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Acórdão
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Digitally signed by LUIZ SERGIO NEIVA DE LIMA VIEIRA:3170 Date: 2015.09.28 16:32:33 BRT Reason: Validade Legal Location: Paraná - Brasil INCIDENTE DECLARAÇÃO INCONSTITUCIONALIDADE Nº 1.225.403-2/01, DO ÓRGÃO ESPECIAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ SUSCITANTE: 2ª CÂMARA CÍVEL DO TJPR INTERESSADOS: ANA MARIA CHRISTOFORO BARSZCZ, ELCIO OSCAR MACHINSKI, ISABEL, CRISTINA FOGGIATTO, JUSSARA CANHA DA SILVA, LUCIA YUMIKO NISHIMURA, ESTADO DO PARANÁ RELATOR DESIGNADO: DES. PAULO ROBERTO VASCONCELOS INCIDENTE DE DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL Nº 131/2010 REESTRUTURAÇÃO DA CARREIRA DE AGENTE FISCAL DO ESTADO TRANSPOSIÇÃO DO AGENTE FISCAL DE NÍVEL MÉDIO AO CARGO DE NÍVEL SUPERIOR DE AUDITOR FISCAL IMPOSSIBILIDADE EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO COM OBSERVÂNCIA DA NATUREZA E COMPLEXIDADE DE CADA CARGO - ARTIGO 37, INCISOS I E II DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL SÚMULA VINCULANTE N.º 43 PRECEDENTES DESTA CORTE E DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL INCIDENTE JULGADO PROCEDENTE, POR MAIORIA DE VOTOS, PARA DECLARAR A INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARTIGOS 151 E 153 DA LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL N.º 131/2010. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Incidente de Declaração de Inconstitucionalidade n.º 1.225.403-2/01, do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, em que é suscitante a 2ª Câmara Cível do TJPR e interessados ANA MARIA CHRISTOFORO BARSZCZ, ELCIO OSCAR MACHINSKI, ISABEL, CRISTINA FOGGIATTO, JUSSARA CANHA DA SILVA, LUCIA YUMIKO NISHIMURA e ESTADO DO PARANÁ.
I RELATÓRIO:
Trata-se de Incidente de Declaração de Inconstitucionalidade suscitado pela colenda 2ª Câmara Cível deste egrégio Tribunal de Justiça relativamente aos arts. 151 e 153 da Lei Complementar Estadual nº 131/2010, a qual reestruturou a carreira dos Agentes Fiscais do Estado, transformando os cargos respectivos com alteração da designação para Auditores fiscal. Segundo o acórdão, teria havido camuflagem na lei, na tentativa do legislador corrigir o vício da Lei Complementar Estadual nº 92/2002, da transposição do agente fiscal de nível médio ao cargo de nível superior de auditor, contrariando o disposto no artigo 37, incisos I e II, da Constituição Federal.
A Procuradoria-Geral de Justiça, no parecer de fls. 539/558, pugnou pela procedência do incidente, alegando, para tanto: que a Lei Estadual nº 7051/78 dispôs a respeito da estrutura e organização da Coordenação da Receita do Estado, especificando que os cargos de Agente
Fiscal AF-1 e AF-2 seriam privativos de quem detivesse grau universitário, enquanto os cargos AF-3 e AF-4 seriam acessíveis a quem detivesse escolaridade de nível médio; que os artigos 68 a 71 da Lei Estadual nº 7051/78 permitiam o acesso funcional aos cargos AF-1 e AF-2 se no decorrer da carreira fossem preenchidos os requisitos necessários, entre eles a escolaridade superior, ora exigida pra o cargo de Auditor Fiscal; que a Lei Complementar Estadual nº 92/2002 revogou a Lei Estadual nº 7051/78, estabelecendo a transposição dos cargos de agente fiscal para auditor fiscal; que nos Incidentes de Declaração de Inconstitucionalidade de nos 315638-3/01 e 315883-8/01 foi reconhecida a inconstitucionalidade do artigo 156 da Lei Complementar Estadual nº 92/2002; que a Lei Complementar Estadual 131/2010, por sua vez, revogou a 92/2002 e, muito embora não tenha utilizado a expressão "transposição", dispôs novamente sobre a reestruturação da carreira de Agente Fiscal, com a consequente transformação dos cargos de Agente Fiscal em cargos de Auditor Fiscal; que os artigos 151 e 153 da Lei Complementar Estadual 131/2010 são inconstitucionais, na medida em que nem todos os Agentes Fiscais AF-1 e AF- 2 submeteram-se a concurso público para cargos que exigem escolaridade superior, tendo sido promovidos mediante acesso; quanto aos agentes AF-3 e AF-4, sequer é exigido curso superior completo; que a transformação dos cargos não pode ser aproveitada aos inativos que ingressaram nas classes AF-3 e AF-4.
É o relatório.
II VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO:
Pois bem. A Lei Complementar Estadual nº 131/2010, em seu art. 7º, organiza a carreira de Auditor Fiscal em 09 (nove) classes, de
"A" à "I". Mais adiante, no art. 21, constam como requisitos para nomeação ao cargo de Auditor Fiscal, a aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos e "grau de instrução superior completo".
No regime da Lei Estadual nº 7051/78 (alterada pelas Lei Estaduais no. 7787/83 e 10682/93), diferentemente, coexistiam cargos de Agente Fiscal acessíveis a detentores de escolaridade de nível médio (classes AF-3 e AF-4) e cargos para os quais se exigia escolaridade superior (cargos AF-1 e AF-2). O provimento dos cargos AF-1 somente era feito por concurso se não houvesse servidores habilitados ao "acesso", estando claro que nem todos os ocupantes de cargos AF-1 e AF-2 o são em razão de concurso público.
A inconstitucionalidade vislumbrada pela 2ª Câmara Cível está justamente no fato de que a Lei Complementar Estadual nº 131/2010 mais uma vez permite que ocupantes de cargos de Agente Fiscal de nível médio passem a ocupar cargos de Auditor Fiscal de nível superior, para o qual não foram aprovados em concurso público, com dispensa dos requisitos legais estabelecidos na mesma lei. Os arts. 151 e 153, portanto, realmente mascaram a transposição feita pela Lei Complementar Estadual nº 92/2002, nivelando nos novos cargos de Auditor Fiscal, para os quais se exige concurso público e escolaridade de nível superior, antigos Agentes Fiscais não investidos mediante concurso público compatível com a escolaridade do cargo, em afronta ao art. 37, incisos I e II, da Constituição Federal.
Valem, pois, para os dispositivos ora questionados os mesmos argumentos já expendidos no Incidente de Declaração de Inconstitucionalidade nº 315638-3/01, relatado pelo Des. Antonio Lopes de Noronha. Vale transcrever parte da decisão:
"(...) A PARANAPREVIDÊNCIA e o Estado do Paraná pediram a declaração incidental de inconstitucionalidade do artigo 156 da Lei Complementar Nº 92/2002, por prever que os servidores dos antigos cargos de Agente Fiscal 2 e 3, que exigiam como requisitos o 2º e 1º graus de escolaridade, respectivamente, passem a ocupar, sem concurso público, o cargo de auditor fiscal que passou a ser privativo de servidores com nível superior (art. 8º), com extensão dos benefícios aos aposentados e pensionistas, conforme disposto no § 2º do mesmo artigo, introduzido pela Lei Complementar Nº 97/2002. Dispõe o artigo 156 da Lei Complementar Nº 92/2002: `Art. 156. A transposição das séries de classes vigentes até então para as classes de que trata o art. 7º desta lei, dar-se-á da seguinte forma: I - os Agentes Fiscais 3-A serão enquadrados na classe de Auditor Fiscal "C" AF-C; II - os Agentes Fiscais 3-B serão enquadrados na classe de Auditor Fiscal "D" AF-D; III - os Agentes Fiscais 3-C serão enquadrados na classe de Auditor Fiscal "E" AF-E; IV - os Agentes Fiscais 2-A serão enquadrados na classe de Auditor Fiscal "F" AF-F; V - os Agentes Fiscais 2-B serão enquadrados na classe de Auditor Fiscal "F" AF-F; VI - os Agentes Fiscais 2-C serão enquadrados na classe de Auditor Fiscal "F" AF-F; VII - os Agentes Fiscais 1-A serão enquadrados na classe de Auditor Fiscal "G" AF-G; VIIII - os Agentes Fiscais 1-B serão enquadrados na classe de Auditor Fiscal "H" AF-H; IX - os Agentes Fiscais 1-C serão enquadrados na classe de Auditor Fiscal "I" AF-I". A inconstitucionalidade está no fato de ser permitida a transposição dos cargos sem que seja preenchido o requisito para ingresso na carreira, contrariando o disposto no artigo 37, incisos I e II, da Constituição Federal, in verbis: (...) A lei complementar em análise coloca nas mesmas condições as pessoas que prestaram concurso para cargo de nível fundamental ou médio com as que ingressaram na carreira em classe de nível superior, configurando promoção, o que não é admissível (...)" Assim, somente os agentes fiscais que foram investidos inicialmente na classe AF-1 e por concurso público de provas ou provas e títulos, nos termos do referido § 1º, do
artigo 21, da antiga Lei Estadual Nº 7.051/78, é que poderiam ser transpostos para o cargo de auditor fiscal".
Apesar da melhor redação da Lei Complementar Estadual nº 131/2010, incorreu o legislador estadual, conscientemente ou não, no mesmo vicio do qual padeceu a lei revogada, já tida por inconstitucional.
É verdade que a Lei Estadual nº 131/2010 envolve a alteração da designação do cargo de Agente Fiscal para Auditor Fiscal e dos requisitos para o seu provimento. Essa realidade, porém, não simplifica a problemática nem transforma o caso em "mera alteração da nomenclatura do cargo, sem qualquer alteração nas atribuições inerentes a seu desempenho", pois é natural aceitar que a não exigência, pela legislação estadual, de nível superior para as classes AF-3 e AF-4 reside nas atribuições menos complexas e de menor responsabilidade dos graus de nível inferior. A Lei Complementar nº 131/2010, portanto, estaria a transferir Agentes Fiscais para cargo de maiores responsabilidades e com requisitos diferentes.
De mais a mais, é preciso lembrar que mesmo no caso de manutenção do nomen iuris do cargo e das mesmas atribuições e responsabilidades, é discutível a constitucionalidade do aproveitamento de servidor público no cargo novo se alterados os requisitos para o provimento. Tão discutível e discutida que o STF, recentemente, reconheceu haver repercussão geral em recurso tratando do tema:
CONCURSO PÚBLICO OFICIAL DE JUSTIÇA EXIGÊNCIA DE ENSINO MÉDIO EXTINÇÃO DO CARGO APROVEITAMENTO EM OUTRO, COM IDÊNTICA NOMENCLATURA, PRÓPRIO A DETENTOR DE CURSO SUPERIOR GLOSA NA ORIGEM EM PROCESSO OBJETIVO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA. Possui repercussão geral a controvérsia acerca da constitucionalidade do aproveitamento de servidor público ocupante de cargo em extinção, cujo requisito de investidura seja a formação no ensino médio, em outro, relativamente ao qual exigido curso superior, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao respectivo provimento. (STF, RE 740008 RG, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, julgado em 12/12/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-042 DIVULG 27-02-2014 PUBLIC 28-02-2014)
Quer também parecer que o estabelecido no art. 1º, § 1º, da Lei Complementar Estadual nº 131/2010, que pretende identificar as atribuições de Auditores e Agentes Fiscais, não elimina o problema. De fato, pode-se dizer que os Auditores Fiscais concentrarão as mesmas atribuições e competências exercidas anteriormente pelos Agentes Fiscais das várias classes, mas não é possível, por exemplo, afirmar que os Agentes Fiscais da classe AF-3, titulares de cargos para os quais não se exige escolaridade superior, já tenham atribuições, competências e responsabilidades inerentes ao (novo) cargo de Auditor Fiscal, que pela lei passarão a ocupar.
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI nº 231, assentou definitivamente que a ascensão ou acesso, a transferência e o aproveitamento de servidores foram banidos pela Constituição de 1988 por configurarem ingresso em carreira diversa para a qual o servidor ingressou por concurso. Vale transcrever a ementa desse julgado:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ASCENSAO OU ACESSO, TRANSFERENCIA E APROVEITAMENTO NO TOCANTE A CARGOS OU EMPREGOS PUBLICOS. - O
CRITÉRIO DO MÉRITO AFERIVEL POR CONCURSO PÚBLICO DE PROVAS OU DE PROVAS E TITULOS É, NO ATUAL SISTEMA CONSTITUCIONAL, RESSALVADOS OS CARGOS EM COMISSAO DECLARADOS EM LEI DE LIVRE NOMEAÇÃO E EXONERAÇÃO, INDISPENSAVEL PARA CARGO OU EMPREGO PÚBLICO ISOLADO OU EM CARREIRA. PARA O ISOLADO, EM QUALQUER HIPÓTESE; PARA O EM CARREIRA, PARA O INGRESSO NELA, QUE SÓ SE FARA NA CLASSE INICIAL E PELO CONCURSO PÚBLICO DE PROVAS OU DE PROVAS TITULOS, NÃO O SENDO, POREM, PARA OS CARGOS SUBSEQUENTES QUE NELA SE ESCALONAM ATÉ O FINAL DELA, POIS, PARA ESTES, A INVESTIDURA SE FARA PELA FORMA DE PROVIMENTO QUE E A "PROMOÇÃO". ESTAO, POIS, BANIDAS DAS FORMAS DE INVESTIDURA ADMITIDAS PELA CONSTITUIÇÃO A ASCENSAO E A TRANSFERENCIA, QUE SÃO FORMAS DE INGRESSO EM CARREIRA DIVERSA DAQUELA PARA A QUAL O SERVIDOR PÚBLICO INGRESSOU POR CONCURSO, E QUE NÃO SÃO, POR ISSO MESMO, INSITAS AO SISTEMA DE PROVIMENTO EM CARREIRA, AO CONTRARIO DO QUE SUCEDE COM A PROMOÇÃO, SEM A QUAL OBVIAMENTE NÃO HAVERA CARREIRA, MAS, SIM, UMA SUCESSÃO ASCENDENTE DE CARGOS ISOLADOS. - O INCISO II DO ARTIGO 37 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL TAMBÉM NÃO PERMITE O "APROVEITAMENTO", UMA VEZ QUE, NESSE CASO, HÁ IGUALMENTE O INGRESSO EM OUTRA CARREIRA SEM O CONCURSO EXIGIDO PELO MENCIONADO DISPOSITIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE QUE SE JULGA PROCEDENTE PARA DECLARAR INCONSTITUCIONAIS OS ARTIGOS 77 E 80 DO ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS
TRANSITORIAS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. (STF, ADI 231/RJ, Rel. Min. Moreira Alves, j. em 05.08.1992, DJ 13.11.1992)
E do voto do Ministro Octávio Galloti nesse julgamento extrai-se com clareza um dado importante na identificação de uma mesma carreira ou de carreiras distintas:
"Ora, o que temos agora em vista é a chamada ascensão funcional, que pressupõe, necessariamente, a existência de duas carreiras: a carreira de origem e aquela outra para a qual ascende o funcionário.
Uma carreira, no serviço público, pode ter cargos de atribuições diferentes, geralmente mais complexas, à medida que se aproximam as classes finais.
Nada impede, também, que a partir de certa classe da carreira, seja exigido, do candidato à promoção, um nível mais alto de escolaridade, um concurso interno, um novo título profissional, um treinamento especial ou o aproveitamento em algum curso, como acontece, por exemplo, com a carreira de diplomata.
O que não se compadece com a noção de carreira - bem o esclareceu o eminente Relator, é a possibilidade de ingresso direto num cargo intermediário.
Se há uma série auxiliar de classes e outra principal, sempre que exista a possibilidade do ingresso direto na principal não se pode considerar que se configure uma só carreira." (sem grifo no original)
A partir dessa ideia, não há como considerar que os cargos de Agente Fiscal das classes AF-4 a AF-1 integrem todos uma única carreira. Isso pela possibilidade que deu a Lei Estadual nº 7051/78, em seu art. 21, § 1º, de ingresso direto na classe inicial da séria AF-1 por concurso público, "quando não houver funcionários habilitados ao acesso". Teríamos, assim, uma carreira compreendida pelos cargos das classes AF-4 a AF-2 e outra carreira distinta para os vários níveis da classe AF-1.
Se a Lei Estadual nº 7051/78 (depois alterada pelas Leis nº 7787/83 e 10682/1993) permitia a ascensão do servidor da classe AF-4 à classe AF-1 (apesar dos requisitos distintos quanto à escolaridade e independentemente de concurso público), depois da Constituição de 1988 essa possiblidade deixou de existir, dada a exigência de "concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego" (art. 37, inciso II).
Nessa perspectiva, talvez estivesse conforme a Constituição a transformação, em cargos de Auditor Fiscal, dos cargos de Agente Fiscal da classe AF-1. Mas isso somente seria verdade para os servidores que nos cargos AF-1 tivessem se investido por concurso público.
Nunca estará, porém, em conformidade com a Constituição a transformação que abranja, como a feita pela Lei Estadual nº 131/2010, também a transposição de cargos de nível médio AF-3 e cargos de nível superior AF-2 para cargos de nível superior de Auditor Fiscal, independentemente de concurso público específico, pois implica investidura em cargo de outra carreira, em afronta o entendimento cristalizado na súmula nº 685 do STF, recentemente transformada em sua 43ª súmula vinculante: "É inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu
provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido".
Este Tribunal, que já se pronunciou pela inconstitucionalidade de alteração virtualmente idêntica proposta pela Lei Complementar Estadual nº 92/2002, não pode ignorar o entendimento vinculante do Supremo Tribunal Federal nem voltar as costas para a jurisprudência que o antecedeu, no sentido da inconstitucionalidade da investidura por transposição:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 13 DA LEI Nº 8.032/03 DO ESTADO DO MARANHÃO. CARGO PÚBLICO. INVESTIDURA POR TRANSPOSIÇÃO. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. O texto constitucional em vigor estabelece que a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração. É inconstitucional a chamada investidura por transposição. 2. Pedido de declaração de inconstitucionalidade julgado procedente" (ADIN Nº 3332/MA - Rel. Min. Eros Grau. Julgamento em 30.06.2005).
Ação direta de inconstitucionalidade. Medida cautelar. Inciso II, do art. 14 e a expressão "e Agente Tributário Estadual" inscrita no art. 15, ambos da Lei Nº 2.081, de 14.01.2000, do Estado do Mato Grosso do Sul, que dispõe "sobre a estrutura, organização e remuneração do Grupo Tributação, Arrecadação e Fiscalização, e dá outras providências". 2. Alegação de afronta ao disposto no art. 37, II, da Constituição
Federal, uma vez que dita lei autoriza, sem prévio concurso público, o "enquadramento" de servidores públicos de nível médio para exercerem cargos públicos efetivos de nível superior. 3. Não é possível acolher como em correspondência ao art. 37, II, da Constituição, o pretendido enquadramento dos Agentes Tributários Estaduais no mesmo cargo dos Fiscais de Renda. Configurada a passagem de um cargo a outro de nível diverso, sem concurso público, o que tem a jurisprudência da Corte como inviável. 4. Relevantes os fundamentos da inicial. 5. Ação direta de inconstitucionalidade conhecida. Medida cautelar deferida para suspender `ex tunc' e até o julgamento final da ação a eficácia dos arts. 14, II e da expressão "e Agente Tributário Estadual" constante doa art. 15, ambos da Lei Nº 2.081, de 14.01.2000, do Estado do Mato Grosso do Sul. (ADIN Nº 2145/MS. Rel. Min. Néri da Silveira. Julgamento em 07.06.2000).
CONSTITUCIONAL. SERVIDOR PÚBLICO. ESCRIVÃO DE EXATORIA E FISCAL DE MERCADORIAS EM TRÂNSITO: ESTADO DE SANTA CATARINA. Lei Complementar Nº 81, de 10.03.93, do Estado de Santa Catarina. I. - Transformação, com os seus ocupantes, de cargos de nível médio em cargos de nível superior. Espécie de aproveitamento. Inconstitucionalidade, porque ofensivo ao disposto no art. 37, II, da Constituição Federal. II. - Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente, declarada a inconstitucionalidade dos Anexos I e II-55 e II-56 da Lei Complementar 81, de 10.03.93, do Estado de Santa Catarina. (ADIN Nº 1030/SC. Rel. Min. Carlos Velloso. Julgamento em 22.08.1996).
Eis as razões por que entendo que a alteração promovida pela Lei Complementar Estadual nº 131/2010 não se limitou a alterar a nomenclatura do cargo de Agente Fiscal, tendo, em verdade, nivelado no patamar superior de Auditores Fiscais todos os Agentes Fiscais, independentemente de terem ou não prestado concurso público "de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego", como exige a Constituição Federal de 1988.
Para finalizar, destaco que, embora pertinente, não deve prosperar a proposta do Ministério Público, vinda na parte final do parecer de fls. 537/558, de declaração de inconstitucionalidade por arrastamento dos arts. 150, caput e §§ 1º e 2º, 152 e 156 da Lei Complementar Estadual nº 131/2010. Isso em razão de a teoria da inconstitucionalidade por arrastamento, também conhecida como inconstitucionalidade por atração ou inconstitucionalidade consequente de preceitos não impugnados, como anota Pedro Lenza (Direito Constitucional Esquematizado. 10° Ed. São Paulo: Método, 2006, p. 130), ter sido concebida para a modalidade concentrada ou abstrata de controle de constitucionalidade, não tendo cabimento no controle difuso ou concreto, como o de que tratam estes autos, em que a declaração de inconstitucionalidade foi suscitada a partir da proposta da 2ª Câmara Cível deste Tribunal, quanto aos dispositivos por ela especificados.
Assim sendo, voto pela procedência do incidente, declarando-se a inconstitucionalidade dos artigos 151 e 153 da Lei Complementar Estadual nº 131/2010.
III DISPOSITIVO:
ACORDAM os Desembargadores integrantes do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por maioria de votos, em julgar procedente o Incidente de Declaração de Inconstitucionalidade, nos termos do voto do Relator Designado. Vencido o Desembargador LUIZ SÉRGIO NEIVA DE LIMA VIEIRA (com declaração de voto). O julgamento foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Presidente, Des. PAULO ROBERTO VASCONCELOS (com voto) e dele participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores REGINA AFONSO PORTES, RUY CUNHA SOBRINHO, PRESTES MATTAR, FERNANDO ANTONIO PRAZERES, ANTONIO LOYOLA VIEIRA, MARQUES CURY, MARIA JOSÉ DE TOLEDO MARCONDES TEIXEIRA, JORGE WAGIH MASSAD, SÔNIA REGINA DE CASTRO, ROGÉRIO KANAYAMA, LUIZ SÉRGIO NEIVA DE LIMA VIEIRA, RENATO BRAGA BETTEGA, MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA, COIMBRA DE MOURA, LUIZ OSÓRIO MORAES PANZA, RENATO LOPES DE PAIVA, JOSÉ AUGUSTO GOMES ANICETO e GUILHERME FREIRE DE BARROS TEIXEIRA. Curitiba, 17 de agosto de 2015. DES. PAULO ROBERTO VASCONCELOS Relator designado
DES. LUIZ SÉRGIO NEIVA DE LIMA VIEIRA Vencido, com declaração de voto
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