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Acórdão
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AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1213325-2, DE SANTO ANTÔNIO DA PLATINA VARA CÍVEL, DA FAZENDA PÚBLICA, ACIDENTES DO TRABALHO, REGISTROS PÚBLICOS E CORREGEDORIA DO FORO EXTRAJUDICIAL, JUIZADO ESPECIAL CÍVEL E JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA AGRAVANTE : WILLIAN VILLAS BOAS JUNIOR AGRAVADOS : MARIA JOSÉ PIRES DO PRADO E OUTROS RELATORA : DESª DENISE KRÜGER PEREIRA AGRAVO DE INSTRUMENTO AÇÃO DE INVENTÁRIO DECISÃO INTERLOCUTÓRIA AGRAVADA QUE INDEFERIU A PRETENSÃO DE FORMALIZAÇÃO DA CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS POR TERMO NOS AUTOS MANUTENÇÃO ALIENAÇÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS QUE, CONFORME PREVISÃO DO ART. 1.793 DO CC/02, DEPENDERIA DE INSTRUMENTO PÚBLICO INVALIDADE DA CESSÃO PACTUADA PELOS AGRAVANTES MEDIANTE SIMPLES INSTRUMENTO PARTICULAR PACTUAÇÃO QUE, ADEMAIS, FIRMOU-SE ANTES DA SUPERVENIÊNCIA DE ALVARÁ JUDICIAL QUE LHE AUTORIZASSE VIOLAÇÃO AO ART. 1.793, § 3º, DO CC/02 DECISÃO AGRAVADA QUE SE ATEVE À CAUSA DE PEDIR E AO PEDIDO DA PARTE, NÃO SE COGITANDO DA PRODUÇÃO DE DECISÃO EXTRA PETITA AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 1213325-2, de Santo Antônio da Platina Vara Cível, da Fazenda Pública, Acidentes do Trabalho, Registros Públicos e Corregedoria do Foro Extrajudicial, Juizado Especial Cível e Juizado Especial da Fazenda Pública, em que é Agravante WILLIAN VILLAS BOAS JUNIOR e são Agravados MARIA JOSÉ PIRES DO PRADO E OUTROS.
I Trata-se de Agravo de Instrumento (f. 10/17) interposto por W. VILLAS BOAS JUNIOR em face de decisão interlocutória proferida pelo Juízo da Vara Cível de Santo Antônio da Platina que, em autos de Ação de Inventário movida por MARIA JOSÉ PIRES DO PRADO e OUTROS em razão do falecimento dos de cujus ADELAIDE PIRES e ANTÔNIO JOSÉ PIRES, indeferiu as insurgências do ora agravante no que toca à suposta cessão de direitos hereditários em seu favor. Eis o teor da decisão da decisão, na parte em que interessa ao presente recurso (f. 262/263):
6 Com relação à insurgência de WILLIAN VILLAS BOAS JÚNIOR e sua esposa GLAIR SOUZA LEMOS VILLAS BOAS, às fls. 156 e ss., no qual informam que teriam direito adquirido ao bem a ser partilhado através de cessão de direitos hereditários dos herdeiros, e que o bem deverá ser adjudicado a eles, a insurgência não comporta conhecimento neste feito. Primeiramente devemos ressaltar que o termo de alienação dos direitos hereditários, relativo ao imóvel do falecido se equipara a bem imóvel (art. 80, II, do CC), e, portanto, deveria ter sido efetuado por instrumento público ou então por termo nos autos, o que não ocorreu, não tendo validade jurídica, já que o valor da aquisição supera 30 salários mínimos, e formalidade do instrumento público para a cessão é essencial à validade do negócio jurídico firmado entre as partes. Ainda, o pedido de Willian e sua esposa para que fossem intimados os herdeiros a elaborar termo de cessão de direitos hereditários nos autos, não é possível a apreciação neste feito, pois é ato voluntário dos herdeiros, não podendo o Juízo compeli-los a fazê-lo, pois é ato voluntário deles, através de termos nos autos ou então escritura pública. Por fim, quanto à alegação de Willian e sua esposa de que já efetuaram o pagamento do valor da aquisição das cotas hereditárias aos herdeiros, este feito não é o meio adequado para discussão, devendo ambos intentarem a ação cabível para reaverem os valores que pagaram, mais perdas e danos. Neste sentido, devem WILLIAN VILLAS BOAS JÚNIOR e GLAIR SOUZA LEMOS VILLAS BOAS, serem intimados da presente decisão e em sendo o caso, a ajuizarem a ação cabível para o cumprimento do contrato firmado com os herdeiros ou a devolução dos valores já pagos.
Inconformados, os cessionários/agravantes recorrem com base nas seguintes considerações: (a) que ajuizada a presente ação de inventário e apresentadas as primeiras declarações pela inventariante MARIA JOSÉ PIRES DO PRADO, ajuizou-se ação de Alvará Judicial para o fim de autorizar a cessão de direitos hereditários do único imóvel deixado pelos falecidos, (b) que tal se deveu ao interesse na alienação dos bens por parte de todos os herdeiros e o interesse de compra do bem pelos ora agravantes WILLIAN VILLAS BOAS JUNIOR e sua esposa GLAIR SOUZA LEMOS VILLAS BOAS; (c) que em 30.11.2010 foi proferida sentença "para o fim de autorizar a cessão dos direitos hereditários de todos os herdeiros dos falecidos, através da inventariante Maria José Pires do Prado, sob o imóvel matriculado sob n. 9.066, junto ao CRI local, pelo valor não inferior ao da avaliação constante nos autos, devendo a quantia ser depositada em conta judicial", tendo a última avaliação do bem indicado o valor de R$ 115.000,00; (d) que em razão de superveniente impugnação da herdeira ALDENIR PIRES DA COSTA, a qual anteriormente havia concordado com o valor da avaliação, o juízo singular suspendeu os efeitos do alvará mencionado; (e) que, todavia, durante o período de eficácia do alvará, celebraram "Contrato de Cessão Onerosa de Direitos Hereditários" do referido bem pelo valor de R$ 140.000,00, já tendo transferido aos agravados o equivalente a R$ 40.000,00, avençando que o restante seria transferido quando da assinatura da escritura pública de cessão de direitos; (f) que, dentro de tal contexto, sobreveio a decisão agravada, merecedora de reforma por este Tribunal de Justiça; (g) que a decisão é extra petita por fundamentar-se em observações não apresentadas pelas partes (invalidade jurídica da cessão de direitos hereditários por instrumento particular); (h) que, ademais, a jurisprudência vem entendendo que em não sendo respeitada a formalidade de escrituração pública deve-se compreender o instrumento particular como "promessa de cessão", de efeitos condicionados à
chancela do juiz do inventário do antigo proprietário (ocorrida na hipótese dos autos); (i) que nenhuma das partes buscou discutir a cessão de direitos ocorrida nos autos, tendo a herdeira ALDENIR PIRES DA COSTA limitado sua irresignação em suposto erro na avaliação do bem, já afastada pelo Juízo Singular; (j) que, portanto, deve ser convalidada a cessão de direitos apresentada ou, quando muito, determinada a intimação dos agravados para formalizarem a cessão de direitos confeccionada, autorizando-se a adjudicação do imóvel para os agravantes; (k) que estão presentes os requisitos necessários à atribuição de efeito suspensivo ao recurso. O pedido liminar foi indeferido por esta Relatora, que determinou o regular processamento do feito. A parte agravada apresentou resposta (f. 462/477) alegando: (a) que outorgaram poderes ao advogado Silvio Cabral do Amaral apenas para a propositura de ação de inventário; (b) que, no entanto, no mês de outubro de 2010 souberam da existência dos autos de alvará nº 581/2008, cuja finalidade era antecipar a venda do único bem imóvel do espólio do de cujus; (c) que a inventariante assinou documento de cessão de direitos hereditários em seu próprio nome, e não em nome do espólio, e que foi induzida em erro, pois não foi orientada sobre de que se tratava o documento, caracterizando-se, assim, vício de consentimento e a nulidade da cessão de direitos hereditários; (d) que nenhum valor referente à cessão de direitos foi depositado em suas contas correntes e, por fim, que a respectiva cessão só tem validade jurídica quando realizada por instrumento público. Encaminhados os autos à Procuradoria-Geral de Justiça, sobreveio parecer pugnando pelo desprovimento do recurso (f. 489/500).
É a breve exposição. II VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO: Os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal foram analisados pela decisão que determinou o processamento do recurso, pendendo análise apenas quanto ao mérito recursal. Observa-se dos autos que os ora agravantes, WILLIAN e MARIA JOSÉ, supostos cessionários dos direitos hereditários dos herdeiros dos de cujus cujo inventário se discute na Ação de Inventário nº 532/2008, pleitearam a elaboração da referida cessão por termo nos autos, pagando-se o preço com relação aos herdeiros capazes e intimando-se para assinar o respectivo termo. Ao produzir a decisão interlocutória ora agravada, o juízo singular indeferiu o pedido, definindo que o contrato de cessão de direitos hereditários em debate não teria validade jurídica, eis que não realizado por instrumento público. 1. Da nulidade da decisão agravada Preliminarmente, sustenta a agravante que "quanto ao entendimento exposto na decisão objurgada, de que o instrumento particular de cessão de direitos hereditários não teria validade jurídica, data vênia, esta matéria não foi arguida pelos agravados, constituindo decisão extra petita, não podendo prosperar (...)" (f. 13).
Sem razão. É que, como cediço, vincula-se o juízo à causa de pedir e aos pedidos das partes, mas não aos fundamentos jurídicos trazidos pelas partes, que podem ser apreciados de ofício pelo julgador. De fato, noticiando-se ao Juízo Singular a existência de suposta cessão de direitos hereditários (f. 224/227) por meio da qual teriam os herdeiros/agravados alienado sua participação hereditária aos ora agravantes, postulando-se a concretização da cessão mediante termo nos autos, é absolutamente natural que se oportunize ao julgador o exame da regularidade da pretensão aduzida, ainda que por fundamentos diversos daqueles eventualmente apontados pelas partes. Não bastasse, extrai-se da leitura do instrumento firmado pela parte agravante que a nulidade reconhecida pelo Juízo Singular na decisão interlocutória agravada foi apresentada não apenas pelos ora agravados (243/245), mas também pelo membro do Ministério Público atuante em primeiro grau de jurisdição (f. 260/261). 2. Da cessão de direitos hereditários Meritoriamente, alegam os agravantes que "a inventariante do Espólio de Adelaide Maria Barreto Pires e Antonio José Pires, firmou em 05.04.2008 com os interessados, ora agravantes, a carta de interesse e proposta de compra de imóvel e, posteriormente, em 04.04.2009, o Contrato de Cessão Onerosa de Direitos Hereditários, oportunidade em que a totalidade dos herdeiros cederam todos seus direitos hereditários aos
agravantes" (f. 14). Apontam que, por tal razão, havendo interesse de menores, ingressaram com Ação de Alvará Judicial, no qual produzida sentença autorizando a celebração do negócio. Acrescentam que, não bastasse, a jurisprudência vem mitigando a exigência da formalização da cessão de direitos por escritura pública, admitindo inclusive a possibilidade de tal instituto por meio de termo exarado nos autos. Sem razão. Em que pese de fato se observar que a Sra. MARIA JOSÉ PIRES DO PRADO, na condição de herdeira inventariante do espólio de seus pais, tenha ajuizado a Ação de Alvará Judicial nº 581/2008 para o fim de autorizar a venda do único bem imóvel deixado pelos de cujus, possível extrair- se que somente veio a ser proferida sentença de procedência naqueles autos em 30.11.2010, condicionando-se tal alienação ao depósito em conta judicial de valor não inferior ao da avaliação constante nos autos (f. 313). Todavia, os efeitos de decisão judicial apenas perduraram até 31.01.2011, quando sobreveio decisão suspendendo o alvará judicial previamente concedido, haja vista o apontamento, pela herdeira ALDENIR PIRES DA COSTA, de valor excessivamente reduzido na avaliação do bem imóvel em discussão (f. 325). É o que basta para, desde logo, afastar-se a pretensão recursal dos ora agravantes, já que, consoante se observa do instrumento de cessão no qual se embasam os recorrentes (f. 224/227), este foi firmado ainda
em 04.04.2009, antes mesmo do curto período de tempo em que eficaz o alvará judicial que autorizava a venda do imóvel a ser partilhado pelos ora agravados. Tenha-se em mente, nesse aspecto, que o § 3º do art. 1.793 do Código Civil é claro ao expressar que "ineficaz é a disposição, sem prévia autorização do juiz da sucessão, por qualquer herdeiro, de bem componente do acervo hereditário, pendente a indivisibilidade". Não bastasse tal reconhecimento, é de se anotar, como já pontuado pela decisão interlocutória agravada, pelos herdeiros agravados e, também, pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, que o instrumento em discussão foi pactuado ao arrepio da legislação vigente. É que, nos termos dos artigos 80, II, e 1.793, caput, do Código Civil, mencionada transação dependeria, necessariamente, de instrumento público: Art. 80. Consideram-se imóveis para os efeitos legais: (...) II - o direito à sucessão aberta.
Art. 1.793. O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o co-herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública.
Desse modo, tendo sido celebrada por simples instrumento particular, agiu com acerto o juízo singular ao reconhecer, incidentalmente, a nulidade da cessão de direitos hereditárias apontada pelos ora agravantes, respeitando-se o comando do art. 166, IV, do Código Civil: Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: (...) IV - não revestir a forma prescrita em lei; É como já decidiu este Colegiado:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO CUMULADA COM PERDAS E DANOS CUMULADA COM TUTELA ANTECIPADA E REINTEGRAÇÃO DE POSSE - INVALIDADE DA CESSÃO DE DIRETOS HEREDITÁRIOS CELEBRADA POR CONTRATO PARTICULAR DE COMPRA E VENDA - ATO SOLENE QUE EXIGE ESCRITURA PÚBLICA - NEGÓCIO INVÁLIDO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO NÃO PROVIDO. (TJPR - 12ª C.Cível - AC - 972170-4 - Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Joeci Machado Camargo - Unânime - - J. 13.03.2013) Daí a bem apontada conclusão do parquet no sentido de que "o instrumento particular de cessão de direitos hereditários não possui validade jurídica perante os autos de inventário nº 532/2008" (f. 498). E não se alegue a possibilidade de alienação mediante termo nos autos vez que, para tanto, seria indispensável eventual manifestação dos cessionários nesse sentido, não podendo o Poder Judiciário compelir a cessão forçada de bens e direitos dos ora agravados. Deve-se ter em mente, ainda, que efetuado eventual pagamento em razão do instrumento de cessão de direitos hereditários, é dado aos agravantes ajuizar ação própria a fim de reaverem os valores que pagaram, como já bem indicou a decisão interlocutória agravada. Em face disso, o voto é pelo desprovimento do recurso de Agravo de Instrumento, mantendo-se hígida a decisão interlocutória agravada. III DECISÃO: Diante do exposto, acordam os Desembargadores da 11ª
Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora. A sessão de julgamento foi presidida pelo Desembargador RUY MUGGIATI, com voto, e dela participou e também acompanhou o voto da Relatora o Desembargador RUI BACELLAR FILHO. Curitiba, 03 de dezembro de 2014. Desª DENISE KRÜGER PEREIRA Relatora
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