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Acórdão
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Estado do Paraná 1.275.492- AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1.275.492-4, DA COMARCA DE SÃO MIGUEL DO IGUAÇU VARA CÍVEL, DA FAZENDA PÚBLICA, ACIDENTES DO TRABALHO, REGISTROS PÚBLICOS E CORREGEDORIA DO FORO EXTRAJUDICIAL, JUÍZADO ESPECIAL CÍVEL E JUÍZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. GRAVANTE AGRAVANTE : MAPFRE VERA CRUZ SEGURADORA S/A. GRAVADO AGRAVADO : JOÃO PAULO FERREIRA DA SILVA RELATORA : DES.ª THEMIS DE ALMEIDA FURQUIM CORTES AGRAVO DE INSTRUMENTO AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS ACIDENTE DE TRÂNSITO ACORDO AUTOR AÇÃO ENTABULADO ENTRE AUTOR DA AÇÃO E RÉU AUSÊNCIA DE ANUÊNCIA DA SEGURADORA ACORDO HOMOLOGADO PELO MAGISTRADO DETERMINAÇÃO DO PROSSEGUIMENTO DO FEITO SECUNDÁRIO IRRESIGNAÇÃO DA SEGURADORA DEMANDA SECUNDÁRIA QUE DEVERÁ SEGUIR A SORTE DA APLICAÇÃO LIDE PRINCIPAL IMPOSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO DE TAL ENTENDIMENTO AO CASO EM APREÇO ENUNCIADO 373 DO CEJ ACORDO INEFICAZ PERANTE A SEGURADORA COMPOSIÇÃO QUE NÃO EXTINGUE AUTOMATICAMENTE A LIDE SECUNDÁRIA - VIABILIDADE DA DISCUSSÃO DA DO EXISTÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO SEGURADO PELO ACIDENTE NA DEMANDA COMPOSTA PELO SEGURADO E SEGURADORA. Agravo de instrumento conhecido e não provido. Vistos, relatados e discutidos estes autos de agravo de 1.275.492- Cível, Pública, instrumento n.º 1.275.492-4, da Vara Cível, da Fazenda Pública, Acidentes do Públicos Trabalho, Registros Públicos e Corregedoria do Foro Extrajudicial, Juizado Especial Cível e Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de São Miguel Iguaçu, do Iguaçu em que é agravante Mapfre Vera Cruz Seguradora S/A. e agravado Silva. João Paulo Ferreira da Silva.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA Estado do Paraná
Agravo de Instrumento n.º 1.275.492-4 (azc) f. 2 Relatório
1. Trata-se de agravo de instrumento interposto pela MAPFRE VERA CRUZ SEGURADORA S/A. contra a r. decisão de fls. 80/83-TJ/PR dos autos n.º 633-81.2012.8.16.0159, de Ação de Indenização por Danos Morais ajuizada por JOÃO PAULO FERREIRA DA SILVA em face de LUIZ GRANDO e da ora RANDO agravante, decisão esta que acolheu os aclaratórios opostos para o fim de retificar a sentença prolatada, passando-se a constar no julgamento que a lide secundária prosseguiria, ante a inexistência de participação da seguradora na elaboração do acordo.
A sustentação da agravante, em resumo, é de que o destino da lide autônoma está ligado ao rumo da lide principal. Destaca que na hipótese de extinção da lide principal, seja por que motivo for, tem-se como necessária a extinção da denunciação. Traz aos autos julgados a fim de corroborar sua tese. Assevera, finalmente, que caberá ao denunciante o pagamento dos ônus sucumbenciais devidos.
Indeferido o efeito suspensivo pleiteado (fl. 88/90), o magistrado a quo prestou as informações solicitadas (fls. 96/97), enquanto o agravado não apresentou sua resposta (fl. 98). Voto
2. O recurso merece conhecimento, na medida em que estão presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, tanto os intrínsecos (cabimento, legitimação e interesse em recorrer), como os extrínsecos (tempestividade, regularidade formal, inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer e preparo).
Oportuno apenas esclarecer que não obstante este Agravo de Instrumento advenha de uma sentença, tem-se como necessário observar que a irresignação da agravante esta atrelada a parte do julgado que versou sobre a manutenção da lide secundária, discussão esta que não se mostra vinculada ao conteúdo do art. 267 ou 269 do CPC, pelo que o recurso apropriado é o Agravo de Instrumento e não a apelação.
3. Não merecendo, contudo, ser provido. TRIBUNAL DE JUSTIÇA Estado do Paraná
Agravo de Instrumento n.º 1.275.492-4 (azc) f. 3
A agravante, irresignada com a decisão do magistrado a quo que determinou o prosseguimento do feito entre o segurado e a seguradora, interpôs o presente recurso com o intuito de buscar o reconhecimento de que a lide secundária segue a mesma sorte da lide primária. Em razão de tal entendimento, alega que não há que se falar em prosseguimento da lide secundária, devendo esta ser extinta.
Sem razão a agravante.
Compulsando os autos, extrai-se que as partes realizaram acordo (fls. 73/74 TJ/PR) com o intuito de pôr fim a discussão travada neste feito. Nesta composição, em que pese conste que há anuência da empresa Mapfre Vera Cruz Seguradora S/A., não existe nenhuma assinatura no local apropriado que comprove a efetiva concordância da seguradora com o que restou acordado.
Mesmo sem a anuência da seguradora com os termos do acordo entabulado entre as partes, o magistrado a quo homologou a composição (fls.75/76 TJ/PR), determinando, posteriormente, que a lide secundária prosseguisse (fls. 80/83 TJ/PR).
A priori, observando-se a situação fática acima elencada e considerando o conteúdo do §2º, art. 787, do Código Civil, poderia se afirmar que a homologação do acordo pelo magistrado a quo é nula, eis que a composição não teve a anuência da seguradora como determina o supramencionado texto legal, que dispõe:
Art. 787. No seguro de responsabilidade civil, o segurador garante o pagamento de perdas e danos devidos pelo segurado a terceiro. § 2o É defeso ao segurado reconhecer sua responsabilidade ou confessar a ação, bem como transigir com o terceiro prejudicado, indenizá- ou indenizá-lo diretamente, sem anuência expressa do segurador. (Destaquei)
Contudo, como já adverte a doutrina e a jurisprudência, o mencionado artigo deve ser analisado com ponderação a fim de evitar iniquidades, posto que sua redação acaba conflitando não só com disposições do Código Civil, mas também com previsões contidas no Código de Defesa do TRIBUNAL DE JUSTIÇA Estado do Paraná
Agravo de Instrumento n.º 1.275.492-4 (azc) f. 4 Consumidor.
Flávio Tartuce, em seu Manual de Direito Civil, faz a seguinte consideração sobre o tema:
"Além disso, o CC/2002 é expresso ao proibir ao segurado reconhecer sua responsabilidade ou confessar a ação, bem como transigir com o terceiro prejudicado, ou indenizá-lo diretamente, sem a anuência expressa do segurador (art. 787, §2º, do CC). Esse dispositivo tem redação bem complicada. Primeiro, porque afasta a possibilidade de o segurado reconhecer a existência de culpa, o que é um direito personalíssimo, infestável e intransmissível, nos termos do art. 11 do CC e do art. 1º, III, da CF/1988. Parece que foi mais um descuido do legislador, ao dispor que esse reconhecimento depende da seguradora. Outro problema refere-se ao poder de transigir, o que é um direito inerente ao segurado. Sendo o contrato de adesão ou de consumo, há como afastar essa regra, pois a parte contratual está renunciando a um direito que lhe é inerente, havendo infringência ao princípio da função social dos contratos em casos tais (art. 421 do CC)." (Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil: volume único. 2.ed.rev.,atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2012, p. 762. - Destaquei)
Em razão da redação questionável do artigo em apreço, foi aprovado na IV Jornada de Direito Civil o enunciado 373, que dispõe da seguinte maneira:
"373 Art. 787: Embora sejam defesos pelo § 2º do art. 787 do Código Civil, o reconhecimento da responsabilidade, a confissão da ação ou a transação não retiram do segurado o direito à garantia, sendo apenas ineficazes perante a seguradora." Extrai-se do mencionado enunciado que não obstante seja defeso pelo §2º, do art. 787, do CC, a transação, não há que se falar que o segurado não detém o direito à garantia, sendo o acordo apenas ineficaz em relação a seguradora.
Destaca-se que nos moldes do que dispõe o art. 844 do Código Civil, a composição entre as partes não aproveita, nem TRIBUNAL DE JUSTIÇA Estado do Paraná
Agravo de Instrumento n.º 1.275.492-4 (azc) f. 5 prejudica senão aos que intervierem, pelo que, como consta no enunciado acima mencionado, os termos da composição não irão interferir na lide secundária.
Assim, pelo que foi exposto, infere-se que não há que se falar em extinção automática da lide secundária, tão somente pelo fato da ação principal ter sido extinta em razão da homologação do acordo como quer fazer entender a agravante.
Quer-se assim dizer que a lide secundária entre o segurado e a seguradora irá prosseguir, sendo possível a discussão sobre a existência de responsabilidade da seguradora perante o fato discutido na lide principal extinta em razão do acordo entabulado entre as partes.
Entendimento este em consonância com o que vem decidindo o Superior Tribunal de Justiça:
"PROCESSUAL CIVIL. DENUNCIAÇÃO À LIDE. ACORDO ENTRE O AUTOR E O RÉU DENUNCIANTE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DO RÉU-DENUNCIADO JULGADOS PREJUDICADOS. NULIDADE. ART. 535 CPC. RETORNO DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE JUSTIÇA PARA QUE HAJA UM NOVO PRONUNCIAMENTO ACERCA DA MATÉRIA DEDUZIDA. 1. A transação ocorrida na lide principal entre o autor e o réu- réu- denunciante não aproveita e nem prejudica os terceiros, especialmente quando existe denunciação da lide, não extinguindo- extinguindo-se, automaticamente, portanto, a demanda secundária. réu- 2. O acordo entre o autor e o réu-denunciante na demanda réu- principal, do qual não fez parte o réu-denunciado, não substitui a transitada sentença de procedência transitada em julgado, motivo pelo qual não há qualquer óbice para que, na segunda demanda, entre denunciante e denunciado, o réu invoque a ausência de responsabilidade do segurado para se eximir quanto ao ressarcimento. ressarcimento 3. Recurso especial conhecido e provido para anular o acórdão que julgou os embargos de declaração, determinando o retorno dos autos ao Tribunal de origem para que profira nova decisão."
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Agravo de Instrumento n.º 1.275.492-4 (azc) f. 6 (REsp 316.046/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/02/2009, DJe 23/03/2009 - Destaquei)
Importante, ainda mencionar julgamento que versa sobre a possibilidade do pagamento do seguro, mesmo quando há transação sem anuência da seguradora, o que por consequência nos remete a conclusão de que a lide secundária não segue a mesma sorte da lide principal.
"RECURSO ESPECIAL. CIVIL. SEGURO DE AUTOMÓVEL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE CIVIL. TRANSAÇÃO JUDICIAL ENTRE SEGURADO E VÍTIMA (TERCEIRO PREJUDICADO). FALTA DE ANUÊNCIA DA SEGURADORA. INEFICÁCIA DO ATO. BOA-FÉ DOS TRANSIGENTES. DIREITO DE RESSARCIMENTO. ACORDO VANTAJOSO ÀS PARTES. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO EFETIVO AO ENTE SEGURADOR. 1. No seguro de responsabilidade civil, o segurado não pode, em princípio, reconhecer sua responsabilidade, transigir ou confessar, judicial ou extrajudicialmente, lesado, extrajudicialmente, sua culpa em favor do lesado, a menos que haja prévio e expresso consentimento do ente segurador, pois, caso contrário, perderá o direito à garantia securitária, ficando pessoalmente obrigado perante o terceiro, sem direito de despender. reembolso do que despender. 2. As normas jurídicas não são estanques, ao revés, sofrem influências mútuas, pelo que a melhor interpretação do parágrafo 2º do art. 787 do Código Civil é de que, embora sejam defesos, o reconhecimento da responsabilidade, a confissão da ação ou a transação não retiram do segurado, que boa- estiver de boa-fé e tiver agido com probidade, o direito à indenização e ao reembolso, sendo os atos apenas ineficazes perante a seguradora (enunciados nºs 373 e 546 das Jornadas de Direito Civil). Desse modo, a perda da garantia securitária apenas se dará em caso de prejuízo efetivo ao ente segurador, a exemplo de fraude (conluio entre segurado e terceiro) ou de ressarcimento de valor exagerado (superfaturamento) ou indevido, resultantes de má-fé do próprio segurado. 3. Se não há demonstração de que a transação feita pelo segurado e pela vítima do acidente de trânsito foi abusiva, infundada ou desnecessária, mas, ao contrário, sendo evidente que o sinistro de fato aconteceu e o acordo realizado foi em termos favoráveis tanto ao segurado quanto à seguradora, não há razão para erigir a regra do art. 787, § 2º, do CC em direito absoluto a afastar o ressarcimento do segurado. 4. Recurso especial não provido." (Recurso Especial n.º 1.133.459/RS, Relator: Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Órgão
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Agravo de Instrumento n.º 1.275.492-4 (azc) f. 7 Julgador: Terceira Turma, Data do Julgamento: 21 de agosto de 2014)
Desta feita, não há como dar provimento a tese da agravante, eis que no caso em pareço a sorte da lide principal não se aplica a demanda secundária, que deverá prosseguir, conforme determinou o magistrado a quo.
4. Passando-se as coisas desta maneira, meu voto é no sentido de negar provimento ao recurso, mantendo-se o que restou decidido em Primeiro Grau. Decisão
5. À face do exposto, ACORDAM os integrantes da Décima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso, nos termos do voto da relatora.
O julgamento foi presidido pelo Senhor Desembargador Luiz Lopes (sem voto), e dele participaram, além da signatária (relatora), os Senhores Desembargadores Albino Jacomel Guerios e Guilherme Freire de Barros Teixeira.
Curitiba, 30 de julho de 2015 (data do julgamento).
Themis de Almeida Furquim Cortes Desembargadora
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