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Acórdão
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Certificado digitalmente por: OSVALDO NALLIM DUARTE
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA APELAÇÃO CÍVEL Nº 1461796-2 DA 1ª VARA CÍVEL E DA FAZENDA PÚBLICA DO FORO REGIONAL DE ARAUCÁRIA. Apelante: AMIL Assistência Médica Internacional LTDA Apelado: Sebastião Rodrigues de Lima Relator: Juiz de Direito Substituto em 2.° Grau Osvaldo Nallim Duarte (em substituição ao Des. Gilberto Ferreira). APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA PROCEDENTE. INSURGÊNCIA DA REQUERIDA (I) RESCISÃO UNILATERAL DEVIDA EM RAZÃO DO INADIMPLEMENTO DO AUTOR. DESCABIMENTO. AUTOR INADIMPLENTE POR MAIS DE 60 DIAS NÃO CONSECUTIVOS. NOTIFICAÇÃO NÃO ENVIADA. EXIGÊNCIA LEGAL. ART. 13, § 1º, III, DA LEI 9.656/1999. REQUISITO INDISPENSÁVEL PARA ALERTAR O CONSUMIDOR DE SUA MORA E DO POSSÍVEL CANCELAMENTO DO PLANO DE SAÚDE. RESCISÃO CONTRATUAL ILEGAL. (II) SITUAÇÃO VIVIDA PELO AUTOR QUE ULTRAPASSA A ESFERA DO MERO DISSABOR COTIDIANO. RESCISÃO INDEVIDA QUE GERA ANGÚSTIA E SOFRIMENTO AO AUTOR, OBRIGANDO-O A RECORRER AO SUS. (III) PRETENSÃO DE REDUZIR O VALOR INDENIZATÓRIO. CABIMENTO. MONTANTE REDUZIDO PARA R$ 5.000,00. QUANTIA RAZOÁVEL E PROPORCIONAL AO CASO. SENTENÇA MODIFICADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
Vistos, etc.
I. RELATÓRIO Cuida-se de "ação de indenização por danos morais" proposta por Sebastião Rodrigues de Lima em Face de AMIL Assistência Médica Internacional LTDA. Narra o autor que, em julho de 2012, ao ser acometido por fortes dores abdominais, dirigiu-se ao Posto de Saúde de Araucária onde
foi diagnosticado com infecção no apêndice, a qual demandava intervenção cirúrgica imediata. Para tanto, fora encaminhado ao Hospital Vitória, em razão da existência de convênio com o plano de saúde de AMIL, do qual o requerente é beneficiário. Informa que lá, recebeu a negativa de internamento pelo plano de saúde sob o argumento de que estava inadimplente com as mensalidades. Relata também que a cirurgia foi realizada pelo SUS, no dia seguinte, em caráter emergencial. Esclarece que, em razão de dificuldades financeiras, atrasou o pagamento de algumas mensalidades, porém, sempre do prazo limite de 60 dias, em atenção à possibilidade de cancelamento do plano de saúde. Diante do exposto, requereu a condenação da requerida ao pagamento de danos morais ante a negativa abusiva e injustificada de cobertura. Citada, a ré apresentou contestação (mov. 22.1), sustentando, em síntese que, quando da recusa para cobertura do internamento e realização da cirurgia, o requerente encontrava-se inadimplente com as mensalidades do plano de saúde por mais de 60 dias. Argumenta que a rescisão unilateral encontra amparo na lei 9.656/1998 e pelo contrato existente entre as partes, razão pela qual não há que se falar em conduta ilícita e abusiva. O autor apresentou impugnação a contestação (mov. 38.1) O magistrado a quo, entendendo ser abusiva a injustificada a recusa de cobertura, julgou procedente a demanda (mov. 70.1), condenando a requerida ao pagamento de indenização a título de danos morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) corrigidos monetariamente pelo INPC e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, ambos a partir da sentença. Por fim, condenou a requerida ao pagamento da totalidade das custas processuais e honorários advocatícios ao patrono do autor, os quais fixou em 10% sobre o valor da condenação Inconformado, o réu interpôs recurso de apelação (mov. 76.1), sustentando/pleiteando, em resumo, que: a) o contrato firmado
2 entre as partes é claro quanto à previsão de cancelamento por inadimplemento nos pagamentos das mensalidades quando decorridos 60 dias de atraso, consecutivos ou não, desde que mediante aviso prévio; b) a possibilidade de cancelamento do contrato por atraso no pagamento encontra-se prevista no artigo 13 da lei 9.656/98; c) o autor tinha conhecimento de que seu contrato seria cancelado caso ultrapassasse o prazo legal de 60 dias de atraso; c) a conduta da AMIL deu-se em conformidade com a lei e as disposições contratuais estabelecidas pelas partes; d) inexistindo conduta ilícita e demonstrado o exercício regular de direito pela empresa, não há que se falar em danos morais. O recurso foi recebido em ambos os efeitos (mov. 78.1) Subiram os autos a este Tribunal. É o relatório.
II. FUNDAMENTAÇÃO O recurso merece conhecimento, na medida em que estão presentes os pressupostos de admissibilidade recursal. Passo à análise dos pontos controvertidos.
NEGATIVA DE COBERTURA Inconformada com a decisão proferida, aduz a recorrente que o contrato firmado entre as partes foi redigido em conformidade com a lei 9.656/98 e é claro quanto à previsão de cancelamento por inadimplemento nos pagamentos das mensalidades quando decorridos 60 dias de atraso (consecutivos ou não). Primeiramente, importa destacar que o Código de Defesa do Consumidor é aplicável ao caso em comento tendo em vista que autor e ré enquadram-se respectivamente nos conceitos de consumidor e fornecedor presentes nos artigos 2º e 3º do referido diploma legal. Nesse sentido, observa-se o enunciado da Súmula 469 do STJ: "Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde".
3 Examinando o contrato havido entre as partes, observa-se que a AMIL está autorizada a suspender ou rescindir o contrato, de maneira unilateral, em caso de atraso no pagamento das mensalidades por período superior a 60 dias consecutivos ou não. A lei 9.656/98, por sua vez, dispõe que a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato depende de prévia notificação o consumidor até o quinquagésimo dia de inadimplência. Entretanto, analisando cuidadosamente os autos verifica-se que, diferentemente do que alega o plano de saúde, a parcela correspondente ao mês de abril de 2012 foi paga na data de 09/06/2012 (mov. 1.5), tornando prejudicada a notificação emitida em 23/05/2012. Observa-se também que na data em que o autor foi informado da negativa (12/07/2012), havia apenas uma parcela em atraso, cujo vencimento ocorreu em 15/05/2012. Considerando as disposições presentes na lei 9.656/98 o requerente encontrava-se em atraso com as mensalidades do plano de saúde por mais de 60 dias não consecutivos. No entanto, em que pese a apelante sustente que o requerente tinha pleno conhecimento de que seu contrato poderia ser cancelado, não há nos autos qualquer prova que demonstre que a AMIL notificou o autor sobre a rescisão contratual dentro do prazo previsto no artigo 13, II da Lei nº 9.656/98, tornando assim injustificada e abusiva a rescisão unilateral. Vejamos:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA C/C INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE - DISPENSA DE PROVA ORAL - CERCEAMENTO DE DEFESA - INOCORRÊNCIA - INADIMPLEMENTO DE MENSALIDADE DO PLANO DE SAÚDE - AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL - RESCISÃO CONTRATUAL ILEGAL - RESTABELECIMENTO DO CONTRATO - INÉPCIA DA INICIAL - INOCORRÊNCIA - DANO MORAL - CONFIGURADO - ADEQUAÇÃO DO ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. 1. A audiência de instrução e julgamento poderá ser dispensada quando a prova documental já esclareceu os fatos, e, a prova oral, no caso, não se mostra necessária e
4 importante para que se caracterize o cerceamento de defesa. 2. A notificação pessoal prevista no art. 13, parágrafo único, inciso II, da Lei nº 9.656/98 é requisito indispensável para a rescisão contratual e a sua ausência torna esta ilegal, implicando no restabelecimento do contrato. 3. Não há que se falar em inépcia da inicial quando dos fatos narrados nos autos decorre logicamente o pedido. 4. O montante indenizatório fixado a título de dano moral deve atender às funções compensatória e pedagógica da indenização, de modo principalmente a coibir a prática de condutas semelhantes. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJPR - 9ª C.Cível - AC - 782328-9 - Curitiba - Rel.: Rosana Amara Girardi Fachin - Unânime - - J. 25.08.2011).
APELAÇÃO CIVIL - AÇÂO DE MANUTENÇÃO DE CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE CUMULADA COM CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO DAS PARCELAS EM ATRASO E PEDIDO DE DANOS MORAIS - CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE - INADIMPLEMENTO DE MENSALIDADE - AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL - EXIGÊNCIA LEGAL - ART. 13, § 1º, III, DA LEI 9.656/1999 - REQUISITO INDISPENSÁVEL A FIM DE ALERTAR O CONSUMIDOR DE SUA MORA E DO POSSÍVEL CANCELAMENTO DO PLANO DE SAÚDE - RESCISÃO CONTRATUAL AFASTADA - DANO MORAL - OCORRÊNCIA - INCOMODOS ADVINDOS DA RESCISÃO CONTRATUAL INDEVIDA QUE ULTRAPASSARAM A ESFERA DO MERO DISSABOR - DECISÃO MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. (TJPR - 9ª C.Cível - AC - 1080642-3 - Curitiba - Rel.: Renato Braga Bettega - Unânime - - J. 03.04.2014).
Na ausência do cumprimento de requisito legal (notificação) para informar o autor de sua mora e do cancelamento do plano de saúde tem-se que a rescisão unilateral do contrato, tal como realizada no presente caso, é ilegal.
DANOS MORAIS Insurge-se a apelante em face da sentença proferida argumentando, que a situação vivenciada pelo autor não ultrapassa a esfera do mero dissabor ou aborrecimento, razão pela qual não há que se falar em reparação pelos supostos danos morais sofridos. Aduz também que não houve qualquer conduta ilícita do plano de saúde que justifique a condenação. Ademais, argumenta que o valor arbitrado a título de danos morais é exorbitante. 5 Sem razão. Ao contrário da tese sustentada pela apelante, o dano moral será reconhecido em caso de objetiva demonstração de dor moral relevante. Em que pese o evidente descumprimento contratual pela parte requerida, é certo que o comportamento da empresa foi de gravidade suficiente para gerar ao autor mais do que dissabores. Da análise da situação concreta, verifica-se que a conduta da requerida foi capaz de gerar intenso sofrimento a vítima. Não há como negar a situação de angústia e aflição psicológica vivenciada pelo autor, que estava gravemente doente, com fortes dores, necessitando de intervenção cirúrgica imediata e teve o seu contrato abrupta e abusivamente rescindido (não houve comunicação prévia). Cediço que essas circunstancias ultrapassam o limite de um mero dissabor cotidiano gerando angústia e sofrimento. Oportuno destacar, também, que é pacifico o entendimento jurisprudencial de que, em se tratando de plano de saúde, há o risco inerente a a própria vida do segurado, sendo que o descumprimento contratual neste aspecto só agrava, ainda mais, as condições psíquicas do consumidor. Deste modo tem entendido o Superior Tribunal de Justiça, veja-se:
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL NÃO ADMITIDO. SEGURO SAÚDE. RECUSA EM CUSTEAR TRATAMENTO DE SEGURADO REGULARMENTE CONTRATADO. SUSPEITA DE CÂNCER. DANO MORAL. A recusa em arcar com os encargos do tratamento da agravada, com suspeita de câncer, já definida nas instâncias ordinárias como indenizável por danos morais, constitui fato relevante, principalmente por ocorrer no momento em que a segurada necessitava do devido respaldo econômico e de tranquilidade para realização de cirurgia e posterior recuperação" (STJ - AgRg no agravo de instrumento nº 520.390-RJ 2003/0077276- 2).
Reconhecido o dano moral, impõe-se a tarefa de aferir uma quantia razoável para a indenização. Primeiramente, importa observar que o valor da indenização deve ser arbitrado levando em consideração as 6 partes envolvidas, o alcance do dano e também o grau de culpa do ofensor. Ademais, esse montante indenizatório deve atender ao significado compensatório do dano moral, sendo que o valor arbitrado deve evitar o enriquecimento sem causa do ofendido e coibir a prática de novas condutas imprudentes ao ofensor. Diante do exposto, convenço-me de que o valor arbitrado pelo magistrado a quo a título de indenização por danos morais deve ser reduzido para R$ 5.000,00, levando em conta ter ele mesmo contribuído para a situação ao deixar de quitar as parcelas nos seus vencimentos. Deste modo voto por conhecer e dar parcial provimento ao recurso de apelação de AMIL Assistência Médica Internacional tão somente para reduzir o valor da indenização por danos morais.
III. DECISÃO Acordam os Desembargadores integrantes da 8ª Câmara Cível, por unanimidade, em conhecer e dar parcial provimento ao recurso de apelação, nos termos do voto do relator. Participaram da sessão, acompanhando o voto, os Desembargadores Luis Sérgio Swiech e Vicente Del Prete Misurelli. Publique-se
Curitiba, 05 de maio de 2016.
OSVALDO NALLIM DUARTE Juiz de Direito Substituto em 2.º Grau Relator convocado
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