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APELAÇÃO CÍVEL Nº 1330334-7, DA 17ª VARA CÍVEL DE CURITIBA
Apelante : SOCIEDADE EDUCACIONAL TUIUTI LTDA
Apelado : MINISTÉRIO PÚBLICO
Relator : Des. LEONEL CUNHA EMENTA 1) DIREITO AMBIENTAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROTEÇÃO E PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE. CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÕES DE FAZER COM INDENIZAÇÃO PECUNIÁRIA (ART. 3º DA LEI Nº 7.347/1985). POSSIBILIDADE. DANOS MORAIS COLETIVOS. CABIMENTO. a) Destaca-se que nos danos ambientais incide a teoria do risco integral, advindo daí o caráter objetivo da responsabilidade, com expressa previsão constitucional (artigo 225, parágrafo 3º, da Constituição Federal) e legal (artigo 14, parágrafo 1º, da Lei nº 6.938/1981. Ou seja, adota-se a responsabilidade objetiva e a reparação integral do dano em razão do princípio da indisponibilidade do interesse público na proteção ao meio ambiente. b) Tal responsabilidade civil na área ambiental visa evitar a ocorrência de danos, estabelecendo medidas repressivas destinadas a inibir a prática deliberada de danos ambientais; ou, quando este é inevitável ou já ocorreu, buscar repará-lo da maneira mais completa possível. c) Além disso, temos que um dano ao meio ambiente pode gerar consequências patrimoniais e extrapatrimoniais (pode atingir tanto a esfera moral individual como a esfera coletiva). Ou seja, um mesmo dano ambiental pode ter reflexo patrimonial e também atingir a esfera moral individual e coletiva, acarretando a responsabilização do poluidor em todas, se for o caso, eis que a reparação ambiental deve ser a mais completa possível. d) E, nesse sentido, destaca-se que nos termos do artigo 3º da Lei nº 7.347/1985, a Ação Civil Pública poderá ter por objeto a condenação em dinheiro, bem como o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, portanto, não restam dúvidas a respeito da possibilidade de cumulação de obrigações de fazer com indenização pecuniária. e) No que diz respeito à indenização por dano moral coletivo, entendo que é cabível por aplicação do artigo 1º da Lei nº 7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública), que passou a prever as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados ao meio ambiente ou a qualquer outro interesse difuso ou coletivo, por ser o meio ambiente um bem público, gera repercussão geral, impondo conscientização coletiva à sua reparação, resguardando, assim, o direito das futuras gerações a um meio ambiente ecologicamente equilibrado. f) É bem de ver, ainda, que para a caracterização do dano moral coletivo ambiental é desnecessário a demonstração de que a coletividade sinta a dor, a repulsa, a indignação, tal qual fosse um indivíduo isolado (REsp 1269494/MG), mas apenas a demonstração dos danos suportados pela coletividade ante a degradação ambiental sofrida. g) Nessa ordem de ideais, destaca-se que o explorador da atividade econômica tem o dever de garantir a preservação ambiental, e, portanto, os danos decorrentes da sua atividade, sejam patrimoniais ou extrapatrimoniais, estarão sempre vinculados a ela, não, sendo, necessário, portanto, se investigar ação ou a conduta do poluidor já que o risco a ela substitui-se. h) Não fosse isso, verifica-se que a propriedade da Ré-Apelante integra o setor especial de áreas verdes, conforme se infere do Laudo Pericial, e, por isso, o ordenamento jurídico dá proteção especial e a sua exploração depende de prévia autorização do órgão ambiental competente, conforme se infere da Lei Municipal nº 9.806/2000, que instituiu o Código Florestal do Município de Curitiba. i) Nessas condições, a sentença merece mantida, visto que pelos documentos juntados aos autos e pelo conteúdo do Laudo Pericial observou-se a existência de dano ambiental causado pela construção de edificações sem que fossem observadas as normas atinentes, bem como pela supressão de vegetação de bosque no interior do terreno, e, ainda, que a Apelante realizou obras, independentemente da inexistência de Alvarás ou Autorizações ambientais e descumpriu em parte o Termo de Compromisso de Ajustamento, evidenciando o menoscabo para com o meio ambiente. 2) DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PROPOSTA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NÃO CABIMENTO. ENUNCIADO 2 DAS 4ª E 5ª CÂMARAS CÍVEIS. a) O trabalho desempenhado pelo Promotor de Justiça quando da propositura e acompanhamento de ações é obrigação institucional previamente paga pelo Estado, não podendo ser, ainda, remunerado pela condenação do vencido em pagamento de honorários advocatícios, porque de trabalho advocatício não se trata, nem com ele se confunde. b) Mesmo que tal verba se destine a Fundo para tanto especialmente criado, ainda assim descabe o pagamento, sobretudo porque esse mesmo Fundo não está disposto a pagar honorários quando vencida a Instituição. c) Nesse diapasão é o Enunciado nº 2 da Quarta e da Quinta Câmaras Cíveis, segundo o qual: "Em sede de ação civil pública, a condenação do Ministério Público ao pagamento de honorários advocatícios somente é cabível na hipótese de comprovada e inequívoca má-fé; dentro de absoluta simetria de tratamento e à luz da interpretação sistemática do ordenamento jurídico, não pode o "parquet" beneficiar- se dessa verba, quando for vencedor na ação civil pública". 3) APELO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO. SENTENÇA REFORMADA, DE OFÍCIO, PARA EXCLUIR A CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Vistos, RELATÓRIO 1) Em 1º de junho de 2007, o MINISTÉRIO PÚBLICO ajuizou AÇÃO CIVIL PÚBLICA em face de SOCIEDADE CIVIL EDUCACIONAL TUIUTI LTDA (fls. 02/33), alegando que: a) em 25 março de 2002, a Associação Xama registrou na Promotoria de Proteção ao Meio Ambiente representação a respeito do aterro de área vegetal localizado onde estava sendo construído o Campus Barigui da Faculdade Tuiuti; b) o imóvel localiza-se na rua Padre Landislau Kula e faz parte do setor especial de áreas verdes e atingido pelo Bosque Nativo Relevante nº BO-0047-A, e, portanto, deve seguir os parâmetros de ocupação estabelecidos pela Lei Municipal nº 9.806/2000 e pelo Decreto nº 194/2000; c) a partir da implantação do
empreendimento, início de 1990, verifica-se por meio de fotos áreas que ocorreu desmate do bosque, que atinge uma área de aproximadamente 30.000 (trinta mil) metros quadrados; d) a Secretaria Municipal do Meio Ambiente SMMA, em resposta a Ofício encaminhado, informou que no ano de 2000 na tentativa de regularizar o empreendimento, solicitou com base no Relatório Ambiental Prévio e em parecer técnico, complementações e esclarecimentos; no entanto, não obteve retorno até 25 de junho de 2003, bem como informou que ocorreu supressão da vegetação nativa e execução de aterro irregular (sem consulta e autorização da Secretaria), e, ainda, que encaminhou as notificações sob nºs 12450/B e 12545/B e lavrou os Autos de Infração sob nºs 4070 e 4076; e) após a realização de audiências e de se constatar que existiam inúmeras irregularidades no aspecto ambiental, no sistema viário e no aspecto urbanístico, restou firmado, em 23 de abril de 2004, Termo de Compromisso de Ajustamento entre a Secretaria Municipal do Meio Ambiente e a Sociedade Civil Educacional Tuiuti, visando a adequação ambiental e urbanística; no entanto, ante o não cumprimento pela Sociedade Civil Educacional Tuiuti, o Ministério Público
ingressou com a presente demanda judicial; f) o resultado da consulta ao procedimento nº 01-118462/2, em 18 de dezembro de 2006, elenca as irregularidades do empreendimento; g) é necessário que a Ré seja compelida a dar prosseguimento ao processo de licenciamento ambiental, complementando o Relatório Ambiental Prévio e implantando as medidas mitigatórias e compensatórias; h) o empreendimento não atende a função social da propriedade, uma vez que não respeita as limitações urbanísticas, bem como porque ocorreu corte mão autorizado de vegetação; i) a Ré deve ser condenada ao pagamento de dano moral, visto que ocorreu desmatamento de bosque nativo, bem como porque a edificação não atende às normas urbanísticas e permanece por mais de 10 (dez) anos sem Alvará de Funcionamento e sem o devido licenciamento ambiental; e, j) nos termos do artigo 21 da Lei nº 7.347/1985 e do artigo 6º, inciso VIII, da Lei nº 8.078/1990 aplica-se, no caso, a inversão do ônus da prova. Pediu, liminarmente, fosse a Ré impedida de ampliar a área construída sem que houvesse aprovação do Município, sob pena de aplicação de multa diária conforme possibilitada o artigo 12 da Lei nº 7.347/1985, e, ao final, requereu fosse a Ré condenada em
obrigação de fazer, sob pena de ter decretada a interdição definitiva do empreendimento, consistente na apresentação do laudo de vistoria expedido pelo Corpo de Bombeiros, do Alvará de Licença para localização e funcionamento vigente, do Alvará Comercial para os ramos de ensino superior, graduação e pós-graduação, do Certificado de vistoria e conclusão de obras; e, da Licença Ambiental expedida pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente, bem como fosse condenada na obrigação de fazer consistente na complementação do Relatório Ambiental Prévio RAP, no atendimento das exigências urbanísticas, no cumprimento das medidas compensatórias contidas no Relatório Ambiental Prévio RAP, após sua aprovação pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, na demolição das áreas construídas em desacordo com a legislação municipal e na implantação do plano de recuperação das áreas degradadas, e, por fim, requereu fosse a Ré condenada ao pagamento de indenização por danos causados ao meio ambiente e por danos morais ambiental.
2) A SOCIEDADE EDUCACIONAL TUIUTI LTDA SET contestou (fls. 163/173), alegando que: a) em 2002 o Ministério Público iniciou o procedimento
Investigatório Preliminar nº 084/2002, e, que após diversas reuniões entre as partes envolvidas, celebrou Termo de Ajustamento, no qual restou obrigada a providenciar a regularização da área, e, para tanto contratou empresas especializadas para desenvolver os estudos necessários, bem como efetuou reformas e adquiriu áreas para abertura de ruas e ofereceu área em bairro de alto padrão para realizar compensação ambiental; no entanto, ante a burocracia dos entes públicos não conseguiu regularizar a área; b) o Autor da ação realizou procedimento investigatório preliminar (nº 84/2012); contudo, não instruiu a presente ação com todos os documentos juntados ao referido procedimento, e, mesmo tendo solicitado cópias, não obteve autorização no prazo da defesa, e, por isso, deve ser determinado a juntada de cópia integral do procedimento investigatório; c) embora fosse interessada, não a convocaram para a audiência realizada em 27 de março de 2007, em que compareceram representantes de diversos órgãos e na qual a Secretaria Municipal de Meio Ambiente informou que o licenciamento da obra estava parado desde 2006 por não ter sido aceito o imóvel indicado a título de compensação; d) que o Município não aceitou o imóvel
para fins de compensação porque está exigindo a entrega de áreas construídas que não se relacionam com o propósito da doação, qual seja, a permuta ambiental; e) as informações solicitadas pelo Ministério Público foram prestadas; f) o Município exigiu fosse adquirido um terreno nos arredores do Campus Universitário, cuja finalidade seria a abertura de uma Rua; contundo, embora tenha aberto e pavimentado a Rua, o Município considera como não cumprida a obrigação ante a ausência de termo de doação; g) realizou diversas benfeitorias nos arredores do Campus Universitário; no entanto, não estão sendo consideradas pelo Ministério Público; h) não há falar-se em dano ambiental porque a doação da área preservada teve como finalidade exatamente a reparação dos alegados damos ambientais; i) que a sua pretensão de compensação ambiental não implica em admissão de culpa acerca de eventual dano ambiental; j) a questão não enseja a condenação por dano moral ambiental, visto que o dano ambiental, por si só, não gera a indenização por dano moral, havendo, a necessidade de o fato atingir a esfera subjetiva das pessoas; k) não é caso de inversão do ônus da prova, porquanto o Ministério Público não é hipossuficiente; e, l) as licenças
requeridas na petição inicial dependem da aprovação do Relatório Ambiental Prévio RAP. 3) A decisão (fls. 348/350) antecipou os efeitos da tutela, determinando não fosse ampliada a área construída, sem que houvesse aprovação do Município. 4) O despacho saneador (fls. 359/361) deferiu a produção de prova pericial ambiental a ser produzida pela Ré, visto que lhe cabe demonstrar que não está causando os danos apontados na petição inicial, e, nomeou o perito. 5) As partes apresentaram quesitos e indicaram os assistentes técnicos, conforme se infere das fls. 364/367 e 368/370. 6) Nas fls. 473/1.391 restou juntado aos autos o Laudo Pericial, e, as partes se manifestaram nas fls. 1.394/1.397 e 1.404/1.405. 7) A sentença (fls. 1.415/1.433) julgou procedentes os pedidos contidos na petição inicial,
"para o fim de condenar a ré à obrigação de fazer consistente em apresentar em Juízo laudo de vistoria expedido pelo Corpo de Bombeiros, alvará e licença para localização e funcionamento vigente, alvará comercial para os ramos de ensino superior, graduação e pós-graduação, certificado de vistoria e conclusão de obras (habite-se), licença ambiental expedida pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente; condenar a ré à obrigação de fazer consistente na Complementação do Relatório Ambiental Prévio RAP apresentado, com as exigências provenientes do Município, atendimento às exigências urbanísticas provenientes da SMU constantes da guia amarela, cumprimento das medidas compensatórias contidas no RAP, após sua aprovação pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente, demolição as áreas construídas em desacordo com a legislação municipal ou sua regularização mediante aquisição de potencial construtivo, implantação do Plano de Recuperação das Áreas Degradadas aprovado pelo Município; condenar a ré ao pagamento de indenização por dano moral ambiental no valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), com incidência de correção monetária pela média do INPC/IGP-DI e juros moratórios de 1% (um por cento ao mês), ambos a partir da data
desta sentença, posto ter sido nesta que houve o arbitramento do valor, de modo atualizado, devendo o valor ser depositado em favor do Fundo de Direitos Difusos (FDD)" (fls. 1.432/1.433), bem como fixou o prazo de 12 (doze) meses para o cumprimento das obrigações de fazer, bem como o prazo de 30 (trinta) dias para o início dos trabalhos, a partir do trânsito em julgado, sob pena de interdição do empreendimento e multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais), e, ainda, condenou a Ré ao pagamento das custas e despesas processuais e os honorários advocatícios, fixados em R$ 30.000,00 (trinta mil reais). 8) A SOCIEDADE EDUCACIONAL TUIUTI LTDA apelou (fls. 1.440/1.456), alegando que: a) a sentença merece reformada quanto às obrigações de fazer, visto que não obteve os Alvarás e as Licenças ante a exigências indevidas efetuadas pelo Município; b) a sentença merece reformada também quanto à condenação por danos morais ante à ausência de demonstração de dano individualizado, capaz de configurar o dano moral ambiental suscetível de indenização, e, caso seja mantida a condenação, o valor é excessivo, devendo ser minorado; e, c) os
valores fixados a título de honorários advocatícios devem ser reduzidos, visto que o valor fixado corresponde a 60% (sessenta por cento) do valor atribuído à causa.
9) Contrarrazões juntadas nas fls. 1.460/1.467.
É o relatório.
FUNDAMENTAÇÃO
a) Do exercício de atividade sem que houvesse licenças e autorizações necessárias, ocorrência de danos ambientais e dano moral coletivo
Observa-se dos autos que a SOCIEDADE EDUCACIONAL TUIUTI desenvolve as suas atividades irregularmente no Campus Barigui, visto que não possui Certificado de Vistoria de Conclusão de Obras, Alvará de Construção, Localização e Funcionamento, Alvará Comercial para os ramos de ensino superior, graduação e pós-graduação e Licença Ambiental e Licença Sanitária, bem como que existem edificações que foram construídas sem que se observassem as disposições atinente à matéria, e, ainda, que a
estrutura da instituição de ensino restou implantada sem que houvesse autorização ou licença do órgão ambiental, conforme se infere do Laudo apresentado pelo Senhor Perito Judicial, mais precisamente no item 7.2 (f. 479), na resposta ao quesito nº 03 (f. 481), na resposta ao quesito nº 04 (f. 481), na resposta ao quesito nº 18 (f. 486), na resposta aos quesitos nºs 20, 21 e 22 (fls. 486/487), bem como dos documentos juntados nas fls. 509/512, f. 534 e fls. 685/686.
Nesse aspecto, destaca-se que o Senhor Perito Judicial afirmou em seu Laudo que "além das questões ambientais que envolvem o imóvel da Requerida, tem-se que existem edificações de considerável porte que necessitam ser regularizadas, porém, ressalte-se que tais edificações extrapolam a área passível de construção do referido terreno, necessitando pois regularizar tal situação junto ao Município de Curitiba, ocasião em que serão estudadas, de acordo com a legislação vigente, as possibilidades de adequação das referidas edificações através de imposições de multas e/ou outras providências cabíveis a serem apuradas pelo poder público municipal (eventualmente por aquisição de potencial construtivo); desta feita Excelência, diante de todas as
irregularidades verificadas no imóvel da Requerida, a mesma, até a presente data, não possui Certificado de Vistoria de Conclusão de Obras, Alvará de Licença para localização e funcionamento e Alvará Comercial; uma vez que tais documentos dependem das providências a serem tomadas pela Requerida para regularização definitiva das questões ligadas ao presente imóvel, ou seja, dito imóvel carece de regularização imediata junto ao Poder Público" (f. 479, destaquei). Além disso, verifica-se que o Relatório Ambiental Prévio ainda não restou aprovado pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, bem como que ocorreu supressão de vegetação de bosque no interior do terreno, conforme se infere do Laudo apresentado pelo Senhor Perito Judicial, mais precisamente no item 7.1 (f. 478), na resposta ao quesito nº 03 (f. 481), na resposta ao quesito nº 06 (fls. 482/483), na resposta ao quesito nº 08 (f. 483) e dos documentos juntados na f. 506 e fls. 508/512. Nesse aspecto, destaca-se que o Senhor Perito Judicial esclareceu em seu Laudo que "a Requerida Sociedade Educacional Tuiuti Ltda. de fato
realizou a supressão de vegetação de bosque no interior do terreno ocupado pela mesma, conforme pode ser visualizado no Mapa Elucidativo presente no Anexo III deste Laudo Pericial, donde verifica-se, que entre os anos de 2000 a 2010 foram suprimidos 6.219,10 metros quadrados de vegetação da bordadura do bosque existente naquele imóvel; frise-se Excelência, que o Município de Curitiba, através da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, vem, desde o ano 2000, tentando realizar a regularização do empreendimento da Requerida, principalmente no que se refere a questão ambiental, sem sucesso; saliente-se que a Requerida elaborou um Relatório Ambiental Prévio RAP, porém, após análises da referida Secretaria do Meio Ambiente, tem-se que tal Relatório necessitou complementações, que não foram satisfeitas pela Requerida prontamente; ou seja, somente em novembro de 2005, o Município de Curitiba considerou que as complementações do RAP estavam suficientes, restando apenas pendente a questão da compensação ambiental, ajustada no TAC Termo de Compromisso de Ajustamento (fls. 56/59 dos autos), com relação ao imóvel de indicação fiscal nº 53.084.008000, pois houve discordância acerca das edificações existentes no imóvel" (f. 478, destaquei).
Destaca-se que o artigo 225 da Constituição Federal prevê os princípios da restauração, recuperação e reparação do meio ambiente, e ainda, no parágrafo 3º, traz expressamente a obrigação de reparar os danos causados. Observe-se:
"Art. 225 Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. §3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados" (destaquei).
E a Lei nº 6.938/1981, em seu artigo 14, parágrafo 1º, estabelece a responsabilidade objetiva nos seguintes termos: "Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a
indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente" (destaquei).
Desse modo, nos danos ambientais incide a teoria do risco integral, advindo daí o caráter objetivo da responsabilidade, com expressa previsão constitucional (artigo 225, parágrafo 3º, da Constituição Federal) e legal (artigo 14, parágrafo 1º, da Lei nº 6.938/1981. Ou seja, adota-se a responsabilidade objetiva e a reparação integral do dano em razão do princípio da indisponibilidade do interesse público na proteção ao meio ambiente.
Tal responsabilidade civil na área ambiental visa evitar a ocorrência de danos, estabelecendo medidas repressivas destinadas a inibir a prática deliberada de danos ambientais; ou, quando este é inevitável ou já ocorreu, buscar repará-lo da maneira mais completa possível.
Nesse sentido são os ensinamentos de PAULO AFFONSO LEME MACHADO: "A responsabilidade
objetiva ambiental significa que quem danificar o ambiente tem o dever jurídico de repará-lo. Presente, pois, o binômio dano/reparação. Não se pergunta a razão da degradação para que haja o dever de indenizar e/ou reparar. A responsabilidade sem culpa tem incidência na indenização ou na reparação dos danos causados ao meio ambiente e aos terceiros afetados por sua atividade (art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/81). Não interessa que tipo de obra ou atividade seja exercida pelo que degrada, pois não há necessidade de que ela apresente risco ou seja perigosa. Procura-se quem foi atingido e, se for o meio ambiente e o homem, inicia-se o processo lógico-jurídico da imputação civil objetiva ambiental. Só depois é que se entrará na fase do estabelecimento do nexo de causalidade entre a ação ou omissão e do dano. É contra o Direito enriquecer-se ou ter lucro à custa da degradação do meio ambiente" (Paulo Affonso Leme Machado. Direito Ambiental Brasileiro. 15ª edição. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 347, destaquei).
Destaca-se que a propriedade da SOCIEDADE EDUCACIONAL TUIUTI integra o setor especial de áreas verdes, conforme se infere da resposta dada pelo Senhor Perito Judicial aos quesitos
nº 12 e nº 13 (f. 485), e, por isso, o ordenamento jurídico dá proteção especial e a sua exploração depende de prévia autorização do órgão ambiental competente, conforme se infere da Lei Municipal nº 9.806/2000, que instituiu o Código Florestal do Município de Curitiba.
Nesse aspecto, os artigos 5º e 6º da Lei Municipal nº 9.806/2000, estabelecem que "É vedado o abate, derrubada ou morte provocada, de árvore(s) nos Bosques Nativos Relevantes ou nos Bosque Nativos, sem autorização especial emitida pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente - SMMA, ficando os infratores sujeitos às penalidades previstas nesta lei" (destaquei), bem como que "É vedada a roçada nos Bosques Nativos Relevantes de qualquer terreno situado no Setor Especial de Áreas Verdes, ficando os infratores sujeitos as penalidades previstas no Capítulo II do Título III, desta lei" (destaquei).
Noutro aspecto, temos que um dano ao meio ambiente pode gerar consequências patrimoniais e extrapatrimoniais (pode atingir tanto a esfera moral individual como a esfera coletiva). Ou seja, um mesmo dano ambiental pode ter reflexo patrimonial e também
atingir a esfera moral individual e coletiva, acarretando a responsabilização do poluidor em todas, se for o caso, eis que a reparação ambiental deve ser a mais completa possível.
Nesse sentido, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: "DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO AMBIENTAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA PELA EMISSÃO DE FLÚOR NA ATMOSFERA. TEORIA DO RISCO INTEGRAL. POSSIBILIDADE DE OCORRER DANOS INDIVIDUAIS E À COLETIVIDADE. NEXO DE CAUSALIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. DANO MORAL IN RE IPSA. (...) 2. É firme a jurisprudência do STJ no sentido de que, nos danos ambientais, incide a teoria do risco integral, advindo daí o caráter objetivo da responsabilidade, com expressa previsão constitucional (art. 225, § 3º, da CF) e legal (art. 14, § 1º, da Lei n. 6.938/1981), sendo, por conseguinte, descabida a alegação de excludentes de responsabilidade, bastando, para tanto, a ocorrência de resultado prejudicial ao homem e ao ambiente advindo de uma ação ou omissão do responsável. (...) 4. É jurisprudência pacífica desta Corte o entendimento de que um mesmo dano ambiental pode atingir tanto a
esfera moral individual como a esfera coletiva, acarretando a responsabilização do poluidor em ambas, até porque a reparação ambiental deve ser feita da forma mais completa possível. 5. Na hipótese, a leitura da exordial afasta qualquer dúvida no sentido de que os autores - em sua causa de pedir e pedido - pleiteiam, dentre outras, a indenização por danos extrapatrimonias no contexto de suas esferas individuais, decorrentes do dano ambiental ocasionado pela recorrente, não havendo falar em violação ao princípio da adstrição, não tendo a sentença deixado de apreciar parcela do pedido (citra petita) nem ultrapassado daquilo que fora pedido (ultra petita). (...) 7. Recurso especial a que se nega provimento" (REsp 1175907/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 19/08/2014, DJe 25/09/2014, destaquei).
Nessa ordem de ideais, destaca-se que o explorador da atividade econômica tem o dever de garantir a preservação ambiental, e, portanto, os danos decorrentes da sua atividade, sejam patrimoniais e extrapatrimoniais, estarão sempre vinculados a ela, não, sendo, necessário, portanto, se investigar ação ou a conduta do poluidor já que o risco a ela substitui-se.
No caso dos autos, conforme já mencionado, e, bem observado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO "o apelante efetivamente infringiu as disposições constantes na legislação ambiental específica. Não realizou estudo de impacto ambiental (apenas o Relatório Ambiental Prévio, o qual não foi aprovado pela SMMA), implantou a estrutura da instituição de ensino sem qualquer autorização ou licença do órgão ambiental estadual, suprimiu vegetação de mata nativa, condutas que são expressamente vedadas pela legislação ambiental" (fls. 1.482/1.483).
Observa-se, assim, a existência de dano ambiental causado pela construção de edificações sem que fossem observadas as normas atinentes, bem como pela supressão de vegetação de bosque no interior do terreno, e, ainda, que a Apelante que realizou obras, independentemente da inexistência de Alvarás ou Autorizações ambientais, bem como descumpriu em parte o Termo de Compromisso de Ajustamento, evidenciando o menoscabo para com o meio ambiente, conforme se infere do Laudo apresentado pelo Senhor Perito Judicial (fls. 472/496).
A falta de acordo entre a Apelante e o Município de Curitiba acerca da área a ser doada para a compensação do dano ambiental, no aspecto patrimonial, não pode ser objeto de decisão nos presentes autos, eis que o Município não é parte.
O que se tem é um Termo de Compromisso de Ajustamento não concretizado. Se a Apelante não concorda com as condições estabelecidas pelo Município, deve contra ele demandar, sendo inidôneo o argumento lançado nestes autos para tentar eximir-se de suas responsabilidades pelos danos ambientais causados.
No que diz respeito à indenização por dano moral coletivo, entendo que é cabível por aplicação do artigo 1º da Lei nº 7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública), que passou a prever as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados ao meio ambiente ou a qualquer outro interesse difuso ou coletivo, por ser o meio ambiente um bem público, gera repercussão geral, impondo conscientização coletiva à sua reparação,
resguardando, assim, o direito das futuras gerações a um meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Nesse sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: "AMBIENTAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROTEÇÃO E PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE. COMPLEXO PARQUE DO SABIÁ. OFENSA AO ART. 535, II, DO CPC NÃO CONFIGURADA. CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÕES DE FAZER COM INDENIZAÇÃO PECUNIÁRIA. ART. 3º DA LEI 7.347/1985. POSSIBILIDADE. DANOS MORAIS COLETIVOS. CABIMENTO. (...) 3. O dano ao meio ambiente, por ser bem público, gera repercussão geral, impondo conscientização coletiva à sua reparação, a fim de resguardar o direito das futuras gerações a um meio ambiente ecologicamente equilibrado. 4. O dano moral coletivo ambiental atinge direitos de personalidade do grupo massificado, sendo desnecessária a demonstração de que a coletividade sinta a dor, a repulsa, a indignação, tal qual fosse um indivíduo isolado. 5. Recurso especial provido, para reconhecer, em tese, a possibilidade de cumulação de indenização pecuniária com as obrigações de fazer, bem como a condenação em danos morais coletivos, com a
devolução dos autos ao Tribunal de origem para que verifique se, no caso, há dano indenizável e fixação do eventual quantum debeatur" (REsp 1269494/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 24/09/2013, DJe 01/10/2013, destaquei).
É bem de ver, ainda, que nos termos do precedente do Superior Tribunal de Justiça acima citado para a caracterização do dano moral coletivo ambiental é desnecessário a demonstração de que a coletividade sinta a dor, a repulsa, a indignação, tal qual fosse um indivíduo isolado, mas apenas a demonstração dos danos suportados pela coletividade ante a degradação ambiental sofrida, e, no caso, os documentos juntados e o Laudo Pericial evidenciam os danos suportados pela coletividade em razão da degradação ambiental promovida pela Ré.
Noutro aspecto, o valor da indenização fixada deve ser mantida, como bem justificou a sentença, ao dispor que "A fixação do quantum indenizatório deve ser baseada nos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, e, considerando-se a condição da ofensora, pessoa jurídica atuante no ramo do ensino particular, a espécie de dano ambiental
praticado e que consistiu no desmatamento de vegetação nativa com área de 15.220,9 m² entre os anos de 1990 e 2010, além de execução de aterro irregular, a intensidade da ofensa infligida, posto que o dano ambiental perdura por mais de vinte anos, e o grau de culpa da ré para a produção do evento lesivo, a fixação do valor indenizatório por dano moral em R$ 300.000,00 (trezentos mil reais) apresenta-se consentâneo e adequado a proporcionar compensação ao dano moral coletivo ambiental e a servir de elemento repressivo-pedagógico à infratora, não sendo fonte de enriquecimento sem causa" (f. 1.431).
Por outro lado, nos termos do artigo 3º da Lei nº 7.347/1985 a Ação Civil Pública poderá ter por objeto a condenação em dinheiro, bem como o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, portanto, não restam dúvidas a respeito da possibilidade de cumulação de obrigações de fazer com indenização pecuniária.
Nesse sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: "PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AMBIENTAL. INTERPRETAÇÃO DO ART. 11 DA LEI 7.347/85. CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER
COM INDENIZAÇÃO PECUNIÁRIA. POSSIBILIDADE. 1. Em ação civil pública ambiental, é admitida a possibilidade de condenação do réu à obrigação de fazer ou não fazer cumulada com a de indenizar. Tal orientação fundamenta-se na eventual possibilidade de que a restauração in natura não se mostre suficiente à recomposição integral do dano causado. 2. Dessa forma, ao interpretar o art. 3º da Lei 7.347/85, deve ser dada à conjunção "ou" valor aditivo, e não alternativo. Consequentemente, deve-se reconhecer a possibilidade abstrata de cumulação da obrigação de fazer, consistente na reparação do dano ambiental causado, com indenização pecuniária. 4. Agravo regimental improvido" (AgRg no REsp 1415062/CE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/05/2014, DJe 19/05/2014, destaquei).
Nessas condições, conforme documentos juntados com a petição inicial (fls. 42/43, fls. 45/47, fls. 48/50, fls. 52/53, fls. 56/58, f. 61 e o próprio Laudo Pericial) o início das obras, independentemente da inexistência de Alvarás ou Autorizações ambientais, bem como a supressão de bosque nativo e, ainda, o descumprimento do Termo de Compromisso de Ajustamento, evidenciam o menoscabo da Apelante
para com o meio ambiente, e, por isso, mantém-se a sentença, com a condenação ao pagamento de dano moral devidamente fixado e a condenação nas obrigações de fazer descritas no dispositivo da sentença (fls. 1.432/1.433). b) Do não cabimento de condenação ao pagamento de honorários advocatícios A sentença merece reformada no que tange ao pagamento dos honorários advocatícios, por se tratar de ação ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO.
O trabalho desempenhado pelo Promotor de Justiça quando da propositura e acompanhamento de Ação Civil Pública é obrigação institucional, previamente paga pelo Estado, não podendo ser, ainda, remunerado pela condenação ao pagamento de honorários advocatícios, porque, obviamente, de trabalho advocatício não se trata, nem com ele se confunde.
A propósito, esta Corte editou o Enunciado nº 2 da Quarta e da Quinta Câmaras Cíveis, segundo o qual: "Em sede de ação civil pública, a condenação do
Ministério Público ao pagamento de honorários advocatícios somente é cabível na hipótese de comprovada e inequívoca má-fé; dentro de absoluta simetria de tratamento e à luz da interpretação sistemática do ordenamento jurídico, não pode o "parquet" beneficiar-se dessa verba, quando for vencedor na ação civil pública".
Mesmo que tal verba se destine a Fundo para tanto especialmente criado, ainda assim descabe o pagamento, sobretudo porque esse mesmo Fundo não está disposto a pagar honorários quando vencida a Instituição.
Assim, a par de não exercer a advocacia, o MINISTÉRIO PÚBLICO é pago, motivo pelo qual descabe a condenação em honorários advocatícios em seu favor.
ANTE O EXPOSTO, voto por que seja negado provimento ao recurso de Apelação, e, reformada a sentença, de ofício, apenas para excluir os honorários advocatícios fixados.
É caso de ciência/vista ao Ministério Público, nesta instância.
DECISÃO ACORDAM os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Cível deste TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ, por unanimidade de votos, em negar seguimento ao Apelo e, de ofício, reformar a sentença, para excluir a condenação ao pagamento de honorários advocatícios.. Participaram do julgamento os Desembargadores LEONEL CUNHA, Presidente com voto, LUIZ MATEUS DE LIMA e ADALBERTO JORGE XISTO PEREIRA. CURITIBA, 19 de maio de 2015. Desembargador LEONEL CUNHA Relator
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