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DOCUMENTO 1
 
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Processo:
1243177-5
(Decisão monocrática)
Segredo de Justiça: Não
Relator(a): Fabian Schweitzer
Desembargador
Órgão Julgador: 17ª Câmara Cível
Comarca: Região Metropolitana de Londrina - Foro Central de Londrina
Data do Julgamento: Thu Jul 31 14:54:00 BRT 2014
Fonte/Data da Publicação: DJ: 1386 Wed Aug 06 00:00:00 BRT 2014

Decisão Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Decisão monocrática. Eventuais imagens serão suprimidas.Recomenda-se acessar o PDF assinado.

AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA FIDUCIÁRIA - INSTRUÇÃO PROBATÓRIA - PROVA PERICIAL DETERMINADA PELO JUIZ A QUO - POSSIBILIDADE - PODER INSTRUTÓRIO DO JULGADOR (ART. 130, CPC) - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - CABIMENTO - VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES - HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA E TÉCNICA DO CONSUMIDOR CARACTERIZADA - DECISÃO A QUO MANTIDA - RECURSO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO - PRECEDENTES DA CÂMARA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento n.º 1.243.177-5 2E DO STJ - DECISÃO MONOCRÁTICA DO RELATOR (ART. 557, CAPUT, DO CPC).
VISTOS, estes autos de Agravo de Instrumento nº.
1.243.177-5, da 9ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Londrina, em que é agravante BV FINANCEIRA S.A. - C.
F. I., e agravado JOSE ALVES BATISTA.
I - RELATÓRIO:
1. Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por BV FINANCEIRA S.A. - C. F. I., contra decisão interlocutória proferida em audiência de conciliação (fls. 25/26-TJ), autos de Ação de Revisão de Contrato Bancário, sob o nº 0019213-41.2014.8.16.0014, que determinou a inversão do ônus da prova e deferiu a produção da prova pericial, imputando ao réu o pagamento das custas do contador judicial.
Inconformado, recorre o réu alegando, em síntese, que a simples condição de hipossuficiência não autoriza a inversão do ônus da prova e, da mesma forma, a verossimilhança não se resume a uma mera plausibilidade de direito, mas a evidencia desse direito.
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Salienta que a perícia foi requerida somente pelo Agravado e não pelo Agravante, descabendo assim, qualquer determinação judicial condenando o agravante ao pagamento dos honorários advocatícios.
Aduz que a prova pericial nos autos é desnecessária tendo em vista que o objeto do feito é a análise da legalidade das cláusulas contratuais, sendo que esta somente teria utilidade para protelar o feito.
Ao final, requereu efeito suspensivo ao presente recurso e a procedência do feito para que se determine a revogação imediata da pericia, assim como do ônus da prova, aduzindo estarem presentes os requisitos legais autorizadores.
É, em síntese, o relatório.
II - DECIDO.
2. De plano passo a julgar o presente recurso, nos termos do artigo 557, caput, do Código de Processo Civil, vez que a pretensão do agravante está em manifesto confronto com jurisprudência dominante deste Egrégio Tribunal de Justiça, bem como da Corte Superior.
3. Insurge-se o banco recorrente contra decisão que, diante da aplicabilidade das normas consumeristas à relação sub judice, PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento n.º 1.243.177-5 4
deferiu a inversão do ônus da prova e determinou a produção de prova pericial nos autos, incumbindo ao réu o seu pagamento.
3.1. Primeiramente, quanto à instrução probatória, muito embora a argumentação do recorrente no sentido de que a matéria sub judice é eminentemente de direito, o que dispensaria a prova técnica, entendo que o recurso não merece prosperar.
É certo que esta Corte possui entendimento firme no sentido de que o julgamento antecipado da lide em casos idênticos ao presente - de revisão de contrato de financiamento - não acarreta, necessariamente, cerceamento de defesa, pois a prova específica não seria indispensável à análise dos pedidos do autor1. Referido entendimento é partilhado, inclusive, por este relator2.
Não obstante, tal posição não autorizaria lógica inversa, ou seja, de que por não causar cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide sem maior instrução da causa, por se tratar de matéria de direito, consequentemente estaria então o Magistrado a quo impedido de
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autorizar a realização da prova pericial em determinados casos específicos, ainda que análogos.
A regra que se extrai do art. 130 do Código de Processo Civil não é somente aquela que autoriza o juiz - por ser o destinatário legal da prova - a indeferir as provas inúteis ou meramente protelatórias, mas também, e mais importante que a primeira, é aquela que estabelece o poder instrutório do julgador sobre a demanda, na medida em que pode até mesmo determinar de ofício3 a produção da prova entendida como necessária ao seu convencimento.
A lógica, portanto, é a de que sendo-lhe livre o convencimento e a apreciação da prova, consequentemente deve ser-lhe livre também a escolha dos meios sobre os quais se realizará a sua apreciação e o seu julgamento.
Em casos tais, a intervenção do Tribunal somente se autoriza nas hipóteses de comprovada má condução do processo ou inversão tumultuária, o que evidentemente não é o caso.
Assim, por ser a decisão sobre a necessidade ou não da instrução processual uma faculdade do julgador - pois é ao seu íntimo
3 Art. 130. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias.
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convencimento que se dirige -, a ele é que caberá, portanto, ponderar se nos autos há elementos e provas suficientes para formar sua convicção4, não podendo o Tribunal impor ao juiz singular o julgamento do feito segundo os subsídios que ele, órgão ad quem, entende sejam suficientes para esclarecer o que de pertinente e relevante havia de ser considerado para o deslinde da controvérsia.
A propósito, cito precedente da lavra do eminente Des. PRESTES MATTAR:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE USUCAPIÃO - CONTESTAÇÃO INTEMPESTIVA - DETERMINAÇÃO DE REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO - POSSIBILIDADE - MAGISTRADO - DESTINATÁRIO DAS PROVAS - REVELIA - OCORRÊNCIA - PRESUNÇÃO RELATIVA - POSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO NO FEITO E PRODUÇÃO DE PROVAS - DECISÃO CORRETA - RECURSO DESPROVIDO.
1. O Juiz é o destinatário das provas, que precisa delas para formar um convencimento seguro sobre a matéria, sendo o mesmo que decide sobre a necessidade ou não de realização de prova pericial.
2. Em se tratando de presunção relativa, a revelia não arreda o direito da parte à produção de prova útil e necessária ao bom
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julgamento da causa, havendo de prevalecer o livre convencimento do magistrado com base na prova produzida nos autos. (TJPR - Setima C.Cível (TA) - AI 0187654-2 - Curitiba - Rel.: Des. Prestes Mattar - Unânime - J. 11.03.2002) (destaquei)
Logo, não procede o recurso na parte em que pretende impedir a realização da prova determinada pelo juiz de primeiro grau.
3.2. Sobre a distribuição do ônus da prova, tratando-se de relação de consumo com a incidência das regras típicas da espécie, há a possibilidade da sua inversão, desde que atendidos certos requisitos.
Com efeito, o art. 6º do Código de Defesa do Consumidor dispõe:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor: VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;
Verifica-se, desse modo, à luz do que estabelece o citado dispositivo, que para a inversão do ônus da prova basta a configuração de um dos seguintes requisitos: (a) verossimilhança das alegações ou (b) hipossuficiência da parte.
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Na espécie, o agravado/consumidor enfrenta dificuldades para saber ao certo o valor de suas dívidas e entender as operações realizadas pela instituição financeira - notadamente os encargos utilizados para atualização do débito - o que caracteriza a hipossuficiência técnica/probatória.
É induvidoso o forte aparato de que dispõem os bancos, inclusive na esfera legislativa, para fazer valer os interesses da atividade econômica que executam, sendo inquestionável sua preponderância na relação de consumo bancário, eis que dispõe de técnicos especializados, equipes de economistas, administradores e contabilistas, gerentes de "marketing" e engenheiros, além de robusto aparato jurídico, para elaborar e fazer cumprir suas diretrizes, seus contratos, e suas políticas de aferimento do lucro empresarial.
Ademais, revelando o negócio jurídico firmado entre as partes uma notória relação de consumo, aplicando-se, destarte, o disposto no artigo 6°, inciso VIII, é de se reconhecer, pois, o direito básico do consumidor/hipossuficiente à facilitação de sua defesa, inclusive com a inversão do ônus da prova, conforme asseverou o Magistrado singular.
No mesmo sentido, esta Colenda 17ª Câmara, então em acórdão de relatoria do eminente Desembargador FERNANDO VIDAL DE OLIVEIRA, decidiu: PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento n.º 1.243.177-5 9
AGRAVO DE INSTRUMENTO ­ AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO ­ ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA ­ PRETENSÃO DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA E PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL ­ POSSIBILIDADE ­ EVIDÊNCIA NÃO SÓ DA VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES DO RECORRENTE, COMO TAMBÉM DE SUA HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA E TÉCNICA ­ PRETENSÃO DE PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL ­ POSSIBILIDADE ­ NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DAS ABUSIVIDADES APONTADAS.
RECURSO PROVIDO ­ POR UNANIMIDADE. (TJPR - 17ª C.Cível - AI 0674038-3 - Foro Central da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Des. Fernando Vidal de Oliveira - Unânime - J. 09.06.2010)
Vale dizer, a hipossuficiência do recorrido é notória, pois é o ente financeiro agravante que possui melhores condições de produzir as provas necessárias ao deslinde do feito.
Todavia, é certo que o deferimento da inversão do ônus da prova em favor do consumidor não acarreta, necessariamente, a transferência da obrigação do pagamento dos honorários periciais à parte adversa.
Nesse sentido, é o precedente de relatoria do eminente Desembargador LAURI CAETANO DA SILVA:
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AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA.
DETERMINAÇÃO JUDICIAL PARA QUE A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA ANTECIPE OS CUSTOS RELATIVOS À PERÍCIA. EFEITO SUSPENSIVO CONCEDIDO. AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A inversão do ônus da prova prevista no artigo 6º, inciso VIII da legislação consumeirista fica subordinada a verificação de dois pressupostos, a saber: a verossimilhança das alegações do consumidor e sua hipossuficiência frente ao fornecedor ou prestador de serviços.
2. A hipossuficiência vincula-se à impossibilidade ou extrema dificuldade técnica e de conhecimento do consumidor de desincumbir-se da prova necessária para demonstração do fato constitutivo do seu direito. Assim, verificando o Juízo que a prova técnica necessária à elucidação dos fatos não pôde ser realizada pela desídia da instituição financeira em trazer ao feito os elementos e documentos de que dispunha, poderá inverter o ônus da prova, atribuindo-lhe as conseqüências nefastas desse fato. 3. Contudo, a inversão do ônus da prova de que trata a legislação consumeirista não se confunde com o deslocamento do pagamento dos honorários periciais, que continua regrado de acordo com o artigo 33 do Código de Processo Civil. (TJPR - 17ª C.Cível - AI 0429424-0 - Foro Central da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Des. Lauri Caetano da Silva - Unânime - J.
26.09.2007) (grifei)
E ainda, o aresto do Superior Tribunal de Justiça, em acórdão de relatoria do eminente Ministro FERNANDO GONÇALVES, cuja ementa é a seguinte: PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento n.º 1.243.177-5 11
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ÔNUS DA PROVA. INVERSÃO. HONORÁRIOS PERICIAIS.
PRETENSÃO DE ATRIBUIR-SE O ÔNUS DE PAGAMENTO À PARTE CONTRÁRIA. DESCABIMENTO. PRECEDENTES.
DECISÃO AGRAVADA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.
1. Com efeito, ainda que deferida, a inversão do ônus probatório não tem o condão de obrigar o fornecedor a custear a prova requerida pelo consumidor, embora gere para aquele a obrigação de arcar com as conseqüências jurídicas pertinentes de sua não produção. Precedentes.
2. Da leitura das razões expendidas na petição de agravo regimental não se extrai argumentação relevante apta a afastar os fundamentos do julgado ora recorrido. Destarte, deve a decisão ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos.
3. Agravo regimental desprovido. (STJ, Quarta Turma, AgRg no REsp. nº 718.821 - SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ.
01.03.2010). (grifei)
Enfim, deve-se alertar à Instituição agravante que, embora a inversão do ônus da prova não implique na transferência da obrigação do pagamento das custas atinentes a perícia requerida pela parte autora, se não houver a produção da mesma, o banco sofrerá as consequências processuais advindas de sua não realização, em razão da inversão do ônus probatório declarado pelo Juízo "a quo".
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Por essas razões, não merece reparos a decisão que determinou a inversão do ônus da prova, tendo em vista que restou configurada a hipossuficiência técnica do consumidor em relação à instituição financeira agravante.
4. Nestas condições, nego seguimento ao recurso, na forma do art. 557, caput, do Código de Processo Civil, posto que contrário a jurisprudência dominante nesta Corte, bem como no Superior tribunal de Justiça.
5. Publique-se. Intimem-se.
6. Oportunamente, efetivadas as anotações necessárias, encaminhe-se para arquivamento.
Curitiba, 22 de Julho de 2014.
FABIAN SCHWEITZER Relator
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1 (TJPR - 17ª C.Cível - AC 0775720-2 - Foro Central da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Des. Lauri Caetano da Silva - Unânime - J. 14.12.2011) --- (TJPR - 3ª C.Cível - AI 0857982-6 - Foro Regional de São José dos Pinhais da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Des. Paulo Roberto Vasconcelos - Unânime - J. 17.04.2012) 2 TJPR - 17ª C.Cível - AI 0707562-7 - Apucarana - Rel.: Juiz Subst. 2º G.
Fabian Schweitzer - Unânime - J. 23.02.2011 --