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Acórdão
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.223.976-2 - DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE LONDRINA 1ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA
APELANTE: JAIR JOSÉ DE ALMEIDA (MAIORDE 60 ANOS)
APELADO: MUNICÍPIO DE LONDRINA
RELATOR: DES. STEWALT CAMARGO FILHO APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANO MATERIAL, MORAL E ESTÉTICO. ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. OCORRÊNCIA DO SINISTRO ATRIBUÍDO À PRESENÇA DE PEDRAS E DETRITOS NA PISTA DE ROLAMENTO, PROVENIENTES DE OBRA PÚBLICA. PRELIMINAR DE MÉRITO REJEITADA. DESPACHO SANEADOR. CARÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE EFETIVO PREJUIZO. INDEFERIMENTO DO DEPOIMENTO PESSOAL DA PARTE. JUIZ DESTINATÁRIO DAS PROVAS. NÃO CONFIGURAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA. MÉRITO. FATOS ALEGADOS NA INICIAL NÃO CORROBORADOS POR DOCUMENTOS. PROVA TESTEMUNHAL NÃO REQUERIDA. ÔNUS PROBATÓRIO DO AUTOR (ARTIGO 333, I, DO CPC). AUSÊNCIA DE PROVA ENTRE A ALEGADA CONDUTA OMISSIVA DO AGENTE ESTATAL E O RESULTADO POR ELA PRODUZIDO. PEDIDOS JULGADOS IMPROCEDENTES. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. VISTOS. I. Trata-se de ação de indenização por danos material, moral e estéticos ajuizada por Jair José de Almeida, em face do Município de Londrina. Na exordial, narrou o autor que, no dia 15.05.2008, ao trafegar de motocicleta pela Avenida Rio Branco, em direção a Avenida Henrique Mansano, em virtude da presença de pedras no asfalto, perdeu o controle de sua motocicleta, vindo a chocar-se contra tubulações de concreto deixadas à margem da via para realização de obras, sem que houvesse qualquer sinalização no local, ocasionando-lhe ferimentos, fratura no fêmur, tíbia e joelho esquerdo. Afirmou que o sinistro veio a ocorrer devido às más condições da via, sendo hipótese de responsabilidade civil objetiva do Município de Londrina, devendo ser condenado ao pagamento de indenização por compensação de dano moral, estético e materiais, estes últimos no valor de R$ 668,00 (seiscentos e sessenta e oito reais), a fim de ressarcir o conserto da motocicleta e a perda dos óculos de grau. Após instrução processual, sobreveio sentença de fl. 80/81, julgando improcedentes os pedidos iniciais. Inconformado o autor promoveu recurso de apelação, que culminou em anular a sentença de fls. 80/81, uma vez que proferida por juízo incompetente (acórdão de fls. 141-145). Após a baixa dos autos à Vara de Origem, sobreveio sentença (fls. 149-152), extinguindo o processo com resolução de mérito, julgando improcedentes os pedidos formulados pelo autor, fundamentando o julgador que "o autor não se desincumbiu do ônus da prova do fato constitutivo de seus direito (CPC, art. 333, I)", condenando-o assim, ao
pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), com observância à concessão da assistência judiciária. Irresignado, o autor promove recurso de apelação (fls. 167-187) requerendo, preliminarmente, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, em razão da supressão da dilação probatória, o que ocasionou prejuízos, uma vez que a controvérsia cuida-se de matéria de fato, e não matéria só de direito. Neste sentido, aponta que "sequer foi realizada audiência de instrução para depoimento das partes envolvidas no acidente a fim de esclarecer tais dúvidas concernentes à responsabilidade, ainda que concorrente, para a ocorrência do acidente" (fl. 171), enfatizando que nem mesmo houve despacho saneador, nos termos do art. 331, § 2º do CPC. No mérito, argumenta haver responsabilidade civil objetiva do ente público, com esteio no § 1º do art. 3º do Código de Trânsito Brasileiro, uma vez que tal dispositivo preconiza que a omissão no cumprimento do dever de manutenção das vias enseja responsabilidade civil objetiva, não havendo necessidade da demonstração da culpa. Nesta linha, assevera ser inequívoca a prova dos danos e do nexo causal, devendo o apelado ser condenado a indenizar. Sustenta que a ausência de sinalização na via interditada para obras configura culpa decorrente de omissão, caracterizando omissão culposa da administração, isso porque caso houvesse adequada sinalização, a colisão poderia ter sido evitada. Por fim, requer o provimento do recurso, a fim de que sejam julgados procedentes os pedidos formulados na exordial, devendo o valor da indenização por dano moral, ser fixado, tendo como parâmetro a extensão dos danos causados pelo acidente, e os danos materiais, na
modalidade lucros cessantes, ressarcindo-o pelo tempo que permaneceu afastado do trabalho, correspondente a sua remuneração na época do fato, no valor de R$ 2.815,59 (dois mil oitocentos e quinze reais e cinquenta e nove centavos), devendo ser determinada a inversão dos ônus sucumbenciais. O Ministério Público em Segundo Grau manifestou-se pelo acolhimento da preliminar, quanto à configuração do alegado cerceamento de defesa (fls. 206-209). É o relatório. II. Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação. O apelante, na inicial, afirmou que se trata o caso de responsabilidade objetiva do Município, pois perdeu o controle de sua motocicleta devido a pedras no asfalto, vindo a chocar-se contra obstáculos de concreto que estavam à margem da rodovia. Na inicial o apelante requereu "provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos, em especial Prova Pericial (a ser realizada por médico do Instituto Médico Legal, em razão do autor não ter condições de arcar com honorários de perito), depoimentos pessoais, sob pena de confissão, oitiva de testemunhas abaixo arroladas, além de outras que puderem ser identificadas durante o trâmite da ação." (fl. 13) No r. despacho de f. 66, o MM. Juiz de primeiro grau determinou a especificação de provas (art. 328 do CPC). O apelante as especificou às f. 68/71: prova pericial; "depoimento pessoal das partes, sob pena de confissão". Não há requerimento para ouvida de testemunhas. No r. despacho de f. 76, o magistrado determinou a intimação das partes para se manifestarem sobre o interesse em
efetivação de audiência preliminar (art. 331 do CPC) e, "No silêncio, tornem conclusos para saneador em gabinete". Requereu o apelante à f. 78, o prosseguimento do feito, "com a designação de audiência de instrução e julgamento". Sobreveio a r. sentença de f. 80/81v, a qual restou anulada por incompetência absoluta de juízo (f.141/145). Nova sentença foi proferida e julgados improcedentes os pedidos (f. 149/152). Opostos embargos de declaração (f. 157/158), estes foram rejeitados. Quanto à preliminar de cerceamento de defesa, alega a parte autora, que a ausência de despacho saneador caracteriza cerceamento de defesa. Em que pese o § 3º do art. 331 do CPC prever o despacho saneador, sua ausência, por si só não induz à nulidade da sentença. Esta está adstrita à comprovação de que a inexistência de despacho saneador ocasionou prejuízos. Neste sentido, é o julgado:
"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARÇÃO. INEXISTÊNCIA DE CONTRADIÇÃO. REDISCUSÃO DE QUESTÕES DE MÉRITO. IMPOSIBLIDADE. OMISSÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE DECISÃO DE SANEAMENTO DO PROCESO. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO. 1. Revelam-se improcedentes os embargos declaratórios em que as questões levantadas traduzem inconformismo com o teor da decisão embargada, pretendendo rediscutir matérias já decidas, sem demonstrar omissão, contradição ou obscuridade (art. 535 do CPC). 2. Embora o art. 331, §3º, do CPC, preveja o saneamento do processo, a sua ausência só acarreta nulidade se demonstrada a ocorrência de prejuízo à parte interessada (art. 249, §1º, do CP), oque não
ocorreu no presente caso, conforme afirmado pelas instâncias ordinárias. 3. Embargos declaração parcialmente acolhidos para sanar omissão constante da decisão embargada, sem, contudo, alterar o resultado do julgamento do recurso especial." (STJ. Min Teori Albino Zavascki. EDcl no REsp 769119. Dje 06/03/2006) (grifei)
Por outro lado, a teor do art. 130 do CPC, "caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias". Assim, entendendo serem inúteis às provas especificadas, é perfeitamente possível que o juiz decida pelo indeferimento quanto à produção probatória. Analisando detidamente as provas especificadas pelo autor, ora apelante, não é difícil constatar que não teriam o condão de esclarecer e provar que o evento danoso ocorreu por omissão do ente público. Por tais motivos, não se verifica que o julgamento do processo no estado em que se encontrava, acarretou cerceamento de defesa, razão pela qual rejeito a preliminar. Veja-se que a doutrina e a jurisprudência têm firmado entendimento no sentido de que, em caso de invocada omissão ou falha na prestação do serviço, a responsabilidade do ente público é subjetiva, devendo ser comprovada, portanto, a culpa na causa do sinistro. Neste sentido:
"RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ACIDENTE DE TRÂNSITO.AUSÊNCIA DE SINALIZAÇÃO EM CRUZAMENTO DE VIA PÚBLICA.RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO MUNICÍPIO NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE DEVER DE SINALIZAR TODOS OS CRUZAMENTOS DA CIDADE, NOS TERMOS DO ARTIGO
80 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. RECURSO DESPROVIDO. (TJPR - 2ª C.Cível - AC - 1248384-0 - Ponta Grossa - Rel.: Lauro Laertes de Oliveira - Unânime DJe 18/09/2014)
Portanto, o dever de indenizar está adstrito à prova de que realmente as condições da pista estavam em conformidade com o que foi alegado na inicial, constituindo fato preponderante à superveniência do fato danoso, preenchido o requisito da existência de nexo de causalidade. Nesse desiderato, vale observar que a inicial não foi lastreada com documento capaz de aclarar o motivo do sinistro. Não há qualquer descrição da situação do local do acidente, ainda que tivessem sido requeridas em data posterior ao acidente, já que o boletim de ocorrência inicial foi lavrado pelo Corpo de Bombeiros, o qual reitere-se, não contém nenhuma descrição do malsinado local onde ocorreu o acidente, ou até mesmo uma declaração do atendente do SIATE, ou ainda, uma declaração da Secretaria de Obras Municipais, quanto à execução de obras na pista. Ademais, ao especificar as provas, o autor não pleiteou nenhuma prova documental que pudesse corroborar as suas afirmativas, ou a oitiva de prova testemunhal que pudessem esclarecer os pontos controvertidos, tal como funcionários do ente municipal que trabalhavam no local, ou pessoas que teriam presenciado o evento danoso. Insta aclarar que, consoante fundamentado na sentença, o boletim de ocorrência (fl. 22-24), lavrado pelo Corpo de Bombeiros, foi o único documento carreado nos autos que fez menção às condições da pista, pontuando que havia pedras e areia na pista. Todavia, em que pese sua presunção de veracidade, ao que tudo indica, foi elaborado, exclusivamente, com base nos relatos do autor/apelado, sem que fossem realizadas diligências técnicas no local do sinistro, nem mesmo há croqui detalhando as peculiaridades do local.
A propósito, é o tópico "Descrição do Fato" do Boletim de Ocorrência, que evidencia que foi confeccionado somente com base no relato do condutor da motocicleta, veja-se: "compareceu na sede do PA em data de 03/06/08 o condutor do V1 passou a relatar que" (fl. 23), quando o evento se deu em 15.05.2008. Nesta trilha, convém mencionar entendimento assentado pelos Tribunais Superiores de que "A presunção de veracidade inerente aos documentos públicos é iuris tantum, podendo ser descaracterizada pelo magistrado, ao examinar o acervo fático da demanda". (STJ. REsp 1099127/AM. Ministro CASTRO MEIRA. 2ª T. Dje 24.02.2010). Por outro vértice, não foi requerida prova testemunhal, valendo consignar que o depoimento do representante legal da municipalidade em nada contribuiria para o deslinde da causa. Acrescento que "Não cabe à parte requerer o próprio depoimento pessoal RT 722/238, RJTJESP 118/247)" Ainda que fosse permitido, o seu depoimento serviria apenas para reiterar a versão trazida na inicial. Seu indeferimento não acarreta prejuízos à recomposição dos fatos, não havendo qualquer violação aos princípios do contraditório, nem ao devido processo legal. Por tais motivos, não se verifica que o julgamento do processo no estado em que se encontrava pudesse culminar com o cerceamento de defesa. Assim, da análise do acervo fático-probatório dos autos não é possível identificar que efetivamente a causa do sinistro tenha sido ocasionada por ato omisso do ente estatal em manter vias públicas em condições mínimas de trafegabilidade. E, se não há provas capazes de dar lastro à versão do apelante, é porque este não se desincumbiu do ônus
de trazer à baila provas essenciais para conferir similitude à sua pretensão (art. 333, I, do CPC). Constituindo o nexo causal elemento configurador da responsabilidade civil, não há dever de indenizar se inexistente o nexo causal. Por conseguinte, escorreita a sentença que entendeu não se tratar de hipótese de responsabilidade civil do Município de Londrina. Pelo exposto, voto para negar provimento ao recurso, mantendo a sentença em sua integralidade. III. ACORDAM os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso. Participaram do julgamento presidido pelo Desembargador STEWALT CAMARGO FILHO Relator, e acompanharam o voto o Desembargador LAURO LAERTES DE OLIVEIRA - Revisor, e o Desembargador ANTÔNIO RENATO STRAPASSON. Curitiba, 04 de novembro de 2014. Des. Stewalt Camargo Filho Relator
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