Íntegra
do Acórdão
Ocultar
Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.Recomenda-se acessar o PDF assinado.
ESTADO DO PARANÁ APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.115.803-7, DA 2ª VARA CÍVEL DA REGIÃO METROPOLITANA DE MARINGÁ FORO CENTRAL DE MARINGÁ. APELANTE: MASTER ASSESSORIA EMPRESARIAL S/S LTDA. APELADAS: HIGI SERV LIMPEZA E CONSERVAÇÃO S/A E OUTRA. RELATORA: JUÍZA CONV. DILMARI HELENA KESSLER. RELATOR ORIGINÁRIO: DES. FÁBIO HAICK DALLA V ECCHIA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA DE COBRANÇA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS. ALEGAÇÃO DE SENTENÇA ULTRA PETITA . INOCORRÊNCIA. LEGITIMIDADE DA SEGUNDA APELADA - AS DUAS EMPRESAS COMPÕEM O MESMO GRUPO ECONÔMICO. POSSIBILIDADE DE RESILIÇÃO UNILATERAL. APLICABILIDADE DO ART. 473, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CC - DEVER DE INDENIZAR A TÍTULO DE DANOS EMERGENTES - AQUISIÇÃO DE EQUIPAMENTOS E CONTRATAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS POR EXIGÊNCIA DA APELANTE - PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PENDENTE DE PAGAMENTO - CONDENAÇÃO DEVIDA. INEXISTÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR A TÍTULO DE LUCROS CESSANTES. APELAÇÃO Apelação Cível n 1.115.803-7 fls. 2 PARCIALMENTE PROVIDA, COM REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1.115.803-7, oriundos da 2ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Maringá, em que figuram, como apelante, MASTER ASSESSORIA EMPRESARIAL S/S LTDA. e, como apeladas, HIGI SERV LIMPEZA e CONSERVAÇÃO S/A e OUTRA. 1. RELATÓRIO Trata-se de Apelação Cível interposta contra sentença (mov. 97-projudi), proferida nos autos de Ação Ordinária de Cobrança com Pedido de Indenização por Perdas e Danos sob nº 0023856-38.2011.8.16.0017 , originária da 2ª Vara Cível da Região Metropolitana de Maringá - Foro Central de Maringá, proposta por Higi Serv Limpeza e Conservação S/A e outra, em face de Master Assessoria Empresarial S/S Ltda., que julgou parcialmente procedente a ação. A recorrente pretende a reforma da sentença, requerendo, em síntese (mov. 118-projudi): a) nulidade da decisão por violação aos limites do pedido;
Apelação Cível n 1.115.803-7 fls. 3
b) ilegitimidade ativa da apelada Higi Serv Serviços Ltda.; c) possibilidade de resilição unilateral do contrato firmado por tempo indeterminado; d) inaplicabilidade do artigo 473, do Código Civil; e) inexistência do dever de indenizar a título de lucros cessantes e danos emergentes; f) reconhecimento da indevida condenação imposta, em decorrência da suposta existência de prestação de serviço pendente de pagamento; g) impugnação aos valores da condenação. O recurso foi recebido em ambos os efeitos (mov. 122-projudi) e contrarrazoado (mov. 128-projudi). É o relatório. 2. FUNDAMENTAÇÃO E VOTO O recurso deve ser conhecido, pois presentes os pressupostos para a sua admissibilidade. 2.1 Preliminares Primeiramente, sustenta, a apelante, a nulidade da decisão, por violação aos limites do pedido. Alega que as apeladas pleitearam, a título de lucros cessantes, o valor de R$ 736.000,00, o qual seria dividido em 20 parcelas de R$ 36.800,00,
Apelação Cível n 1.115.803-7 fls. 4
mas a sentença fixou a condenação em período correspondente a 22 meses, ou seja, superior ao pleiteado na petição inicial. Contudo, conforme se extrai da exordial, especialmente na parte do pedido, as autoras assim requereram: "(...) 4) condenar o réu a indenizar os lucros cessantes causados à 1ª autora, observada a metodologia de apuração de lucro utilizada pela Receita Federal do Brasil, na forma da lei, ou aquela que melhor entender Vossa Excelência " (mov. 1-projudi). O Juízo a quo , ao proferir a sentença, considerou as provas colacionadas aos autos, e concluiu que o contrato deveria perdurar de novembro de 2010 a novembro de 2012 e, tendo sido rescindido em janeiro de 2010, os lucros cessantes deveriam ser calculados a partir de fevereiro de 2011, até novembro de 2012 (mov. 97-projudi). Não ocorreu, portanto, ofensa aos artigos 1 2 128 e 460 , do Código de Processo Civil. A apelante sustenta, ainda, ilegitimidade ativa da apelada Higi Serv Serviços Ltda., sob o fundamento de que, ainda que integre o mesmo grupo econômico da empresa Higi Serv Limpeza e Conservação S/A, não houve nenhuma negociação ou contratação com a primeira empresa. Contudo, razão não lhe assiste.
1 Art. 128. O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte. 2 Art. 460. É defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que Ihe foi demandado.
Apelação Cível n 1.115.803-7 fls. 5
Cumpre esclarecer que, apesar de cada empresa possuir CNPJ próprio, integram o mesmo grupo econômico, respondendo solidariamente pelas obrigações assumidas. Ademais, foi por intermédio da empresa Higi Serv Serviços Ltda. que foram contratados os 22 funcionários temporários adicionais, para exercerem a função de servente nas dependências da apelante. Portanto, restam afastadas as alegadas nulidades. 2.2 Mérito No mérito, alega, a apelante, que é possível a resilição unilateral do contrato de experiência firmado por tempo indeterminado, pois notificou previamente as apeladas, nos termos do artigo 599, do Código Civil. Razão lhe assiste, em parte. Primeiramente, cumpre esclarecer que o contrato firmado entre as partes não era de experiência, conforme restou comprovado pelas apeladas, demonstrando que a expectativa era de que o contrato durasse ao menos dois anos. Ademais, a apelante não trouxe aos autos qualquer prova capaz de comprovar tal alegação.
Apelação Cível n 1.115.803-7 fls. 6
Ainda que seja possível a resilição unilateral em contrato firmado por tempo indeterminado, o parágrafo único art. 473 3, do Código Civil, determina que, caso haja investimentos consideráveis, por uma das partes, para sua execução, a notificação somente produzirá efeitos após prazo compatível com a natureza e vulto dos investimentos. Sobre o assunto, leciona o ilustre doutrinador Silvio Venosa: A regra geral é no sentido de que nos contratos por prazo indeterminado ou naqueles que se converterem em tal, após o decurso de um prazo estabelecido, basta a vontade unilateral de um contratante para resili-lo. No entanto, a notificação com prazo exíguo pode trazer injustiças. Imagine a hipótese de quem se estrutura para distribuir determinados produtos de um fabricante; contrata muitos empregados; adquire veículos; contrata publicidade; faz longas previsões orçamentárias e, após pouco tempo de relação negocial, se vê perante uma singela notificação de resilição do contrato em trinta dias. É evidente que essa resilição é abusiva e que tempo razoável deve ser concedido ao contratante, tendo em vista os investimento realizados.4 (Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. V. 2, 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p.497-498)
No caso em análise, a apelante rescindiu o contrato depois de apenas 2 (dois) meses de duração. 3 Art. 473. Parágrafo único. Se, porém, dada a natureza do contrato, uma das partes houver feito investimentos consideráveis para a sua execução, a denúncia unilateral só produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos. 4 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. V. 2, 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p.497-498.
Apelação Cível n 1.115.803-7 fls. 7
Note-se que, conforme documentos acostados à exordial (mov. 1), bem como os depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas (mov. 78), as apeladas fizeram consideráveis investimentos, inclusive com aquisição de equipamentos e contratação de funcionários, a fim de atender às exigências da apelante. Conforme bem apontado pela Magistrada a quo, na sentença: "Há que se reconhecer que uma empresa que cumule a experiência da primeira autora (como se pode ver dos atestados de capacidade técnica juntados no sequencial "1.48") não se sujeitaria a contratar funcionários e adquirir bens de expressiva monta, assumindo riscos econômicos, se não tivesse a garantia de que o contrato persistiria no tempo. As autoras, inclusive, contrataram profissional habilitado para treinar os funcionários que laborariam no estabelecimento da ré. Necessário observar que o negócio jurídico trouxe confiança às autoras, de modo que a boa-fé objetiva, a lealdade e a segurança deveriam ter sido observadas pela ré." (mov. 97) Portanto, em razão da rescisão unilateral precoce, as apeladas não tiveram tempo hábil para efetuar novas contratações, a fim de fornecer seus serviços, bem como avisar previamente seus empregados sobre o encerramento dos trabalhos, o que resultou na demissão desses e consequente dispêndio com verbas rescisórias, e demais despesas. Assim, existindo investimentos para a execução dos serviços, e não havendo notificação prévia com
Apelação Cível n 1.115.803-7 fls. 8
tempo hábil, a resilição contratual só ocorrerá a partir do momento em que se possa compensar os investimentos assumidos. Nesse sentido: CIVIL E PROCESSO CIVIL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - RESILIÇÃO UNILATERAL DE CONTRATO COMERCIA L - EMPRESA AUTORIZADA E OPERADORA DE TELEFONIA MÓV EL - SENTENÇA EXTRA PETITA - PRELIMINAR REJEITADA - MÉRITO - VALIDADE DA EXTINÇÃO DO CONTRATO - APLICAÇÃO DO ART. 473 DO CÓDIGO CIVIL - DIREITO A LUCROS CESSANTES PELO RESTANTE DO PRAZO INICIALMENTE CONTRATADO. (...) 3. A resilição unilateral do contrato é prerrogativa legal conferida à parte contratante e se opera mediante denúncia notificada ao outro contratante; mas se em razão da natureza do contrato uma das partes houver feito investimentos consideráveis para a sua execução a denúncia unilateral só produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos, nos termos do art. 473 do Código Civil. (TJ-MG - AC: 10518110015196001 MG , Relator: Otávio Portes, Data de Julgamento: 03/07/2014, Câmaras Cíveis / 16ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 14/07/2014)
Daí porque não merece acolhimento a alegação de inaplicabilidade do art. 473, parágrafo único, do Código Civil. Neste ponto, a digna Juíza de Direito Substituta em Segundo Grau, Dra. Luciane R. C. Ludovico, divergiu do entendimento da presente Relatora, nos seguintes termos:
Apelação Cível n 1.115.803-7 fls. 9
"Não se questiona o direito à reparação pelos danos emergentes que decorreram da antecipada resilição do contrato, mas de seu alcance, pois cabendo ao julgador estabelecer os limites da reparação, há que se verificar, sempre, a possibilidade de uma das partes ser beneficiada em prejuízo da outra. A regra do parágrafo único do art. 473 CPC objetiva justamente dar à parte prejudicada com a solução prematura do contrato o direito ao ressarcimento pelos investimentos que fez por ter expectativa de um mínimo de duração contratual, sendo correto, portanto, no caso em apreço, que a Recorrida seja indenizada. A questão é que, no caso dos equipamentos adquiridos pela Apelada (HIGI SERV LIMPEZA E CONSERVAÇÃO S.A.), a prova oral indica e a natureza de sua atividade faz crer que eles poderiam ser utilizados para atender outros clientes e, por isso, indenizá-la pura e simplesmente implicará num enriquecimento sem causa para a empresa o que é vedado em nosso ordenamento jurídico -, pois ela receberá o quantum indenizatório e incorporará tais equipamentos em seu patrimônio, deles tirando um benefício. Assim, neste tópico, certo é que o investimento, em última análise, foi revertido em prol da atividade da Apelada, por isso a proposta de provimento parcial do recurso, só que em maior extensão, para excluir a condenação relativa à reparação pela compra dos equipamentos."
A apelante, sustenta, ainda, a inexistência do dever de indenizar, a título de lucros cessantes, tendo em vista que as apeladas são líderes de mercado, contando com anos de experiência e, certamente, já possuem outros clientes com necessidades semelhantes, oportunidades nas quais poderão utilizar os equipamentos adquiridos. A sentença merece reforma nesta seara. Em razão da aplicação do artigo 473, parágrafo único, do Código Civil, os investimentos realizados pela
Apelação Cível n 1.115.803-7 fls. 10
apelada foram compensados com os valores arbitrados na sentença. Contudo, a condenação, a título de lucros cessantes, ao pagamento " do valor mensal de R$ 36.800,00 (trinta e seis mil e oitocentos reais), contados e corrigidos pelo INPC a partir de fevereiro de 2011, até novembro de 2012, acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar da sentença", deve ser excluída, tendo em vista que o dispositivo em análise visa resguardar valores perdidos em razão do investimento, mas não os lucros cessantes. O prazo razoável, exigido no dispositivo legal, refere-se ao tempo necessário para recuperar o valor investido para a execução do contrato, e não lucrar. Note-se que, se a apelada não tivesse realizado qualquer investimento, a norma não incidiria no caso concreto. Ademais, conforme se extrai da proposta constante do mov. 1.6 (autos nº 0023856-38.2011.8.16.0017), formulada pela apelante e aceita pela apelada, está prevista a possibilidade de cancelamento do serviço, desde que observado o aviso prévio de 30 (trinta) dias. Portanto, a sentença deve ser reformada, a fim de excluir a condenação da apelante pelos lucros cessantes, constantes da letra "e" do dispositivo. Pugna, a apelante, pelo reconhecimento da indevida condenação imposta pela prestação de serviço pendente de pagamento.
Apelação Cível n 1.115.803-7 fls. 11
Não merece acolhimento tal pleito, tendo em vista que a fatura em questão refere-se aos serviços prestados pelas apeladas, durante a vigência do contrato, os quais não foram pagos pela apelante, conforme se extrai dos comprovante s acostados à exordial (mov. 1). Note-se que a apelante não trouxe nenhuma prova capaz de corroborar a alegação de condenação indevida. Por fim, com o acolhimento, ainda que parcial, do apelo da recorrente, com a exclusão da condenação dos valores a título de lucros cessantes, permanece vencida na parte restante, fixada em primeiro grau, razão pela qual se justifica a redistribuição do ônus da sucumbência em relação às despesa s processuais e honorários advocatícios, em 70% para a apelante e 30% para a apelada. Nestes termos, voto pelo parcial provimento do recurso. 3. DISPOSITIVO Diante do exposto, ACORDAM os Julgadores integrantes da Décima Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por maioria de votos, em DAR PARCIAL PROVIMENTO ao Recurso de Apelação interposto por MASTER ASSESSORIA EMPRESARIAL S/S LTDA., nos termos do voto. Participaram do julgamento, acompanhando o voto da Relatora, o Desembargador Ruy Muggiati, vencida a Juíza de
Apelação Cível n 1.115.803-7 fls. 12
Direito Substituta em Segundo Grau Luciane R. C. Ludovico, que dava parcial provimento ao recurso, em maior extensão. Curitiba, 29 de abril de 2015
DILMARI HELENA KESSLER Relatora Designada LUCIANE R. C. LUDOVICO Vencida, sem declaração de voto
|