Íntegra
do Acórdão
Ocultar
Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.
AGRAVO DE INSTRUMENTO- AÇÃO POSSESSÓRIA- DECISÃO QUE DESACOLHEU A RECONVENÇÃO POR SER A AÇÃO POSSESSÓRIA UMA DUAL OU DÚPLICE- PEDIDO RECONVENCIONAL CUJA MATÉRIA ESCAPA À ABRANGÊNCIA DO ARTIGO 922 DO CPC- VIABILIDADE - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. Em princípio, não cabe reconvenção em ação possessória, em razão de sua natureza dúplice, decorrente do art. 922 do estatuto processual. Porém, não visando a reconvenção o alcance de proteção possessória , que pode ser conseguido pela via prevista no citado art. 922, nada impede que seja ela admitida em ação de natureza possessória, satisfeitos os requisitos do art. 315, do digesto processual. Cuida-se de discussão possessória em razão de contrato firmado entre as partes, sendo que a indenização reclamada na reconvenção diz respeito com a rescisão de dito contrato, sob a alegação de ser ele de natureza agrária, estando sob a égide do Estatuto da Terra, justificando-se o socorro à via reconvencional.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de AGRAVO DE INSTRUMENTO nº 266.008-2 da 2ª VARA CÍVEL da comarca de MARINGÁ em que são agravante ANGELO JOSÉ PINTO e agravados ESPÓLIO DE MASSATOSHI ISHITANI E OUTRO. RELATÓRIO: Inconformado com a decisão proferida nos autos de Reintegração de Posse que deixou de receber a reconvenção, o agravante interpõe o presente, visando sua reforma e para tanto aduz: O agravante propôs ação reconvencional objetivando receber, com fundamento no art. 95, VIII do Estatuto da Terra, indenização por danos materiais e morais pela retomada ilegal do imóvel, cujo termo contratual seria em novembro de 2005. No entanto, o MM. Juiz singular rejeitou liminarmente a reconvenção, sob o fundamento de que em ação possessória, devido a sua natureza dúplice, descabida a ação reconvencional. A decisão rechaçada ignora os fundamentos trazidos na contestação e na reconvenção, uma vez que, o contrato pactuado entre as partes é de natureza agrária, sujeito ao Estatuto da Terra, e que em tal caso a ação seria de despejo como previsto no art. 32 do Decreto n° 59.566/66. A posse do agravante está garantida por contrato verbal, assim, sua ação não é possessória, mas reivindicatória, cujo pressuposto, neste caso, é a declaração da rescisão contratual de exploração agrícola firmado entre ele e o proprietário e ainda vigente entre as partes. Deveria a reivindicação ser promovida através da ação de despejo, nos termos do art. 32 do Dec. nº 59.566/66, que regulamenta o Estatuto da Terra, Lei 4.504/64, mesmo porque, nos termos do art. 39 do citado Decreto, quando o contrato, ainda que denominado comodato, for de natureza agrária, como no caso, aplicar-se-ão as normas do Estatuto da Terra para a solução das pendências jurídicas. Os contratos agrários devem observar, dentre outros princípios, a proibição de renúncia por parte do arrendatário ou do parceiro não-proprietário, de direitos ou vantagens estabelecidas em leis ou regulamentos (art. 13, inciso IV da Lei 3947/66). Dentre tais direito e vantagens está o da segurança na obtenção dos resultados de investimentos e da colheita do plantio, pois consta do referido estatuto que os contratos de agrários terminarão sempre depois de realizada a colheita, bem como, estabelece que o prazo mínimo de tais contratos é de 03 (três) anos (art. 95). Assim, a recusa do recorrente em devolver o imóvel não se traduz como posse injusta, eis que se presume um prazo mínimo de três anos e, tendo este iniciado em 1992, sem a notificação prevista no art. 22 do Estatuto da Terra, restou prorrogado pelo mesmo prazo. Em novembro de 2002 o contrato foi pela terceira vez prorrogado, com seu término previsto para 2005 e a sua retomada mediante a ação de reintegração de posse é ilegal e prejudicial aos direitos do agravante. O art. 581 do atual Código Civil estabelece que nos contratos de comodato por prazo indeterminado se presume concebido pelo prazo necessário a seu uso, portanto, os autores são carecedores de ação, uma vez que o agravante se encontra no justo gozo da posse, garantida por lei e pelo contrato. Por conseqüência, o procedimento adotado é nulo, pois, por se tratar de contrato de natureza agrária, deve ser observado o sumário. Por tais razões é que propôs a ação reconvencional, sendo inaplicável ao presente o fundamento utilizado na decisão agravada, cujo conhecimento está vinculado à apreciação do mérito da ação o qual suscita a produção de provas em audiência, constituindo-se o julgamento antecipado em violação ao princípio de contraditório e da ampla defesa. Apenas por argumentação, ainda que a ação fosse de natureza dúplice, caberia o pedido contraposto, ante o princípio do aproveitamento dos atos processuais, consignado no art. 250 do CPC, devendo a reconvenção ser recebida como pedido contraposto, uma vez que não importa em prejuízo à parte e atende à finalidade processual de permitir que o agravante, no mesmo processo, em consonância com o princípio da economia processual seja ressarcido dos prejuízos advindos com a presente. Requer provimento do presente para, reformando a decisão atacada, seja deferido o recebimento do pedido de indenização do agravante como ação reconvencional ou como pedido contraposto à contestação. Recebido o recurso, este foi contraminutado e pelo seu improvimento. Informações do MM. Juiz singular no sentido de ter mantido o despacho atacado, bem como pelo cumprimento pelo agravante do disposto no art. 526 do CPC. É o relatório. FUNDAMENTAÇÃO: Presentes os requisitos extrínsecos e intrínsecos, impõe-se o conhecimento do agravo. O espólio agravado ingressou com a ação reintegratória contra o agravante e sua mulher, aduzindo ter cedido a eles, em comodato, uma casa de madeira, visto que, tendo notificado para desocupa-la, se opõe eles a devolve-la. Em sua defesa, alega o agravante, naqueles autos, que firmou contrato verbal para a guarda da propriedade, a qual estava sendo alvo de invasões, recebendo por este trabalho dois salários mínimos, habitação, energia e água, tendo sido autorizado a realizar, sem qualquer ônus, a exploração agrícola do imóvel, apresentando reconvenção, pleiteando nesta indenização pelos danos que lhe deu causa o agravado. Embora tenha o agravado trazido aos autos o Contrato Particular de Comodato firmado entre a inventariante e a OVETRIL INDUSTRIAL DE ÓLEOS LTDA, no qual constou que o comodato era gratuito quanto a área de terras e subsolo, bem como o Contrato de Comodato firmado entre a Ovetril e o agravante (fls. 62), que teve e como objeto o empréstimo gratuito de uma casa situada no lote 19 da Gleba Patrimônio Maringá- Pr, comprovado que notificou devidamente o agravante em 23 de junho de 2003, para que desocupasse em 15 dias a moradia concedida a título precário, tem-se que o agravante vem afirmar que contrato realizado entre as partes, verbalmente, é de natureza agrária, sujeito ao Estatuto da Terra, pois que lhe foi possibilitada a utilização da área para plantio, o que tornaria sua posse justa, ante os fundamentos por ele levantados. Nos termos do art. 922 do CPC, o réu não precisa reconvir para que se lhe reconheça, ao final, o direito à posse, à proteção desta e à indenização dos danos sofridos. Bastam alegações deduzidas na contestação, confortadas com as provas produzidas. Em princípio, não cabe reconvenção em ação possessória, em razão de sua natureza dúplice, decorrente do art. 922 do estatuto processual. Neste sentido, a jurisprudência de nossos tribunais. Porém, não visando a reconvenção o alcance de proteção possessória , que pode ser conseguido pela via prevista no citado art. 922, nada impede que seja ela admitida em ação de natureza possessória, satisfeitos os requisitos do art. 315, do digesto processual. " A natureza dúplice da ação possessória, no rastro do artigo 922 do Código de Processo Civil, não tem o condão de afastar, em tese, a possibilidade de reconvenção" (RSTJ 112/169). Necessário, porém, é examinar o caso concreto. O agravante, nos termos do art. 95, VIII, do Estatuto da Terra, que entende aplicável ao caso, na reconvenção, aduziu ter direito à indenização por benfeitorias, o que lhe garante o artigo 186 do Código Civil, ser sua posse garantida por contrato verbal, tendo sido esbulhada pelo agravado, posto que sua ação não é possessória, mas reivindicatória, cujo pressuposto é a declaração da rescisão do contrato de exploração agrícola firmado entre ele e o proprietário e que entende ainda vigente entre as partes, pleiteando ao final o pagamento da indenização por danos materiais e morais, o que é viável a sua argüição em sede de reconvenção, visto que, o art. 315 do CPC é expresso em dizer que o réu pode reconvir ao autor no mesmo processo toda vez que a reconvenção seja conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa. No caso dos autos, a ação e a reconvenção tem fundamento em um mesmo contrato, havendo identidade de causas, pretendendo ainda o réu ser indenizado pelo autor, cuja matéria, pelas razões aduzidas, escapa da abrangência do art. 922 do CPC, sendo admissível a sua argüição em sede de reconvenção. "Admite-se a reconvenção como forma de ampliar a discussão em torno do relacionamento obrigacional, vez que se constitui em matéria diversa daquelas previstas no art. 922 do Código de Processo Civil. A natureza dúplice da ação possessória, no rastro do art. 92 do CPC, não tem o condão de afastar, em tese, a possibilidade de reconvenção ( precedentes do Superior Tribunal de Justiça" (TAPR, 4ª Câm. Cível, AgIn. 167953-4, Rel. Juiz Sérgio Rodrigues). " A natureza duplica das ações possessórias, ensejando ao réu demandar , na contestação, proteção possessória e indenização pelos prejuízos sofridos em razão da moléstia à sua posse provocada pelo autor, não constitui empeço ao manejo de reconvenção, quando se tratar de matéria que escape à abrangência do artigo 922 do Código de Processo Civil. Para os efeitos do art. 922, a reconvenção é certamente inaceitável, por desnecessária... nem por isso se concluirá pela absoluta e geral inadmissibilidade dessa forma de resposta do réu em ação possessória: ela cabe par veicular outras pretensões que não contempladas no artigo (Adroaldo Furtado Fabrício)" (Ac. 12670, 6ª Câm. Cível do TAPR, Rel. Juiz Mendes Silva, j: 19.11.2001, p: 30.11.2001). No caso dos autos, ao que se pode inferir do contido neste instrumento, cuida-se de discussão possessória em razão de contrato firmado entre as partes, sendo que a indenização reclamada na reconvenção diz respeito com a rescisão de dito contrato, sob a alegação de ser ele de natureza agrária, estando sob a égide do Estatuto da Terra, justificando-se o socorro à via reconvencional. Ante o exposto, nosso voto é no sentido de que se dê provimento ao presente recurso, para o efeito de se admitir a reconvenção oposta pelo agravante. ACORDAM os Juízes integrantes da Sexta Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento ao presente recurso. Participaram do julgamento os eminentes juízes CARVILIO DA SILVEIRA FILHO, Presidente sem voto, PAULO HABITH e Juiz Conv. J.J. GUIMARÃES DA COSTA. Curitiba, 19 de outubro de 2004. ANNY MARY KUSS Relator
|