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Acórdão
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(1.361.830-7), DA 1ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE LONDRINA AGRAVANTE: AUTARQUIA MUNICIPAL DE SAÚDE AGRAVADO: ROBERTO NOGUEIRA DAS DORES E OUTRO RELATOR: DES. HÉLIO HENRIQUE LOPES FERNANDES LIMA
Agravo de Instrumento. Ação de indenização por danos materiais e morais. Autarquia Municipal de Saúde. Inversão do ônus da prova. Possibilidade. Aplicação da Teoria Dinâmica do Ônus da Prova. Adiantamento dos honorários periciais. Cabimento. Inteligência do art. 33, do Código de Processo Civil e da Súmula 232, do Superior Tribunal de Justiça. Recurso desprovido. 1. "Embora não tenha sido expressamente contemplada no CPC, uma interpretação sistemática da nossa legislação processual, inclusive em bases constitucionais, confere ampla legitimidade à aplicação da teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, segundo a qual esse ônus recai sobre quem tiver melhores condições de produzir a prova, conforme as circunstâncias fáticas de cada caso. (...)."(REsp 1286704/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi. DJe 28/10/2013). 2. Súmula 232, do Superior Tribunal de Justiça: "A Fazenda Pública, quando parte no processo, fica sujeita à exigência do depósito prévio dos honorários do perito."
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 0011722-88.2015.8.16.0 (1.361.830-7), da 1ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Londrina, em que é agravante a AUTARQUIA MUNICIPAL DE SAÚDE e agravados ROBERTO NOGUEIRA DAS DORES e ANA KELLY DOS SANTOS NOGUEIRA DAS DORES.
I - RELATÓRIO
Autarquia Municipal de Saúde agrava de instrumento em face da decisão de fls. 61/63-TJ, proferida nos autos de ação de indenização por danos morais e materiais, autuado sob o n. 0069823-13.2014.8.16.0014, que acolheu a preliminar de ilegitimidade passiva do Município de Londrina, determinando sua exclusão do polo passivo da lide; fixou os pontos controvertidos; determinou, de ofício, a realização de prova pericial e inverteu o ônus probatório quanto aos fatos ocorridos dentro da Unidade de Pronto Atendimento e o atendimento do SAMU, adotando a teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova. Alega o agravante que a) é do autor o ônus de provar os fatos constitutivos de seu direito, nada havendo nos autos a autorizar o afastamento da regra ordinária do art. 333, do Código de Processo Civil; b) não pode a Autarquia ser compelida a adiantar os honorários periciais, mormente por não ter requerido a produção da referida prova. O efeito suspensivo foi indeferido pela decisão de fls. 67/68. Informações à fl. 73, noticiando a manutenção da decisão agravada e o cumprimento do disposto no art. 526, do Código de Processo Civil. É o relatório.
II - VOTO
Pretende o agravante a reforma da decisão que determinou, de ofício, a realização de prova pericial e a inversão do ônus probatório. Roberto Nogueira das Dores e Ana Kelly dos Santos Nogueira das Dores ajuizaram Ação Ordinária de Indenização por Danos Morais e Materiais, tendo em vista o falecimento de seu filho, ocorrido na Unidade de Pronto Atendimento - Jardim Sabará, em Londrina-PR. Apresentada Contestação (fls. 39/50) e Impugnação à Contestação (fls. 51/57), sobreveio a decisão agravada, que determinou a exclusão do Munícipio de Londrina do polo passivo da lide; fixou os pontos controvertidos; determinou, de ofício, a realização de prova pericial e inverteu o ônus probatório quanto aos fatos ocorridos dentro da Unidade de Pronto Atendimento e o atendimento do SAMU, adotando a teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova. (fls. 61/63).
- Inversão do ônus da prova
Sustenta o agravante que é do autor o ônus de comprovar os fatos constitutivos de seu direito, não havendo motivos para afastar a regra ordinária do art. 333, do Código de Processo Civil. A inversão do ônus da prova foi determinada pelo MM. Magistrado a quo, ao seguinte argumento:
(...) esclareço que à parte ré caberá o ônus de provar que seus prepostos, dentro da Unidade de Pronto Atendimento e o atendimento do SAMU, adotaram todas as práticas recomendadas pela ciência médica para levar a bom termo o procedimento a eles confiado. Mesmo porque a comprovação do que se passou com o paciente naquele local e momento constituiria, para a parte autora, ônus diabólico, do qual dificilmente poderia desincumbir-se. É o que se denomina de teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova (fl. 62-v.).
É certo que o art. 333, I do Código de Processo Civil, atribui ao autor o ônus de comprovar os fatos constitutivos de seu direito, sendo certo ainda que ao caso não se aplicam as regras do Código de Defesa do Consumidor. No entanto, doutrina e jurisprudência têm mitigado a regra disposta pelo art. 333, do Código de Processo Civil, considerando a existência de situações nas quais a produção de determinada prova se torna demasiadamente difícil para a parte, comprometendo ou impedindo o cumprimento de seu ônus probatório. Tem-se consagrado, assim, a denominada Teoria da Distribuição Dinâmica do Ônus da Prova, que, aliás, encontra arrimo nos princípios da Isonomia, Devido Processo Legal e Acesso à Justiça (art. 5º, caput, XIV e XXV, todos da Constituição Federal) ante a atribuição de ônus da produção da prova a quem detiver melhores condições de produzi-la, de acordo com as circunstâncias de cada caso. Vale transcrever os ensinamentos de Sérgio Cruz Arenhart sobre o tema:
Segundo esta teoria a prova deve ser produzida pela parte que possui mais fácil acesso a ela, sendo que a não produção desta prova deve redundar em presunção em seu desfavor. No Brasil, a teoria tem aplicação não apenas no campo das relações de consumo (...) mas ainda em outros ramos, como no direito contratual (...) Esta teoria, por certo, é muito mais amoldada à realidade do que o sistema do art. 333, do CPC, permitindo ao magistrado, segundo as particularidades do caso concreto, distribuir o ônus da prova da maneira mais equânime, de forma a otimizar a participação das partes no processo. ("Prova" - Prova e verdade. Concurso para a cadeira de Processo Civil na Universidade Federal do Paraná. Citado no acórdão proferido nos autos de Apelação Cível 336151-3-1, relatado pelo Desembargador Jorge de Oliveira Vargas).
O Superior Tribunal de Justiça assim já decidiu:
CIVIL E PROCESSO CIVIL. PEDIDO. INTERPRETAÇÃO. CRITÉRIOS. PROVA. ÔNUS. DISTRIBUIÇÃO. LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ. COBRANÇA DE DÍVIDA JÁ PAGA. LIMITES DE INCIDÊNCIA. DISPOSTIVOS LEGAIS ANALISADOS: ARTS. 17, 18, 125, I, 282, 286, 333, I E II, 339, 355, 358, 359, 460 E 512 DO CPC; E 1.531 DO CC/16 (940 DO CC/02). (...) 6. Nos termos do art. 333, II, do CPC, recai sobre o réu o ônus da prova da existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. 7. Embora não tenha sido expressamente contemplada no CPC, uma interpretação sistemática da nossa legislação processual, inclusive em bases constitucionais, confere ampla legitimidade à aplicação da teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, segundo a qual esse ônus recai sobre quem tiver melhores condições de produzir a prova, conforme as circunstâncias fáticas de cada caso. (...)."(REsp 1286704/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/10/2013, DJe 28/10/2013).
A Teoria da Distribuição Dinâmica do Ônus da Prova é aplicável também à Fazenda Pública. Confira-se, exemplificativamente: ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS.INAPLICABILIDADE DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA PREVISTA NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. AUSÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO. SERVIÇO PÚBLICO PRESTADO DIRETAMENTE PELA ESTADO E CUSTEADO POR RECEITAS TRIBUTÁRIAS. RESSALVA, CONTUDO, ACERCA DA POSSIBILIDADE DE EVENTUAL REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO POR FORÇA DA TEORIA DINÂMICA DA DISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS DA PROVA. RECURSO PROVIDO. (TJPR - 2ª C.Cível - AI - 1278206-0 - Foz do Iguaçu - Rel.: Silvio Dias - Unânime - - J. 02.12.2014)
PROCESSO CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - APLICAÇÃO DA TEORIA DA DISTRIBUIÇÃO DINÂMICA DO ÔNUS DA PROVA - FLEXIBILIZAÇÃO DA REGRA DO ART. 333, DO CPC - POSSIBILIDADE - ARRIMO CONSTITUCIONAL - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - INAPLICABILIDADE - PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO DIRETAMENTE PELO ENTE PÚBLICO E CUSTEADO POR RECEITAS TRIBUTÁRIAS - ATRIBUIÇÃO DO PAGAMENTO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS MANTIDO - RECURSO PROVIDO. I - Não obstante o art. 333, do CPC delineie a responsabilidade do ônus da prova no processo, hodiernamente a jurisprudência, mitigando tal regra, entende haver situações em que a prova se torna demasiadamente dificultosa para a parte, de forma a impedi- la da desincumbência de seu ônus probatório. Diante disso, consagrou-se a teoria essa a qual foi denominada de Teoria da Distribuição Dinâmica do Ônus da Prova, que, inclusive, encontra arrimo no princípio da Isonomia, Devido Processo Legal e Acesso à Justiça (art. 5º, caput, XIV e XXV, todos da Constituição Federal) ante a atribuição de ônus da produção da prova a quem detiver melhores condições de produzi-la, de acordo com as circunstâncias de cada caso. II - Não se aplica o Código de Defesa do Consumidor quando o serviço público é prestado diretamente pelo Estado e custeado por meio de receitas tributárias. (TJPR - 1ª C.Cível - AI - 1171011-1 - Londrina - Rel. Desig.: Rubens Oliveira Fontoura - Por maioria - J. 10.06.2014).
Assim, é de ser mantida a inversão do ônus probatório levada a efeito pelo MM. Magistrado singular.
- Do adiantamento dos honorários periciais
Argumenta a agravante que a produção da prova foi determinada pelo Magistrado, não podendo a autarquia ser compelida a antecipar os honorários do perito. Sem razão. Relativamente à antecipação dos honorários periciais, determina o art. 33 do Código de Processo Civil:
Cada parte pagará a remuneração do assistente técnico que houver indicado; a do perito será paga pela parte que houver requerido o exame, ou pelo autor, quando requerido por ambas as partes ou determinado de ofício pelo juiz.
Tem-se, portanto, que, regra geral, os honorários do perito devem ser adiantados pela parte que requereu a produção da prova. No caso, embora tenha o autor protestado especialmente pela juntada das imagens captadas pelas câmeras de segurança do recinto da UPA - Jardim Sabará, do prontuário médico do menor Roberson e dos exames que se fizeram nele e o pedido de informações ao conselho tutelar, (fl. 25/26), a ora agravante, quando da oferta da contestação, requereu, em especial, o depoimento pessoal do autor, oitiva de testemunhas, juntada de documentos e outras (fls. 50). Destarte, como não houve requerimento pela realização de prova pericial e fora invertido o ônus sucumbencial, ainda que se trate de autarquia estatal, não há como se impor o ônus pelo pagamento de sua confecção à parte autora, sendo devido o adiantamento do valor, nesses moldes e nos termos da Súmula 232, do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
A Fazenda Pública, quando parte no processo, fica sujeita à exigência do depósito prévio dos honorários do perito.
Assim, não merece reforma a decisão que impôs aos requeridos o depósito dos honorários periciais.
Diante do exposto, merece ser mantida a decisão agravada, por seus próprios fundamentos. Em consequência, define-se o voto pelo não provimento do agravo. III - DECISÃO
ACORDAM os Desembargadores integrantes da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo de instrumento.
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