Íntegra
do Acórdão
Ocultar
Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.Recomenda-se acessar o PDF assinado.
Certificado digitalmente por: FRANCISCO LUIZ MACEDO JUNIOR Apelação Cível nº 1490178-9 do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba 5ª Vara Cível. Apelante: Unimed Curitiba Sociedade Cooperativa de Médicos Apelado: Maria Eliane Oliveira Lufti Relator: Desembargador Francisco Luiz Macedo Júnior OBRIGAÇÃO DE FAZER APELAÇÃO CÍVEL PLANO DE SAÚDE RELAÇÃO DE CONSUMO APLICAÇÃO DO CDC NEGATIVA DE COBERTURA DE PRÓTESES/ÓRTESES CONTRATO ANTERIOR À LEI N. 9.656/98 ADEQUAÇÃO DO PLANO À NOVA LEGISLAÇÃO AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE OPORTUNIDADE PARA ADEQUAÇÃO DO PLANO À NOVA LEGISLAÇÃO CONTRATO DE ADESÃO INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR CLÁUSULA ABUSIVA COBERTURA DEVIDA REEMBOLSO DOS VALORES SUPORTADOS PELA AUTORA PARA CUSTEIO DOS MATERIAIS NECESSÁRIOS À REALIZAÇÃO DA CIRURGIA DANOS MORAIS CONFIGURADOS SENTENÇA MANTIDA APELAÇÃO CONHECIDA A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Em se tratando de relação de consumo, as cláusulas contratuais devem ser interpretadas com fulcro nas disposições do Código de Defesa do Consumidor, especialmente naquelas que conferem proteção contratual ao consumidor, as quais, dentre outras regras, estabelecem a interpretação que lhe é mais favorável. Trata-se de recurso de apelação interposto pela Unimed Curitiba Sociedade Cooperativa de Médicos contra a sentença que julgou procedentes os pedidos formulados na Ação de Reparação de Danos Materiais e Morais, proposta por Maria Eliane Oliveira Lufti em face da apelante, que condenou a ré a reembolsar a autora, pelos gastos suportados com a cirurgia solicitada pelo médico assistente, no importe de R$ 7.200,00 (sete mil e duzentos reais), corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora, a partir do desembolso. Condenou, também, por danos morais, fixados em R$ 10.000,00 (dez mil reais), corrigidos monetariamente desde a sentença e acrescidos de juros de mora desde a citação.
Em suas razões recursais (mov. 74.1 fls. 312/329), a ré Unimed Curitiba alega a existência de exclusão contratual para próteses e órteses de qualquer natureza.
Assevera que a Lei nº 9.656/98 ampliou a cobertura contratual, com a consequente adequação do montante devido à título de mensalidade, para fazer frente as despesas inerentes ao novos procedimentos que as operadoras passaram obrigatoriamente a assegurar.
Afirma que apesar do advento da Lei nº 9.656/98, a apelada teria optado pela manutenção do contrato nos moldes originários, o qual possuiria limitações que lhe são inerentes, e que, em vista disto, deveria conformar-se com o espectro de coberturas oferecidas.
Sustenta que a apelada não pagou por tal serviço,
portanto, não poderia dele se beneficiar.
Defende, ainda, a incorrência de danos morais, ante a inexistência de prática de ilícito. Argumenta que a negativa de custeio do material solicitado derivaria de limitação de cláusula contratual, amparada em lei consumerista.
Requer o reconhecimento e provimento do recurso, para que seja julgada totalmente improcedente a ação, com a consequente inversão dos ônus de sucumbência, além do afastamento da condenação em danos materiais e morais.
Contrarrazões às fls. 341/351 (mov. 82.1), pelo não provimento do apelo.
É o relatório,
VOTO: Presentes os requisitos de admissibilidade, intrínsecos e extrínsecos.
Da cobertura
Defende a apelante Unimed Curitiba a legalidade da negativa de cobertura dos materiais solicitados pela apelada, ao argumento de existência de exclusão expressa, no contrato, para cobertura de próteses e órteses de qualquer natureza.
Sustenta, ainda, a impossibilidade de reparação por danos morais, quando o caso trata de interpretação de cláusulas do contrato.
Sem razão.
Em sendo aplicável a Lei Consumerista, a interpretação das cláusulas contratuais deve ser feita com fulcro nas disposições do CDC, especialmente naquelas que conferem proteção contratual ao consumidor, as quais, dentre outras regras, estabelecem a interpretação que lhe é mais favorável.
E, nesse norte, a limitação de custeio do material é disposição abusiva, eis que, no caso, além de restar plenamente demonstrada à necessidade de seu uso, para a reabilitação da saúde da segurada, a restrição de cobertura restringe direito fundamental inerente à natureza do contrato de seguro.
É preciso observar que o objeto ou finalidade do plano em questão é a saúde, ou a garantia de cobertura contra evento futuro e incerto, danoso à saúde do segurado ou de seus dependentes.
O artigo 5.º da Lei de Introdução ao Código Civil dispõe que: "o Juiz deverá aplicar a lei tendo em vista os fins sociais a que ela se dirige e as exigências do bem comum". Nesse sentido, o julgamento que envolva contratos como o que une as partes da presente lide, deve ter em conta tais postulados, entendendo abusiva a cláusula que exclua a prestação
de qualquer serviço, sem que isto esteja destacado, para que o consumidor possa ter total conhecimento.
E, no caso, é incontroverso que o contrato é de adesão, impossibilitando qualquer discussão a respeito das cláusulas ali insertas.
De se salientar, que toda teoria do direito atual encaminha-se no sentido de suprir a hipossuficiência das partes, quer sejam contratantes ou litigantes.
Nesse passo, cabe aqui um parênteses, no tocante à abrangência do plano de saúde contratado pelo autor, especialmente quanto à aplicabilidade ou não da Lei n. 9.656/98.
No caso, de se ver que inexiste qualquer demonstração de que tenha sido oportunizada à consumidora, a adequação do seu plano à nova legislação.
Ora, não consta dos autos prova alguma de que a apelante tenha ofertado à apelada a oportunidade de adaptação do antigo plano, a nova ordem legal {em conformidade com a Resolução Normativa n. 64/03, da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar)}.
Nada obstante a recorrente ter afirmado que à beneficiária foi oportunizada a adaptação de seu contrato a nova legislação, mas que esta teria optado por permanecer com o contrato antigo, fato é que não trouxe nenhuma prova neste sentido.
Nesse passo, embora o contrato em análise tenha sido celebrado anteriormente, está submetido às disposições do Código de Defesa do Consumidor, devendo, nesse caso, ante a inexistência de demonstração de que foi ofertada a adequação ao novo plano, incidir as disposições da Lei n. 9.656/98.
É que, cabendo à operadora informar a seus clientes sobre as mudanças ocorridas após a entrada em vigor da citada Lei, e não tendo comprovado que assim fez, inevitável a sujeição do contrato em análise a nova legislação regulamentadora, conforme o artigo 351 da citada Lei.
No mesmo sentido é a jurisprudência uníssona desta Corte:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE NULIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PLANO DE SAÚDE. PRESCRIÇÃO PARA REALIZAÇÃO DE EXAME. NEGATIVA DE COBERTURA.INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.Aplica- se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de Plano de Saúde.Entendimento já está pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça na Súmula nº 469.CONTRATO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI N.º 9.656/98. ABRANGÊNCIA. NOTIFICAÇÃO PARA ADAPTAÇÃO DO PLANO. INEXISTÊNCIA DE PROVA.A Lei n.º 9.656/98 incide sobre os contratos celebrados anteriormente à sua vigência, salvo se demonstrado, pela operadora, que foi
1 Art. 35 Aplicam-se as disposições desta Lei a todos os contratos celebrados a partir de sua vigência, assegurada ao consumidor com contrato já em curso a possibilidade de optar pelo sistema previsto nesta Lei.
oportunizada ao consumidor a migração ao novo plano.NECESSIDADE DA REALIZAÇÃO DO EXAME DE CINTILOGRAFIA ÓSSEA. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE COBERTURA. CONTRATO QUE NÃO EXCLUI EXPRESSAMENTE A COBERTURA DO EXAME DEMANDADO. ABUSIVIDADE DA CLÁUSULA RECONHECIDA.1. As prestadoras de serviço deverão respeitar os preceitos legais estabelecidos quanto à clareza das cláusulas contratuais, evitando previsões abusivas ou obscuras.2. Não poderá ser negada a cobertura de exame que se mostra imprescindível ao tratamento do paciente, tendo em vista que não há expressa exclusão do referido procedimento no contrato firmado entre as partes.ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE PREVISÃO DO EXAME NO ROL DA ANS. ROL NÃO EXAUSTIVO.O rol da Agência Nacional de Saúde não é exaustivo, arrola apenas alguns procedimentos que devem ser obrigatoriamente cobertos pelas operadoras, pelo que, é devida a cobertura do exame indicado, máxime porque compete aos médicos a análise da adequação dos procedimentos a serem utilizados para o tratamento de cada caso.DANOS MORAIS CARACTERIZADOS. DEVER DE INDENIZAR EVIDENCIADO.Para que surja o dever de indenizar, forçosa a ocorrência de abalo à honra e à imagem da pessoa, capaz de causar sofrimento, tristeza, dor, humilhação, prejuízo à saúde e integridade. QUANTUM INDENIZATÓRIO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.A quantia correspondente a 10 (dez) Salários Mínimos vigentes à época do pagamento mostra-se razoável e proporcional, tendo em vista que a negativa de cobertura é abusiva.READEQUAÇÃO ALTERAÇÃO EX OFFICIO DO TERMO INICIAL DA CONTAGEM DA CORREÇÃO MONETÁRIA FIXADO EM SENTENÇA. DATA DO ARBITRAMENTO.1. Por se tratar de matéria de ordem pública, é possível a correção de ofício do termo inicial da correção monetária.2. Na indenização por danos morais, o termo inicial da correção monetária deve ser a data do
arbitramento (Súmula 362 do STJ).RECURSO DESPROVIDO.ALTERAÇÃO, EX OFFICIO, DO TERMO INICIAL DA CORREÇÃO MONETÁRIA. (TJPR - 9ª C.Cível - AC - 1424592-4 - Campo Mourão - Rel.: Vilma Régia Ramos de Rezende - Unânime - - J. 18.02.2016)
APELAÇÃO CÍVEL - OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPARAÇÃO DE DANOS - PLANO DE SAÚDE - NECESSIDADE TRATAMENTO ONCOLÓGICO - PRESCRIÇÃO MÉDICA DE QUIMIOTERAPIA COMBINADA - NEGATIVA DE COBERTURA SOB O ARGUMENTO DE SER TRATAMENTO EXPERIMENTAL - ILEGALIDADE - PACTO ANTERIOR À LEI 9.656/98 - OPÇÃO DE ADAPTAÇÃO DO CONTRATO NÃO COMPROVADA NOS AUTOS - ÔNUS DA OPERADORA DO PLANO DE SAÚDE - CONTRATO DE ADESÃO - ABUSIVIDADE RECONHECIDA - AFRONTA AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - DEVER DE COBERTURA - DANOS MORAIS - INOCORRÊNCIA - NEGATIVA PAUTADA EM EXPRESSA DISPOSIÇÃO CONTRATUAL E LEGAL - AFASTAMENTO DA CONDENAÇÃO - APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (TJPR - 9ª C.Cível - AC - 1432514-5 - Curitiba - Rel.: Domingos José Perfetto - Unânime - - J. 12.11.2015) Esclareça-se, por fim, que embora o magistrado tenha afirmado que a apelada, como beneficiária dos planos antigos, tenha sido convidada a pleitear a migração a um plano regulamentado pela Lei n. 9.656/98, aplicando imediatamente a nova legislação ao caso, importante salientar, aqui, que independentemente da aplicação da lei nova ou não, conforme será demonstrado adiante, a negativa de cobertura mostra-se de qualquer modo abusiva.
Cumpre esclarecer, a propósito, que a apelante alega que negou o material solicitado pela autora, ante a existência de exclusão expressa no contrato, conforme Condições Gerais, Cláusula VII Serviços Não Assegurados (mov. 1.6 - fl. 44), que dispõe:
"CLÁUSULA VII SERVIÇOS NÃO ASSEGURADOS. 7.1. Não são cobertas por este Regulamento as despesas relativas a: (...) m) marca-passo, lente intraocular, aparelhos ortopédicos, válvulas, próteses e órteses de qualquer natureza; (mov. 1.6 - fl. 44) Porém, como não foi oportunizada para a contratante a migração para plano diferenciado, a partir da edição da Lei n. 9.656/98, bem como por se tratar de exclusão genérica, resta indevida essa negativa.
É que a interpretação sempre deve ser favorável ao consumidor, quando implicar em restrições de direitos.
Logo, ineficaz a cláusula disposta, especialmente porque nos novos contratos regidos pela Lei n. 9.656/98, o material solicitado possui tal cobertura contratual.
Além disso, a referida cláusula VII, item 7.1, alínea `m', que exclui da cobertura as próteses e órteses, trata-se de disposição abusiva,
nos termos do art. 51, IV2, do CDC, porque a interrupção do tratamento, sem a realização da cirurgia liberada, para colocação dos materiais solicitados, neste caso, colocaria em risco a vida da paciente.
Registre-se, aqui, que a requerida liberou o procedimento cirúrgico, contudo, não liberou o material solicitado.
Ora, se apelante não nega sua obrigação de custear a cirurgia como um todo, é intuitivo que essa obrigação se entenda também aos materiais necessários a realização desse procedimento. É que, existindo previsão contratual para cobertura da cirurgia para colocação de parafuso bloqueio 3,5 e placa anatômica de úmero proximal, como no caso, todos os materiais inerentes ao procedimento, ou ao tratamento que dele decorrem, estão inseridos nos limites do pacto, não se admitindo cláusula específica que os exclua.
Ressalte-se, a respeito, que o caso trata de contrato de adesão a plano de saúde, onde há inegável prevalência dos interesses da contratada empresa de plano de saúde cabendo ao consumidor, apenas, aderir às cláusulas, termos aditivos e alterações contratuais preestabelecidos pela prestadora de serviços, configurando, desse modo, 2 Art. 51 - São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: (...) IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;
evidente relação de consumo. Logo, como já se disse, o contrato deve ser interpretado da forma mais favorável ao consumidor, em razão da sua hipossuficiência técnica.
Aliás, a obrigatoriedade do plano custear os materiais inerentes ao procedimento cirúrgico coberto já possui matéria pacífica, no âmbito desta Corte:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - PLANO DE SAÚDE - ANGIOPLASTIA COM IMPLANTAÇÃO DE STENTS - LIBERAÇÃO DA CIRURGIA, MAS RECUSA DO MATERIAL - CONTRATO QUE PREVÊ A EXCLUSÃO DE COBERTURA PARA ÓRTESES E PRÓTESES - APLICABILIDADE DA LEI Nº 9.656/1998 - CONTRATO ANTERIOR - OPERADORA DO PLANO DE SAÚDE QUE NÃO COMPROVOU QUE OPORTUNIZOU A ADAPTAÇÃO OU MIGRAÇÃO - APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO CDC - AMBAS LEGISLAÇÕES QUE GARANTEM O FORNECIMENTO DO MATERIAL NECESSÁRIO AO ATO CIRÚRGICO - DANO MORAL CONFIGURADO - PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO - "QUANTUM" MINORADO - TERMO INICIAL - CORREÇÃO MONETÁRIA A PARTIR DO ARBITRAMENTO E JUROS DE MORA DESDE A CITAÇÃO, POR SE TRATAR DE ILÍCITO CONTRATUAL - PRECEDENTES DO STJ RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJPR - 9ª C.Cível - AC - 1388778-6 - Curitiba - Rel.: José Augusto Gomes Aniceto - Unânime - - J. 03.09.2015)
APELAÇÃO CÍVEL. PLANO DE SAÚDE. AUTORA DIAGNÓSTICADA COMO PORTADORA DE DOENÇA DIVERTICULAR GRAVE DO SIGMOIDE.CIRURGIA DE RETOSSIGMOIDECTOMIA.PROCEDIMENTO
AUTORIZADO. NEGATIVA DE COBERTURA PARA O MATERIAL A SER UTILIZADO NO PROCEDIMENTO. PINÇA-SELADORA "LIGASURE". IMPOSSIBILIDADE. OFENSA AO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. DEVER DE COBERTURA PRESENTE. REEMBOLSO DEVIDO. DANOS MORAIS. CIÊNCIA DA NEGATIVA QUANDO DA HOSPITALIZAÇÃO PARA A CIRURGIA. CONDUTA QUE ULTRAPASSA O MERO DISSABOR AGRAVANDO SOBREMANEIRA A SITUAÇÃO DE SOFRIMENTO E AGONIA PSICOLÓGICA DA SEGURADA. DANO MORAL CONFIGURADO. VALOR FIXADO EM R$10.000,00 (DEZ MIL REAIS), ACRESCIDOS DE JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA A PARTIR DO ACÓRDÃO. INVERSÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL. RECURSO 1 PROVIDO. RECURSO 2 DESPROVIDO. (TJPR - 10ª C.Cível - AC - 1330697-9 - Curitiba - Rel.: Arquelau Araujo Ribas - Unânime - - J. 30.07.2015) Por todo o exposto, verifica-se que o plano de saúde deve reembolsar à autora os valores despendidos com o custeio do material necessário a realização da cirurgia coberta, nos exatos termos da sentença.
Dos danos morais
Defende a seguradora apelante a inocorrência de danos morais.
Cumpre asseverar, aqui, que é incontestável a existência de dano moral a justificar a reparação, neste caso, porque a negativa de cobertura do material necessário à realização de cirurgia de emergência importa em conduta ilícita que merece censura e reparação.
Assim, o caso não trata de mero descumprimento contratual, mas de não atendimento da obrigação assumida, que gera profunda dor psíquica, diante da incerteza de ter recuperada a saúde do beneficiário do plano, considerando que a seguradora apelante estava obrigada a prover os recursos necessários para o tratamento devido e se omitiu neste momento delicado.
Dessa forma, é notório o abalo psicológico que sofreu a usuário de plano de saúde, ante o descumprimento da obrigação de arcar com o tratamento médico, situação que afeta o equilíbrio psicológico do indivíduo e caracteriza o dever de indenizar, pois ultrapassa o mero dissabor, importando em desrespeito ao princípio da dignidade humana e, como tal, seus direitos à personalidade.
No mesmo sentido:
"(...) Ressalte-se que a relação jurídica avençada no caso dos autos desborda da idéia tradicional de contrato no qual há simples comutatividade de prestações, com vantagens e obrigações recíprocas, na hipótese dos autos se paga pela tranquilidade, a fim de garantir incerteza futura quanto à bem inestimável, no caso a vida, pois restabelecimento da plena saúde é o resultado esperado, logo, discutir a contrato sem justa causa com o fim de protelar o cumprimento da obrigação, importa em conduta ilícita que merece imediata reprimenda e reparação. Releva ponderar, ainda, que os paradigmas atinentes ao regular cumprimento deste tipo de contrato foram ultrapassados, resultando em efetivo prejuízo de ordem moral, atingidos direitos inerentes a personalidade da parte autora, tendo em vista a frustração da expectativa
de lhe ser prestado adequadamente o serviço ofertado, ilícito contratual que ultrapassa o mero incômodo. 3 Portanto, ao negar a cobertura dos materiais indicados pelo cirurgião e necessários para a realização de procedimento cirúrgico coberto, a requerida não só inadimpliu com suas obrigações contratuais, como também submeteu a segurada e sua família a constrangimentos e abalos psicológicos desnecessários, além de despender recursos para custear os materiais solicitados, a fim de garantir a realização da cirurgia de emergência, o que por certo foi causa de profunda angústia.
Desta feita, inegável o dever de indenizar.
No mesmo sentido é a jurisprudência deste Tribunal de Justiça:
APELAÇÕES CÍVEIS - AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - RECURSO DA RÉ PARCIALMENTE CONHECIDO - INSURGÊNCIA ACERCA DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS INCIDENTES SOBRE A INDENIZAÇÃO MATERIAL - SENTENÇA QUE DEIXOU DE FIXÁ-LOS (PROVIMENTO MAIS BENÉFICO À RECORRENTE) - FALTA DE INTERESSE RECURSAL - APELO NÃO CONHECIDO NESSE PONTO - PLANO DE SAÚDE - NECESSIDADE DE CIRURGIA DE ARTROPLASTIA TOTAL DE QUADRIL - NEGATIVA PARCIAL DE REEMBOLSO SOB A JUSTIFICATIVA DE AUSÊNCIA DE COBERTURA PARA PRÓTESES E LIMITAÇÃO DE VALORES A SEREM REEMBOLSADOS - ILEGALIDADE -
3 TJ/RS, AC 70040761231 e AgReg. 70042325803, 5ª C. Cível, Rel.: Jorge Luiz do Canto, J. 25/05/2011.
PACTO ANTERIOR À LEI 9.656/98 - OPÇÃO DE ADAPTAÇÃO DO CONTRATO NÃO COMPROVADA NOS AUTOS - ÔNUS DA OPERADORA DO PLANO DE SAÚDE - CONTRATO DE ADESÃO - ABUSIVIDADE DAS CLÁUSULAS RECONHECIDA - CONTRATO APRESENTADO PELA RÉ QUE SE MOSTRA ILEGÍVEL; CONTUDO, A PRÓPRIA PARTE AUTORA APRESENTOU CONDIÇÕES GERAIS DA AVENÇA PERFEITAMENTE LEGÍVEIS - AFRONTA AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - CABIMENTO - INTELIGÊNCIA DO ART. 6º, VIII, DO CDC - DEVER DE RESTITUIÇÃO INTEGRAL DOS VALORES DESPENDIDOS COM O PROCEDIMENTO, DEDUZIDA A QUANTIA JÁ PAGA ADMINISTRATIVAMENTE - FIXAÇÃO, DE OFÍCIO, DOS JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA - OMISSÃO DA SENTENÇA - MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA - DANOS MORAIS CONFIGURADOS - PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO - SITUAÇÃO QUE EXTRAPOLOU O MERO DISSABOR - INDENIZAÇÃO DEVIDA - REDUÇÃO DO QUANTUM - POSSIBILIDADE - SENTENÇA REFORMADA - REDISTRIBUIÇÃO DAS VERBAS DE SUCUMBÊNCIA - RECURSO DA RÉ PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, PARCIALMENTE PROVIDO UNICAMENTE PARA REDUZIR O MONTANTE INDENIZATÓRIO - APELAÇÃO DA AUTORA A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO APENAS PARA CONDENAR A RÉ AO REEMBOLSO INTEGRAL DAS DESPESAS MÉDICAS, FIXANDO- SE, DE OFÍCIO, JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA SOBRE A INDENIZAÇÃO MATERIAL. (TJPR - 9ª C.Cível - AC - 1277732-1 - Curitiba - Rel.: Domingos José Perfetto - Unânime - - J. 26.02.2015)
Igualmente vem decidindo o Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CIVIL. DANOS MORAIS. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA DE PRÓTESE NECESSÁRIA A PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. DANOS MORAIS. CABIMENTO. REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. É abusiva a cláusula que exclua da cobertura órteses, próteses e materiais diretamente ligados ao procedimento cirúrgico a que se submete o consumidor. Precedentes. 2. A jurisprudência do eg. Superior Tribunal de Justiça entende ser passível de indenização a título de danos morais a recusa indevida/injustificada pela operadora do plano de saúde em autorizar a cobertura financeira de tratamento médico. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1349952/MG, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 03/03/2016, DJe 10/03/2016) Grifos inseridos.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. 1. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS. 2. ANÁLISE DO AGRAVO REGIMENTAL.3. PLANO DE SAÚDE. PRÓTESE NECESSÁRIA AO TRATAMENTO DE ARTROPLASTIA DE QUADRIL. PROCEDIMENTOS. RECUSA INDEVIDA/INJUSTIFICADA. DANO MORAL CARACTERIZADO. 4. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7 DO STJ. 5. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1(...). 2. É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que a recusa indevida/injustificada, pela operadora de plano de saúde, em autorizar a cobertura de tratamento médico prescrito, a que esteja legal ou contratualmente obrigada, gera direito de ressarcimento a título de dano moral. 3. A revisão do quantum indenizatório estipulado pelo Tribunal de origem só é admitida quando irrisório ou exorbitante, o que não ocorre no caso
em questão, em que os valores arbitrados não destoam dos parâmetros estabelecidos nesta Corte, para casos análogos, respeitando os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. 4. Agravo regimental improvido. (EDcl no AgRg no REsp 1535608/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/12/2015, DJe 03/02/2016) Grifos inseridos. Conclui-se, desse modo, que restaram plenamente configurados os pressupostos que justificam a condenação da requerida, ao pagamento de indenização em favor da requerente, pela injusta recusa de cobertura do plano de saúde, pois tal fato agravou o sofrimento da segurada e de sua família, que já se encontravam abalados física e psicologicamente.
No tocante ao quantum indenizatório fixado houve resignação da apelante.
Diante do exposto, VOTO por CONHECER o recurso, para NEGAR-LHE PROVIMENTO, mantendo a respeitável sentença, nos termos da fundamentação retro.
ACORDAM os Membros Integrantes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade de votos, em CONHECER o recurso, para NEGAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto do Relator.
Participaram do julgamento os Excelentíssimos Senhores Desembargadores José Augusto Gomes Aniceto (presidente sem voto), Domingos José Perfetto e Coimbra de Moura.
Curitiba, 12 de maio de 2016.
|