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Acórdão
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.280.499-6, DA 2ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE FOZ DO IGUAÇU. APELANTE: Pessi Comércio de Lanches Ltda. APELADO: Município de Foz do Iguaçu e outro. RELATORA: Desª. Lélia Samardã Giacomet. APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. PLEITO DE OBTENÇÃO DE ALVARÁ DE LICENÇA DE LOCALIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO PARA CONSEQUENTE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS E EMISSÃO DE NOTAS FISCAIS. NECESSIDADE DE APRESENTAÇÃO DE LAUDO DE VISTORIA APROVADO PELO CORPO DE BOMBEIROS. ART. 530 DO DECRETO MUNICIPAL Nº 21.348/2012. IMÓVEL QUE NÃO ATENDE AOS REQUISITOS DE SEGURANÇA CONTRA INCÊNDIOS E PÂNICO. PROJETO DE ADEQUAÇÃO INACABADO. QUESTÃO DE SEGURANÇA PÚBLICA QUE ATENDE AO INTERESSE PÚBLICO PRIMÁRIO. AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA DO DIREITO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. VISTOS, discutidos e relatados os presentes autos de Apelação Cível sob nº 1.280.499-6, da 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Foz do Iguaçu, em que figura como Apelante Pessi Comércio de Lanches Ltda. e Apelados Município de Foz do Iguaçu e 9º Grupamento do Corpo de Bombeiros Militar de Foz do Iguaçu.
I RELATÓRIO:
Trata-se de recurso de apelação cível interposto contra a r. sentença de fls. 433/441, proferida nos autos de mandado de segurança com pedido liminar nº 0008814-02.2014.8.16.0030, em trâmite perante a 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Foz do Iguaçu, em que o MM. Juízo a quo denegou a segurança pleiteada, nos seguintes termos: "(...)Nota-se do caso em análise que a parte impetrante alega o abuso de poder por parte da impetradas, contudo, dos documentos carreados aos autos, não é possível verificar-se a veracidade desta alegação, posto não ser esta a situação apresentada, ausente qualquer documento que coadune tal informação.
Depreende-se dos autos que o pedido de alvará de licença de localização e funcionamento restou indeferido pelo fato de que a impetrante efetivamente não cumpriu os requisitos ensejadores da liberação, conforme se denota das informações trazidas pelo responsável pelo Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Paraná, senão, veja-se: (...)
Nesse compasso, uma vez não preenchidos os requisitos constantes da legislação, não há maneira de ocorrer a liberação do alvará de funcionamento do estabelecimento, já que inexistente a adequação às normas de prevenção e incêndio, o que prejudica a segurança pública e afronta a legalidade.
Dessa feita, resta clara a inexistência de direito líquido e certo ou mesmo de abuso de poder por parte da administração pública e assim, não existindo nos autos
elementos de prova a assegurar sua pretensão, não se configura qualquer ato ilegal ou abusivo por parte das autoridades impetradas. (...)
Diante do exposto, julgo improcedente o pedido para denegar o mandado de segurança, nos termos da fundamentação, o que faço com resolução de mérito, na forma do art. 269, inciso I do Código de Processo Civil. (...)" Inconformada, Pessi Comércio de Lanches Ltda. interpôs recurso de apelação (fls. 447/465), pleiteando a reforma integral do julgado. Sustentou, em síntese, que:
a) a Apelante é pessoa jurídica de direito privado, exercendo atualmente atividade de prestação de serviços terceirizados a companhias aéreas no ramo de alimentação serviço de bordo;
b) considerando que o alvará de licença para localização e funcionamento nº 152223/2012, emitido pelo Município de Foz do Iguaçu, venceria em 31/12/2013, a ora Apelante protocolizou novo pedido, em março de 2013;
c) ocorre que, dependendo tal alvará da realização de vistoria pelo Corpo de Bombeiros, um representante deste grupamento foi até o local em 09/04/2013, ocasião em que reprovou a construção, por considerar que as instalações estavam em desacordo com as normas de segurança contra incêndios, emitindo a notificação nº 311074/2013;
d) por tal motivo, a Apelante teve de elaborar novo projeto de prevenção contra incêndio, celebrando, em 20/05/2013, Termo de Ajustamento de Conduta TAC com o Corpo de Bombeiros;
e) o projeto de prevenção foi aprovado pelo Corpo de Bombeiros em 26/06/2013, sendo dado início imediato às obras de adequação do projeto de prevenção contra incêndios, conforme cronograma
de execução (fl. 23);
f) após a realização de outras vistorias, nas quais foram determinados ajustes variados, devidamente cumpridos pela Apelante, em 11/03/2014, o Corpo de Bombeiros solicitou a alteração do projeto de adequação às normas de segurança contra incêndio e pânico aprovado em 20/05/2013, ampliando-o e unificando-o com outras construções próximas do imóvel em questão, os quais representariam "risco incorporado";
g) inobstante as outras três construções situadas no mesmo terreno pertencerem a pessoas jurídicas distintas da Apelante, novo projeto foi apresentado, tendo sido celebrado novo Termo de Ajustamento de Conduta TAC com o Bombeiro, em 27/03/2014;
h) tendo havido o novo ajuste para com o Corpo de Bombeiros, em 28/03/2014, a Apelante requereu nova licença de localização e funcionamento junto ao Município, que deferiu provisoriamente o pedido, até 27/06/2014, não sendo emitido, contudo, o documento escrito respectivo;
i) porém, em razão da ausência da conclusão das adequações determinadas, o Corpo de Bombeiros emitiu documento ao Município, solicitando que fosse a Apelante impedida de emitir notas fiscais de prestação de serviços desde fevereiro de 2014 até a conclusão das adequações finais do projeto de prevenção contra incêndio e pânico, o que foi acatado pela municipalidade;
j) a Apelante procurou o Corpo de Bombeiros para que fosse emitido documento provisório quanto ao funcionamento do estabelecimento, para que o Município restabelecesse a emissão de notas fiscais, o que restou infrutífero;
k) sem poder emitir notas fiscais desde fevereiro de 2014, a Apelante amarga prejuízos consideráveis junto a seus parceiros comerciais;
l) desde o ano de 2007, a Apelante possui licença para localização e funcionamento conferida pelo Município, nunca tendo sido solicitada a unificação de projetos;
m) a unificação de projetos contra incêndio e pânico é incabível no caso vertente, uma vez que o imóvel é ocupado por pessoas jurídicas distintas, sem qualquer nexo de atividade.
Ao final, pugnou pelo provimento do recurso, para o fim de conceder a segurança pleiteada e, com isso, determinar a emissão do competente alvará de localização e funcionamento, permitindo que a Apelante emita normalmente notas fiscais de prestação de serviços.
O recurso foi recebido no duplo efeito.
Ambas as partes recorridas não apresentaram contrarrazões aos termos da apelação, o que se infere dos documentos de fls. 482 e 485.
Distribuído o feito neste Tribunal de Justiça, foram os autos remetidos à douta Procuradoria Geral de Justiça, a qual emitiu pronunciamento pelo desprovimento do recurso (fls. 11/15-TJ).
É o relatório.
II VOTO:
Presentes os pressupostos de admissibilidade, tanto os intrínsecos (legitimidade, interesse, cabimento e inexistência de fato impeditivo e extintivo), quanto os extrínsecos (tempestividade, preparo e regularidade formal), conheço do recurso interposto.
Cuida-se de mandado de segurança com pedido liminar impetrado por Pessi Comércio de Lanches Ltda., com vistas à obtenção de alvará de localização e funcionamento que lhe permita exercer regularmente sua atividade empresarial, o qual foi indeferido pelo Município
de Foz do Iguaçu em razão da ausência de vistoria aprovada pelo Corpo de Bombeiros quanto às normas de prevenção contra incêndio e pânico.
Pois bem.
Compulsando o presente caderno processual, tenho que não assiste razão à Apelante, devendo a sentença objurgada ser mantida incólume em grau de recurso.
Isso porque, da leitura dos escritos que compõem o feito, denota-se não haver conjunto probatório que se amolde ao conceito de prova pré-constituída.
Procedendo-se à análise detida dos autos, tem-se que a quaestio juris diz respeito à possibilidade de concessão de alvará de licença municipal para funcionamento de empresa atuante no setor de alimentos no Município de Foz do Iguaçu.
Em assim sendo, a discussão se relaciona ao exame dos pressupostos suficientes à emissão, pelo Poder Público municipal, de licença para o seu funcionamento.
Nesse contexto, em se tratando de alvará de licença, cumpre destacar o escólio de Maria Sílvia Zanella Di Pietro, in verbis: "Licença é o ato administrativo unilateral e vinculado pelo qual a Administração faculta àquele que preencha os requisitos legais o exercício de uma atividade." (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 220) (grifou-se) Celso Antônio Bandeira de Mello, por sua vez, preceitua o seguinte, in verbis:
"Licença é o ato vinculado, unilateral, pelo qual a Administração faculta a alguém o exercício de uma atividade, uma vez demonstrado pelo interessado o preenchimento dos requisitos legais exigidos." (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 21. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 418.) A jurisprudência desta Corte de Justiça possui entendimento consolidado a respeito do tema, conforme os arestos que se seguem: "DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO ADMINISTRATIVO MANDADO DE SEGURANÇA APELAÇÃO CÍVEL NEGATIVA DE CONCESSÃO DE ALVARÁ DE FUNCIONAMENTO PARA CONSULTÓRIO ODONTOLÓGICO PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE RECURSAL DO APELANTE AFASTADA RECORRENTE PESSOA JURÍDICA A QUE SE VINCULA A AUTORIDADE TIDA COMO COATORA POSSIBILIDADE PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS ALVARÁ DE LICENÇA ATO ADMINISTRATIVO VINCULADO REQUISITOS LEGAIS CUMPRIDOS OBRIGATORIEDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA EM CONCEDÊ-LO RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDO E NÃO PROVIDO, MANTENDO-SE A SENTENÇA EM SEDE DE REEXAME NECESSÁRIO. 1. Detém legitimidade para interpor recurso de apelação a pessoa jurídica à qual a autoridade assinalada como coatora se encontra vinculada, já que é em relação a ela que se operarão os efeitos da sentença. Precedentes jurisprudenciais. 2. Estando cumpridos todos os requisitos previstos em lei para a concessão de alvará de funcionamento de consultório odontológico, é imperioso que a Administração Pública proceda à sua expedição, por se tratar de ato administrativo vinculado. (TJPR - 5ª C.Cível -
ACR - 569588-3 - Dois Vizinhos - Rel.: José Marcos de Moura - Unânime - - J. 22.03.2011 grifou-se) APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. LOTEAMENTO. SUSPENSÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO EM RAZÃO DA INSTAURAÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. SEGURANÇA CONCEDIDA PARA DETERMINAR O PROSSEGUIMENTO DO PROCESSO. LICENÇA QUE SE TRATA DE ATO VINCULADO. PODER PÚBLICO QUE, SE PREENCHIDOS OS REQUISITOS LEGAIS, DEVE CONCEDÊ-LA. SUSPENSÃO PERPETUADA QUE NÃO POSSUI PREVISÃO LEGAL. SENTENÇA ESCORREITA. RECURSO DESPROVIDO, SENDO A SENTENÇA CONFIRMADA EM SEDE DE REEXAME NECESSÁRIO. (TJPR - 4ª C.Cível - ACR - 1078204-2 - Toledo - Rel.: Lélia Samardã Giacomet - Unânime - - J. 04.04.2014) In casu, em sentido diametralmente oposto às alegações deduzidas pela Impetrante, ora Apelante, restou incontroverso que, em razão da inadequação de projeto relacionado à prevenção de incêndios, o Corpo de Bombeiros não emitiu o laudo de aprovação respectivo, requisito imprescindível para que o Município de Foz do Iguaçu emitisse o competente alvará de localização e funcionamento da empresa, nos termos do Decreto Municipal nº 21.348/2012 (Código Tributário do Município de Foz do Iguaçu), em especial o disposto no art. 530, in verbis: "Art. 530. A expedição da licença de localização para funcionamento, da licença de verificação regular de funcionamento e do Habite-se ficarão condicionadas à prévia vistoria e aprovação pelo Corpo de Bombeiros.
Parágrafo Único - A vistoria de segurança e prevenção contra incêndio poderá ser executada de ofício ou a pedido do interessado." Nessa toada, ao contrário do alegado pela Apelante em suas razões de recurso, entendo que não há possibilidade de se conceder a segurança.
Afinal, o escopo da licença em questão é justamente atestar que a sede da empresa reúne condições suficientes para o seu regular funcionamento, estando em sintonia com as regras de segurança pública pertinentes.
Dessa forma, ausente um dos pré-requisitos estabelecidos pelo Município de Foz do Iguaçu para a obtenção de alvará de licença de localização e funcionamento, não há que se falar em direito líquido e certo da Apelante, sob pena de vilipendiar o próprio interesse público primário, materializado, in casu, pela necessária segurança contra incêndios e pânico, passível de atingir a coletividade.
E ainda, consigne-se que a alegação da Apelante no sentido de não poder emitir notas fiscais é mera consequência de sua inaptidão para a obtenção do alvará de localização e funcionamento, motivo pelo qual as informações prestadas pelo 9º Grupamento do Corpo de Bombeiros (fls. 400/402), no sentido de que deve ainda o imóvel adequar-se às regras de segurança contra incêndio e pânico, revelam conduta legal e razoável, com vistas ao atendimento de princípios de ordem pública insculpidos no ordenamento jurídico pátrio.
Por fim, cumpre destacar julgado proveniente deste Tribunal de Justiça em caso semelhante, in verbis: APELAÇÃO CÍVEL - MANDADO DE SEGURANÇA - CONCESSÃO DE ALVARÁ DE LICENÇA PARA COMÉRCIO VAREJISTA
DE FOGOS DE ARTIFÍCIOS - ATO ADMINISTRATIVO VINCULADO - DOUTRINA - ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL QUE NÃO CONCEDE LICENÇA, POIS O ESTABELECIMENTO ESTÁ SITUADO EM ZONA RESIDENCIAL - INEXISTÊNCIA DE EMPECILHO LEGAL QUE OBSTE O FUNCIONAMENTO DO REFERIDO ESTABELECIMENTO - APLICABILIDADE DO ARTIGO 131, §1º DA LEI MUNICIPAL 1.861/2010 - CONCESSÃO DA SEGURANÇA QUE NÃO ABRANGE SOMENTE ESTA MATÉRIA - NECESSÁRIA COMPROVAÇÃO DE QUE TODA A DOCUMENTAÇÃO PARA A CONCESSÃO DO ALVARÁ ESTÁ REGULAR - ARTIGO 8º DA LEI ESTADUAL 13.758/2002 - NECESSIDADE DE LICENÇA DA SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA DO ESTADO - INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUE ESTA LICENÇA FOI CONCEDIDA - DENEGAÇÃO DA SEGURANÇA QUE SE MANTÉM, AINDA QUE POR MOTIVOS DIVERSOS DOS COLOCADOS NA R. SENTENÇA. RECURSO DESPROVIDO. (TJPR - 4ª C.Cível - AC - 1208273-0 - Prudentópolis - Rel.: CRISTIANE SANTOS LEITE - Unânime - - J. 19.08.2014) Logo, pelos motivos dantes alinhavados, a manutenção da r. sentença é medida que se impõe.
Pelo exposto, voto no sentido de conhecer do recurso de apelação interposto e, no mérito, negar-lhe provimento, mantendo- se incólume a escorreita sentença outrora proferida.
III DECISÃO:
ACORDAM os integrantes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso de apelação, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.
Presidiu o julgamento a Excelentíssima Senhora Desembargadora Regina Afonso Portes, com voto, e dele participou o Excelentíssimo Desembargador Guido Döbeli. Curitiba, 08 de dezembro de 2014.
LÉLIA SAMARDÃ GIACOMET Desembargadora Relatora
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