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Acórdão
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APELAÇÃO CIVEL Nº 1.388.027-4 DA 1ª VARA CÍVEL E DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE PATO BRANCO
APELANTE 01: Ulisses Matioda e outros APELANTE 02: Município de Pato Branco APELADOS: Os mesmos RELATORA: Desª. Lélia Samardã Giacomet. REVISORA: Desª Regina Afonso Portes APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO. UTILIDADE PÚBLICA. SENTENÇA QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS E FIXOU A INDENIZAÇÃO EM FAVOR DOS RÉUS. APELAÇÃO DOS RÉUS. NULIDADE DA SENTENÇA. VALOR INDENIZATÓRIO FIXADO COM BASE EM MERO LAUDO DE AVALIAÇÃO PRÉVIA. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE PERÍCIA DEFINITIVA PARA VIABILIZAR UMA CORRETA QUANTIFICAÇÃO DO BEM EXPROPRIADO. PERÍCIA QUE SE LIMITOU À AFERIÇÃO DOS LUCROS CESSANTES, SEM REAVALIAR A ÁREA EXPROPRIADA. ELEMENTOS INDICANDO QUE A EXTENSÃO OCUPADA FOI SUPERIOR À ÁREA ATINGIDA PELO DECRETO EXPROPRIATÓRIO. NECESSIDADE DE AVALIAÇÃO MINUCIOSA DO IMÓVEL PARA GARANTIR UMA JUSTA INDENIZAÇÃO. PRELIMINAR ACOLHIDA. SENTENÇA ANULADA. APELAÇÃO DOS RÉUS CONHECIDA E PROVIDA. APELAÇÃO DO AUTOR PREJUDICADA. Apelação 01 conhecida a provida para anular a sentença. Apelação 02 prejudicada. VISTOS relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível (1 e 2) sob nº. 1.388.027-4, da 1ª Vara Cível e da Fazenda Pública da Comarca de Pato Branco, em que são apelantes (1) Ulisses Matioda, Lenir Lourdes Matioda, Moacir Carlos bertol, Margot Iria Formighieri Bertol e Elvira Serafina Galera Bertol e (2) Município de Pato Branco, sendo apelados os mesmos reciprocamente entre si.
I - RELATÓRIO:
Tratam-se de recursos de apelação (1 e 2) interpostos por ambas as partes litigantes nos autos de "Desapropriação" sob nº 0002089-29.2007.8.16.0131, ajuizada pelo Município de Pato Branco em face de Ulisses Matioda e outros, em face da r. sentença (fls. 356-364) que julgou parcialmente procedentes os pedidos para o fim de:
"a) desapropriar e incorporar ao patrimônio do Município de Pato Branco o imóvel denominado área de terra "parte do Imóvel Ulisses Matioda lote 54", a ser desmembrado de uma parte do lote rural sob nº. 54 do núcleo Bom Retido, contendo a área de 8.733,36 m², constante da matrícula n. 15.620 do 1º Registro Geral de Imóveis desta Comarca, valendo a presente sentença como título para registro no referido Ofício Imobiliário.
b) condenar o Município de pato Branco a pagar aos réus, indenização pela desapropriação do imóvel dos
réus, no valor de R$ 63.142,19 (sessenta e três mil, cento e quarenta e dois reais e dezenove centavos), sendo devida indenização aos autores, de forma proporcional à extensão de suas áreas na matrícula.
Deverão incidir juros compensatórios a partir da imissão na posse, (18.06.2009, fls. 175/176), à razão de 12% ao ano (súmula 618, do STF). Ainda, o valor da condenação deverá ser corrigido monetariamente pela média do INPC + IGP-DI, e incluindo os juros de mora de 6% ao ano, a contar da data da avaliação judicial (fls. 39).
Condenar o Município de Pato Branco ao pagamento à ré Elvira Serafina Galera Bertol, de indenização por lucros cessantes, no valor de R$ 5.142,08 (cinco mil, cento e quarenta e dois reais e oito centavos), corrigido monetariamente pela média do INPC + IGP-DI desde a data da avaliação judicial (fls. 276), e acrescido de juros de mora a contar da citação.
(...)
Diante da sucumbência recíproca, condeno as partes no rateio, em igual (50% cada parte), das custas e despesas processuais, bem como, na mesma proporção condeno as partes e honorários advocatícios que fixo em 15% (quinze por cento) do valor da condenação (...)."
Contra a sentença Ulisses Matioda e outros interpuseram Embargos de Declaração (fls. 378-381), os quais foram, no entanto, rejeitados pelo juízo (fl. 386).
Inconformados, Ulisses Matioda e outros interpuseram Recurso de Apelação (fls. 391-398), sustentando, em síntese que: (a) o valor indenizatório fixado pela sentença baseou-se unicamente na avaliação prévia efetuada para fins de imissão na posse, a qual não refletiu o real valor do imóvel desapropriado; (b) embora tenham formulado reiterados pedidos de nova avaliação, a perícia posteriormente produzida limitou-se à questão dos lucros cessantes, deixando de avaliar o valor real da área expropriada; (c) ademais, a perícia constatou que a área efetivamente desapropriada foi equivalente à 15.725,34 m², extensão muito superior à área abrangida pelo decreto expropriatório, de apenas 8.733,36m²; (d) a indenização fixada em R$ 63.142, 19 (sessenta e três mil, cento e quarenta e dois reais e dezenove centavos) considerou apenas área de 8.733,36m², representando enriquecimento ilícito do ente expropriante; (e) a ré Elvira Serafina Galera Bertol ingressou na lide após a retificação do polo passivo e jamais concordou com o valor oferecido; (f) a quantia acolhida pela sentença não perfaz a justa indenização preconizada pelo artigo 5º, XXIV da Constituição.
Diante dessas alegações requerem, preliminarmente, seja declarada a nulidade da sentença para que seja determinada a realização de perícia técnica apta a refletir a justa indenização pelo imóvel expropriado. Sucessivamente, requerem a reforma da sentença, devendo ser fixado um valor condizente com a real metragem do terreno, bem como os lucros cessantes.
O Município de Pato Branco interpôs Recurso de Apelação (fls. 399/409), sustentando a impossibilidade de incidência dos juros de mora e compensatórios na hipótese em que o ente expropriante deposita integralmente o valor da indenização antes da imissão na posse. Requer o provimento do recurso, apenas, para que sejam afastados os juros moratórios e compensatórios.
Os recursos foram recebidos e as partes intimadas para contrarrazoá-los.
O Município de Pato Branco apresentou contrarrazões às fls. 406-409 ao passo em que os réus, Ulisses Matioda e outros, não apresentaram contrarrazões.
A Douta Procuradoria Geral de Justiça, instada a se manifestar, através de seu parecer acostado às fls. 417-429 manifestou-se pelo provimento do recurso a fim de que seja anulada a sentença e determinada a produção da prova pericial sobre a integralidade do bem imóvel expropriado.
Vieram-me os autos conclusos.
É o relatório.
II - VOTO:
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de Apelação interposto por Ulises Matioda e outros.
Em sede preliminar, os Apelantes pugnam pela nulidade da sentença que julgou parcialmente procedente a ação de desapropriação, sob o argumento de que a indenização foi fixada apenas com base em avaliação prévia, a qual não refletiu o real valor do imóvel desapropriado.
Assiste-lhes razão.
Consoante dispõe o parágrafo 3º do art. 182 da Constituição Federal, "as desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro".
Segundo a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello:
"Indenização justa, prevista no art. 5º, XXIV, da Constituição, é aquela que corresponde real e efetivamente ao valor do bem expropriado, ou seja, aquela cuja importância deixe o expropriado absolutamente indene, sem prejuízo algum em seu patrimônio. Indenização justa é aquela a que se consubstancia em importância que habilita o proprietário a adquirir outro bem perfeitamente equivalente e o exime de qualquer detrimento (Curso de Direito Administrativo. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 850). (grifei)
Desse modo, a garantia constitucional da justa indenização impõe ao magistrado dever de primar pela aferição do real valor do imóvel expropriado, devendo assumir a função de condutor do processo e com isso determinar, mesmo de ofício, a produção das provas técnicas e complementações necessárias à melhor quantificação do bem.
Não foi o que sucedeu no caso em exame.
Colhe-se dos autos que o Município de Pato Branco propôs ação de desapropriação em face Ulisses Matioda, Lenir Lourdes Matioda, Moacir Carlos bertol, Margot Iria Formighieri Bertol, no intuito de promover o depósito e alcançar a imissão na posse sobre o bem imóvel contendo a área de 8.733,36 m², descrito na matrícula n. 15.620, do 1º Registro de Geral de Imóveis da Comarca de Pato Branco, em razão do Decreto Municipal n. 5.182/2007.
O Decreto em questão instrumentalizou a desapropriação do imóvel, por utilidade pública, para viabilizar obra de "prolongamento da Rua Urbano Wittmann, ligando a Estrada Municipal de acesso à Fazenda da Barra ao Loteamento Parque do Som, visando atender à demanda de veículos com transporte de cargas do setor agropecuário em contorno parcial à área urbana e desvio de trecho urbano de grande declividade que oferece risco de acidente". Para tanto, ente expropriante aduziu que o valor do bem imóvel seria, à época, de R$ 32.488,10 (trinta e dois mil, quatrocentos e oitenta e oito reais e dez centavos) (fls. 02-21).
Ordenada a avaliação prévia para fins de imissão na posse (fl. 22), o avaliador judicial um corretor de imóveis atribuiu ao imóvel o valor de 63.142,19 (sessenta e três mil, cento e quarenta e dois reais e dezenove centavos) pela área de 8.733,36 m², com base nos preços médios da região (fl. 39), valor este prontamente depositado pelo Município.
Posteriormente, a ré Elvira Serafina Galera Bertol foi integrada ao polo passivo da demanda e expressou a sua discordância para com o valor da avaliação, requerendo, em sua contestação, "a produção de novo laudo pericial de avaliação da área" (fls. 138). Tal pedido foi reiterado na petição de fls. 190-192 e também nos embargos declaratórios de fls. 222-226.
A despeito disso, o feito prosseguiu à míngua de prova pericial definitiva sobre o imóvel.
De fato, observa-se que a perícia produzida nos autos versou unicamente sobre a quantificação dos lucros cessantes alegados pelos réus em decorrência de suposto arrendamento de parte do imóvel desapropriado (fls. 273 e ss.).
Não houve reavaliação do imóvel por profissional habilitado.
Sendo assim, a sentença fixou a indenização no valor de R$ 63.142,19 (sessenta e três mil, cento e quarenta e dois reais e dezenove centavos) baseada apenas na avaliação prévia efetuada por um corretor de imóveis.
Como se vê, o procedimento adotado pelo juízo a quo está eivado de falhas que impossibilitaram a correta aferição do valor imóvel, violando direito dos réus à justa indenização.
Primeiramente, porque o valor da indenização foi quantificado apenas com base na avaliação prévia, de caráter sumário, que se mostra inapta a refletir o correto valor do imóvel.
Cumpre ressaltar que a avaliação prévia nada mais é senão uma perícia preliminar, destinada a estabelecer um valor provisório do imóvel expropriado fins de imissão antecipada na posse, sem excluir a necessidade de apurar-se o valor justo no curso da instrução processual mediante perícia definitiva.
Nesta linha, o Superior Tribunal de Justiça já afirmou:
"Os valores para fins de imissão prévia na posse e o valor final estabelecido são inconfundíveis. Tanto isso é certo que a imissão na posse, que na espécie não ocorreu, satisfaz-se com o depósito da metade do valor provisoriamente e de plano estimado pelo vistor. Esse valor, bem é de ver, nada tem haver com o valor final, apurado depois da amplitude do contraditório pata refletir o justo preço de que trata o artigo 5º, inciso XXIV, da Constituição da República. (...) Recurso especial não conhecido. Decisão unânime". (STJ - REsp: 239237 SP 1999/0105755-8, Relator: Ministro FRANCIULLI NETTO, Data de Julgamento: 09/05/2000, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJ 19/06/2000 p. 136) (grifei)
A propósito, este Tribunal vem reiteradamente afirmando a necessidade de perícia definitiva nas demandas desapropriatórias. Confira-se:
"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO.SENTENÇA QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS INICIAIS PARA CONFIRMAR A LIMINAR CONCEDIDA E DECRETAR A DESAPROPRIAÇÃO REALIZADA DE PARTE DO IMÓVEL DO APELANTE E FIXANDO A INDENIZAÇÃO DEVIDA EM R$ 28.640,88 (VINTE E SEIS MIL, SEISCENTOS E QUARENTA REAIS E OITENTA E OITO CENTAVOS). FIXAÇÃO DA INDENIZAÇÃO POR DESAPROPRIAÇÃO COM BASE NO VALOR ENCONTRADO NO LAUDO JUDICIAL DE AVALIAÇÃO PROVISÓRIA.IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO PROCESSUAL, COM A REALIZAÇÃO DE PERÍCIA DEFINITIVA PARA SE AFERIR O PREÇO JUSTO E A EXTENSÃO DA ÁREA EFETIVAMENTE DESAPROPRIADA. O LAUDO PERICIAL DEFINITIVO NÃO SE CONFUNDE COM O LAUDO JUDICIAL DE AVALIAÇÃO PROVISÓRIA, OU SEJA, ESTE NÃO POSSUI O CONDÃO DE SE AFERIR O EXATO VALOR QUE DEVERÁ O EXPROPRIANTE PAGAR AO EXPROPRIADO A TÍTULO DE INDENIZAÇÃO, COMO OCORRE NO DEFINITIVO.RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARA CASSAR A SENTENÇA, RESTANDO PREJUDICADOS OS DEMAIS TÓPICOS RECURSAIS." (TJPR - 4ª C.Cível - AC - 1165846-7 - Região Metropolitana de Maringá - Foro Regional de Sarandi - Rel.: Maria Aparecida Blanco de Lima - Unânime - - J. 06.05.2014) (grifei)
"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA. FIXAÇÃO DA INDENIZAÇÃO POR DESAPROPRIAÇÃO COM BASE NO VALOR ENCONTRADO NO LAUDO JUDICIAL DE AVALIAÇÃO PROVISÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO PROCESSUAL, COM A REALIZAÇÃO DE PERÍCIA DEFINITIVA PARA SE AFERIR O PREÇO JUSTO E A EXTENSÃO DA ÁREA EFETIVAMENTE DESAPROPRIADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARA CASSAR A SENTENÇA, RESTANDO PREJUDICADOS OS DEMAIS TÓPICOS RECURSAIS. O laudo pericial definitivo não se confunde com o laudo judicial de avaliação provisória, ou seja, este não possui o condão de se aferir o exato valor que deverá o expropriante pagar ao expropriado a título de indenização, como ocorre no definitivo, haja vista que o mesmo tem apenas o objetivo de efetuar a avaliação provisória do imóvel objeto de desapropriação, para fins de depósito e imissão prévia na posse. Por isso, a necessidade de se cassar a sentença, a fim de que siga a instrução processual com a realização de perícia definitiva para se apurar tanto o preço justo como a real extensão da área expropriada, haja vista que com
relação a esta há dúvidas nos autos. (TJPR - 5ª C.Cível - AC - 663077-3 - Faxinal - Rel.: Luiz Mateus de Lima - Unânime - - J. 06.07.2010) (grifei)
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESAPROPRIAÇÃO. DECISÃO DE 1º GRAU QUE RESTABELECE IMISSÃO NA POSSE DO IMÓVEL, APÓS DEPÓSITO COMPLEMENTAR EM OBEDIÊNCIA À AVALIAÇÃO JUDICIAL PRÉVIA DETERMINADA POR ESTE TRIBUNAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 824.713-0. DECISÃO ESCORREITA. AUSÊNCIA DE NULIDADE NA AVALIAÇÃO JUDICIAL PRÉVIA.PARTE AGRAVANTE QUE FOI INTIMADA DA DATA E LOCAL INICIAL DA DILIGÊNCIA. DESNECESSIDADE DE PARTICIPAÇÃO DE ASSISTENTES TÉCNICOS, POIS A AVALIAÇÃO PRÉVIA NÃO SE CONFUNDE COM A PERÍCIA COMPLETA A SE REALIZAR NA INSTRUÇÃO PROCESSUAL. RECURSO DESPROVIDO." (TJPR - 5ª C.Cível - AI - 932063-2 - Centenário do Sul - Rel.: Rogério Ribas - Unânime - - J. 26.03.2013). (grifei) Outro ponto a merecer destaque - ressaltado pelo parecer do Douto Procurador de Justiça - é que avaliação prévia foi elaborada por Corretor de Imóveis, profissional este que não possui as habilidades necessárias para a confecção de perícia em desapropriação. Na esteira do entendimento cristalizado pela Corte Superior: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECLAMAÇÃO. TESE. JULGADO DESCUMPRIDO. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO. PERÍCIA TÉCNICA. NECESSIDADE. PROFISSIONAL. FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA. ART. 145 DO CPC. ART. 12, § 3.º, DA LEI 8.629/1993. DECISÃO RECLAMADA. NOMEAÇÃO. PERITO JUDICIAL. CORRETOR DE IMÓVEIS. DESCUMPRIMENTO CONFIGURADO. 1. A tese firmada no julgamento do Ag 1.334.673/ES confirma a ilegalidade prima facie da designação de corretor de imóveis para proceder a perícia judicial em ação de desapropriação, na forma do art. 145, §§ 1.º a 3.º, do CPC, e do art. 12, § 3.º, da Lei 8.629/1993, à míngua de qualificação em ensino superior. 2. A decisão judicial que, a despeito da clareza desse comando judicial, procede à nomeação de perito judicial sobre corretor de imóveis, em que pese não configurada a exceção prevista no § 3.º do art. 145 do CPC, descumpre o teor do referido julgado. 3. Reclamação procedente (Rcl 7.277/ES, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 27/11/2013, DJe 05/12/2013)
Portanto, a aferição do valor indenizatório justo requeria a elaboração de perícia minuciosa e definitiva, no decorrer da instrução processual, que comprovasse a existência de novos e mais profundos elementos para se chegar ao valor correto.
Para além disso, quando do levantamento topográfico realizado para quantificar os lucros lucros cessantes, a engenheira agrônoma constatou que área ocupada após a construção da estrada foi bastante superior àquela versada originalmente pelo decreto expropriatório, atingindo a extensão de 15.725,32 m² (quinze mil, setecentos e vinte e cinco virgula trinta e dois metros quadrados - fl. 276) ou seja, quase o dobro da área inicialmente referida pelo Decreto.
Ocorre que o juízo desconsiderou ao fixar a indenização, eis que a avaliação acolhida pela sentença versou apenas sobre área de 8.733,36 m².
Neste caso, a perícia definitiva haveria de ser determinada de ofício pelo magistrado para aferir o valor da real extensão do imóvel. É esse o teor da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
"PROCESSUAL. ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO DIRETA. REFORMA AGRÁRIA. CONTESTAÇÃO DA OFERTA. PERÍCIA. NECESSIDADE. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. ÔNUS DO EXPROPRIANTE.
1. A ação de desapropriação para fins de reforma agrária, sujeita à procedimento específico estabelecido pela LC 76/93, impõe a realização de prova pericial pelo juízo, quando o expropriado contestar a oferta.
2. A determinação da perícia em desapropriação direta, quando contestada a oferta, é ato de impulso oficial (art. 262, do CPC), porquanto a perícia é imprescindível para apuração da justa indenização, muito embora não vincule o juízo ao quantum debeatur apurado . (...) (REsp 992.115/MT, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 01/10/2009, DJe 15/10/2009)"
Desse modo, conclui-se que a sentença é nula por
De outro turno, não procede a alegação do Apelado no sentido de que todos os réus teriam "concordado" com o quantum aferido na avaliação prévia, ao requererem o levantamento desse valor sob a alcunha de considera-los "incontroverso", na petição de fl. 195).
Diferente disso, o fato de referirem-se a tal valor como "incontroverso", retrata apenas a sua concordância com este valor a um título mínimo, o que não afasta a existência de valores controvertidos que poderiam ser encontrados após a realização da perícia definitiva.
Ademais, constata-se que a ré Elvira Bertol jamais aquiesceu com a avaliação prévia, uma vez que se manifestou reiteradamente pela necessidade da prova pericial.
De mais a mais, a correta avaliação do bem expropriado é de tal importância que o Superior Tribunal de Justiça entende ser "possível ao juiz, em Ação de Desapropriação, ante as peculiaridades do caso concreto, excetuar a regra insculpida no art. 22 do Decreto-Lei 3.365/1941 e determinar a realização de perícia avaliatória, ainda que os réus tenham concordado com o montante oferecido pelo Estado. (Precedentes: REsp 886.672/RO, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 22.11.2007; REsp 651.294/GO, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ 6.3.2006,; AgRg no AREsp 272.004/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe 5/12/2013. (grifei)
Desse modo, ainda que os todos os réus houvessem concordado com a avaliação prévia, é de se lembrar que a área atingida pela desapropriação foi superior em quase o dobro da área referida no decreto expropriatório (fl. 276), o que, por si só, impunha ao magistrado a conduta ativa de determinar a realização de uma nova perícia para quantificar toda a extensão ocupada.
Por essas razões, é de rigor o conhecimento e provimento do recurso de apelação interposto por Ulisses Matioda e outros para o fim de declarar a nulidade da sentença, a fim de que seja determinada a realização de perícia definitiva que afira o justo preço pela real extensão da área desapropriada.
Por conseguinte, julgo prejudicada a análise da Apelação interposta pelo Município de Pato Branco.
III - DECISÃO:
ACORDAM os integrantes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer e dar provimento ao recurso de apelação interposto por Ulisses Matioda e outros, a fim de cassar a sentença vergastada, julgando, por conseguinte, prejudicado o apelo interposto pelo Município de Pato Branco, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.
Presidiu o julgamento a Excelentíssima Senhora Desembargadora Regina Afonso Portes, com voto e, dele participou a Ilustríssima Juiza de Direito Substituta de Segundo Grau Cristiane Santos Leite.
Curitiba, 15 de setembro de 2015. LÉLIA SAMARDÃ GIACOMET Desembargadora Relatora
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