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Acórdão
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Certificado digitalmente por: ARQUELAU ARAUJO RIBAS PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA APELAÇÃO CRIME Nº 1.359.227-9 DA 4ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE LONDRINA. APELANTE: JUNIOR MISAEL ANAMÁ APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO RELATOR: DES. ARQUELAU ARAUJO RIBAS REVISOR: DES. JOSÉ CICHOKI NETO APELAÇÃO CRIME. ROUBO MEDIANTE EMPREGO DE ARMA (FACA) CRIME CONTINUADO DOIS FATOS. CONDENAÇÃO. PRELIMINAR ACOLHIDA - NULIDADE DO PROCESSO ALEGAÇÃO DE INSANIDADE MENTAL NÃO REALIZADO O EXAME MÉDICO- LEGAL ARQUIVADO O INCIDENTE EM AFRONTA A REGRA DO ART.149, CPP. RÉU DIAGNOSTICADO COM ESQUIZOFRENIA - MAIS DE 18 INTERNAMENTOS. NECESSIDADE DE SE AVERIGUAR A HIGIDEZ MENTAL DO ACUSADO AO TEMPO DA CONDUTA. PROCESSO ANULADO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Crime nº 1.359.227-9, da 4ª Vara Criminal da Comarca de Londrina, em que é recorrente JUNIOR MISAEL ANAMÁ e recorrido MINISTÉRIO PÚBLICO. RELATÓRIO 1. Junior Misael Anamá foi denunciado pela prática, em tese, do crime de roubo mediante emprego de arma (faca) por duas vezes, (art. 157, §2º, I, do Código Penal). Após a instrução, o magistrado sentenciante julgou procedente a pretensão punitiva, condenado o réu a pena definitiva de 06 (seis) anos e 2 (dois) meses de reclusão, e 15 (quinze) dias-multa, a ser cumprida inicialmente em regime semiaberto, (fls.203/221). 1.1. O acusado apela, alegando, que o réu merece ser absolvido em virtude de que o crime não foi consumado verdadeiramente; se houve crime deve ser desclassificado para furto porque não provada a grave ameaça ou violência; o réu é indígena, não foi assistido por representante da FUNAI, violado o art.8º e 56 da Lei nº 6001/73; há nulidade processual visto que o pedido de exame de sanidade mental foi dispensado sem
a devida intimação do defensor; a confissão de um incapaz não constitui prova; a insanidade mental do acusado está reconhecida nos documentos de fls.65, 73 e 75; as testemunhas não comprovaram o uso de ameaça ou intimação pela faca usada na prática dos delitos; não houve reconhecimento induvidoso das vítimas; há de ser reconhecida a prescrição do crime de furto. Requer ainda, a concessão dos benefícios da justiça gratuita, (fls.228/231). 1.2. O Ministério Público apresentou contrarrazões pugnando pelo desprovimento do apelo, (fls. 246/257). 1.3. O d. Procurador de Justiça Ramatis Fávero, opinou por converter o julgamento em diligência para ser remetido ao Tribunal, o incidente de insanidade mental. (fls.262). Juntado aos autos, as fotocópias de fls.272/477, retornaram os autos ao d.Procurador que opinou pela declaração de nulidade do processo desde a decisão que determinou o arquivamento do incidente de sanidade mental (fls. 625/637). É o relatório. FUNDAMENTOS DE FATO E DE DIREITO 2. Extrai-se o relato fático da denúncia:
"No dia 04 de abril de 06, por volta das 23 hs, na Av Mário Romagnoll, nas proximidades da esquina com a Av.Francisco Gabriel Arruda, nesta Cidade o ora denunciado JUNIOR MISAEL ANAMÁ, agindo com animus furandi, e empregando grave ameaça, exercida com o emprego de arma branca (uma faca, apreendida às fls.11), depois de, dando voz de assalto à vítima EVA ELIANE DA SILVA sob a mira da referida arma branca, reduzi-la à incapacidade de resistência, subtraiu para si 01 sacola contendo em seu interior, 01 celular Motorola, modelo C-200, habilitado pela operadora TIM 02 cartões, um da caixa econômica federal e um de Ticket Alimentação, uma calça e uma blusa usada e as chaves de casa, avaliados em R$110,00, (fls.11 e 13) tendo o denunciado conseguido deter para si a posse da res furtiva, consumando o delito. No dia 04 de abril de 06, por volta das 23 horas, na A Av Mário Romagnoll, nas proximidades da esquina com a rua Lindalva Basseto, nesta Cidade o ora denunciado JUNIOR MISAEL ANAMÁ, agindo com animus furandi, e empregando grave ameaça, exercida com o emprego de arma branca (uma faca, apreendida às fls.11), depois de, dando voz de assalto à vítima ALLAN FELIPE DE OLIVEIRA sob a mira da referida arma branca, reduzi-la à incapacidade de resistência, subtraiu para si 01 bolsa
preta com a inscrição ZIP, contendo em seu interior, materiais escolares, avaliados em R$ 20,00, (fls.11 e 13) tendo o denunciado conseguido deter para si a posse da res furtiva, consumando o delito. ADMISSIBILIDADE 3. Presentes os pressupostos de admissibilidade, intrínsecos e extrínsecos, é de conhecer o recurso. PRELIMINAR DA NULIDADE DO PROCESSO / NÃO FOI REALIZADO O EXAME DE SANIDADE MENTAL DO ACUSADO. 4. Alega nulidade do processo a partir da decisão que dispensou realizar exame de sanidade mental no acusado Junior Misael Anamá deferido na decisão de fl.70. Em audiência de instrução e julgamento, o réu alegou ser viciado em "crack" e ter problemas mentais. O MM. Juiz condutor do processo concedeu a liberdade provisória condicionada a realizar tratamento psiquiátrico na Casa de Saúde de Rolândia (fls.73/4). 4.1. A Casa de Saúde de Rolândia LTDA. S/C, através de seu diretor, em 10/03/2010, oficiou ao Ministério Público da Comarca de Rolândia, que encaminhou ao Juízo de Londrina, as informações de que o internamento do acusado
comprometia a segurança e integridade física dos pacientes (fl.95), requerendo solução ao impasse. 4.1.1. Diante desse quadro, o MM. Juiz condutor do processo revogou a liberdade provisória, decretou a prisão preventiva do acusado a ser cumprida no Complexo Médico Penal em Piraquara, ainda, determinou a imediata realização dos exames de sanidade mental e de dependência toxicológica, (fls.102/3 e fls.114/5). 4.1.2. Os exames não foram realizados quando, em 03/05/2012 a defesa requereu a "extinção" da ação penal sob o argumento de que permaneceu preso por mais tempo da pena, a ser eventualmente imposta ou o imediato julgamento de Junior Misael Anamá, absolvendo-se ou desclassificando para o crime de furto. 4.1.3. Encontra-se acostados aos autos prontuários relativos ao atendimento médico do acusado, na Casa de Saúde Rolândia (fls.273 a 477 e 490/610), sendo que às fls.491/vº , decidiu o MM. Juiz a quo determinar o arquivamento do incidente de sanidade mental do réu Junior Misael Anamá com fundamento na inércia da defesa em se manifestar quanto a insistência na realização do exame de sanidade mental e dependência toxicológica (em 21/11/2012, fls.490vº).
5. Da lei processual penal, retira-se o teor do artigo 149 do Código de Processo Penal1, observe-se: "Quando houver dúvida sobre a integridade mental do acusado, o juiz ordenará, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, do defensor, do curador, do ascendente, descendente, irmão ou cônjuge do acusado, seja este submetido a exame médico-legal." 5.1. Atente-se que a defesa alegou insanidade mental do acusado e dependência toxicológica por uso de "(crack)", prova não realizada embora agendada por diversas oportunidades no Instituto Médico Legal, diante do não comparecimento do acusado. 5.2. A decisão que determinou o arquivamento do incidente restou motivado pelo longo decurso do prazo sem a realização do laudo técnico, ainda, tomando-se por base a afirmação da defesa na peça de fls.171/2 de que o réu não é mais dependente químico, cujo exame seria tão somente para esta constatação, oportunidade em requereu a extinção da ação penal. No mesmo sentido, desistiu da realização da prova o
1 DO INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL DO ACUSADO
Representante do Ministério Público de 1º grau, parecer de fl.162 dos autos em apenso, fl.289 TJ. 5.3. Entretanto, como salientou o d. Procurador de Justiça Ramatis Fávero às fls.625 e ss. o exame pericial buscava também averiguar a imputabilidade penal do acusado, não somente se dependente químico. "Destarte, por certo, era mesmo o caso de se determinar a realização do exame médico legal, o qual todavia não poderia ter sido dispensado com fundamentos estranhos à disciplina normativa do incidente de sanidade mental (art.149 usque 154, do CPP).2 5.3.1. Em vários registros dos autos, principalmente expedidos pela Casa de Saúde Rolândia3 onde o acusado esteve internado por força desta ação penal, tomou-se o conhecimento de que o mesmo seria esquizofrênico, e neste Hospital foi paciente em outras 17 (dezessete) oportunidades, assim como internado em outros estabelecimentos. 5.4. Salienta-se a necessidade de realizar o exame médico-legal para averiguar a sanidade mental do acusado sob pena de grave ofensa ao exercício da ampla defesa, uma vez que no caso concreto, o denunciado foi condenado por roubo 2 Parecer PGJ, fl.634. 3 Ofício de fl.95
sem ter sido previamente afastada a alegada inimputabilidade penal. 5.5. Em havendo fundada dúvida sobre a integridade mental do acusado ao tempo da ação criminosa, o juiz ordenou a requerimento do Ministério Público e do defensor, fosse o acusado submetido a exame médico-legal, cujo procedimento não poderia ter sido arquivado sem o laudo, a rigor do art.149, do Código de Processo Penal. 5.6. Frise-se a alegação da defesa de que o réu superou a dependência química e do Ministério Público quanto a dificuldade da realização do exame não são fundamentos idôneos e por isso, a prova deve ser realizada com a entrega do laudo médico-legal acerca da higidez mental do acusado ao tempo da conduta. 6. Neste sentido a jurisprudência desta Corte: "APELAÇÃO CRIMINAL - CRIME PREVISTO NO ARTIGO 344 DO CÓDIGO PENAL - PRELIMINAR DE MÉRITO ALEGADA PELO RÉU PAULO SÉRGIO AMANTINO - ALEGADA INIMPUTABILIDADE - INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL - DÚVIDA NA HIGIDEZ MENTAL - MOTIVO RELEVANTE - ARTIGO 80 DO CODIGO DE PROCESSO PENAL - SUSPENSÃO DA
SENTENÇA SINGULAR EM RELAÇÃO AO ACUSADO E CISÃO DOS PROCESSOS - ALEGADA AUSÊNCIA DE LIAME SUBJETIVO E COAÇÃO IRRESISTÍVEL PELOS RÉUS DONISETE DO CARMO AMANTINO E PEDRO GRALDO AMANTINO - NÃO EVIDENCIADO - ALEGADA AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO - PLEITO ABSOLUTÓRIO - IMPOSSIBILIDADE - DOLO EVIDENCIADO - CRIME DE NATUREZA FORMAL - RECURSOS CONHECIDOS, ACOLHIMENTO DA PRELIMINAR DE MÉRITO EM RAZÃO DA INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL - CISÃO DOS PROCESSOS - DESPROVIMENTO DO MÉRITO DO RECURSO DE DONISETE DO CARMO AMANTINO E PEDRO GERALDO AMANTINO.I (TJPR - 2ª C.Criminal - AC - 1254213-3 - Apucarana - Rel.: Marcio José Tokars - Unânime - - J. 11.06.2015) 7. Ante o exposto, o voto é no sentido de conhecer, dar provimento ao recurso para acolher a preliminar e anular o processo a partir da decisão de fls.182 dos autos em apenso (2006.5501-1) que determinou o arquivamento do incidente de insanidade mental do recorrente, para ser realizado o exame por laudo médico-legal, após, intimadas as partes e apresentadas as alegações finais, prolatada nova sentença na ação principal.
DECISÃO: ACORDAM os integrantes da 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos em conhecer, dar provimento ao recurso, nos termos do voto relatado. Participaram do Julgamento: Des Arquelau Araujo Ribas (Presidente com voto), Des. José Cichocki Neto e Des. João Domingos Kuster Puppi. Curitiba, 11 de agosto de 2.016. ARQUELAU ARAUJO RIBAS Desembargador Relator
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