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Acórdão
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 1345763-1, DE FOZ DO IGUAÇU 2ª VARA CÍVEL. APELANTE: MARIA SALETE FONTANA NETTO E OUTROS APELADO: ESPÓLIO DE ELZA POSSAMI FONTANA RELATOR: DESEMBARGADOR SIGURD ROBERTO BENGTSSON REVISOR: DESEMBARGADOR MARIO NINI AZZOLINI APELAÇÃO CÍVEL. INVENTÁRIO. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. SENTENÇA QUE RECONHECEU O DEVER DA REQUERIDA DE PRESTAR CONTAS. FALECIMENTO DA INVENTARIANTE. EXTINÇÃO DO PROCESSO. AÇÃO DE NATUREZA PERSONALÍSSIMA. IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO PELOS HERDEIROS. RECURSO DE APELAÇÃO NÃO PROVIDO. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1345763-1, de Foz do Iguaçu 2ª Vara Cível, em que é Apelante Maria Salete Fontana Netto e outros e Apelado Espólio de Elza Possami Fontana.
I RELATÓRIO. Trata-se de recurso de apelação da sentença proferida nos autos de "Prestação de contas da inventariança" - autuado sob o nº 0012195-86.2012.8.16.0030 (424/2012) - em que requereram as autoras a prestação de contas de sua genitora e inventariante Elza Possamai nos autos de inventário sob nº 475/1999, correspondente aos bens deixados
pelo seu genitor Ângelo Fontana. Em contestação (fls. 64/66) a requerida alegou que não há contas a serem prestada, uma vez que todas as informações já constam nos autos de inventário. O magistrado, na sentença proferida (fls. 100/104), julgou procedente o pedido inicial, para condenar a requerida à prestação de contas relativas à administração do espólio de Ângelo Fontana. Após a prolação da sentença, a ilustre procuradora da requerida informou o falecimento da inventariante e requereu a extinção do processo sem julgamento do mérito por carência de condição da ação (fls. 107/108 e 109). A respeito da informação do falecimento as requerentes requereram a substituição do polo passivo pelo novo inventariante (fls. 115/1169) porque o processo já havia sido concluído. O magistrado extinguiu o processo sem resolução do mérito, com fundamento no artigo 267, inciso VI c/c artigo 462 do CPC (fls. 118). Inconformadas, as autoras apelaram (fls. 123/129) alegando que quando do falecimento da requerida a ação já tinha finalizado, de maneira que as contas devem ser apresentadas. A procuradora da requerida falecida peticionou (fls. 138/139) sustentando que "a obrigação de prestar contas do encargo exercido por Elza Possamai Fontana não pode ser assumida pelos herdeiros, haja vista que a inventariança foi exercida com exclusividade por aquela".
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É a exposição. II - VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO.
As autoras ajuizaram ação de prestação de contas contra a genitora Elza Possamai, por ser esta a inventariante dos bens deixados por Ângelo Fontana. Após a prolação da sentença em que se reconheceu o dever da requerida de prestar as contas, a procuradora da requerida informou o falecimento da inventariante (fls. 107/108), conforme certidão de óbito de fls. 110. Diante do falecimento da requerida, o magistrado extinguiu o processo sob o entendimento de que a obrigação de prestar contas é de cunho personalíssimo, não podendo ser transmitida aos herdeiros. Desta decisão recorrem as requerentes. A sentença está correta. A ação de prestação de contas tem natureza personalíssima e, portanto, o dever de prestá-las não pode ser transmitido aos herdeiros/sucessores. Na ação de prestação de contas há duas fases, duas pretensões, como bem observado por HUMBERTO THEODORO JUNIOR (Curso de Direito Processual Civil, Procedimentos Especiais, Volume III, 8ª edição, Forense, 1993, item 1.270, p. 97): "a de executar o direito à prestação de contas e a de acertar o conteúdo patrimonial das contas". A sentença proferida na primeira fase, ao reconhecer a necessidade de
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prestação de contas, instaura, segundo o doutrinador, "a segunda fase do procedimento, em que se acertarão as contas devidas e se fixará o saldo respectivo". Verifica-se, no presente caso, que a requerida exercia o cargo de inventariante, era quem administrava os bens. A primeira fase da ação foi concluída com a condenação da requerida em prestar contas, mas considerando o falecimento da inventariante, a segunda fase nem mesmo se iniciou. Não se pode exigir que outro herdeiro preste contas, pois a ação tem natureza personalíssima. Este é o entendimento do STJ: CIVIL E PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE EXIGIR CONTAS. MORTE DA PARTE RÉ. SUCESSÃO PROCESSUAL. IMPOSSIBILIDADE. OBRIGAÇÃO PERSONALÍSSIMA. 1. Ação de prestação de contas, distribuída em 23/06/2003, da qual foi extraído o presente recurso especial, concluso ao Gabinete em 28/09/2012. 2. Recurso especial em que se discute se o espólio da ré falecida pode suceder-lhe na ação de exigir contas. 3. A disposição do art. 914, II, do CPC, de que a ação de prestação de contas compete a quem tiver a obrigação de prestá-las, deve ser lida e interpretada no sentido de competir somente àquele que administra os bens e interesses de terceiros (obrigação personalíssima), porque é a pessoa capaz de informar quais providências e despesas foram feitas, como foram feitas e por que o foram.
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4. Os herdeiros não podem ser obrigados a prestar contas relativas a atos de gestão praticados por terceiro, realizados sem a anuência ou qualquer participação deles, mormente se considerado o ônus que a inércia lhes impõe, de o Juiz, eventualmente, acolher aquelas que o autor apresentar (art. 915, §§ 2º e 3º, do CPC). Precedentes. 5. A pretensão deduzida na ação de prestação de contas - o aclaramento dos gastos, rendimentos e a prova da boa administração - não se confunde com o direito material ao crédito eventualmente existente, de modo que poderá o credor, pela via comum, buscar satisfazê-lo em face dos herdeiros, nos limites da herança. 6. Recurso especial conhecido e desprovido. (REsp 1354347/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/05/2014, DJe 20/05/2014). (destaque nosso). AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. MORTE DOS RÉUS/RECORRENTES OBRIGADOS A PRESTAR CONTAS. TRANSMISSÃO DA OBRIGAÇÃO AO ESPÓLIO. INVIABILIDADE. OBRIGAÇÃO PERSONALÍSSIMA. EXTINÇÃO DA AÇÃO COM RELAÇÃO AOS RÉUS. 1. A obrigação de prestar contas é personalíssima e não se transmite ao espólio ou herdeiros dos réus. Precedentes. 2. Impõe-se a extinção do feito com relação aos réus falecidos, ante a impossibilidade de substituição do polo passivo. 3. Agravo regimental provido. Recurso especial
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prejudicado. (AgRg no REsp 1145754/ES, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/02/2014, DJe 07/03/2014). RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS - MORTE DO MANDATÁRIO - TRANSMISSÃO DA OBRIGAÇÃO AO ESPÓLIO - INVIABILIDADE - AÇÃO DE CUNHO PERSONALÍSSIMO - EXTINÇÃO DA AÇÃO SEM O JULGAMENTO DO MÉRITO - MANUTENÇÃO - NECESSIDADE - ARTS. 1323 E 1324 DO CC/1916 - AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO - INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO N. 211 DA SÚMULA/STJ - RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO. I - O mandato é contrato personalíssimo por excelência, tendo como uma das causas extintivas, nos termos do art. 682, II, do Código Civil de 2002, a morte do mandatário; II - Sendo o dever de prestar contas uma das obrigações do mandatário perante o mandante e tendo em vista a natureza personalíssima do contrato de mandato, por consectário lógico, a obrigação de prestar contas também tem natureza personalíssima; III - Desse modo, somente é legitimada passiva na ação de prestação de contas a pessoa a quem incumbia tal encargo, por lei ou contrato, sendo tal obrigação intransmissível ao espólio do mandatário, que constitui, na verdade, uma ficção jurídica; IV - Considerando-se, ainda, o fato de já ter sido homologada a partilha no inventário em favor dos herdeiros, impõe-se a manutenção da sentença que julgou extinto o feito sem resolução do mérito, por ilegitimidade passiva, ressalvada à recorrente a
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pretensão de direito material perante as vias ordinárias; V - As matérias relativas aos arts. 1323 e 1324 do Código Civil de 1916 não foram objeto de prequestionamento, incidindo, na espécie, o teor do Enunciado n. 211 da Súmula/STJ; V - Recurso especial improvido. (REsp 1055819/SP, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/03/2010, DJe 07/04/2010). Oportuno destacar o trecho do acórdão anteriormente mencionado de relatoria da Ministra Nancy Andrighi (REsp 1.354.347-SP): "Então, a disposição do art. 914, II, do CPC, de que a ação de prestação de contas compete a quem tiver a obrigação de prestá-las, deve ser lida e interpretada no sentido de competir somente àquele que administra os bens e interesses de terceiros, porque é a pessoa capaz de informar quais providências e despesas foram feitas, como foram feitas e por quê o foram". Deste modo, diante da impossibilidade de substituição do polo passivo pelos herdeiros, correta a extinção do processo. Conclusão. Diante do exposto, voto pelo desprovimento do recurso de apelação. III DECISÃO. Acordam os Desembargadores da 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer negar provimento ao recurso de apelação.
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Participaram da sessão e acompanharam o voto do Relator o Desembargador RUY MUGGIATI e a Juíza Substituta em Segundo Grau LUCIANE R. C. LUDOVICO (Subst. Des. Mario Nini Azzolini). Curitiba, 07 de outubro de 2015. [assinado digitalmente] SIGURD ROBERTO BENGTSSON Desembargador
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