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Acórdão
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EMENTA REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA JULGADA PROCEDENTE EM PARTE. PRESCRIÇÃO. OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE ATO INTERRUPTIVO DA PRESCRIÇÃO. PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA. SÚMULA 119-STJ. OCORRÊNCIA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO COM JULGAMENTO DE MÉRITO. ART. 269, IV, DO CPC. SENTENÇA REFORMADA. REEXAME NECESSÁRIO PROVIDO. APELAÇÕES CÍVEIS PREJUDICADAS.
VISTOS, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação nº 0208.207-5, da 3ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Curitiba, em que são apelantes o Município de Curitiba e Jorge Tadeu Rosa e apelados os mesmos. Trata a espécie de Reexame necessário e Apelações Cíveis intentadas pelo Município de Curitiba e por Jorge Tadeu Rosa e Outro, sendo apelados os mesmos, contra a r. sentença proferida nos autos de Ação de Indenização por Desapropriação Indireta, que foi julgada parcialmente procedente, para o efeito de condenar a municipalidade ao pagamento da importância de R$ 9.222,48 referente a área ocupada, a edificação e o muro. Inconformadas, com a r. sentença, as partes apelam. Aduz o Município de Curitiba, em seu apelo, em síntese: em preliminar: a prescrição vintenária e a impossibilidade do pedido: que o perito do juízo atestou que a ocupação deu-se no ano de 1.974, e o pedido só foi formulado após o decurso dos vinte anos. Impugna, por outro lado, o entendimento que houve ação proposta pela proprietária anterior, de nome Josefina Dall'Astro, e assim, tal ação teria interrompida a prescrição. Aduz que essa era parte ilegítima para intentar ação de desapropriação, razão porque aquela ação, noticiada às fls. 29 a 44, não tem o condão de interromper a prescrição. No mérito: que o valor do metro quadrado adotado na r. sentença de R$ 66,71 não é o correto, devendo ser adotado o valor obtido pelo assistente técnico, que é de R$ 42,26. Ainda, alega o não cabimento de indenização pela construção, ante a inexistência de prova, nos autos, de que tenha existido construção na área desapropriada e, por fim, impugna a verificação de juros compensatórios e compensatórios. Ao seu turno, os então autores, Jorge Tadeu Rosa e Outro, em apelação, aduzem: que a prova pericial demonstrou a exist~encia de uma casa de alvenaria edificada no local desapropriado, com 76,5 m2 e que fora demolida, assim, requerem a modificação do valor global da edificação atingida de R$ 2.752,00 para R$ 42.896,61 e, ainda, impugnam a verba referente os honorários advocatícios como fixados na r. sentença, aduzindo que tal verba deve ser majorada para o valor de 20% sobre o valor total da condenação. Os recurso foram contra-arrazoados, manifestando-se, após, o membro do Ministério Público em I Grau. Remetidos a esta Corte, colheu-se a manifestação do Procurador da Justiça que pugnou pelo conhecimento e provimento do reexame necessário, ao efeito de reformar-se a sentença, ante o reconhecimento da ocorrência da prescrição, julgando-se, em conseqüência, improcedente o pedido formulado na peça inicial, com base no artigo 269, IV, do CPC, restando prejudicada a apreciação das apelações cíveis interpostas. É o relatório. Presentes os requisitos de admissibilidade, cumpre em conhecer o reexame necessário e as apelações cíveis interpostas. Trata-se de ação ordinária de Indenização por Desapropriação Indireta, movido por Jorge Tadeu Rosa e Outro contra o Município de Curitiba, em que o douto juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido, recorrendo de ofício, em obediência a regra insculpida no artigo 475, do CPC. Assim, cabe, primeiramente, o reexame necessário, bem como, as Apelações Cíveis, intentadas pelas partes. Em reexame necessário, há que se proceder a reforma da r. sentença, para, em reconhecer-se a prescrição, julgar-se pela improcedência do pedido contido na peça inicial. Nestes termos, de se ver que: Consoante resposta do Senhor Perito ao quesito de nº 02, de fls. 152, a ocupação do terreno pelo requerido deu-se "há 26 anos atrás, isto é, em 1974" (verbis). E, a ação só foi intentada no ano de 1.999, portanto, já decorrido mais de vinte anos, portanto já existente um ´[óbice legal para a propositura da ação, qual seja a prescrição vintenária. A douta sentença, acatando a tese dos autores, entendeu que houve causa interruptiva da prescrição, qual seja, a propositura da ação de desapropriação por parte de Josefina Dall'Astro Moro e que foi julgada improcedente ante o reconhecimento da ilegitimidade ativa dessa, visto que, ao adentrar com a referida ação não mais detinha posse e propriedade do imóvel desapropriado, eis que já havia doado a área aos agora autores. E, como asseverado pela municipalidade, "Se o direito em discussão é indivisível, a interrupção da prescrição por um dos credores a todos aproveita (RSTJ 43:298)". Ora, no caso, a ação anteriormente proposta não era por um dos credores, mas de pessoa sem qualquer legitimidade para reivindicar a indenização. Logo, claro fica que a citação naquela ação não impedia os recorridos de terem ingressado anteriormente com esta medida, bem como a mesma não implica na interrupção do prazo prescricional. Além do mais vale observar que os apelados receberam por doação a área, que foi obtida através de processo de usucaí~]ao no ano de 1986, ou seja, somente após o alegado apossamento administrativo, que teria ocorrido em 1974. Portanto, a titularidade da área jamais abrange a parte referente as vias públicas, até porque são insuscetíveis de aquisição por este modo. Aliás, a causa de pedir tem por base a respectiva escritura de doação e a matrícula do imóvel, títulos que atestam que a aquisição através do usucapião deu-se após o apossamento administrativo. De modo que, tenha-se em conta que o evidente e inequívoco ato que suspenda ou interrompa a prescrição só pode ser praticado por quem detenha a posse ou a propriedade do imóvel desapropriado, não se admitindo, bem por isso, que terceiro, parte ilegítima para pleitear em seu próprio nome a indenização por desapropriação indireta, possa acarretar a interrupção da prescrição. Ao contrário, deve ter legitimidade, esse terceiro, para que ato seu possa levar a interromper o lapso prescricional, o que, convenhamos, não ocorreu no caso presente. E, tal é o entendimento manifestado pelo Procurador de Justiça que, por oportuno convém aqui reproduzir, posto que o adoto como razões de decidir. Ei-lo, em fiel reprodução: "Com efeito, desde a contestação, alega o município achar-se prescrito o direito indenizatório perseguido pelo casal demandasnte ( f. 50), sendo certo que lhe assiste absoluta razão. Sabido que a ação de desapropriação indireta prescreve em vinte anos ( Súmula 119-STJ), o que se tem por firme nos autos é que, tal como reconhecido expressamente na r. sentença ( f. 238), com apoio em informação levantada pelo Perito (f. 152, resposta ao segundo quesito dos requerentes), a ocupação da área afetada ocorreu no ano de 1974, sendo que a ação sub judice veio de ser proposta apenas em março de 1999 ( cf. carimbo de distribuição aposto na inicial), ou seja, mais de duas décadas depois de consumada a referida ocupação. No entanto, o juiz sentenciante ( f. 235), na mesma linha de pensamento do órgão ministerial ( fls. 220/1), houve por bem em rejeitar a caracterização do lapso prescricional, ao argumento de que "no ano de 1.993 a ex-proprietária do imóvel ajuizou ação de indenização, em virtude da desapropriação, a qual ao final foi julgada extinta, sem julgamento de mérito, em decorrência da ilegitimidade ativa daquela. De tal modo, tendo o Município de Curitiba, parte passiva naquela ação, sido citado, ocorreu a interrupção da prescrição, face do disposto no art. 219 do CPC. Da data da propositura daquela ação - 26/11/93 -, até o ajuizamento da presente, transcorreram apenas cinco anos, portanto, não há que se falar em prescrição" (f. 235). Data vênia, não pode ser aceito tal raciocínio, pois que equivale a admitir que terceira pessoa ( que não seja a titular ativa da relação jurídico-material) possa, por ato próprio, obter a interrupção da prescrição wextintiva em favor do verdadeiro sujeito do direito. Sem dúvida, não é este o propósito do legislador, que, ao disciplinar as causas interruptivas da prescrição ( art. 219 do CPC - citação válida do devedor - e artigo 172, I do Código Civil de 1916), tem em mira um comportamento positivo do real credor ( ressalvada a hipótese do 172, V, do C.C.), incompatível, pois, com uma postura negligente quanto à ação que protege seu direito. Na hipótese sob crivo, não se pode aproveitar a citação consumada em processo anterior, embora fundado em idênticos fatos, em vista de que nele foi a ação movida por parte absolutamente ilegítima, a qual, comprovadamente, há anos deixara de ser a proprietária do imóvel objeto da expropriação, o que motivou a extinção dessa primeira demanda por ilegitimidade ativa ad causam (cf. sentença copiada às fls. 101/5, proferida nos autos nº 18.133/93 - 4ª VFP da Capital. O aproveitar-se citação havida em pretérita lide, como fator capaz de interromper a prescrição em um outro processo, subseqüente, evidentemente reclama a presença, no pólo ativo, do mesmo titular do direito perseguido em Juízo, bem assim que haja nexo de necessariedade entre os litígios." E, prossegue, o douto agente do Parquet, em Segundo Grau, em seu parecer retro: "In casu, a indevida ação anteriormente proposta pela ex-proprietária do imóvel expropriado ( Josefina Dall'Astra Moro) não era pressuposto necessário nem lógico a que os efetivos proprietários (Jorge Tadeu Rosa e sua mulher) pudessem, eles próprios, intentar o mesmo pleito indenizatório perante o município de Curitiba, por isso que a citação operada naquela primeira demanda, proposta por Josefina, não lhes pode beneficiar como causa interruptiva para esta segunda. Não se pode, por outro viés, admitir que entre a anterior proprietária e os atuais houvesse um direito solidário de exercitarem sua pretensão indenizatória frente ao município, pois se assim fosse, aí sim, poderia a citação havida no processo anterior ter a pretendida força interruptiva, a teor do autorizativo inscrito no parágrafo único do artigo 176 do Código Civil ( de 1916). No entanto, quando Josefina, por doação, transferiu a titularidade dominial do imóvel para os ora autores, neles sub-rogou, desde então, a exclusividade na fruição dos direitos concernentes ao bem ( cf. se vê das cópias da escritura e matrícula inclusas às fls. 012 e 013). Como bem adverte SÍLVIO RODRIGUES "em regra, os efeitos da prescrição são pessoais" ( in Direito Civil - Parte Geral, vol. 1, 29ª ed., São Paulo: Saraiva, 1999, p. 339 ), daí ser inviável que em desatinada ação proposta por quem não mais ostenta a qualidade de credor possa a citação aí operada, conquanto válida, constituir-se em fator interruptivo da prescrição ( 172, I do C.C. e 219 do CPC), menos ainda, nessa condição, beneficiar ao efetivo credor em ação posterior. Nem se alegue, por outra, que a citação efetivada na primeira ação conteria, em relação a esta segunda demanda, o benefício interruptivo anunciado no artigo 174, III do Código Beviláqua ( a interrupção pode ser promovida por "terceiro que tenha legítimo interesse"), uma vez que ao ativar a anterior lide, insista-se, sua autora Josefina não mais detinha a titularidade do imóvel atingido pelo município, o que, por si só, denota a ausência de qualquer interesse seu no litígio, pois já não lhe caberia a percepção de qualquer indenização da municipalidade, na medida em que doara o bem ao casal Jorge e Marilise sem qualquer ressalva ( cf. escritura inclusa à f. 013 e verso), gerando a inequívoca presunção de que estes últimos sub-rogaram-se no direito de receber qualquer valor indenizatório, cuja pretensão estão efetivamente a exercer na presente ação, obstada, no entanto, pela consumada prescrição aqui sustentada. E, conclui, por fim,o Procurador de Justiça, em seu parecer: "Como não se pode esperar que a citação de parte ilegítima passiva possa interromper a prescrição do direito do autor credor ( RT 649/31, RF 303/182), por simetria não se pode consentir com situação inversa, ou seja, não se operará a interrupção da prescrição quando a citação do efetivo réu tenha resultado de ação proposta por quem não detenha a qualidade de efetivo autor, sempre na perspectiva de que o instituto da prescrição extintiva, como salientado, funda-se essencialmente na inércia do real titular do direito subjetivo a ser jurisdicionalmente tutelado." Portanto, para concluir, resumidamente, a citação do Município de Curitiba, deflagrada em lide pretérita, movida por autora carecedora de ação por ilegitimidade ativa ( Josefina Dall'Astra Moro), não se presta a interromper a prescrição em favor dos autores desta segunda demanda ( Jorge Tadeu e Marilise), cuja improcedência se faz de rigor, com base e supedâneo no artigo 269, IV do CPC. Do exposto, impõe-se o com hecimento e provimento do reexame necessário para o fim de se reformar a r. sentença, proferida às fls. 233 "usque" 240 para o efeito de, reconhecida a prescrição, julgar-se improcedente o pedido formulado na petição inicial, o que se faz com base e fulcro no contido no artigo 269, IV, do CPC. Por outro lado, ante o reconhecimento da prescrição, e provimento do reexame necessário, prejudicados os recursos interpostos pelo requerido, o Município de Curitiba e pelos autores, Jorge Tadeu Rosa e Outro. Pelo exposto, o voto é no sentido de se conhecer e dar provimento ao reexame necessário, para reformando a r. sentença, julgar improcedente a pedido inicial, com julgamento de mérito, ex vi da norma contidfa no art. 269, IV, do CPC, restando prejudicadas as Apelações Cíveis intentadas pelas partes. ACORDAM OS INTEGRANTES DA 9a CÂMARA CÍVEL DO TRIBUNAL DE ALÇADA DO ESTADO DO PARANÁ, POR UNANIMIDADE DE VOTOS, EM ACOLHER O REEXAME NECESSÁRIO, PARA REFORMAR A R. SENTENÇA, PREJUDICADOS OS RECURSOS DAS PARTES. Participaram do julgamento os Senhores Juízes Wilde Pugliese e Nilson Mizuta. Curitiba, 13 de maio de 2.003 Luiz A. Barry/ Juiz Conv.
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