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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
ESTADO DO PARANÁ Apelação Cível n.º 1212901-8, do Juízo Único da Comarca de Santa Mariana. Apelantes : 1) Willian Aparecido Mellos; e 2) Banco Finasa S/A. Apelados : 1) Banco Finasa; e 2) Willian Aparecido Mellos. Relator : Des. Fernando Paulino da Silva Wolff Filho. BUSCA E APREENSÃO. CONCESSÃO DOS BENEFÍCIOS DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DE MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ E DE MULTA COERCITIVA. POSSIBILIDADE. MULTAS QUE POSSUEM FINALIDADES (E RAZÕES) DISTINTAS. AUSÊNCIA, NO CASO, DE BIS IN IDEM. MAJORAÇÃO DO VALOR DA MULTA COERCITIVA. IMPOSSIBILIDADE, NO CASO, SOB PENA DE PRESTIGIAR O ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL. ENTREGA CERTIFICADA POR NOTÁRIO. DESNECESSIDADE DE JUNTADA DO AVISO DE RECEBIMENTO. FÉ PÚBLICA DOS AGENTES DELEGADOS. CONSTITUIÇÃO EM MORA. VALIDADE. PEDIDO INICIAL JULGADO PROCEDENTE DESDE LOGO (ART. 515, § 3º, DO CPC). EXCESSO DE COBRANÇA. AUSÊNCIA, NO CASO. DESCONTO PROPORCIONAL DOS JUROS DEVIDO AO VENCIMENTO ANTECIPADO. IMPOSSIBILIDADE. APELO 1 (RÉU) E APELO 2 (AUTOR) PARCIALMENTE PROVIDOS. Vistos, etc.
que, em sede de ação de busca e apreensão, julgou extinto o processo, sem resolução de mérito, nos termos do art. 267, VII, do CPC, contra ela se insurgem ambas as partes, com o propósito de reformá-la. Em suas razões, o réu, ora apelante 1 (fls. 134/138), sustenta, em suma, que: a) faz jus aos benefícios da justiça gratuita; b) a multa diária para a apresentação do documento original (e fornecimento do endereço do cartório) não deveria ter sido minorada, já que o banco autor descumpriu seis vezes a ordem judicial para apresentá-lo e, ainda, tentou alterar a verdade dos fatos, causando-lhe "dano processual", e zombado do Poder Judiciário; c) não há enriquecimento sem causa diante de descumprimento de ordem judicial; e d) a sentença deve ser reformada, para que seja mantida a multa diária no valor de R$ 500,00 desde a data da intimação para cumprimento da ordem judicial até a data da sentença. Por sua vez, o autor, ora apelante 2 (fls. 154/186), alega, em síntese, que: a) a mora ex re decorre do inadimplemento da obrigação no seu termo, sendo desnecessária a notificação pessoal; b) o ato de comunicação (notificação extrajudicial) pode ser realizado mediante carta registrada expedida por cartório de registro de títulos e documentos ou protesto do título, à escolha do credor, nos termos do art. 2º, § 3º, do DL nº 911/69; c) a notificação extrajudicial do devedor é uma faculdade da instituição financeira; d) não foi oportunizado prazo para emendar a inicial e comprovar a constituição em mora; e) tendo em vista que o veículo foi apreendido, não é possível a extinção do feito com fundamento no art. 267 do CPC; f) a sentença apresenta um erro formal no seu dispositivo, uma vez que o art. 267 VII trata de convenção ou arbitragem, o que não é o caso; g) não é possível a manutenção da multa diária para apresentação de documento, porque o banco autor já foi penalizado pela aplicação da multa por litigância de má-fé; h) não é possível a devolução do bem apreendido, uma vez que a sua propriedade já se
1 Juiz de Direito Rogério de Vidal Cunha.
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consolidou em favor do banco credor fiduciário, nos termos do art. 3º, § 1º, do DL nº 911/69; e i) a multa diária para devolução do bem apreendido, no valor de R$ 1.000,00 por dia, é demasiadamente elevada, devendo ser minorada, sob pena de enriquecimento sem causa do réu devedor. Recebidos os recursos nos efeitos devolutivo e suspensivo (fl. 191), a seguir, conquanto ambas as partes tenham sido intimadas, apenas o autor, ora apelante 1, apresentou contrarrazões (fls. 254/264). É o relatório. Voto I Inicialmente, noto que, quanto ao pedido de concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, assiste razão ao réu, ora apelante 1. Conforme se verifica dos autos, o apelante 1 juntou aos autos declaração de que não está em condições de suportar o pagamento das custas sem prejuízo próprio ou de sua família (fl. 138), e os documentos apresentados pela parte contrária indicam que ele, de fato, não percebe valores elevados. Assim, tendo em vista que a concessão da justiça gratuita está condicionada à simples afirmação (art. 4º da Lei nº 1.060/50), que "presume- se pobre, até prova em contrário, quem afirmar essa condição nos termos desta lei, sob pena de pagamento até o décuplo das custas judiciais" (§ 1º do referido artigo), e que além do mais inexistem indícios aptos a rechaçar a presunção de veracidade firmada pelo réu, ora apelante 1, defiro em favor dele o benefício em questão. Cumpre registrar, todavia, que, segundo o entendimento assente na jurisprudência, a concessão do benefício de assistência judiciária, em
não tem efeitos retroativos, de sorte que a parte só está isenta do pagamento das custas processuais decorrentes de atos posteriores à sua concessão. Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. PEDIDO FORMULADO NA PEÇA RECURSAL. EFEITOS RETROATIVOS. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL. ALÍNEA "C". NÃO DEMONSTRAÇÃO DA DIVERGÊNCIA. 1. O STJ possui entendimento no sentido de que a concessão do benefício da assistência judiciária gratuita só produzirá efeitos quanto aos atos processuais relacionados ao momento do pedido, ou que lhe sejam posteriores, não sendo admitida, portanto, sua retroatividade. (...) 3. Agravo Regimental não provido. (AgRg no AREsp 442.474/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/02/2014, DJe 07/03/2014) Assim, é certo que a concessão do benefício de assistência judiciária gratuita não isenta o réu, ora apelante 1, do eventual pagamento das verbas de sucumbência devidas até a data da concessão. II Ultrapassada essa questão, observo que os apelos serão julgados simultaneamente, sendo que as questões trazidas a exame em ambos, segundo a ordem em que serão enfrentadas adiante, referem-se: a) à multa diária por descumprimento de ordem judicial; b) à regularidade da notificação extrajudicial; c) ao excesso de cobrança; d) ao desconto proporcional dos juros pelo vencimento antecipado da dívida; e e) ao ônus de sucumbência. III Quanto à necessidade de alteração da multa fixada, os recursos de ambas as partes não procedem. 4
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Antes, porém, de dizê-lo porquê, é preciso reportar o que ocorreu formalmente até agora. Conforme se depreende dos autos, após diversas tentativas infrutíferas de compelir o banco autor a apresentar o documento original referente ao suposto acordo celebrado entre as partes (o réu devedor arguiu que a sua assinatura foi falsificada), a Juíza Camila Covolo de Carvalho, por meio da decisão interlocutória de fl. 77, determinou que o banco autor exibisse o termo de acordo original e fornecesse o endereço do Tabelionato Facchini (aquele que reconheceu a assinatura do réu devedor), no prazo de cinco dias, sob pena de multa diária de R$ 500,00 por dia de descumprimento. O banco réu, então, interpôs agravo de instrumento questionando o cabimento, o prazo e o valor da multa fixada (fls. 82/87), o qual tramitou sob o nº 0840375-0. A decisão agravada foi mantida por este Tribunal de Justiça (fls. 195/197 e 217/ 220) e, atualmente, encontra-se em trâmite um Agravo ao Superior Tribunal Justiça registrado sob o nº 248185/PR, conclusos com a Min. Maria Isabel Gallotti2. Não obstante, na sequência, por ocasião da sentença da presente ação de busca e apreensão, o Juiz de Direito Rogério de Vidal Cunha entendeu por bem reduzir o valor fixado da multa para R$ 50,00 por dia, limitando- a ao valor do crédito tomado (fl. 126-v.) Pois bem.
2 AREsp nº 248185 / PR (2012/0225732-6) autuado em 24/10/2012, Agravante: Banco Finasa S/A, Agravado William Aparecido Mellos. Informação disponível em: << https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/>>.
possível a fixação de multa diária para apresentação de documento, já que a sua aplicação concomitantemente à multa por litigância de má-fé caracteriza bis in idem. Não lhe assiste razão, todavia. A despeito da minha posição sobre o cabimento da multa na hipótese em se tratando de exibição incidental, cabível, a meu ver, o art. 359 do CPC , é fato que, na espécie, o cabimento da multa diária já foi decidido por este Tribunal de Justiça por meio do agravo de instrumento nº 0840375-0, atualmente em trâmite perante o STJ, decisão que deve ser prestigiada em respeito ao princípio da segurança jurídica e que, portanto, não pode ser revista. Então, passando-se as coisas dessa forma, cumpre consignar que, ao contrário que tenta fazer crer o apelante 2, a multa coercitiva possui finalidade diversa daquela que ostenta a multa por litigância de má-fé, dai porque inexiste bis in idem na aplicação concomitante de ambas as multas. Conforme se verifica do próprio retrospecto processual, a multa diária se propõe a compelir o banco autor a cumprir a ordem judicial que determinou tanto a apresentação do documento original quanto o fornecimento do endereço do cartório que autenticou a assinatura do réu (fl. 77). A multa por litigância de má-fé, por outro lado, tem como objetivo punir o banco autor por tentar induzir o Juízo a erro e tumultuar o andamento processual com a reiterada juntada de outros documentos que não aqueles determinados pela decisão judicial (fls. 52/53, 59/60, 73/75. 93/94 e 114/115). Assim, considerando-se que a multa coercitiva e a multa por litigância de má-fé possuem finalidades (e razões) distintas, não há que se falar 6
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em bis in idem. III.b. Alega o réu, ora apelante 1, que o valor fixado a título de multa coercitiva na decisão de fl. 77 deve ser mantido, já que o banco autor descumpriu reiteradamente a ordem de apresentação do documento e ainda tentou alterar a verdade dos fatos. Também não lhe assiste razão. Conforme foi visto, a multa diária fixada na decisão de fl. 77 e reduzida na sentença (fls. 121/127) tem como objetivo compelir o banco réu ao cumprimento de determinada ordem judicial, e não puni-lo pela alteração da verdade dos fatos ou pela produção de "danos processuais" a outra parte. A respeito do objetivo da multa coercitiva, vale observar a doutrina de Sérgio Cruz Arenhart, no sentido de que: "a finalidade da multa é sustentar a autoridade (imperium) da decisão judicial, no intuito de coibir qualquer possibilidade de transgressão da determinação do Poder Judiciário. (...) Sua função é precisamente esta: acenar com a violência ao patrimônio do devedor recalcitrante, para forçá-lo a cumprir a deliberação judicial (...) o principal prejudicado com o descumprimento de uma ordem judicial é, sem dúvida, o próprio Estado e não a parte autora. Afinal, trata-se de ofensa à sua autoridade, que instabiliza o poder que deve o Estado exercer."3 Além disso, a multa coercitiva nos moldes em que pretende o réu, ora apelante 1, ocasionaria uma vantagem patrimonial desarrazoada, já que o valor total, sem atualização monetária, resultaria na vultuosa importância de R$ 397.500,00 (a decisão foi publicada em 16/08/2011 e a sentença foi proferida em 25/10/13). Necessária, portanto, a sua minoração,
3 ARENHART, Sérgio. Cruz. A doutrina brasileira da multa coercitiva - três questões ainda polêmicas. In: José Miguel Garcia Meina; Luana Pedrosa de Figueiredo Cruz; Luís Otávio Sequeira de Cerqueira; Luiz Manoel Gomes Junior. (Org.). Os poderes do juiz e o controle das decisões judiciais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 535-549.
Nesse norte: AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL - EMBARGOS À EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA - OBRIGAÇÃO DE FAZER CONSISTENTE NA SUSPENSÃO DE ATOS EXECUTÓRIOS - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL DA CASA BANCÁRIA PARA REDUZIR O VALOR DA MULTA DIÁRIA, VISTO QUE FIXADA EM QUANTIA TERATOLÓGICA PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. INSURGÊNCIA DO MUTUÁRIO. 1. Esta Corte já decidiu que o artigo 461, § 6º, do Código de Processo Civil permite ao magistrado alterar o valor da multa quando este se tornar insuficiente ou excessivo, mesmo depois de transitada em julgado a sentença. Precedentes. 2. É possível a redução das astreintes fixadas fora dos parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade, determinada a sua limitação ao valor do bem da obrigação principal, evitando-se o enriquecimento sem causa. Precedentes. 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg nos EDcl no REsp 1099928/PR, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 11/11/2014, DJe 17/11/2014) IV Já em relação à regularidade da notificação extrajudicial, assiste razão ao banco autor, ora apelante 2. Isso porque nos autos consta certidão do notário dando 8
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conta de que a Notificação Extrajudicial fora enviada e recebida no endereço do devedor (fl. 15). De acordo com o entendimento jurisprudencial, a ausência do Aviso de Recebimento é irrelevante quando há certidão do Cartório de Registro de Títulos e Documentos atestando a entrega da notificação extrajudicial no endereço do domicílio do devedor, como no presente caso. Ressalte-se, ainda, que o agente delegado possui fé pública no exercício de suas funções, não havendo nos autos nenhum elemento capaz de elidir tal presunção. Nessa toada, são os seguintes precedentes desta Corte e do Superior Tribunal de Justiça: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CARTA ENTREGUE PARA A MUTUÁRIA, POR MEIO DE CARTÓRIO DE TÍTULOS E DOCUMENTOS. NOTIFICAÇÃO CERTIFICADA POR AGENTE DELEGATÁRIO, POSSUIDOR DE FÉ PÚBLICA. OBSERVÂNCIA DO ARTIGO 3°, § 2°, DO DL 911/69. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Para caracterização da mora, é suficiente que a entrega da notificação seja certificada por agente delegatário, possuidor de fé pública, dispensando-se a juntada do AR. (...). (TJPR, AC 1043778-8, 17ª C.Cível, Rel. Des. Renato Lopes de Paiva, e-DJ 24/07/13) CIVIL E PROCESSUAL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. BUSCA E APREENSÃO. NOTIFICAÇÃO. CERTIDÃO DO CARTÓRIO. SUFICIÊNCIA. A lei não exige, para constituição em mora do devedor, mais do que a notificação registrada no Registro de Títulos e Documentos e em cujo verso encontra-se
notificada, no endereço indicado. Recurso especial provido. (STJ, REsp 244944/SC, T3, Rel. Min. Castro Filho, DJe 24/11/03). Nesse mesmo sentido vem entendendo esta 17ª Câmara Cível: PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. PROCESSO EXTINTO COM FUNDAMENTO NO ART. 267, IV DO CPC. COMPROVAÇÃO DA REGULAR CONSTITUIÇÃO EM MORA DO DEVEDOR. DEVEDOR FIDUCIANTE CONSTITUÍDO EM MORA VIA NOTIFICAÇÃO FORMALIZADA PELO CARTÓRIO DE TÍTULOS E DOCUMENTOS. VALIDADE. RECURSO PROVIDO. O preposto da empresa de Correios quando atesta a entrega da correspondência no endereço, discrimina o dia e a hora, atua como auxiliar da Justiça, razão pela qual o ato deve ser tido como válido, até prova em contrário. (TJPR - 17ª C.Cível - AC 896949-9 - Maringá - Rel.: Lauri Caetano da Silva - Unânime - J. 06.06.2012)stj Logo, como o notário certificou o envio da notificação extrajudicial e o seu recebimento no endereço presente no contrato (fl. 11/15), o devedor foi devidamente constituído em mora. De conseguinte, ao contrário do que restou consignado na sentença, não seria possível a extinção do processo, sem resolução de mérito, nos termos do art. 267 do CPC. V Provida a apelação no ponto supracitado (extinção sem resolução de mérito), passo, desde logo, ao exame do mérito, nos termos do art. 515, § 3º, do CPC4, uma vez que a causa versa exclusivamente sobre questão de direito e está em condições de julgamento imediato.
4 Art. 515. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada. (...) 10
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VI Em relação à improcedência do pedido devido ao excesso de cobrança, não assiste razão ao réu. Primeiro, porque a ação de busca e apreensão tem como objeto a retomada do bem pelo credor fiduciário, e não a cobrança de dívida propriamente dita. Tanto é assim que o pagamento da integralidade da dívida pendente (art. 3º, § 2º, do DL nº 911/69) é uma faculdade conferida ao devedor fiduciante para reaver o veículo apreendido. Caso ele (o devedor) não promova essa quitação, consolida-se a propriedade do credor fiduciário sobre o veículo automotor e, não sendo desconstituída a mora, sobrevém o julgamento de procedência da ação de busca e apreensão. Segundo, porque, conforme se verifica do art. 3º, § 4º, do DL nº 911/695, o diminuto valor supostamente cobrado a maior nesta ação de busca e apreensão (no caso, uma única parcela, no valor de R$ 180,87, paga quatro dias antes da propositura da ação, fl. 47) poderia ter sido facilmente descontado após o pagamento da integralidade da dívida pendente (art. 3º, § 2º), segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial, ocasião na qual seria determinada a restituição do que foi pago a maior. E terceiro, porque, em todo caso, verifica-se que, mesmo que fosse reconhecida a quitação da parcela de nº 07/36, como pretende o réu, a
§ 3o Nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito (art. 267), o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento. 5 Art. 3o O proprietário fiduciário ou credor poderá, desde que comprovada a mora, na forma estabelecida pelo § 2o do art. 2o, ou o inadimplemento, requerer contra o devedor ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, a qual será concedida liminarmente, podendo ser apreciada em plantão judiciário. (...) § 2o No prazo do § 1o, o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da dívida pendente, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial, hipótese na qual o bem lhe será restituído livre do ônus. § 3o O devedor fiduciante apresentará resposta no prazo de quinze dias da execução da liminar. § 4o A resposta poderá ser apresentada ainda que o devedor tenha se utilizado da faculdade do § 2o, caso entenda ter havido pagamento a maior e desejar restituição. § 5o Da sentença cabe apelação apenas no efeito devolutivo. (...) (g.n.) 10 ... 36) se encontram em aberto. VII No que diz respeito à necessidade de redução proporcional dos juros devido ao vencimento antecipado da dívida, também não assiste razão ao réu. Isso porque o desconto proporcional dos juros tem como pressuposto, em regra, a quitação antecipada de dívida, o que não é o caso. Confira-se, a propósito, o que prevê o § 2º do art. 52 do CDC: "é assegurado ao consumidor a liquidação antecipada do débito, total ou parcialmente, mediante redução proporcional dos juros e demais acréscimos". Na espécie, ao contrário, trata-se de vencimento antecipado ocasionado pela própria inadimplência do devedor em relação a contrato de financiamento garantido por alienação fiduciária, com base em expressa previsão contratual (item "6", subitem "6.1 `a'", fl. 09) e nos termos da legislação própria sobre o tema, em especial o art. 2º, § 3º, do DL nº 911/696. Nesse norte: AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. BEM APREENDIDO. PEDIDO INICIAL JULGADO PROCEDENTE. CREDOR FIDUCIÁRIO CONSOLIDADO NA POSSE E PROPRIEDADE DO BEM OBJETO
6 Art. 2o No caso de inadimplemento ou mora nas obrigações contratuais garantidas mediante alienação fiduciária, o proprietário fiduciário ou credor poderá vender a coisa a terceiros, independentemente de leilão, hasta pública, avaliação prévia ou qualquer outra medida judicial ou extrajudicial, salvo disposição expressa em contrário prevista no contrato, devendo aplicar o preço da venda no pagamento de seu crédito e das despesas decorrentes e entregar ao devedor o saldo apurado, se houver, com a devida prestação de contas. (...) § 3º A mora e o inadimplemento de obrigações contratuais garantidas por alienação fiduciária, ou a ocorrência legal ou convencional de algum dos casos de antecipação de vencimento da dívida facultarão ao credor considerar, de pleno direito, vencidas todas as obrigações contratuais, independentemente de aviso ou notificação judicial ou extrajudicial. (g.n.) 12
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DA GARANTIA FIDUCIÁRIA. AGRAVO RETIDO: 1. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO VERIFICADO. PROVA DOS AUTOS SUFICIENTE. RECURSO DESPROVIDO. RECURSO DE APELAÇÃO: 2. REGULARIDADE DA CONSTITUIÇÃO EM MORA JÁ DECIDIDA EM SEDE DE AGRAVO DE INSTRUMENTO. 3. VENCIMENTO ANTECIPADO DA DÍVIDA. REDUÇÃO PROPORCIONAL DOS JUROS. IMPOSSIBILIDADE. 4. CONTRATO DE MÚTUO REPRESENTADO POR CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS EXPRESSAMENTE CONTRATADA. 5. MORA DO DEVEDOR CONFIGURADA. ORIENTAÇÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - RESP 1.061.530-RS. RECURSO DESPROVIDO. (TJPR - 17ª C.Cível - AC - 1131175-8 - Castro - Rel.: Lauri Caetano da Silva - Unânime - - J. 14.05.2014. g.n.) APELAÇÃO CÍVEL PELA PARTE AUTORA - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO - 1. NULIDADE DA SENTENÇA - VÍCIO DE JULGAMENTO EXTRA PETITA NÃO VERIFICADO - NÃO ACOLHIMENTO - 2. LEGALIDADE DA CAPITALIZAÇÃO DE JUROS - ACOLHIMENTO - PACTUAÇÃO EXPRESSA NO CONTRATO - MATÉRIA JÁ OBJETO DE RECURSO REPETITIVO (STJ, RESP 973.827-RS) - 3.ENCARGOS MORATÓRIOS - INCIDÊNCIA DE JUROS REMUNERATÓRIOS - LEGALIDADE - ATENDIMENTO AO DEVER DE INFORMAÇÃO DO ARTIGO 6º, III DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - 4. TARIFAS ADMINISTRATIVAS (CORRESPONDENTES NÃO BANCÁRIOS E DE SERVIÇOS DE TERCEIROS) - ILEGALIDADE - OCORRÊNCIA - INEXISTÊNCIA DE DISCRIMINAÇÃO DO SERVIÇO PRESTADO - COBRANÇA INDEVIDA - REPETIÇÃO DO INDÉBITO NA FORMA SIMPLES - 5. CLÁUSULA DE VENCIMENTO ANTECIPADO - ABUSIVIDADE
PROPORCIONAL DE JUROS E DEMAIS ACRÉSCIMOS - NÃO ACOLHIMENTO - POSSIBILIDADE DE O CONSUMIDOR PRESERVAR O CONTRATO - ARTIGO 54, §2º DA LEI Nº 8.078/90 - 6. MORA - CONFIGURAÇÃO - NÃO RECONHECIDA NENHUMA ILEGALIDADE DOS ENCARGOS INCIDENTES NO PERÍODO DE NORMALIDADE - 7. RESTABELECIMENTO DA LIMINAR QUE AUTORIZOU O DEPÓSITO MENSAL DAS PARCELAS INCONTROVERSAS - IMPOSSIBILIDADE - NÃO CUMPRIMENTO, PELO AUTOR, DA DETREMINAÇÃO JUDICIAL - 8. REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJPR - 17ª C.Cível - AC - 1119633-1 - Curitiba - Rel.: Tito Campos de Paula - Unânime - - J. 26.02.2014. g.n.) APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO.CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO.-COBRANÇA DA TEC E INCIDÊNCIA DO IOF. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL.-COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. ENCARGOS DA MORA.APLICAÇÃO DO RECURSO REPETITIVO RESP N.º 1.058.114/RS.-CAPITALIZAÇÃO COMPOSTA DE JUROS. LEI 10.931/2004.PREVISÃO EXPRESSA NO CONTRATO.-TAC E TEC. VALORES DEVIDOS. PALAVRA EMPENHADA E VALORES NÃO EXORBITANTES.-TARIFA DE SERVIÇOS DE TERCEIROS. NÃO OBSERVÂNCIA DO ARTIGO 282, III, DO CPC.-CLÁUSULA DE VENCIMENTO ANTECIPADO. CONJECTURAS. - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EXTRAJUDICIAIS.ABUSIVIDADE.REPETIÇÃO/COMPENSAÇÃO. - INTERCORRÊNCIA DA MORA. -SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. PROPORCIONALIZAÇÃO AO PROVEITO ECONÔMICO OBTIDO POR VENCEDOR E VENCIDO.-RECURSO DO BANCO RÉU CONHECIDO EM PARTE E, NA PARTE CONHECIDA, 14
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PARCIAMENTE PROVIDO.- APELO DO MUTUÁRIO CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE. [...] 6. Cláusula de vencimento antecipado. Devedor em mora não pode impor ao banco credor o aguardo do prazo contratual para que a instituição financeira possa exigir direito por meio do devido processo legal. Ademais, o pedido formulado a respeito se baseia em hipóteses futuras que podem não se concretizar. (TJPR - 17ª C.Cível - AC - 1056241-1 - Foro Regional de Colombo da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Renato Lopes de Paiva - Unânime - - J. 21.08.2013. g.n.) VIII Com a reforma da sentença, faz-se necessária a redistribuição da sucumbência, pois, ao fim e ao cabo, o réu, ora apelante 1, perdeu tudo e por isso deverá arcar com o pagamento da integralidade das custas e dos honorários advocatícios (art. 20 do CPC), os quais fixo em R$ 800,00, quantia que está de acordo com a fragilidade da causa matéria simples e de fácil solução, cujas questões estão quase todas sumuladas -, o tempo decorrido desde a propositura da ação até a efetiva entrega jurisdicional e o trabalho dos advogados do autor, de quem se exigiu poucas intervenções. Posto isso, voto no sentido de: a) dar parcial provimento ao recurso de apelação 1 (réu), a fim de conceder ao réu, ora apelante 1, o benefício da justiça gratuita; b) dar parcial provimento ao recurso de apelação 2 (autor), para considerar comprovada a constituição em mora; c) nos termos do art. 515, § 3º, do CPC, julgar, desde logo, procedente o pedido inicial, consolidando a propriedade fiduciária nas mãos do autor; e d) redistribuir o ônus de sucumbência.
Acordam os integrantes da Décima Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar parcial provimento ao recurso de apelação 1 (réu) e ao recurso de apelação 2 (autor), além de julgar desde logo procedente o pedido inicial, nos termos do voto do Relator. Participaram do julgamento o Des. Lauri Caetano da Silva (Presidente) e o Juiz Subst. 2º G. Marco Antonio Antoniassi. Curitiba, 11 de novembro de 2015. Des. Fernando Paulino da Silva Wolff Filho Relator
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