais; d) condenar o Município ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. Esta decisão foi mantida em sede de reexame necessário (p. 38/46).
Julgada procedente a Ação Declaratória, os servidores promoveram execução por quantia certa em face do Município de Curitiba. A execução resultou na expedição de precatório requisitório de natureza alimentar nº 104.090/09 contra o Município no valor de R$ 15.821.828,20 (quinze milhões, oitocentos e vinte e um mil, oitocentos e vinte e oito reais e vinte centavos), conforme informado às fls. 59.
A Ação Civil Pública arguiu a nulidade do processo de execução nos autos de nº 36.501/2007 sob os seguintes fundamentos: a) nulidade absoluta da citação da execução; b) prescrição intercorrente da execução; c) nulidade da liquidação de sentença; d) nulidades absolutas da conta de execução dos requeridos; e) relativização da coisa julgada, com efeitos rescisórios e anulatórios da conta executiva dos requeridos.
O pedido liminar formulado na inicial da Ação Civil Pública foi parcialmente deferido em primeiro grau, para o fim de impedir que os réus, antes do trânsito em julgado da demanda, efetuassem o levantamento de valores decorrentes do precatório requisitório expedido nos autos nº 36.501/1997, com exceção dos valores incontroversos apontados pelo próprio Município de Curitiba (p. 201/209).
O Município, em face desta decisão liminar, interpôs Agravo de Instrumento nº 1.049.028-7 no qual foi deferido pedido de reconsideração formulado pelo ente público para conceder o efeito suspensivo ativo nos seguintes termos: "estender a suspensão realizada pelo Magistrado a quo, deferindo o efeito suspensivo parcial postulado pelo agravante para impedir o depósito e levantamento do valor controverso, excepcionando-se o valor incontestável (RS 844.322,00), depósito do qual não se opõe o Município". Em sede de agravo de instrumento foi cassada a decisão que determinou o depósito integral da verba referente ao precatório (fls. 210/211).
Foi proferida sentença na referida Ação Civil Pública, do dispositivo constou:

"Ante o exposto:
a) com fulcro no art. 269, I, do Código de Processo Civil, julgo a presente ação civil pública improcedente no que se refere às alegações de nulidade da citação ocorrida na ação de execução e de prescrição da pretensão executória;
b) com fulcro nos arts. 267, VI, do Código de Processo Civil, julgo a presente ação civil pública extinta sem a resolução de seu mérito no que tange às demais alegações veiculadas pelo Município de Curitiba;
c) revogo a liminar concedida nestes autos.
Não vislumbrando a existência de má-fé do Município de Curitiba, deixo de condená-lo ao pagamento das verbas de sucumbência, conforme previsão do art. 18 da Lei n.º 7.347/1985.
Comunique-se o Exmo. Sr. Desembargador Relator dos recursos de agravo de instrumento n.º 1.049.028-7 e 1.076.218-8 acerca da prolação desta sentença, instruindo-se o ofício com uma cópia." (fls. 212/218)

A pretensão do Município de Curitiba, no presente pedido de suspensão dos efeitos da sentença, é de obstar o depósito, o pagamento e o levantamento da parcela controvertida referente ao Precatório nº 104.090/2009, expedido nos autos nº 36.501/1997, pelos servidores, até o trânsito em julgado da Ação Civil Pública. Ou seja, requer a suspensão dos efeitos da sentença, mantendo-se os efeitos da liminar inicialmente deferida e estendida em sede de agravo de instrumento.
Para valorar a possibilidade de deferimento do pleito de suspensão, incumbe a valoração da potencialidade da decisão proferida causar lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. A decisão proferida em pedido de suspensão de liminar não tem o intuito de solucionar o mérito da lide, o acerto ou desacerto da decisão, mas, está restrita as hipóteses do art. 4º da Lei nº 8.437/1992 e artigo 12, §1º da Lei 7347/85.
Diante disso, o objeto de analise deste pedido limita-se a apreciar se eventual ordem de depósito e levantamento de valores controvertidos implicarão em violação ao interesse público, lesão à ordem ou à economia pública. Para isso, necessário se faz analisar a existência de indícios de nulidade na execução, ou seja, a plausibilidade da tese de que são ilegítimos os valores devidos e a temeridade de levantamento de elevada quantia dos cofres públicos.
A sentença proferida na Ação civil Pública tem potencialidade para causar dano ao interesse público e à economia municipal, caso, ao final, seja proferida decisão com trânsito em julgado, no sentido de reformar a decisão de primeiro grau.
No caso, identificam-se os requisitos autorizadores da concessão de suspensão. Primeiro porque a execução do julgado questionado pode resultar em prejuízo ao erário, ou seja, lesão à ordem econômica.
A não suspensão da decisão acarretará o levantamento de valores decorrentes de precatório requisitório de natureza alimentar, caso reconhecido que parte desses valores não são devidos, a repetição dos valores indevidamente levantados será de impossível concretização.
A não repetição dos valores, caso reconhecida a ilegitimidade, resultará em lesão aos cofres públicos. O que, consequentemente, irá ferir o interesse público.
Ainda que não seja possível inferirem-se quais serviços serão prejudicados, de que forma efetivamente a não suspensão da repercutirá na proteção assegurada à saúde, à segurança, à ordem ou à economia públicas, certamente o prejuízo ocorrerá.
A doutrina aceita o cabimento da medida excepcional de suspensão para proteção de interesses que não estejam especificamente descritos no artigo 4º da Lei 8437/92, mas que estejam relacionados à proteção do interesse público primário.
O prejuízo aos cofres públicos decorrente da possibilidade de levantamento de valores ilegítimos e risco de não repetição destes valores não atinge exclusivamente o interesse público secundário, que representa o interesse patrimonial do Estado como pessoa jurídica, este interesse não goza de supremacia em face do interesse particular.
O risco de dano ao erário público atinge efetivamente o interesse público primário, porque implicará em restrições na realização de políticas públicas e investimentos que interessam à coletividade.
Nesse sentido é a lição de Elton Venturi:

"Sendo correto concluir-se que o objetivo dos dispositivos normativos reguladores dos pedidos de suspensão diz respeito à tutela do interesse público primário lato senso, a alusão aos valores sociais expressamente mencionados pela legislação constitui mera exemplificação que não pode e nem deve ser manejada com o intuito de restringir a atuação da medida excepcional, desde que, reitere-se, deduzida com a estrita observância do devido processo legal.
Muito embora no mais das vezes as situações amparadas pelos pedidos de suspensão sejam referíveis ou correlacionadas à lesão de interesses atrelados a algum daqueles expressamente previstos, não nos parece razoável excluir-se outros que se identifiquem com um conceito necessariamente flexível e legítimo de interesse público" (VENTURI, Elton. Suspensão de Liminares de sentenças contrárias ao Poder Público. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. P. 128)

Consiste em princípio basilar do Direito Administrativo o princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado. Este princípio é inerente à organização da sociedade e rege os atos da administração pública. Assim leciona Celso Antônio Bandeira de Mello:

"Significa que o Poder Público se encontra em situação de autoridade, de comando, relativamente aos particulares, como indispensável condição para gerir os interesses públicos postos em confronto. Compreende, em face de sua desigualdade, a possibilidade, em favor da Administração, de constituir os privados em obrigações por meio de ato unilateral daquela. Implica, outrossim, muitas vezes, o direito de modificar, também unilateralmente, relações já estabelecidas." (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. CURSO DE DIREITO ADMINISTRATIVO. 25ª edição. Malheiros Editores. 2007. P. 96)

O princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado é prerrogativa atribuída ao Poder Público e orienta a sua atuação na concretização do bem comum. Ou seja, é dever-poder que serve ao desempenho da função administrativa.
Nesse sentido completa o referido doutrinador:

"Ora, a Administração Pública está, por lei, adstrita ao cumprimento de certas finalidades, sendo-lhe obrigatório objetivá-las para colimar interesse de outrem: o da coletividade. É em nome do interesse público - o do corpo social - que tem de agir, fazendo-o na conformidade da intentio legis. Portanto, exerce "função", instituto - como visto - que se traduz na ideia de indeclinável atrelamento a um fim preestabelecido e que deve ser atendido para o benefício de um terceiro. É situação oposta à da autoridade da vontade, típica do Direito Privado. De regra, neste último alguém busca, em proveito próprio, os interesses que lhe apetecem, fazendo-o, pois, com plena liberdade, contanto que não viole alguma lei." (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. CURSO DE DIREITO ADMINISTRATIVO. 25ª edição. Malheiros Editores. 2007. P. 98)

Também tem relevância na análise do pedido do Município de Curitiba a plausibilidade da tese exarada na Ação Civil Pública que pretende o reconhecimento da nulidade da execução. Sobre isso se admite em sede de pedido de suspensão a cognição sumária do mérito para valorar a temeridade do deposito e levantamento de valor controverso antes do trânsito em julgado da Ação Civil Pública.
Colaciono as razões da decisão do Desembargador Paulo Habith que deferiu o efeito suspensivo ativo no Agravo de Instrumento nº 1.049.028-7. Adoto-as como razões de decidir, porque demonstram, em juízo sumário de cognição, a plausibilidade da tese que embasou a Ação Civil Pública:

"1. Trata-se de pedido de reconsideração formulado pelo agravante, Município de Curitiba, em face da decisão (fls. 1586/1590) proferida pela ilustre juíza substituta em 2º grau Denise Hammerschmidt, que deixou de atribuir o efeito suspensivo ativo postulado.
2. Frente as ponderações trazidas pelo agravante, entendo que o pedido de reconsideração merece prosperar.
Isso porque, dentre os fatos narrados e da análise da documentação colacionada nos autos, verifica-se a possibilidade de risco de lesão grave e de difícil reparação que poderão experimentar os cidadãos curitibanos pelo congelamento de valor exorbitante a ser depositado judicialmente (valor original de R$15.821.828,00).
Explico. A decisão bem lançada, mas ora agravada, admitiu a possibilidade da existência de excesso de execução nos cálculos da liquidação realizada pelos agravados. Deste modo, concedeu liminar para que a parte controvertida do valor do precatório não seja levantada pelos agravados até o trânsito em julgado da presente Ação Civil Pública, resguardando, ao menos parcialmente, o patrimônio público e evitando o dano imediato de levantamento total do precatório, inquinado de nulo na mencionada ação civil.
Com o presente recurso, a Municipalidade almeja a dispensa de realizar o depósito em juízo do valor controvertido, até o trânsito em julgado da ação. Para tanto, aduz que o valor em excesso, aproximadamente R$ 15.000.000,00, é demasiadamente expressivo, importando em gravame ao erário público, impedindo a destinação a outras finalidades sociais e públicas.
Pois bem. A fundamentação apresentada contém o caráter relevante que exige o art. 558 do Código de Processo Civil, sendo possível a concessão do efeito suspensivo parcial pleiteado pelo agravante.
Ainda que a Ação Civil Pública tenha sido interposta pela inércia da Municipalidade, certo é que a coletividade não deve sofrer por falta de investimento em diversas obras ou serviços com a expedição de um precatório que, prima facie, não guarda correlação com a coisa julgada, na medida em que apresentam fortes indícios de excesso de execução.
Há que se deduzir que a parte controvertida, se não teve sua origem em nulidade, pode decorrer de erro material, pois os créditos trabalhistas reclamados não seriam jamais de tal monta, merecendo a apuração correta.
A municipalidade, por seu turno, tem condições de a qualquer tempo realizar o deposito sem prejudicar sua finalidade pública, podendo ser intimada para tanto. Exceto a parte incontroversa que deverá depositar, de imediato.
De outro lado, leva-se em conta ainda que ao Poder Judiciário não cabe, frente a razoável dúvida, garantir pleito, embora legal, mas imoral.
Portanto, outro não pode ser o entendimento deste Relator senão por estender a suspensão realizada pelo magistrado a quo, deferindo o efeito suspensivo parcial postulado pelo agravante para impedir o deposito e levantamento do valor controverso, excepcionando-se o valor incontestável (R$: 844.322,00), deposito do qual não se opõe a Municipalidade.
Estando presentes os pressupostos necessários e indispensáveis para a concessão do efeito suspensivo, acolho o presente pedido de reconsideração.
3. Face o exposto, defiro o efeito suspensivo ativo, de modo parcial, como acima, cassando a decisão que determinou o deposito integral da verba referente ao precatório."

Ainda que a sentença possa ser impugnada por meio de recurso de apelação, que, nos termos do artigo 520, do Código de Processo Civil, será recebido nos efeitos devolutivo e suspensivo, salvo nos casos expressamente previstos em lei, quando será recebida apenas no efeito devolutivo, não é possível afastar o interesse processual do pedido de suspensão.
A possibilidade de interposição de recurso com efeito suspensivo não impede o pleito de suspensão. Colha-se lição da doutrina:
"...o recurso e o incidente de suspensão de execução de decisão são figuras distintas, já que o primeiro visa à reforma da decisão sob alegação de sua injuridicidade, enquanto que o segundo mantém intocável a decisão, incidindo apenas sobre a sua eficácia, sob a alegação e que, se for executada, a decisão causará dano irreparável ao interesse público." (RODRIGUES, Marcelo Abelha. Suspensão de segurança: sustação da eficácia de decisão judicial proferida contra o Poder público. 3ª Ed. RT, 2010, p. 218).

Ainda que a parte não opte por interpor recurso voluntário, a sentença proferida contra a Fazenda Pública está sujeita ao reexame necessário, assim sendo, não produz efeito senão depois de confirmada pelo juízo ad quem. Na inexistência de interposição de recurso voluntário, o juiz procederá à remessa dos autos ao Tribunal ou este poderá avocá-los.
Nem mesmo a suspensão da eficácia pela necessidade de submissão da sentença ao duplo grau de jurisdição impede o ente público de pleitear a suspensão prevista nos artigo 4º da Lei nº 8.437/1992 e artigo 12, §1º da Lei 7347/85. É neste sentido o posicionamento da doutrina:

"Assim considerando, o fato de as sentenças proferidas contra a Fazenda Pública serem obrigatoriamente submetidas ao duplo grau de jurisdição não implica nem garante sua ineficácia absoluta enquanto não revistas pelo órgão ad quem. Relembre-se, ainda, a viabilidade da obtenção de eventual antecipação dos efeitos da tutela no âmbito das ações deduzidas contra o Poder Público (vide infra), hipótese em que seria plenamente cabível o pedido de suspensão, desde que dentro das condições ora propostas.
Ressalte-se, por fim, que em termos práticos, a consecução da sustação excepcional da liminar ou da sentença através do pedido de suspensão demonstra-se mais vantajosa ao Poder Público na medida em que pode imunizar a eficácia do provimento judicial até o julgamento final do feito, o que não ocorre nem com o chamado efeito suspensivo recursal, nem através do reexame oficial.
Por todos esses motivos é plenamente viável a caracterização de interesse processual na dedução do incidente de suspensão, ainda que em prol da Fazenda Pública subsistam as hipóteses legais impondo a remessa necessária." (VENTURI, Elton. Suspensão de Liminares de sentenças contrárias ao Poder Público. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. P. 113/114)

Em situação análoga, o Supremo Tribunal Federal já se manifestou:

EMENTA: Agravo Regimental em Suspensão de Liminar. Decisão agravada que constatou à época grave lesão à ordem e à economia públicas, diante da temeridade de levantamento de vultosa quantia dos cofres públicos e da plausibilidade da tese de esse valor ser indevido. Pedido de reforma e de restauração dos efeitos da decisão do TRF da 4ª região, nos autos de agravo de instrumento em ação civil pública, que permitiu o levantamento de 50% dos valores de precatórios antes suspensos, decorrentes de condenação da União ao pagamento de indenização de 200.000 pinheiros adultos. Processo principal que discute a possibilidade de relativização da coisa julgada. Surgimento de fato novo. Superveniência de sentença em ação civil pública que mantém a condenação (coisa julgada) em todos seus termos, à exceção do quantum debeatur. Necessidade de nova perícia. Novo contexto fático-jurídico. Constatação da potencialidade de ocorrência de dano inverso, em termos de economia pública e de segurança jurídica, caso não se pague qualquer valor devido aos agravantes. Reforma parcial da decisão agravada para estabelecer uma fórmula judicial provisória apta a proteger o Erário e a limitar o pagamento dos precatórios, em montante que assegure aos agravantes os efeitos da coisa julgada nos limites explicitados nos autos do processo originário. Autorização do levantamento parcial, via precatório, dos valores devidos aos agravantes, a título de parte incontroversa, a qual deverá ser fixada pelo juízo de primeiro grau, devendo o montante liberado (1) não ser superior ao percentual de 50% (cinquenta por cento) do valor total do precatório antes suspenso (nos termos em que decidiu o TRF da 4ª Região) e (2) ser calculado com a inclusão dos valores já pagos. Determinação ao juízo de primeiro grau de imediata realização de perícia judicial, caso seja necessária ao cumprimento da autorização condicionada estabelecida nesta decisão. Extensão dos efeitos desta decisão às suspensões acolhidas pelo mesmo fundamento por anterior pedido de extensão. Agravo Regimental parcialmente procedente.

(SL 172 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 18/12/2009, DJe-045 DIVULG 11-03-2010 PUBLIC 12-03-2010 EMENT VOL-02393-01 PP-00033 RTJ VOL-00216- PP-00156)

Da sentença proferida em primeiro grau nos autos de Ação Civil Pública constou que a Ação Civil Pública apenas seria a ação adequada para defesa do patrimônio público lesado por ato judicial quando limitada a veiculação de pretensão de querela nullitatis.
Entendeu o Magistrado a quo que "a ação civil pública não se presta para declaração de nulidade de qualquer ato judicial, relativizando completamente a coisa julgada e afastando a segurança jurídica, mas apenas para o reconhecimento de nulidade absoluta insanável, entendida esta como sendo aquela que decorre da ausência de pressuposto processual de existência da relação processual".
Sob este fundamento apenas conheceu a Ação Civil Pública no que diz respeito à arguição de nulidade da citação na ação de execução de sentença e quanto à alegação de prescrição da pretensão executória, porque são matérias de ordem pública cognoscíveis a qualquer tempo e grau de jurisdição. Com relação a estes pleitos, julgou a demanda improcedente, com fulcro no artigo 269, I do Código de Processo Civil.
Com relação às demais arguições deduzidas na inicial da Ação Civil Pública, aquelas relativas a nulidades existentes na execução capazes de ensejar excesso de execução, entendeu que, por não configurarem nulidades absolutas insanáveis, não merecem ser conhecidas. Nesta parte julgou a Ação Civil Pública extinta sem resolução do mérito, com fulcro no artigo 267, VI do Código de Processo Civil.
A sentença postulou, de forma alternativa, que, mesmo considerando a possibilidade de opor matérias que extrapolam os limites da querela nullitatis por meio de Ação Civil Pública, não seria possível alegar excesso de execução por não se tratar de matéria de ordem pública, portanto, sujeita a preclusão.
Nesses termos foi proferida a sentença:

"As demais não se configuram em nulidades absolutas insanáveis e, portanto, são matérias estranhas à ação civil pública em que se almeja a declaração de nulidade de ato judicial eventualmente lesivo ao patrimônio público (consigne-se, ademais, que a simples leitura da petição inicial evidencia que, embora nominada de ação civil pública, a demanda proposta se trata de verdadeira ação de embargos à execução, haja vista as matérias nela veiculadas, ação esta que o Município de Curitiba, no momento processual oportuno, não opôs).
(...)
Deste modo, todas as demais alegações do Município de Curitiba, as quais veiculam, na verdade, o reconhecimento de excesso de execução, deveriam ter sido levantadas por meio da ação autônoma de impugnação de que dispunha, qual seja, a de embargos à execução (e não em ação civil pública, instrumento processual que, ademais, não visa substituir outra ação judicial cujo prazo de ajuizamento foi perdido).
Como não o fez e não se trata de matéria de ordem pública - até porque a leitura atenta dos pedidos do Município de Curitiba denota que os supostos erros no cálculo dos autores não se tratam de meros erros materiais, os quais são passíveis de correção -, operou-se a preclusão."

A doutrina admite que a impugnação de decisão judicial se realize, especialmente, pela via recursal, quando anterior ao trânsito em julgado da ação, e por meio de ação rescisória, que desconstitui a coisa julgada material.
É possível também, após o trânsito em julgado, arguir vícios de nulidade absoluta por meio da querela nullitatis que consiste em ação de arguição de nulidade que tem cabimento mais restrito que a ação rescisória, disciplinada no artigo 485, do Código de Processo Civil, é imprescritível e oposta com a finalidade de invalidar a sentença por vício de nulidade absoluta.
Sendo a Ação Civil Pública ação constitutiva-declaratória, admite-se, diante dos fundamentos arguidos na inicial, em um juízo de cognição não exauriente, que é possível que esta ação faça às vezes da querela nullitatis. Podendo, inclusive substituir a querela nullitatis, ou seja, a Ação Civil Pública pode ser utilizada como ação ordinária declaratória de nulidade absoluta da sentença.
No caso em questão discute-se a validade de citação no âmbito da Administração Pública. O meio para se discutir este vício é a ação ordinária. Neste sentido é o entendimento da jurisprudência:

"A falta de citação compromete a sentença, que por isso não transita em julgado, devendo o vício ser atacado por ação ordinária" (STJ-3ªT., REsp 649.618, Min. Menezes Direito, j. 16.11.06, DJU 19.3.07) No mesmo sentido: STF-Pleno: RTJ 107/778, STF-RT 588/245 e STF-RAMPR 44/131, sempre o mesmo acórdão; RTJ 110/210; RSTJ 8/231, 89/247, 169/352; STJ-RT 819/178; STJ-Bol. AASP 2.076/737J; RT 636/69; JTJ 172/266; JTA 106/87, três votos a dois; JTAERGS 78/106, citação da p. 108; Lex-JTA 142/364. (Código de Processo Civil e legislação processual em vigor/ Theotonio Negrão, José Roberto F. Gouvêa, Luis Guilherme A. Bondioli, João Francisco N. da Fonseca. 45. ed. Ver. E atual. São Paulo: Saraiva,2013)

Sendo a Ação Civil Pública uma ação ordinária, é grande a viabilidade desta no caso em pauta para abrir a discussão sobre a validade da citação, bem como outras nulidades absolutas no processo de execução que, se comprovada ocorrência destas, será reconhecida a expedição de precatório em valor que excede aos limites da coisa julgada.
A possibilidade de que em instância recursal seja revisto o julgamento de improcedência do pleito com relação à arguição de nulidade da citação realizada na execução implicará em nulidade de todo o processo de execução. Essa possibilidade se configura como indício da temeridade decorrente da ordem de depósito e levantamento de valores controvertidos.
Também se vislumbra a possibilidade de que em sede recursal ou no reexame necessário do feito sejam conhecidas as arguições de nulidade no processo de execução e, consequentemente, julgado o mérito da demanda.
Ainda que não se possa, neste incidente processual, considerar se as nulidades que repercutem no montante da condenação existem ou não, reconhece-se a plausibilidade da tese e a possibilidade de reforma da sentença.
Por isso, necessária se faz a medida de suspensão da sentença para evitar que em caso de reforma, a decisão não produza seus efeitos em razão da impossibilidade de repetição dos valores controvertidos indevidamente depositados e levantados. E, consequentemente, reverterá em
Inclusive o Superior Tribunal de Justiça já admitiu que a inviabilidade da coisa julgada contrária à Constituição pode ser reconhecida a qualquer tempo e por qualquer meio processual, confira-se:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE SENTENÇA. DECLARAÇÃO INCIDENTAL DE INCONSTITUCIONALIDADE DA NORMA QUE EMBASOU O TÍTULO JUDICIAL. POSSIBILIDADE.
1. Tendo o Estado perdido o prazo para apresentar os embargos à execução, ingressou, posteriormente, com pedido de declaração de inconstitucionalidade incidental da Lei Estadual n. 3.935/87, que instituiu a trimestralidade discutida na demanda.
2. Cândido Rangel Dinamarco, ao debater o reconhecimento da ineficácia ou invalidade da coisa julgada formada contra Constituição, defende que ela está sujeita a ser reconhecida a qualquer tempo e por qualquer meio processual ao alcance da parte, inclusive por meio da querela nullitatis, ou seja, a "ação declaratória de nulidade absoluta é insanável da sentença" (in Relativizar a Coisa Julgada, Meio jurídico, n. 43, março de 2001 e n. 44, abril de 2001).
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 886.535/ES, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 10/09/2013, DJe 30/09/2013)

Em face do exposto, em virtude da supremacia do interesse público, faz-se necessária a suspensão dos efeitos da liminar deferida, nos termos requeridos pelo Município de Curitiba.
Isso posto:

I. Defiro o pedido de suspensão da sentença proferida na Ação Civil Pública nº 0000868-91.2013.8.16.0004, em trâmite na 1ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Curitiba. Reestabelecendo os efeitos da liminar deferida em sede de Agravo de Instrumento nº 1.049.028-7.
II. Dê-se imediato conhecimento desta decisão àquele Juízo.
Intimem-se.

Curitiba, 12 de março de 2014.


Des. Guilherme Luiz Gomes
Presidente do Tribunal de Justiça