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Acórdão
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HABEAS CORPUS - HOMICÍDIO CULPOSO - PARTO - DENÚNCIA RECEBIDA - TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL - IMPOSSIBILIDADE - FALTA DE JUSTA CAUSA - INOCORRÊNCIA - RAZOABILIDADE DA NARRATIVA FÁTICA IMPUTADA AO PACIENTE - EXAME DAS PROVAS - IMPOSSIBILIDADE - VIA INADEQUADA - NECESSIDADE DE PROCESSAMENTO REGULAR DA AÇÃO PENAL - ORDEM DENEGADA. Se os fatos descritos na denuncia permitem a defesa o conhecimento pleno da acusação formulada e, em tese, constituem figura típica penal, não e de se tê-la por inepta sob a alegação de falta de justa causa, cuja constatação será feita durante a instrução criminal. A inexistência de nexo causal entre a conduta medica, tida por incúria, omissão ou imperícia, e o fato letal poderá ser verificada a partir de confronto entre os dados oferecidos pelo inquérito policial, não pela via do HC, o que impede se tranque a ação penal ab initio. Não é possível no âmbito de habeas corpus proceder-se à nova capitulação penal dando ao crime sua exata definição jurídica, visto que tal providência requer discussão aprofundada da prova, além do necessário exame de mérito da ação penal.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus nº 270.914-4, de Curitiba - 10ª Vara Criminal, em que são impetrantes Rodrigo Sanchez Rios, Alessandro Silvério e Daniel Laufer, paciente Aluísio Favoro e impetrado o MM. Juiz de Direito da 10ª Vara Criminal de Curitiba. Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de Aluísio Favaro, denunciado como incurso nas sanções do artigo 121, parágrafos 3º e 4º, do Código Penal, alegando-se não ser típica a conduta narrada na denúncia, que a conduta do paciente que conduziu a vítima à morte foi anterior ao nascimento, que não pode lhe ser imputada a prática de homicídio culposo, que o artigo 121, do Código Penal, tutela a vida extra-uterina, que por outro lado, a vida intra-uterina (ser humano em formação) é tutelada pelos artigos 124, 125 e 126, do Código Penal, que há distinção entre o crime de homicídio e o de aborto, que no crime de aborto não se prevê a forma culposa, que o homicídio só ocorre quando o feto nasce com vida, que o Ministério Público elaborou em equívoco quando imputou ao paciente o crime de homicídio culposo, que no laudo de necropsia se refere tratar-se de um corpo nati-morto, que a denúncia deve ser rejeitada quando o fato narrado não constituir crime, que em certas situações excepcionais se recomenda a restituição da liberdade ao paciente ou a adoção de providências urgentes para o resguardo do direito de ir, vir e ficar. Pede-se seja deferida a liminar para o adiamento do interrogatório marcado para 10.08.04 e, no mérito, a aplicação da norma do artigo 43, inciso I, do Código de Processo Penal, como o conseqüente trancamento da ação penal. Deferida a liminar, a foram prestadas informações, anexando-se cópia da denúncia (f. 43/44). A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pela denegação da ordem (f. 57/62). É o relatório. Não obstante os fundamentos que orientaram a decisão concessiva da liminar, deferida em 02.08.04 (f. 35/38), tenho que a ordem não é de ser concedida, porquanto a pretendida rejeição da denúncia, com o conseqüente trancamento da ação penal, não se mostra possível através do meio utilizado. Narra a denúncia: "No dia 18 de novembro de 1.999, aproximadamente as 03 h 15 min, a vítima MARILDA RODRIGUES, gestante que possuiu acompanhamento médico adequado durante o pré-natal (inclusive com a solicitação diligente de cardiotocografia pelo Dr. Edgar Dias Justen Júnior), foi internada, em trabalho de parto, no hospital e maternidade Santa Isabel, localizado na Rua Shirlei Solange Montovani, n 1.160, Vila Nossa Senhora da Luz dos Pinhais, nesta Capital, data e horários estes em que o denunciado ALUISIO FAVARO era o plantonista responsável pelo atendimento obstétrico pelo SUS. Ocorre que durante o monitoramento do trabalho de parto, registrado em prontuário, demonstrou-se que o denunciado, a despeito de ser o responsável pela e saúde de mãe e filho, durante as 9 horas de trabalho de parto de Marilda, contrariando flagrantemente o que se denota do laudo de necropsia de fls. 14/15, o qual indica sofrimento fetal agudo durante o trabalho de parto (feto banhado e mecônio, que são as próprias fezes do recém-nato), atestou imperitamente ou negligentemente deixou que atestassem que o bebe apresentava batimentos cardíacos normais (140 bat/min) e, mesmo quando os batimento cardíacos normais baixaram, na oitava hora de parto, para 120 bat/min, e na nona hora para 80 bat/min, agindo com negligencia, não providenciou a realização urgente de um cesárea, procedimento que evitaria a morte do nascituro. A discrepância existente entre os dados anotados no prontuário, os quais indicam batimentos cardíacos normais, e a causa mortis do feto, indicam também que o denunciado não se certificou se eram observados os procedimentos adequados de monitoramento, o que revela não ter estado presente durante o trabalho de parto, não ter monitorado corretamente os dados vitais do feto, inclusive seus batimentos cardíacos ou ter imprudente e negligentemente delegado o cuidado de seus pacientes - mãe e bebê - a funcionários cuja qualificação profissional desconhecia. A conduta médica negligente e imperita do denunciado se evidencia, ainda, por não haver atuado de modo adequado face a suspeita de fatores de risco para vitalidade no nascituro, quando, ao tomar conhecimento da indicação feita a paciente para a realização do exame de cardiotocografia, sequer providenciou saber os motivos da indicação de tal exame, o que leva a conclusão de que o denunciado nem mesmo cientificou-se dos resultados do acompanhamento pré-natal a gestante, cujos prontuários podem ser facilmente resgatados em bancos de dados mantido pela secretaria municipal de saúde. Em decorrência da inobservância, pelo denunciado, de seus elementares e relevantes deveres profissionais, não houve qualquer interrupção, reversão ou controle dos fatores de desequilíbrio que acometiam o nascituro; sem que fosse detectada e convenientemente avaliada, a condição de perigo a saúde do feto viu-se agravada, com o decurso do tempo e com o desenvolvimento irregular do trabalho de parto - cujo impacto o nascituro, mal assistido e sem oxigênio necessário aos processos vitais, não pode suportar - conduzindo-o a morte, anteriormente ao nascimento, as 12h10m do dia 18 de novembro" (verbis f. 45/46/TA). A denúncia, portanto, sustenta ter o paciente incidido no ilícito penal tipificado no artigo 121, parágrafos 3º e 4º (homicídio culposo qualificado, sustentando os impetrantes a atipicidade da sua conduta porquanto não prevista na legislação penal o crime de aborto na modalidade culposa. Diante disso, resta evidente que para esta finalidade não se presta a medida impetrada, pois, para que se possa alcançar nova capitulação do crime, realizando-se a perfeita subsunção do fato ao tipo penal, é necessário e imprescindível se proceda ao exame acurado dos elementos de prova colhidos na fase indiciária, inclusive diante da interpretação a ela dada pelos impetrantes. Certo é que em razão da sua natureza não se admite em Habeas Corpus se proceda a um exame aprofundado, analítico ou interpretativo da prova, ensinando Heleno Cláudio Fragoso que "a única limitação quanto a prova no âmbito do habeas-corpus é que seja extreme de dúvidas e inteiramente inequívoca. A regra a ser considerada é a seguinte: não se pode admitir em HC matéria de prova duvidosa ou controvertida" (Jurisprudência Criminal, São Paulo, 1979, II/432, nº 431). Por sua vez, ensina Julio Fabbrini Mirabete que "Só é admissível o conhecimento de novo pedido quando haja matéria nova, que não foi objeto de deliberação anterior, ou seja, o conhecimento do novo pedido depende de que sejam apresentados novos fundamentos de fato ou direito" (Código de Processo Penal Interpretado, 8ª ed., p.1421). É entendimento harmônico que: "Em sede de habeas-corpus só se reconhece a falta de justa causa para a ação penal, sob o fundamento de divórcio entre a imputação fática contida na denúncia e os elementos de convicção em que ela se apóia, quando a desconformidade entre a imputação feita ao acusado e os elementos que lhe servem de supedâneo for incontroversa, translúcida e evidente, revelando que a acusação resulta de pura criação mental de seu autor. Em face da natureza do habeas-corpus, não é possível em seu âmbito o confronto e a valoração de provas" (TACRIM-SP, RT 527/355, in Damásio E. de Jesus, Código de Processo Penal anotado, 8ª ed. 199-0, p. 415). Com razão, pois o Procurador José Kumio Kubota quando, oficiando pela Procuradoria Geral de Justiça, assim se pronunciou: "O pedido reúne condições de ser conhecido, no entanto, não se divisa abuso de poder algum ou mesmo se revela constrangimento ilegal corrigível por ordem de hábeas corpus. Isso porque a situação em apreço não pode ser solucionada através da distinção simples entre vida intra-uterina e vida extra-uterina. A denúncia contra o ora paciente narra a existência de gestante que experimentou longas horas em "trabalho de parto" sem a correta assistência médica, e cujo feto, ao final, perecera. Em que pese o esforço dos impetrantes na tentativa de descaracterizar a conduta do paciente como conduta homicida quando traçam paralelo entre os crimes de homicídio e de aborto, cumpre esclarecer que o presente caso, segundo a narrativa acusatória, jamais poderia configurar um impunível aborto culposo, precisamente pelo fato de que o feto falecera após o início do parto. A distinção que se deve fazer é entre a morte fetal antes do início do parto (que caracterizava o aborto) e tal morte após o início do parto (que caracterizava o infanticídio ou o homicídio culposo, dependendo do caso) na qual também se insere a situação comumente chamada trabalho de parto. Se a morte do feto ocorre na fase de transição da vida uterina para a vida extra-uterina, que se dá com o início do parto (desde as contrações até a expulsão do feto), não se cogita mais de hipótese de aborto. Tal situação pode configurar ou o crime de infanticídio (se for praticado pela própria mãe em razão do estado puerperal) ou o crime de homicídio (se praticado pela própria mãe em razão do estado puerperal) ou o crime de homicídio (se praticado por terceiro, p. ex., pelo médico). Para corroborar o expendido, socorremo-nos das lições do saudoso NÉLSON HUNGRIA ao tratar do infanticídio e cotejá-lo com a figura do aborto: "O Código atual ampliou o conceito de infanticídio: o sujeito passivo deste já não é apenas o recém-nascido, mas também o feto nascente. Ficou, assim, dirimida a dúvida que se apresentava no regime do Código anterior, quando o crime se realizava no regime do Código anterior, quando o crime se realizava in ipso partu, isto é, na fase de transição da vinda uterina para a vida extra-uterina. Já não há mais identificar-se, em tal hipótese, o simples aborto, ... o crime é infanticídio. (...) Antes de iniciado o parto, a ocasião do feto é aborto; iniciado o parto, o crime é infanticídio. (...) Nem mesmo é necessário indagar se o feto era capaz de vida autônoma: basta averiguar, remontando-se ao momento anterior à expulsão, a presença de vida biológica, isto é, a existência do mínimo de atividades funcionais de que o feto já dispõe antes de vir à luz, e das quais é o mais evidente atestado a circulação sanguínea." (Comentários ao Código Penal. vol. V. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense: 1979, p. 257-258) A esse respeito, consulte-se também o julgado abaixo que bem esclarece a circunstância início de parto/trabalho de parto: "Médico que negligencia atendimento a parturiente - Morte do nascituro após o início do parto - Ausência de participação da mãe - Configuração - Aborto ou infanticídio -Inocorrência - (Voto vencedor) - 'Emenda oficial: Provocada a morte do feto a caminho da luz, por ato omissivo ou comissivo de outrem que não a mãe, quando o nascente já fora encaixado com vida no espaço para tanto reservado na pelve feminina, o crime é de homicídio - Iniciado o trabalho de parto, vindo a ocorrer a morte do feto por culpa do Médico Assistente, não há como cogitar-se de aborto, ficando bem tificado o crime de homicídio culposo" (TACRIM-SP - AC - Rel. Pires Neto - Rel. Pires Neto - RJTACRIM-SP 34/290) Aliás, a própria lição de CEZAR ROBERTO BITENCOURT sobre aborto, citada pelos impetrantes (fl. 06), deixa claro esse aspecto, quando o ilustre doutrinar ensina que, no aborto, "relativamente ao objeto, não é a pessoa humana que se protege, mas a sua formação embrionária; em relação ao aspecto temporal, somente a vida intra-uterina, ou seja, desde a concepção até momentos antes do início do parto" (negrito nosso). Ademais, apesar de a tese mandamental apoiar-se, em parte, na expressão "anteriormente ao nascimento" contida na denúncia, cabe assinalar que no relatório do Conselho Regional de Medicina do Paraná, acostado às fls. 23/24, consta a seguinte descrição a respeito do processo de parto em questão: "O parto foi realizado e durante o período expulsivo houve detecção do sofrimento fetal, provavelmente agravado pela circular de cordão, nascendo o RN em parada cardiorespiratória. Isto pode ser evidenciado através do partograma." (fl. 24) Ora, se foi no processo de expulsão do nascituro que se detectou parada cardiorespiratória, em decorrência do "sofrimento fetal agudo durante o trabalho de parto", por "carência de oxigênio" (hipoxia) (fl. 23), então não se pode falar em situação abortiva, já que a descrição evidenciada que o feto estava em processo de nascimento, o que é diverso de morte anterior ao nascimento. A propósito, ainda, os arestos abaixo cuja assaz similitude com a espécie bem ilustra a vexata quaestio e a dirime: "Homicídio culposo - Médico plantonista que, ao atender parturiente, comete falha no diagnóstico, deixa-se sem o necessário acompanhamento, retardando o trabalho de parto, que leva à morte do feto no ventre materno - Configuração (voto vencedor) - 'Age com imperícia e negligência o médico plantonista que, ao atender parturiente, comete falha de diagnóstico e determina sua internação, deixando-a por conta da enfermagem, sem tratamento e acompanhamento médico necessários, permitindo que dinâmica do trabalho de parto seja retardada, o que gera o resultado morte do feto no ventre materno, uma vez que a singular situação em que se encontrava a gestante e a posição de garantidor do acusado impunha-lhe a obrigação de uma maior assistência médica, criando sua completa omissão e seu descaso um perigo juridicamente desaprovado que se realizou no fato típico, sendo certo que, comprovado pela presença de bossa serossangüínea que o feto vivo estava para ser expulso, não se pode falar de atipicidade da conduta, por ausência de sujeito passivo, sendo a morte de qualquer ente humano, nesse período, homicídio ou infanticídio, conforme a conduta do sujeito ativo (voto vencedor - Dr. Canellas de Godoy)" (TACRIM-SP - AC - Rel. Marco Nahum - Rolo-flash 1281/089 - j. 09.11.1999) "Comete crime de homicídio culposo o médico responsável por atendimento em hospital que, avisado em sua residência sobre paciente internada com fortes dores, em início de trabalho de parto, e cujo feto tem seus batimentos cardíacos reduzidos, medica-a por telefone, deixando-a aos cuidados de enfermeiras, que, sem a assistência de um profissional habilitado, realizam o parto, vindo o feto a falecer" (voto vencedor -TACRIM-SP - AC - Rel. Di Rissio Barbosa - RJD 28/131) "Se terceiro mantém conduta, sem auxílio da mãe, de que resulte a morte do nascituro, durante o parto, comete homicídio, doloso ou culposo, dependendo da forma de seu ato. Não se trata de aborto, pois o parto já se iniciara e não se trata de infanticídio, pois a mãe não teve participação danosa alguma no evento. Responde por homicídio culposo o médico que negligencia no atendimento de paciente, sob sua responsabilidade, durante o parto, causando a morte do nascituro. (Voto vencedor: Juiz Luiz Ganzerla)" (TACRIM-SP - EF - Rolo-flash 1.077/226, j. 21.11.1996) Assim, diante dos fatores mencionados, não se pode inferir no sentido de manifesta atipicidade da conduta atribuída ao paciente. Ao contrário, os indícios fáticos e os fundamentos teóricos estão a indicar, ao menos em tese, a tipicidade penal da imputação. Por outro lado, a tentativa de se aprofundar ainda mais na investigação dos dados fáticos que envolvem a questão, bem como nas controvérsias doutrinárias correlatas, desborda do âmbito estreito do writ, ao mesmo tempo que evidencia a ausência de atipicidade patente da imputação. É, portanto, imprescindível que o feito criminal subjacente ao presente mandamus tenha regular processamento, com instrução probatória dilatada e possibilidade de ambas as partes (Ministério Público e réu) formularem suas respectivas argumentações (contraditório), e, então, seja ultimado por julgamento que decorra de cognição exauriente dos fatos e questões jurídicas envolvidos, o que não se alcança por meio de ação de habeas corpus." (f. 58/62) Não é no âmbito da ação de habeas corpus que será dada ao crime sua exata definição jurídica, visto que tal providência requer discussão aprofundada da prova, além da necessária interpretação próprio do exame de mérito da ação penal condenatória. Não é possível, portanto, proceder-se à nova capitulação do fato em sede de habeas corpus, principalmente quando aquela já realizada na sentença está em plena com os elementos probatórios colhidos na ação penal, conforme se afirmou, tanto no julgamento da apelação, quanto na Revisão Criminal (f. 08 e 13). Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça assim se posicionou: Descrevendo a denúncia, com apoio no inquérito, fato que constitua crime em tese, não cabe, na via sumarísima do writ, o trancamento da ação penal em julgamento da causa. Recurso de habeas-corpus a que se nega provimento" (RHC nº 2048/PR, rel. Min. Assis Toledo, j. 12,08.1992, DJ 08.09.1992, p. 14370). "RHC - HOMICÍDIO CULPOSO - PÓS-PARTO - ALEGAÇÃO DE FALTA DE JUSTA CAUSA - INOCORRÊNCIA. - Se os fatos descritos na denúncia permitem a defesa o conhecimento pleno da acusação formulada e, em tese, constituem figura típica penal, não é de se tê-la por inepta sob a alegação de falta de justa causa, cuja constatação será feita durante a instrução criminal. - A inexistência de nexo causal entre a conduta médica, tida por incúria, omissão ou imperícia, e o fato letal poderá ser verificada a partir de confronto entre os dados oferecidos pelo IP, não pela via do HC, o que impede se tranque a ação penal ab initio. - Recurso Improvido." (RHC 4845/RS, rel. Min. Cid Flaquer Scartezzini, j. 13.09.95, DJ 09.10.99, p. 33581, negritei). Na realidade, a se o fato narrado na denúncia puder caracterizar crime, a ação penal não poderá ser a ação penal trancada, sob pena de se impedir o exercício do direito-dever do Estado, consistente do jus persequendi e do jus puniendi, pois, a discussão acerca da efetiva conduta do paciente, circunstâncias da morte da vítima, da existência ou não do delito, da diferença entre o crime de aborto e o de homicídio, ou da distinção entre a vida intra-uterina e extra-uterina, é própria da ação penal onde, por óbvio, se estabelece o contraditório. Não procede a afirmação de ausência de justa causa para o recebimento da denúncia, com o conseqüente prosseguimento da ação penal contra o paciente, ainda mais quando a fundada na hipótese contida no artigo 43, inciso I, do Código de Processo Penal ("quando o fato narrado evidentemente não constituir crime."), pois o fato nela narrado é típico, constitui crime em tese, o que afasta a aplicação do mencionado dispositivo legal. Inexistente, portanto, o apontado constrangimento ilegal. Nestas condições, cassando a liminar, denego o habeas corpus. Diante do exposto, ACORDAM, os Juízes da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Alçada do Paraná, por unanimidade, em denegar o habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Participaram do julgamento os senhores Juízes Marques Cury e Lenice Bodstein. Curitiba, 23 de setembro de 2004. Rogério Coelho Presidente e Relator
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