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Acórdão
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.205.753-1, DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA 22ª VARA CÍVEL APELANTE : SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE REC. ADESIVO : RICARDO HELAL APELADOS : OS MESMOS RELATOR : DES. JOSÉ LAURINDO DE SOUZA NETTO APELAÇÃO CÍVEL AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANOS MORAIS E ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CIRURGIA EM COLUNA MIGRAÇÃO PARA SEGURO SAÚDE E NÃO PLANO DE SAÚDE APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS PLANO DE SAÚDE SUL AMÉRICA SEGURO SAÚDE APENDICITE E OBSCESSO VOLUMOSO EM FID - INDICAÇÃO MÉDICA ATESTANDO A NECESSIDADE DA REALIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO CIRÚRGICO EMERGENCIAL SITUAÇÃO DE URGÊNCIA RECUSA INDEVIDA NA COBERTURA - CONTRATO DE ADESÃO PREVISÃO CONTRATUAL - APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR CLÁUSULA DE CARÊNCIA AFASTAMENTO DANO MORAL ATENDIMENTO ÀS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO - MANUTENÇÃO DO QUANTUM. APELO DESPROVIDO. "Lídima a cláusula de carência estabelecida em contrato voluntariamente aceito por aquele que ingressa em plano de saúde, merecendo temperamento, todavia, a sua aplicação quando se revela circunstância excepcional, constituída por necessidade de tratamento de urgência decorrente de doença grave que, se não combatida a tempo, tornará inócuo o fim maior do pacto celebrado, qual seja, o de assegurar eficiente amparo à saúde e à vida." (REsp 466667/SP, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 27/11/2007, DJ 17/12/2007); APELAÇÃO 1 NÃO CONHECIDA E APELAÇÃO 2 DESPROVIDA POR UNANIMIDADE. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1.205.753-1, do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba 22ª Vara Cível, em que é apelante Sul América Companhia de Seguro Saúde, recorrente adesivo Ricardo Helal e apelados os mesmos. I - Trata-se de recurso de apelação cível e recurso adesivo interpostos contra a sentença proferida nos autos de ação de obrigação de fazer c/c danos morais e antecipação de tutela nº 1558/2012, a qual julgou procedente o pedido inicial, confirmando a antecipação de tutela, para o fim de condenar a requerida na liberação do procedimento médico descrito pelo médico do autor, bem como condenar a requerida ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00, a ser atualizado monetariamente pelo INPC/IGPDI, de ora em diante até a data da efetiva satisfação, acrescido de juros de mora de 1% ao mês, a partir do evento danoso, conforme Súmula nº 54 do Superior Tribunal de Justiça. Em face da sucumbência, condenou a requerida ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais foram em R$ 1.800,00. Em suas razões de inconformismo, a seguradora alega que a empresa Sul América Seguro Saúde S/A foi incorporada pela Sul América Companhia de Seguro Saúde, razão pela qual requer a regularização do polo passivo e juntada da documentação relativa à incorporação. Informa que o procedimento cirúrgico requerido foi liberado, segundo protocolo de 20/09/2012, mas com fundamento no §4º do artigo 461 do Código de Processo Civil, deve lhe ser garantido prazo razoável para cumprimento da determinação que lhe for ordenada, não se evidenciando razão de ser para a multa aplicada. Segue, esclarecendo que o autor contratou por sua livre e espontânea vontade, recebendo as condições gerais no ato da contratação, não podendo ser alegado vício, principalmente, quanto às cláusulas referentes à doença preexistente. Argumenta que o seguro saúde contratado tem como objeto
a garantia do reembolso das despesas médico-hospitalares cobertas, nos limites da apólice. Não tem, portanto, por escopo, a prestação de serviços médicos. Destaca que em caso de preexistência de doença, a seguradora se reserva à prestação da cobertura parcial temporária, com respaldo no contrato e na legislação vigente. Esta cobertura parcial se da por um período de 24 meses, podendo haver exclusão da cobertura de eventos cirúrgicos, leitos de alta tecnologia e procedimentos de alta complexidade relacionados diretamente às doenças preexistentes. Argumenta que segundo a confirmação do autor na petição inicial, sobre doença preexistente, quando da contratação, a sua declaração foi inexata sobre o seu real estado de saúde, razão pela qual incide a hipótese do artigo 766 do Código Civil. Houve, assim, quebra da boa-fé contratual. Invoca o §4º do artigo 54 do Código de Defesa do Consumidor, que permite a imposição de cláusulas restritivas em contratos de adesão, sob pena de quebra do equilíbrio contratual, desde que as cláusulas estejam redigidas de forma compreensível, como ocorre no caso dos autos. Conclui que não há previsão para a cobertura para a situação pleiteada. Aduz que não houve comprovação do dano moral; que não houve prática de ato ilícito, mas apenas cumprimento contratual; que caso seja mantida a condenação, o valor do dano dever ser reduzido, para revelar apenas o caráter compensatório da reparação, sem se falar em punição do agente, o que implicaria em enriquecimento ilícito. Por fim, prequestiona os artigos 5º, V e X da Constituição, artigos 927 e 944 do Código Civil, as Súmulas nº 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal e 211 do Superior Tribunal de Justiça, requerendo o provimento do recurso para a reforma da sentença e a consequente inversão do ônus da prova. Igualmente inconformado, o autor recorre adesivamente, destacando que faz jus ao benefício da assistência judiciária gratuita em sede recursal; pugnando pela majoração do valor do dano moral fixado pela sentença em R$ 5.000,00, pois sofreu o risco de perder a vida e a humilhação por ter negado um serviço que era seu por direito. Defende a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e a consequente inversão do ônus da prova, não cabendo discussão acerca da aplicação da cláusula rebus sic stantibus ou teoria da
imprevisão. Argumenta que existiu um ato ilícito, pois avisou que não realizaria o procedimento porque o período de carência da portabilidade não havia sido cumprido, quando inexistia carência. Assevera que por força do artigo 35-C da Lei nº 9656, o paciente que corre risco de morrer ou de ter lesões irreparáveis deve ser atendido. Ressalta a presença do ato ilícito, do nexo de causalidade e do dano, configurado pela dor, constrangimento, tristeza e angústia, que só cessaram com a intervenção do Judiciário. Pugna, assim, pela majoração do dano para o valor de R$ 20.000,00, requerendo o provimento do recurso. Contrarrazões às fls. 296-300, pelo autor. Contrarrazões às fls. 302-308, pela seguradora. Após, vieram os autos para julgamento do recurso. É o relatório. II - O recurso de apelação merece ser conhecido, porque presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, mas melhor sorte não socorre o recurso adesivo, pelos fundamentos expostos a seguir. O autor formulou, em sede de recurso adesivo, pedido de concessão de assistência judiciária gratuita para a particular interposição deste recursal, já que durante toda a instrução processual veio recolhendo normalmente as custas. Diante desta constatação, foi proferido o despacho de fls. 318, pelo qual o recorrente adesivo foi intimado para apresentar documentação que demonstrasse que desde 2010 a sua situação financeira mudou, a fim de justificar o pedido da benesse. Embora o despacho não tenha sido específico quanto à qual documentação apresentar, certamente, poderia o autor/ recorrente ter se valido das declarações de imposto de renda desde 2010 até esta data, bem como comprovantes de renda, declaração de contador e outros documentos que entendessem plausível, desde que comprovassem o exigido. Todavia, em resposta ao despacho de fls. 318, para comprovar a sua situação de carência econômica e justificar o pedido de assistência judiciária gratuita, juntou os documentos de fls. 322-357, que consiste
em atestado médico de 04/11/2013 de que apresenta "restrição" para suas atividades profissionais por tempo indeterminado, ou seja, o atestado não disse que o autor está totalmente incapacidade para o exercício profissional. Juntou ainda declaração dirigida ao INSS, de 13/06/2012, indicando que após 08 meses da realização da sua cirurgia não estava apto a laborar. Já em 14/11/2012, há atestado médico indicado que estava inapto para o trabalho por 180 dias, a partir de 30/10/2012, isto é, até 30/04/2013. Contudo, no que diz respeito à sua condição financeira, não juntou um documento sequer no sentido de demonstrar o quanto percebia antes da cirurgia e o quanto passou a perceber durante o período em que esteve totalmente incapacitado e parcialmente, como se encontrava em novembro de 2013. Denota-se que o autor declara-se empresário e às fls. 224 indica se sócio de empresas de diversas categorias como distribuidora de petróleo, posto de combustível, farmácia e padaria. Logo, deveria ter apresentado documento que refutasse esta conclusão e efetivamente demonstrasse a sua precária condição financeira. Mas não o fazendo, deu ensejo ao despacho de fls. 359, que indeferiu o pleito de concessão de assistência judiciária gratuita e determinou o recolhimento do preparo do recurso, em 05 (cinco) dias, sob pena de não conhecimento do adesivo. Contudo, o recorrente quedou-se inerte quanto a este recolhimento, conforme certidão de fls. 368, limitando-se a apresentar comprovante de concessão de aposentadoria por invalidez a partir de 09/04/2014. Logo, conclui-se que quando intimado para comprovação econômica, em junho de 2014, já recebia esta aposentadoria e poderia ter colacionado o documento aos autos. Não o fazendo, resta atingido pelo instituto da preclusão. Ademais, o autor/recorrente não mencionou uma linha sequer sobre a presunção de que seria sócio de empresas de diversas natureza e, assim, estaria apto a recolher o preparo. Por tais razões, deixo de conhecer do recurso adesivo, por deserção.
Feitas estas ponderações, passa-se a analisar o mérito do apelo interposto pela ré. Do apelo interposto pela ré No tocante ao histórico dos autos, vislumbra-se que Ricardo Helal ajuizou a presente ação de obrigação de fazer contra a Sul América Companhia de Seguro de Saúde, visando a concessão de antecipação de tutela para realização de procedimento cirúrgico na coluna de Pseudorartrose de Artrodese Lombar, bem como tratamento futuro concernente à enfermidade, a fim de evitar risco de morte. No mérito, buscou a procedência do pedido de confirmação da tutela antecipada, bem como condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais. Segundo a decisão de fls. 70, a tutela antecipada foi concedida para determinar que a empresa requerida liberasse imediatamente o procedimento cirúrgico solicitado pelo médico, conforme descrição do documento de fls. 39, sob pena de multa diária arbitrada em R$ 3.500,00. Este despacho foi proferido em 11/09/2012, sendo que a ré tomou ciência da decisão em 12/09/12 (juntada de fls. 73, verso e certidão de fls. 75). Em 20/09/2012 a seguradora apresentou documento de Validação Prévia de Procedimentos VPP, com a descrição do procedimento como "PAGAMENTO LIMINAR", com data de 14/09/2012. Em sua petição assevera que cumpriu a determinação judicial, esclarecendo que a validação demandaria a mobilização de uma estrutura complexa que pondera qual a clínica mais adequada e os materiais necessários para o procedimento solicitado. Considerou, assim, que o prazo concedido era exíguo, pugnando pela sua dilação ou a redução da astreinte. Em seguida, apresentou contestação (fls. 91). Em manifestação, o autor confirmou que foi submetido ao procedimento cirúrgico, por força da liminar, o qual teve complicações e necessitava de um procedimento chamando RNM coluna lombar, o qual foi negado pelo plano de saúde. Pugnou, novamente, pela liberação dos procedimentos cirúrgicos, com majoração da multa anteriormente fixada. Em sede incidental, o procedimento foi liberado (fls. 185 e
186), com determinação de autorização imediata, sob pena de multa diária de R$ 5.000,00, em 20/10/2012, com expedição do mandado de intimação no mesmo dia (fls. 187) e cumprimento em 22/10/2012 (fls. 212, verso). Na impugnação datada de 14/11/2012 (fls. 188), o autor informou que não havia comprovação de cumprimento da ordem judicial para a realização da segunda cirurgia. No tocante ao mérito da questão, importante frisar que a relação existente entre as partes é tipicamente de consumo. Os contratos de plano de saúde devem ser analisados à luz da legislação consumerista, consoante entendimento já sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça. In verbis: "Súmula 469 do STJ: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde." Desta feita, a interpretação das cláusulas contratuais deve ser feita com fulcro nas disposições do Código de Defesa do Consumidor, especialmente naquelas que conferem proteção contratual ao consumidor, as quais, dentre outras regras, estabelecem a interpretação que lhe é mais favorável. Neste sentido, preceitua o artigo 47 do CDC: Art. 47. As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor. Passada tal ponderação, a questão a ser discutida é a responsabilidade da ré pela cobertura do procedimento cirúrgico reclamado pelo autor, a partir da alegação de doença preexistente. E a despeito da previsão das cláusulas 18.6, 18.7 e 18.8 (fls. 108), de exclusão de Cobertura Parcial Temporária para doenças preexistentes, pondera-se que a hipótese deve ser analisada sob o caráter emergencial. Afinal, incontestável que a solução para o mal que acometia a parte era de emergência, segundo a definição do próprio contrato às fls. 108, verso, cláusula 19.1.1: "Emergência é evento que implique em risco imediato de
vida ou lesões inseparáveis para o Segurado, caracterizada em declaração do médico assistente." Na espécie, o documento de fls. 39 demostra de forma satisfatória que o autor fazia controle da dor com uso de morfina, analgésicos e outros opióides, bem como não conseguia controlar a pressão arterial, elevando os riscos de eventos cardiovasculares fatais e, apesar de tratamento conservador, não houve melhora clínica. Incontestável, que a solução para o mal que acometia a parte autora era de emergência, pois além da dor que sofria, não contida até mesmo com morfina, ainda estava sujeito a picos de hipertensão e risco cardiovascular. Evidente, portanto, o risco de morte a que estava sujeito o autor. Conforme previsão da Lei n. 9656/98: "Art. 35-C. É obrigatória a cobertura do atendimento nos casos: I - de emergência, como tal definidos os que implicarem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente, caracterizada em declaração do médico assistente; e II de urgência, assim entendidos os resultantes de acidentes pessoais ou de complicações no processo gestacional". Assim, como os atendimentos de emergência são definidos como os que implicam em risco imediato à vida, devem ter cobertura sem restrição, após 24 horas da contratação, ou seja, após a assinatura do contrato (art. 12, V da Lei nº 9.656). Sobre a questão, oportuno colacionar os seguintes julgados: "APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CONTRATUAL. PLANO DE SAÚDE. CARÊNCIA. NEGATIVA DE COBERTURA. CIRURGIA CARDÍACA DE EMERGÊNCIA. RISCO DE VIDA. REEMBOLSO DEVIDO. DOCUMENTOS IDÔNEOS. COMPROVAÇÃO. 1. Afasta-se a eficácia de cláusula contratual que estabelece o prazo de carência, quando comprovada a situação de emergência, caracterizada pela necessidade de submeter o autor a cirurgia cardíaca para a desobstrução de artérias. 2. Os documentos idôneos e não desconstituídos pelo réu comprovam o valor desembolsado pelo
autor com as despesas médico- hospitalares. APELAÇÃO NÃO PROVIDA." (TJPR, AC 0754036-5, 10ª C. Cível, Rel. Des. NILSON MIZUTA, DJ 04/07/2011). "Lídima a cláusula de carência estabelecida em contrato voluntariamente aceito por aquele que ingressa em plano de saúde, merecendo temperamento, todavia, a sua aplicação quando se revela circunstância excepcional, constituída por necessidade de tratamento de urgência decorrente de doença grave que, se não combatida a tempo, tornará inócuo o fim maior do pacto celebrado, qual seja, o de assegurar eficiente amparo à saúde e à vida." (REsp 466667/SP, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 27/11/2007, DJ 17/12/2007); Conclui-se, então, que a limitação estabelecida pelo seguro de saúde é inaceitável, diante do fato de que o procedimento revelava-se indispensável, senão para a cura, ao menos para a manutenção da vida digna e mais saudável do paciente. Mister destacar que esta emergência foi diagnosticada dentro do consultório do médico de confiança do autor, e não em ambulatório. E sob este aspecto, o contrato é omisso, pois nas cláusulas 19.2 a 19.9, limita-se a tratar de atendimento ambulatorial, prevendo uma cobertura para as primeiras doze horas ou até que resulte na necessidade de eventos cirúrgicos. Neste passo, nos moldes do artigo 47 do Código de Defesa do Consumidor, deve haver interpretação mais favorável ao consumidor e, assim, estabelecer-se que o procedimento de emergência não ambulatorial está sujeito à cobertura para doença preexistente. E sobre esta possibilidade, confira-se a doutrina: "Fundamental entender que a cláusula não será lida de forma mais favorável ao consumidor, mas será interpretada de forma mais favorável. Esse esclarecimento é necessário porque há diferença significativa entre a mera leitura e a interpretação, atos cuja similaridade é só superficial, e que empregam processos de raciocínio essencialmente diversos. Interpreta-se quando há espaço para dúvidas, quando há
indefinições, e o art. 47 não pode nem deve ser lido (e interpretado) como se pretendesse que toda e qualquer cláusula contratual fosse favorável ao consumidor." Para a espécie, vislumbra-se que a existência de lacuna contratual quanto à emergência não ambulatorial autoriza interpretação mais favorável ao autor/consumidor, impondo o entendimento de que o atendimento emergencial para o caso de consultório deve ser coberto pelas mesmas 12 horas, mas como se trata de procedimento uno, não haveria como fracionar em horas. Portanto, a cobertura deve ser integral do procedimento como um todo. Feitas estas ponderações, vale ainda discorrer sobre o fato de que o autor contratou seguro saúde e não plano de saúde e que, portanto, a apelante não estaria obrigada a lhe prestar serviço, mas sim a lhe reembolsar o que estivesse previsto na cobertura e dentro da apólice. Embora seja legítima a distinção feita entre os contratos, na prática, ela é inócua. A partir do momento em que se está reconhecendo que os procedimentos cirúrgicos requeridos pelo autor não estavam atingidos pela carência e, portanto, não se incluíam na ressalva feita na cláusula de carência temporária, reconhece-se que deveriam ser reembolsados, caso tivesse sido este o caminho adotado pelo autor. Entretanto, o Magistrado de primeiro grau, ao conceder a antecipação de tutela, entendeu por bem determinar que a empresa de saúde prestasse o serviço, esvaziando, assim, o direito consolidado ao reembolso. Destarte, sendo por uma via, ou por outra, caberia à apelante oportunizar a cirurgia, na maneira como se deu, principalmente, mediante o caráter emergencial do procedimento. No tocante ao pleito de indenizatório, há de se esclarecer que o abalo psicológico provocado por considerável desconforto, angústia e preocupação, além do mero aborrecimento, dá ensejo à reparação, sendo este o caso dos autos. É certo que por estar em risco a vida do autor, a recusa da apelante se traduz em fato gerador de estresse, angústia, aflição psicológica e apreensão, não devendo, por isso, ser tido como mero dissabor decorrente do
inadimplemento contratual. Além da preocupação constante, decorrente do seu estado de saúde precário, em vista de seu quadro clínico, o autor sofreu abalo psíquico, enquanto esperava a liberação do procedimento. Portanto, ao negar a cobertura do procedimento submeteu o autor a constrangimento e abalo psicológico desnecessários, que lhe causaram profunda angústia. Desta feita, inegável o dever de indenizar. É a posição deste Tribunal de Justiça: "AÇÃO ORDINÁRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - PLANO DE SAÚDE (...) "Tratando-se de contrato de seguro-saúde sempre haverá a possibilidade de consequências danosas para o segurado, pois este, após a contratação, costuma procurar o serviço já em evidente situação desfavorável de saúde, tanto a física como a psicológica. - Conforme precedentes da 3ª turma do STJ, a recusa indevida à cobertura pleiteada pelo segurado é causa de danos morais, pois agrava a sua situação de aflição psicológica e de angústia no espírito. Recurso Especial conhecido e provido." (STJ - RESP 200400643034 - (657717 RJ) - 3ª T. - Relª Min. Nancy Andrighi - DJU 12.12.2005 - p. 00374)". (TJPR, Ac. 14898, 10ª CCv, Ap. Cível n. 539965-1, Relator Des. Ronald Schulman, julgado em 05/02/2009, DJPR 28/04/2009.). Assim, configurado o dever de indenizar, tem-se que o quantum indenizatório deve ser mantido, consideradas as peculiaridades do caso em tela, isto é, que atende às condições da apelante, do ofendido e do bem jurídico lesado, assim como à intensidade e duração do sofrimento, e à reprovação da conduta do agressor, não se olvidando, ainda, que o ressarcimento da lesão ao patrimônio moral deve ser suficiente para recompor os prejuízos suportados, sem importar em enriquecimento sem causa da vítima. Não há, portanto, falar-se em minoração. Em face do exposto, voto no sentido de não conhecer do primeiro apelo, interposto pelo autor; conhecer do segundo apelo, interposto pela
réu, mas negar-lhe provimento, nos fundamentos do voto supracitado. Ante ao exposto, ACORDAM os Senhores integrantes da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em não conhecer da apelação 1 e negar provimento à apelação 2, nos termos do voto do Relator. Acompanharam o voto do eminente Desembargador Relator, os Exmos. Des. Themis Furquim Cortes e o Juiz Substituto em 2º Grau Osvaldo Nallim Duarte. Curitiba, 9 de julho de 2015. Des. JOSÉ LAURINDO DE SOUZA NETTO Relator
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