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INCONSTITUCIONALIDADE AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 1.295.190- 1.295.190-1 Autor: Autor: JAMIL PECH Interessada: Interessada: CÂMARA MUNICIPAL DE PAULO FRONTIN Relator: Relator: Des. Rogério Kanayama AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 997/2014 DO MUNICÍPIO DE PAULO FRONTIN. MODIFICAÇÃO À LEI DE USO E OCUPAÇÃO DO SOLO URBANO. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO PROCESSO LEGISLATIVO. VÍCIO FORMAL NÃO EVIDENCIADO EM SEDE DE COGNIÇÃO SUMÁRIA. INOCORRÊNCIA DE DIRETA VIOLAÇÃO DIRETA AOS ARTS. 150, 151 E 152, DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. AFRONTA À LEGISLAÇÃO FEDERAL E MUNICIPAL. PLANO DA LEGALIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE CONTROLE CONCENTRADO SOBRE TAIS LEIS. REQUISITOS DO FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA NÃO CONFIGURADOS. LIMINAR INDEFERIDA. INDEFERIDA. "Os Tribunais de Justiça dos Estados, ao realizarem o controle abstrato de constitucionalidade, somente podem utilizar, como parâmetro, a Constituição do Estado" (ARE 645992 AgR, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 26/06/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-158 DIVULG 10-08-2012 PUBLIC 13-08-2012). VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Inconstitucionalidade 1.295.190- Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.295.190-1, de Paulo Frontin, em que é requerente o Prefeito Municipal de Paulo Frontin e, interessada, a Câmara Municipal de Paulo Frontin. I - Trata-se de Ação Direta de Inconstitucionalidade, com pedido de liminar, proposta por Jamil Pech, Prefeito de Paulo Frontin-PR, contra a Lei Municipal nº 997/2014, promulgada pelo Presidente da Câmara de Vereadores daquele Município, que alterou a Lei de Uso e Ocupação do Solo Urbano (Lei nº 881/2012). Sustenta o autor, em síntese, que a Lei Municipal nº 997/2014 é inconstitucional porquanto inobservados os princípios e procedimentos para alteração do Plano Diretor - que é composto, entre outras, pela Lei de Uso e Ocupação Urbana -, além de padecer de vício quanto à iniciativa para emenda. Argumenta, nesse contexto, que tal ato legislativo viola os arts. 4º, 7º, 150 e 152, da Constituição Estadual, e reflexamente o Estatuto da Cidade (Lei Federal nº 10.257/2001, em especial os arts. 43 e 44). Pede, então, a imediata suspensão da eficácia da Lei Municipal em questão e, ao final, a declaração de inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 997/2014 (fls. TJ-2/12). Acosta procuração com poderes especiais (fls. TJ-14), atos de nomeação de seus respectivos procuradores (fls. TJ-15 e 16) e documentos pertinentes (fls. 17/117). Em cumprimento ao determinado às fls. TJ-121, a Câmara Municipal de Paulo Frontin prestou informações aduzindo que a Lei Municipal em tela é formal e materialmente hígida, uma vez que se refere a uma alteração pontual da Lei de Uso e Ocupação do Solo, a qual prescinde
de participação popular (fls. TJ-128/143). Juntou documentos (fls. TJ- 147/193). Redistribuiu-se o presente feito a este Relator por sucessão ao Des. Sérgio Arenhart (fls. TJ-197). Na sequência, a douta Procuradoria-Geral do Estado defendeu a constitucionalidade da Lei Municipal nº 997/2014, ao argumento de que é plenamente possível a emenda ao Projeto de Lei de iniciativa do Executivo Municipal, desde que não implique em aumento de despesas, como é o caso. Adverte, ainda, que a Ação Direta de Inconstitucionalidade não se presta à verificação de compatibilidade entre Lei Municipal e Lei Federal (Estatuto da Cidade) (fls. TJ-204/208). Ato contínuo, a douta Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pelo indeferimento do pedido liminar ante a ausência de fumus boni iuris (fls. TJ-). II Constituem requisitos para a concessão da medida cautelar pleiteada o fumus boni iuris e o periculum in mora. Alerta, nesse passo, Reinaldo Poletti que "a concessão de liminar é condicionada a requisitos muito rígidos. A Constituição inseriu na competência do Supremo o processo e julgamento de pedido de medida cautelar das ações diretas de inconstitucionalidade (art. 102, I, p), mas ela somente é cabível quando a vigência imediata do texto contra o qual se representou poderá ocasionar dano irreparável ao Erário ou criar situação de difícil desfazimento. A suspensão liminar é medida de caráter excepcional que pressupõe demonstrada, além da relevância jurídica do fundamento da argüição, a ocorrência de interesse público prevalente, aferível pela iminência de dano irreparável ou de difícil
reparação, que recomende o imediato retorno à situação anterior" (in: Controle de constitucionalidade das leis. p. 130/131). Sob essa ótica, não vislumbro, no caso, a presença dos supramencionados pressupostos, em especial a plausibilidade jurídica dos fundamentos deduzidos pelo autor. É que, entre outros aspectos, de pronto, vê-se que não se trata de alteração da Lei nº 912/2013, que instituiu o Plano Diretor do Município de Paulo Frontin, mas da lei complementar a este (Lei nº 881/2012), ou seja, ao contrário do que sustenta o autor, nenhum dos requisitos exigidos para a elaboração ou modificação do Plano Urbanístico Geral faz-se necessário para a modificação de lei complementar a ele sujeita. Na hipótese sob exame, o Prefeito Municipal submeteu o Projeto de Lei nº. 007/2014 à apreciação da Câmara Municipal, propondo a alteração da redação do art. 3º, da Lei Municipal nº. 881/2012 (Lei de Uso e Ocupação do Solo Urbano), com o objetivo de aumentar o perímetro urbano do Município, in verbis: "Projeto de Lei 007/2014 Data 17/07/2014 Súmula: Altera a redação do Artigo 3º da Lei Municipal 881/2012, Lei de Uso de Ocupação do Solo. JAMIL PECH, Prefeito Municipal de Paulo Frontin, Estado do Paraná, no uso de suas atribuições legais, submete à apreciação dessa Egrégia Câmara de Vereadores o LEI: seguinte PROJETO DE LEI
Art. 1º. Fica alterada a redação do Artigo 3º da Lei Municipal 881/2012, passando a vigorar com a seguinte redação: "Art. 3º. O perímetro Urbano ilustrado no Mapa em anexo, fica delimitado conforme a seguinte descrição: (...) omissis (...). Art. 2º. Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação, revogadas as disposições em contrário. Paulo Frontin PR, 17 de julho de 2014. Jamil Pech Prefeito Municipal" Justificou-se o Projeto da seguinte forma: "O presente projeto visa aumentar o perímetro urbano do município atendendo ao pedido realizado pelo empresário Rogério Dalacanton e seu sócio Renato Sates, os quais pretendem implantar um loteamento próximo ao Cemitério Municipal. O referido pedido também aumentará a área urbana beneficiando outros projetos de habitação naquela região. E também atende ao pedido do Vereador Isidório Nicolau Pech em estender o perímetro para a região da PRT 160, região do posto Denilson. Ressaltamos que o pedido do empresário foi acompanhado de documentação referente a instalação de um loteamento no terreno entre a PRT 160, a BR 153 e o Cemitério Municipal de Paulo Frontin, dentro do que determina o Plano Diretor do Município.
Tal alteração visa corrigir o artigo da lei que estava errado a sequência dos pontos e foi corrigido na realização do serviço topográfico. Assim sendo, colocamos à apreciação dos nobres Edis o presente Projeto de Lei, no intuito de promover respaldo legal. Na outra banda, contando com os bons préstimos desta distinta Casa de Leis, requer seja conferido ao mesmo a tramitação em Regime de Urgência Urgentíssima" (fls. 29). Observa-se, assim, que a iniciativa do Projeto de Lei - que nada mais é do que o ato que deflagra o processo legislativo foi do Poder Executivo Local, conforme estabelece a Lei Municipal nº 881/2012 (art. 4º, § 3º, primeira parte). Contudo, a Câmara Municipal, após discussão, apresentou emenda aditiva ao referido Projeto, incluindo o art. 1º-A, para modificar o art. 9º, da Lei nº 881/2012 - Quadro 03 - com o intuito de diminuir as dimensões mínimas dos lotes de Zona Urbana de Baixa Densidade (Z1) de 360m2 para 240m2 e Zona Urbana de Densidade Média (Z2) de 300m2 para 200m2 (fls. 22/24). O Poder Executivo vetou parcialmente o Projeto de Lei, no que tange ao conteúdo da emenda, conforme mensagem de veto de fls. 25/26: "Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do inc. V do art. 65 da Lei Orgânica Municipal, decidi vetar por contrariedade ao interesse público, a emenda ao Projeto de Lei nº 007/2014, especificadamente o Artigo 1º A, o qual altera a redação do Quadro 03, da Lei 881/2012. veto: Razões do veto:
O Projeto de Lei nº. 007/2014, em sua redação original, amplia o quadro urbano do Município de Paulo Frontin, estabelecendo um perímetro urbano mais extenso e em direção à área já indicada no Plano Diretor. Tal projeto também visava atender a empreendimentos de interesse municipal com vistas à regularização fundiária de loteamentos urbanos. No entanto, a emenda ao Projeto de Lei n. º 007/2014 descaracteriza todo o Plano Diretor que foi construído com a participação popular no ano de 2012, uma vez que caso aprovada, ao invés de uma simples ampliação do perímetro urbano, acarretará uma profunda alteração legislativa. E essa alteração somente poderá ser realizada nos termos do Estatuto das Cidades (Lei Federal 10.257/01), com a observância de todo o procedimento adotado pela elaboração do Plano Diretor. É importante ressaltar que o Poder Público Municipal, no ano de 2012, investiu cerca de R$30.000,00 para estudo e elaboração do Plano Diretor, sendo que naquele instrumento não há qualquer previsão desse tipo de emenda. Portanto, realizar uma alteração tão radical, sem ouvir a comunidade, é total irresponsabilidade. Sendo assim, primado pela satisfação do interesse coletivo e descartando qualquer decisão atrelada à especulação fundiária, optamos por VETAR PARCIALMENTE a Lei 997/2014, em seu artigo 1º A, por atentar contra os princípios do Estatuto das Cidades, bem como contra os interesses da população frontinense. Portanto diante de substanciais modificações urbanísticas, imperiosa é a participação popular no processo de elaboração e modificação de projeto de lei para a alteração do Plano Diretor Municipal.
Ante a justificativa exposta e por contrariar interesse público e dispositivo legal, VETO parcialmente o Projeto de Lei nº 007/2014, no que tange à emenda proposta, devolvendo-a para exame dos membros dessa Casa de Leis, desde já solicitando seja mantida a redação original do referido PL. Ainda, anunciamos que nos próximos dias será nomeada uma Comissão Especial para análise e revisão do Plano Diretor Municipal, em obediência à legislação pertinente, a qual contará com a participação de representantes dessa Casa de Leis. Essas, Senhor Presidente, são as razões que me levaram a vetar parcialmente o projeto em causa, as quais ora submeto à elevada apreciação dos Senhores Vereadores." (fls. 25/26). A Câmara Municipal, então, derrubou o veto e promulgou a Lei nº 997/2014, publicada no Diário Oficial dos Municípios do Paraná em 24 de setembro de 2014 (fls.28/29). Pois bem. Como dito, a Lei de Regulação do Uso e Ocupação do Solo Municipal nº 881/2012, a qual foi alterada em parte pela Lei nº 997/2014 em debate, constitui-se em lei complementar ao Plano Diretor de Paulo Frontin-PR (art. 8ª, da Lei nº 912/20131). Portanto, não é o Plano Diretor em si, mas um complemento a ele.
1 "Art. 8º - Constituem leis complementares à presente Lei de Plano Diretor Municipal de Paulo Frontin os seguintes diplomas legais, a serem votadas em prazo não superior a seis meses após a promulgação da presente, obedecida a exigência de quórum qualificado, conforme disposto pela Lei Orgânica Municipal: 1. Lei de Regulação do Uso e Ocupação do Solo Municipal; 2. Lei de Regulação Local dos Instrumentos do Estatuto da Cidade; 3. Código de Obras; 4. Código de Posturas; e 5. Lei de Gestão Democrática."
Nos termos da Constituição Federal, do Estatuto da Cidade e da Constituição Estadual2, Plano Diretor é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana - obrigatório para cidades com mais de 20.000 (vinte mil) habitantes - em que o Poder Público Municipal pretenda empregar as ferramentas do parcelamento, edificação e utilização compulsórias ou inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional. José Afonso da Silva, em sua obra "Direito Urbanístico Brasileiro", ensina que "é plano, porque estabelece os objetivos a serem atingidos, o prazo em que estes devem ser alcançados (ainda que, sendo plano geral, não precise fixar prazo, no que tange às diretrizes básicas), as atividades a serem executadas e quem deve executá-las. É diretor, porque fixa as diretrizes do desenvolvimento urbano do Município". Em outras palavras, continua o doutrinador, "o plano diretor, como instrumento de atuação da função urbanística dos Municípios, constitui um plano geral e global que tem, portanto, por função sistematizar o desenvolvimento físico, econômico e social do território municipal, visando ao bem-estar da comunidade local" (ob. cit. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 138).
2 "CONSTITUIÇÃO FEDERAL Art. 182. (...) § 1º. O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana."
"ESTATUTO DA CIDADE LEI Nº. 10.257/2001 Art. 40. O plano diretor, aprovado por lei municipal, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana".
"CONSTITUIÇÃO ESTADUAL DO PARANÁ Art. 152. O plano diretor, instrumento básico da política de desenvolvimento econômico e social e da expansão urbana, aprovado pela Câmara Municipal, é obrigatório para as cidades com mais de vinte mil habitantes, expressando as exigências de ordenação da cidade e explicitando os critérios para que se cumpra a função social da propriedade urbana."
Exatamente em razão dessa função desempenhada pelo Plano Diretor e de sua importância para o planejamento urbano brasileiro é que se exige, no processo de sua elaboração e na fiscalização de sua implementação, que os Poderes Legislativo e Executivo municipais garantam "a promoção de audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade" (art. 40, § 4º, I, do Estatuto da Cidade Lei Federal nº 10.257/2001). Tanto é assim que o art. 2º, parágrafo único, da Lei nº 912/2013 (Plano Diretor de Paulo Frontin), dispõe: "Art. 2º. (...) Parágrafo único. O Plano Diretor Municipal de Paulo Frontin será revisado a qualquer momento de sua vigência, por solicitação formal de pelo menos cinco por cento do eleitorado municipal ou dois terços dos vereadores, e, independentemente de qualquer manifestação, durante o decurso do quinto ano de sua vigência, sendo assegurada a participação da sociedade através civil através de Audiências Públicas e demais formas de consulta popular, nos moldes estabelecidos pela Lei da Democrática" Gestão Democrática . Contudo, rememore-se, a Lei nº 881/2012, que regula o uso e a ocupação do solo urbano do Município de Paulo Frontin, trata de matéria sem dúvida afeta ao Plano Diretor, mas que com este não se confunde. A lição, ainda atual de José Nilo de Castro, deixa clara esta relação de complementariedade entre as referidas leis, quando esclarece que "decorrerão do plano diretor legislações específicas (codificações) sobre o uso e ocupação do solo urbano, sobre as construções
e edificações, sobre as políticas administrativas e sanitárias locais, cujas implementações após a aprovação legislativa, far-se-ão pelos órgãos e agentes executivos" (in: Direito Municipal Positivo. Minas Gerais: Editora Del Rey, 1991, p. 266). Logo, não houve qualquer violação ao contido nos arts. 150, 151 e 152, da Constituição Estadual, in verbis: "Art. 150. A política de desenvolvimento urbano será conforme executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tendo por objetivo ordenar o desenvolvimento das funções da cidade e garantir o bem-estar dos seus habitantes." (destaquei). "Art. 151. A política de desenvolvimento urbano visa assegurar, dentre outros objetivos: I - a urbanização e a regularização de loteamentos de áreas urbanas; II - a cooperação das associações representativas no planejamento urbano municipal; III - a preservação de áreas periféricas de produção agrícola e pecuária; IV -a garantia à preservação, à proteção e à recuperação do meio ambiente e da cultura; V - a criação e manutenção de parques de especial interesse urbanístico, social, ambiental, turístico e de utilização pública; VI - a utilização racional do território e dos recursos naturais, mediante controle da implantação e do funcionamento de atividades industriais, comerciais, residenciais e viárias. Art. 152. O plano diretor, instrumento básico da política de desenvolvimento econômico e social e de expansão
urbana, aprovado pela Câmara Municipal, é obrigatório para as cidades com mais de vinte mil habitantes, expressando as exigências de ordenação da cidade e explicitando os critérios para que se cumpra a função social da propriedade urbana. § 1º. O plano diretor disporá sobre: I - normas relativas ao desenvolvimento urbano; II - políticas de orientação da formulação de planos setoriais; III - critérios de parcelamento, uso e ocupação do solo e zoneamento, prevendo áreas destinadas a moradias populares, com garantias de acesso aos locais de trabalho, serviço e lazer; IV - proteção ambiental; V - ordenação de usos, atividades e funções de interesse zonal. § 2º. O Poder Público municipal poderá exigir, nos termos do art. 182, § 4°, da Constituição Federal, o adequado aproveitamento do solo urbano não- edificado, sub-utilizado ou não-utilizado." (destaquei). Até porque, quando a Constituição Estadual - ao reproduzir os termos do art. 182, da Constituição Federal3 trata das "diretrizes gerais fixadas em lei", refere-se à legislação federal, v.g., Estatuto da Cidade, exatamente como se demonstrou acima em relação ao Plano Diretor e ilustrado pelo diagrama abaixo:
3 Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da lei cidade e garantir o bem estar de seus habitantes".
Plano Diretor de Paulo Frontin Constituição Estadual art. 150
Lei Federal nº 10.257/2001 CF art. 182, caput.
Note-se que a Constituição Federal dispõe em seu art. 21, XX, que compete à União "instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos". Mais adiante, estabelece competência concorrente entre a União e os Estados e o Distrito Federal para legislar sobre direito urbanístico (art. 24, I, da CF). Porém, nesse aspecto, explicita no § 1º, do art. 24, que "no âmbito da competência concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais". Com efeito, outra não pode ser a conclusão de que quando o art. 182, caput, da Constituição Federal e, por norma de reprodução, o art. 150, da Constituição Estadual, trata das "diretrizes gerais fixadas em lei" quer de fato dizer "diretrizes gerais fixadas em lei federal". A doutrina é vasta nesse sentido, não obstante exista certa complexidade no tema, como alerta José Afonso da Silva, que também entende, ao interpretar a regra do art. 182, caput, da Constituição Federal, que o dispositivo está a se referir à lei federal.
Uadi Lammêgo Bulos, ao comentar o art. 182, caput, da Constituição Federal, explica que "as diretrizes gizadas no art. 182 devem pautar-se numa lei federal. Instituídas pela União, tais diretrizes têm a missão de consubstanciar a política de desenvolvimento urbano, a qual se liga a algo maior: a política de desenvolvimento nacional" (in: Constituição Federal Anotada. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 1.119). Pinto Ferreira, igualmente, ao interpretar referida regra, defende que "A Constituição refere-se a uma lei que edita as diretrizes gerais definindo a política de desenvolvimento urbano, enquanto o município edita leis implementadoras. A União baixa e edita as normas gerais de urbanismo válidas para todo território nacional, contendo princípios nacionais de urbanismo, que devem ser obedecidas em seus poderes básicos pelo Estado e principalmente pelos municípios. A nossa Constituição, em matéria de direito urbanístico, atribui competência concorrente à união, Estados e Municípios. A competência do Estado é limitada, pois cabe à União Legislar as normas gerais de urbanismo, cumprindo ao município editar o plano diretor ou quaisquer outros planos urbanísticos locais" (in: Comentários à Constituição Brasileira. São Paulo: Saravia, 1994, 6º volume, p. 433). Antonio Celso Di Munno Corrêa, em artigo intitulado "Planejamento Urbano", do mesmo modo, assegura que "competência para instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano equivale, pois, a competência para editar normas gerais sobre Urbanismo. Deve-se, pois, entender esta norma de competência em correlação com o que ficou insculpido no art. 182, caput, segundo o qual a política de desenvolvimento urbano, que compete ao Município executar, conforme contida no plano diretor aprovado pela Câmara Municipal (§ 1º), deve conformar-se às `diretrizes gerais fixadas em lei' isto é, na lei federal" (RT 646, p. 45).
Acompanham tal posição Celso Ribeiro Bastos e Ives Granda Martins, em Comentários à Constituição do Brasil, vol. 7, São Paulo: Saraiva, 2004, p. 206/207; bem como José Nilo de Castro, em Direito Municipal Positivo, Minas Gerais: Editora Del Rey, 1991, p. 266. Ainda, cita-se Rogério Gesta Leal, em Comentários à Constituição do Brasil, de coordenação científica de J.J. Gomes Canotilho, Gilmar Ferreira Mendes, Ingo Wolfgang Sarlet e Lenio Luiz Streck, que enfatiza que "quis a Constituição Federal de 1988 estabelecer que o instrumento de concretização e mesmo vinculação da propriedade urbana às diretrizes e objetivos da política urbana é o plano diretor, instrumento básico da política do Município, cabendo a ele regulamentar os critérios necessários para que a propriedade possa atender à sua função social. É preciso, contudo, com base na competência concorrente dos Estados e Municípios, a partir das diretrizes gerais da União federal, legislar sobre direito urbanístico. Ainda que num primeiro momento pareçam conflitantes, as disposições de cada nível legislativo não se cruzam, pois, embora disponham sobre o mesmo tema, o fazem em âmbitos distintos. Em razão das normas constitucionais, os Estados-membros, apesar de não possuírem Estados- seu competência para disciplinar o Plano Diretor quanto ao seu conteúdo, processo de elaboração e implementação, têm competência para legislar sobre direito urbanístico, assim como a União Federal tem competência para dispor sobre diretrizes gerais à ocupação do solo" (ob. cit. São Paulo: solo Saraiva, 2013, p. 1.864/1.865, sublinhei). Não se trata, então, de hipótese de afronta direta à Constituição, mas à lei federal nela referida que, sabidamente, não está sujeita a controle concentrado de constitucionalidade pelo Tribunal de Justiça Estadual.
É que só se pode falar em inconstitucionalidade, pela via concentrada no âmbito estadual, por ofensa aos arts. 150, 151 e 152, da Constituição Estadual, se houver violação direta aos seus ditames e, não, reflexa ou indiretamente em relação à lei por eles mencionada. Nesse aspecto, verifica-se a usurpação dos limites da Ação Direta de Inconstitucionalidade, no âmbito da Justiça Estadual, pois como entende o Supremo Tribunal Federal, "os Tribunais de Justiça dos Estados, ao realizarem o controle abstrato de constitucionalidade, somente podem utilizar, como parâmetro, a Constituição do Estado" (ARE 645992 AgR, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 26/06/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-158 DIVULG 10-08-2012 PUBLIC 13- 08-2012). Explica o Ministro Celso de Mello sobre a questão: "(...) como já assinalei em decisão proferida nesta Suprema Corte, crises de legalidade, que irrompem no âmbito do sistema de direito positivo, caracterizadas pela eventual inobservância, por parte do órgão estatal, do seu dever jurídico de subordinação normativa à lei, revelam-se, por sua natureza mesma, situações insuscetíveis de controle jurisdicional concentrado. Isso significa, portanto, considerada a diretriz jurisdicional firmada pelo Supremo Tribunal Federal, que, para efeito de ativação de jurisdição constitucional desta Suprema Corte, em sede de fiscalização concentrada, impõe-se que a alegada situação de inconstitucionalidade decorra, de modo direto e imediato, da própria norma estatal impugnada, inviabilizando-se, no entanto, o acesso à ação direta, se a verificação do alegado conflito hierárquico com a Carta Política depender do exame prévio ou do confronto anterior do ato
questionado com o conteúdo de outros diplomas de caráter ordinário, hipótese em que não se revelará cabível a instauração do processo de controle concentrado de constitucionalidade. Desse modo, se a exegese da lei que veio a consubstanciar-se na resolução administrativa ora questionada , divergiu do sentido e do conteúdo do diploma legislativo que pretendeu interpretar, quer porque o ato impugnado tenha se projetado ultra legem, quer porque tenha permanecido contra legem, a questão caracterizará, sempre, típica crise de legalidade, e não de inconstitucionalidade, a inviabilizar, em conseqüência, como já enfatizado, a utilização do mecanismo processual de fiscalização normativa abstrata. O conflito existente entre uma resolução administrativa, como esta emanada do E. Tribunal Superior Eleitoral, e o teor de determinado diploma legislativo, especialmente quando tal antagonismo delinear-se no contexto de um processo hermenêutico, não se alçará, só por si, ao plano da transgressão direta ao texto constitucional. (...) Torna-se evidente, pois, (...) que a inconstitucionalidade deve transparecer, diretamente, do texto do ato impugnado, cujo exame para viabilizar a instauração do processo de fiscalização concentrada supõe cotejo imediato com as normas de parâmetro inscritas na própria Constituição da República. Com efeito, a prolação do juízo de inconstitucionalidade que traduz um juízo de desvalor não pode, nem deve depender, para efeito de controle normativo abstrato, da prévia análise de outras espécies jurídicas infraconstitucionais, para, somente a partir desse exame e num desdobramento exegético ulterior, efetivar-se o reconhecimento da ilegitimidade constitucional do diploma questionado, consoante tem advertido a jurisprudência desta Suprema Corte (ADI
613/DF, Rel. p/ o acórdão Min. CELSO DE MELLO). Cabe não desconsiderar, portanto, neste ponto, a advertência do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que a finalidade a que se acha vinculado o processo de fiscalização normativa abstrata, restringe-se, tão- somente, à aferição de situações caracterizadoras de inconstitucionalidade direta, imediata ou frontal (RTJ 133/69, Rel. Min. CARLOS VELLOSO RTJ 134/558, Rel. Min. CELSO DE MELLO RTJ 137/580, Rel. Min. CARLOS VELLOSO RTJ 139/67, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.). Para que se viabilize o controle abstrato de constitucionalidade, é necessário que a situação de conflito, entre o ato estatal dotado de menor positividade jurídica e o texto da Constituição, transpareça, de maneira direta e imediata, do cotejo que se faça, desde logo, entre as espécies normativas em relação ao antagonismo, não se revelando cabível, para esse efeito, que o contraste hierárquico com a Carta Política seja feito de modo oblíquo, como ocorre no caso ora em exame, mediante confronto prévio com qualquer estatuto de caráter legal (RTJ 147/545- 546, Rel. Min. CELSO DE MELLO)" (STF, ADI 2626/DF, Tribunal Pleno, Rel. p/ o Acórdão Min. Ellen Grecie, DJ de 05.03.2004). E, mais recentemente: "AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE CONTROLE NORMATIVO ABSTRATO JUÍZO DE CONSTITUCIONALIDADE QUE DEPENDE DE CONFRONTO ENTRE DIPLOMAS LEGISLATIVOS DE ÍNDOLE INFRACONSTITUCIONAL AÇÃO DIRETA NÃO CONHECIDA PARECER DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA PELO NÃO PROVIMENTO DO RECURSO DE
AGRAVO DECISÃO QUE SE REPORTA AOS FUNDAMENTOS QUE DERAM SUPORTE AO PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO MOTIVAÇÃO "PER RELATIONEM" LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DESSA TÉCNICA DE MOTIVAÇÃO FUNDAMENTAÇÃO VÁLIDA RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. - Não se legitima a instauração do controle normativo abstrato, quando o juízo de constitucionalidade depende, para efeito de sua prolação, do prévio cotejo entre o ato estatal impugnado e o conteúdo de outras normas jurídicas infraconstitucionais infraconstitucionais editadas pelo Poder Público. A ação direta não pode ser degradada em sua condição jurídica de instrumento básico de defesa objetiva da ordem normativa inscrita na Constituição. A válida e adequada utilização desse meio processual exige que o exame "in abstracto" do ato estatal impugnado seja realizado, exclusivamente, à luz do texto constitucional. A inconstitucionalidade deve transparecer, diretamente, do próprio texto do ato estatal impugnado. A prolação desse juízo de desvalor não pode nem deve depender, para efeito de controle normativo abstrato, da prévia análise de outras espécies jurídicas infraconstitucionais, para, somente a partir desse exame e em desdobramento exegético ulterior, efetivar-se o reconhecimento da ilegitimidade constitucional do ato questionado. Precedente: ADI 842/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO. Crises de legalidade que irrompem no âmbito do sistema de direito positivo revelam-se, por sua natureza mesma, insuscetíveis de controle jurisdicional concentrado, pois a finalidade a que se acha vinculado o processo de fiscalização normativa abstrata restringe-se, tão somente, à aferição de situações configuradoras de inconstitucionalidade direta, imediata e frontal. Precedentes. O Supremo Tribunal Federal tem salientado, em seu magistério
jurisprudencial, a propósito da motivação "per relationem", que inocorre ausência de fundamentação quando o ato decisório o acórdão, inclusive reporta- se, expressamente, a manifestações ou a peças processuais outras, mesmo as produzidas pelo Ministério Público, desde que, nestas, se achem expostos os motivos, de fato ou de direito, justificadores da decisão judicial proferida. Precedentes. Doutrina. O acórdão, ao fazer remissão aos fundamentos fático-jurídicos expostos no parecer do Ministério Público e ao invocá-los como expressa razão de decidir , ajusta-se, com plena fidelidade, à exigência jurídico-constitucional de motivação a que estão sujeitos os atos decisórios emanados do Poder Judiciário (CF, art. 93, IX)." (STF, ADI 416 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 16/10/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-215 DIVULG 31-10-2014 PUBLIC 03-11-2014). Este c. Órgão Especial assim, também, se manifestou: "AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL Nº 52/2008. CRIAÇÃO DE BENEFÍCIOS FISCAIS. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL CARACTERIZADA. AUSÊNCIA DE ESTUDO DE IMPACTO ORÇAMENTÁRIO. DIMINUIÇÃO DE RECEITA QUE PODE VIR A COMPROMETER O EQUILÍBRIO DO ORÇAMENTO MUNICIPAL. ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL DECORRENTE DE AFRONTA A DISPOSITIVOS DA LEI DE LICITAÇÕES E DA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL. INOCORRÊNCIA. SUPOSTA OFENSA QUE DEVE SER RESOLVIDA NO PLANO DA LEGALIDADE, NÃO PODENDO SER ANALISADA EM SEDE DE AÇÃO DIRETA
DE INCONSTITUCIONALIDADE. 1. É inconstitucional a lei de iniciativa da Câmara Municipal que cria benefícios de ordem tributária, instituindo isenções fiscais de impostos e taxas sem respectivo estudo de impacto orçamentário, uma vez que com a diminuição de receitas pode vir a causar um desequilíbrio nas contas municipais, comprometendo o orçamento. 2. O dispositivo de norma municipal que trate de normas gerais sobre licitação e contratação mostra-se inconstitucional, uma vez que tal matéria se insere na competência privativa da União, ex vi do disposto no art. 22, XXVI, da Constituição Federal. 3. Mostra-se inviável a análise, em controle concentrado, de alegação de inconstitucionalidade material de um diploma legislativo se para tanto, é necessário o confronto do ato questionado com normas infraconstitucionais, uma vez que nesse caso, o confronto com a Constituição dá-se, quanto muito, de maneira indireta ou oblíqua. Ação julgada procedente." (TJPR - Órgão Especial - AI - 511859-0 - Cascavel - Rel.: Ruy Cunha Sobrinho - Unânime - - J. 06.08.2010). Por essa razão é que a ofensa a toda e qualquer regra não insculpida diretamente na Constituição Estadual não será caso de inconstitucionalidade mas, a depender da situação concreta, de ilegalidade. Nesse aspecto, registre-se que a Lei nº 881/2012 estabelece, em seu art. 4º, § 3º, que "por encaminhamento de projeto de Lei do Poder Executivo, ou por manifestações de pelo menos cinco por cento do Executivo eleitorado municipal, será apreciada pela Câmara Municipal proposta de criação de novas zonas urbanas, peri-urbanas ou modificações dos perímetros aqui estabelecidos, sendo assegurada a manifestação da estabelecidos
cidadania através de Audiência Pública Extraordinária revestida das formalidades constantes da Lei de Gestão Democrática" (sublinhei). Ora, na hipótese em estudo, tais requisitos não foram observados quando da apresentação do Projeto de Lei nº 007/2014 (visando aumentar o perímetro urbano), de autoria do Poder Executivo Local, à Câmara de Vereadores. A Lei Municipal nº 997/2014, a priori, não cumpriu o processo legislativo previsto nas Leis Municipais nº 881/2012 e 885/2012 para a sua alteração. Entretanto, isso não afronta a Constituição Estadual, por tratar-se, como visto, de mera ilegalidade. Para melhor compreensão, observe-se o gráfico abaixo: Constituição Federal Estatuto da Cidade Constituição Estadual
Plano Diretor de Paulo Frontin
Lei de Lei de Regulação Código de Obras Código de Lei de Gestão Regulação do Local dos Posturas Democrática Uso e Ocupação Instrumentos do Estatuto da do Solo Cidade Municipal Ademais, não vislumbro qualquer vício quanto à iniciativa de emenda ao Projeto de Lei Municipal. Como se sabe, a apresentação de emendas conceituadas por Manoel Gonçalves Ferreira Filho "como uma iniciativa acessória ou secundária, segundo o direito positivo brasileiro é a proposta
de direito novo já proposto, sendo reservado aos membros do Poder Legislativo o poder de Emendar" (Do processo legislativo. São Paulo: saraiva, 1995, p) para ser válida precisa guardar pertinência temática com o projeto inicial e não gerar aumento de despesa, exatamente como ocorre na espécie. Esse é o entendimento do Supremo Tribunal Federal: "Ação direta de inconstitucionalidade. Lei nº 10.926/1998 do Estado de Santa Catarina. Tribunal de contas. Vício de iniciativa. Inconstitucionalidade formal. Transposição de cargos de corte de contas para o quadro de pessoal do Poder Executivo. 1. Inconstitucionalidade formal de dispositivo acrescentado por emenda parlamentar que transpõe cargos de analista de controle externo do quadro de pessoal do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina para o grupamento funcional do Poder Executivo local. Essa transposição promove indiretamente a extinção de cargos públicos pertencentes à composição funcional do Tribunal de Contas do Estado. 2. Conforme reconhecido pela Constituição de 1988 e pelo Supremo Tribunal Federal, gozam as cortes de contas do país das prerrogativas da autonomia e do autogoverno, o que inclui, essencialmente, a iniciativa reservada para instaurar processo legislativo para criar ou extinguir cargos, como resulta da interpretação sistemática dos arts. 73, 75 e 96, II, b, da Constituição Federal (cf. ADI nº 1.994/ES, Relator o Ministro Eros Grau, DJ de 8/9/06; ADI nº 789/DF, Relator o Ministro Celso de Mello, DJ de 19/12/94). 3. A jurisprudência da Corte é firme no sentido de que a Constituição Federal veda ao Poder
Legislativo formalizar emendas a projetos de iniciativa exclusiva se delas resultar aumento de despesa pública ou se forem elas totalmente impertinentes à matéria versada no projeto (ADI nº 3.288/MG, rel. Min. Ayres Britto, DJ de 24/2/11; ADI n° 2350/GO, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ de 30/4/2004). No caso dos autos, o projeto original já versava acerca da transposição de cargos públicos, mas essa transposição limitava-se a cargos do quadro do Poder Executivo. 4. Ação julgada procedente." (STF, ADI 3223, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 06/11/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-021 DIVULG 30-01- 2015 PUBLIC 02-02-2015). "AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 2º DA LEI GAÚCHA N. 10.385/1995. PARALISAÇÃO DOS SERVIDORES DO PODER JUDICIÁRIO ESTADUAL. DIAS PARADOS CONTADOS COMO DE EFETIVO EXERCÍCIO. EMENDA PARLAMENTAR. ALTERAÇÕES DO DISPOSITIVO APONTADO COMO PARÂMETRO DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DA NORMA IMPUGNADA. PREJUDICIALIDADE DA AÇÃO NÃO CONFIGURADA. DESRESPEITO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES E À AUTONOMIA ADMINISTRATIVA E FINANCEIRA DO PODER JUDICIÁRIO. 1. Alterações promovidas pelas Emendas Constitucionais n. 19/1998 e 41/2003 não causam prejuízo à análise da constitucionalidade da norma impugnada à luz do art. 96, inc. II, al. b, da Constituição da República. 2. Admissão de emendas parlamentares aos projetos de lei de iniciativa privativa do Poder Executivo e Judiciário, desde que guardem pertinência temática com o projeto e não importem em aumento de despesas. 3. A Emenda Parlamentar n. 4/1995 afastou-
se da temática do Projeto de Lei n. 54/1995, interferiu na autonomia financeira e administrativa do Poder Judiciário: desrespeito ao art. 2º da Constituição da República. 4. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente." (ADI 1333, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 29/10/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-226 DIVULG 17-11-2014 PUBLIC 18-11-2014). Por fim, não se antevê o risco da irreparabilidade dos danos emergentes do ato impugnado porquanto não demonstrado a urgência na suspensão da Lei Municipal, especialmente por não acarretar acréscimo de despesas ao erário. Acentue-se que o "iminente receio de conflito entre os Poderes em face de injunções políticas com conotações partidárias opostas" (fls. 11), não conduz à caracterização do periculum in mora ou da alta conveniência da Administração, que pressupõe a possibilidade de prejuízo decorrente do retardamento da decisão postulada e a irreparabilidade ou insuportabilidade dos danos oriundos do próprio ato impugnado. Além disso, no exame do mérito, poder-se-á modular os efeitos do que vier a ser decidido. III Do exposto, voto pelo indeferimento do pedido de liminar.
ACORDAM os Desembargadores integrantes do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em indeferir o pedido de liminar.
Participaram do julgamento os Desembargadores Telmo Cherem (Presidente eventual, com voto), Regina Afonso Portes, Gamaliel Seme Scaff, Prestes Mattar, Rogério Coelho, Marcos S. Galliano Daros, Marques Cury, Maria José de Toledo Marcondes Teixeira, Jorge Massad, Sônia Regina de Castro, Lauro Laertes de Oliveira, Eugênio Achille Grandinetti, Cláudio de Andrade, D'artagnan Serpa Sá, Luís Carlos Xavier, Luiz Osório Panza, Renato Lopes de Paiva, Luís Espindola e Guilherme Freire Teixeira. Curitiba, 4 de maio de 2015.
ROGÉRIO KANAYAMA Relator
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