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Acórdão
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Certificado digitalmente por: FRANCISCO LUIZ MACEDO JUNIOR Agravo de Instrumento nº 1536362-9, do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba 11ª Vara Cível. Agravante: Unimed Curitiba Sociedade Cooperativa de Médicos. Agravado: Miguel Cassiano Uniczycki (representado). Relator: Desembargador Francisco Luiz Macedo Junior. AGRAVO DE INSTRUMENTO PLANO DE SAÚDE OBRIGAÇÃO DE FAZER NEGATIVA DE CUSTEIO DE TRATAMENTO INTENSIVO COM TERAPIAS MULTIDISCIPLINARES (FISIOTERAPIA PELO MÉTODO PEDIASUIT, TERAPIA OCUPACIONAL, FONOAUDIOLOGIA, ÓRTESE THERATOGS, PSICOMOTRICIDADE RELACIONAL, PSICOLOGIA, PSICOPEDAGOGIA, E OUTROS) PACIENTE COM ATRASO NO DESENVOLVIMENTO NEUROPSICOMOTOR E COM DIGNÓSTICO DE ESPECTRO AUTISTA INDICAÇÃO MÉDICA CARACTERIZADA SITUAÇÃO DE URGÊNCIA E EMERGÊNCIA IMINENTE RISCO DE INVOLUÇÃO DO DESENVOLVIMENTO MOTOR ANTECIPAÇÃO DE TUTELA PRESENÇA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES (ART. 300, DO CPC) RECURSO CONHECIDO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. Trata-se de recurso contra decisão proferida em Ação de Obrigação de Fazer (Autos nº 0008531-95.2016.8.16.0001), que deferiu a tutela pretendida, determinando à ré, "que imediatamente após o recebimento da intimação desta decisão, cumpra a obrigação de fazer
pertinente à autorização e cobertura dos seguintes procedimentos; i- fisioterapia motora; ii- fisioterapia theratogs; iii- órtese theratogs; iv- protocolo pediasuit; v- tratamento neuroevolutivo bobath; vi- interação sensorial; vii-cinesiotape neuromuscular; viii-psicopedagogia; ix- psicomotricidade relacional; x- musicoterapia; xi- hidroterapia, e; xii- equoterapia." (fls. 241/243-TJ)
Sustenta a agravante, em síntese, que não estariam presentes os requisitos autorizadores para a concessão da tutela provisória de urgência.
Defende a legalidade da negativa de cobertura dos procedimentos, a qual, segundo a agravante, estaria amparada pela ausência de cobertura contratual e legal.
Afirma, também, que não se estaria diante de uma situação emergencial.
Requer a concessão do efeito ativo. Ao final, pede o provimento do recurso, para o fim de revogar a decisão agravada.
Despacho inicial às fls. 263/264, indeferindo o efeito suspensivo.
Contrarrazões às fls. 269/276.
Parecer da douta Procuradoria Geral de Justiça às fls. 278/289, opinando pelo não provimento do recurso.
É o relatório,
VOTO:
Presentes os requisitos de admissibilidade, intrínsecos e extrínsecos, de se conhecer o presente recurso.
Cuida-se de agravo de instrumento interposto contra decisão do juízo da 11ª Vara Cível da Comarca de Curitiba que, em Ação de Obrigação de Fazer, deferiu a antecipação de tutela pretendida, por entender presente a verossimilhança das alegações, bem como o periculum in mora.
Pois bem, a tutela antecipada de urgência, inserta no artigo 300, do Novo Código de Processo Civil, "será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo".
Segundo Marinoni, Arenhart e Mitidiero, in Novo Código de Processo Civil1, "para a concessão da tutela antecipada de urgência, diversamente do que ocorria no direito anterior, basta a probabilidade do direito".
Nas palavras dos autores citados, "a probabilidade que autoriza o emprego da técnica antecipatória para a tutela dos direitos é a probabilidade lógica que é aquela que surge da confrontação das
1 Marinoni, Luiz Guilherme. Novo código de processo civil comentado/ Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart, Daniel Mitidiero. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 312.
alegações e das provas com os elementos disponíveis nos autos, sendo provável a hipótese que encontra maior grau de confirmação e menor grau de refutação nesses elementos".2
No que diz respeito ao perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, estes resumem-se na caracterização da urgência, o que se conceituava na legislação anterior como o perigo na demora (periculum in mora).
Sobre o tema, esclarece Medina, que "usa-se, hoje, a expressão perigo de demora (periculum in mora) em sentido amplo, seja para se afirmar que a tutela de urgência é concedida para se evitar dano decorrente da demora processual, seja porque se está diante de uma situação de risco, a impor a concessão de medida de emergência a evitar a ocorrência de dano iminente"3.
A respeito bem esclarecem Marinoni, Arenhart e Mitidiero4:
"A tutela provisória é necessária simplesmente porque não é possível esperar, sob pena de o ilícito ocorrer, continuar ocorrendo, ocorrer novamente, não ser removido ou de dano não ser reparado ou reparável no futuro. Assim, é preciso ler as expressões perigo de dano e risco ao resultado útil do processo como alusões ao perigo de demora. Vale dizer: há urgência quando a demora pode comprometer a realização imediata ou futura do direito. " 2 Op. cit, p. 312. 3 Medina, José Miguel Garcia. Novo Código de Processo Civil Comentado (livro eletrônico): com remissões e notas comparativas ao CPC/1973. 1. ed. São Paulo: Editora Revista dos tribunais, 2015, p. 291. 4 Marinoni, Luiz Guilherme. Novo código de processo civil comentado/ Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart, Daniel Mitidiero. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 313.
Em assim sendo, por ser medida de caráter especial, posto que adianta, ao menos em termos, a decisão final do conflito, deve haver obediência às condições estabelecidas na lei, para a sua concessão, sem que com isso sejam causados prejuízos às partes.
Tais requisitos ou condições, como se disse, encontram- se elencados no artigo 300 do Novo Código de Processo Civil, dentre as quais, destaca-se a probabilidade do direito invocado (fumus boni iuris) e o perigo de dano (periculum in mora).
Na hipótese, verifica-se que para o autor, ora agravado, menor impúbere, representado por seu genitor, diagnosticado com transtorno de espectro autista (TEA) e atraso no desenvolvimento neuropsicomotor, foram indicadas pelo seu médico neuropediatra, as seguintes terapias: fisioterapia motora; fisioterapia theratogs; órtese theratogs; protocolo Pediasuit; tratamento neuroevolutivo bobath; interação sensolrial; cinesiotape neuromuscular; psicopedagogia; psicomotricidade relacional; musicoterapia; hidroterapia, e; equoterapia.
Todavia, inobstante a necessidade e urgência do tratamento, a agravante se recusa a liberar o procedimento, ao argumento de ausência de cobertura.
No caso, a antecipação de tutela foi deferida nos termos da decisão de fls. 241/243, vez que presentes a probabilidade do direito, em vista da comprovada necessidade dos tratamentos em questão, bem como da urgência destes, a fim de evitar a progressão da doença que
acomete o agravado, bem como a regressão do seu desenvolvimento neuropsicomotor, além de danos temporários e/ou permanentes nas funções diárias do paciente.
Conveniente citar, por oportuno, parte do parecer da douta Procuradoria Geral de Justiça:
"(...), a concessão da referida liminar encontra-se condicionada à presença dos pressupostos previstos no artigo 300, do novo Código de Processo Civil, consistentes no provável direito do autor e existente perigo de dano ou risco àquele resultado. A tutela liminar específica foi devidamente deferida pelo magistrado singular, pois conforme fundamentado na decisão agravada o autor é portador de doença grave e a demora e interrupção dos tratamentos pode prejudicar o seu desenvolvimento. Sendo assim, não merecem prosperar as alegações da agravante ao afirmar que os médicos assistentes não relataram o caráter emergencial dos tratamentos, pois o próprio quadro clínico do agravado demonstra a necessidade de imediatismo das terapias para a melhora na saúde do menor, bem como para o avanço de seu desenvolvimento, conforme relatórios dos médicos supracitados. " (fl. 282) Ademais, resta incontroverso que o agravado possui transtorno de espectro autista (TEA) e atraso global no desenvolvimento motor.
Diante desse quadro clínico restou provada a necessidade de ser submetido a específico tratamento terapêutico, com o objetivo de intensificar o seu desenvolvimento neuropsicomotor, independência e melhoria na sua qualidade de vida. E, isto, pelo plano de saúde de assistência médico-hospitalar, que contratou.
A respeito, conveniente citar o relatório médico assinado pela fisioterapeuta, Dra. Graziele Nicolini de Souza, a qual atesta a necessidade deste tratamento especializado e específico, a fim de evitar diversas intercorrência clínicas e involuções dos ganhos obtidos com os tratamentos, bem como a melhora da qualidade de vida do segurado.
Confira-se:
"O menor Miguel Cassiano Uniczycki, nascido dia 28/07/2011, com diagnóstico clínico de Espectro Autista e Atraso no desenvolvimento neuropsicomotor (DNPM), CID F84.0, foi avaliado nesta data pelas seguintes especialidades: fisioterapia, fonoaudiologia, musicoterapia, psicologia, psicopedagogia e terapia ocupacional. (...) A avaliação ocorreu por meio de: avaliação exploratória, mobilizações e posicionamentos, testes específicos por meio de atividade lúdica, sendo assim, pode-se verificar atraso global do desenvolvimento motor. O paciente apresenta bom controle de cabeça e tronco, marca independente, independência nas trocas de postura, porém verificamos a presença de atraso na aquisição da fala, poucas vivências psicomotoras com déficits nos aspectos psicomotores tais como coordenação motora ampla e fina, equilíbrio dinâmico, organização temporal e espacial, propriocepção, pular e imagem corporal, além de alterações no controle e expressão da força muscular. Foi observado atrasos na formação de conceitos e atenção sustentada, integração cognitiva, regulação de comportamentos, demonstração agitação psicomotora, déficit importante de atenção e concentração, reconhecimento corporal, experiência do "eu", conduta social, habilidades interpessoais, auto expressão, integração e estimulação sensorial deficitárias necessitando de estimulação, além de apresentar dificuldades na realizadas das atividades de vida diária (AVD's)
Contudo, verifica-se a necessidade de tratamento interdisciplinar: fonoaudiologia, fisioterapia motora, fisioterapia TheraTogs, Protocolo PediaSuit com fisioterapia e Terapia Ocupacional, Tratamento Neuroevolutivo Bobath, Integração Sensorial, Cinesiotape neuromuscular, psicomotricidade relacional, musicoterapia, psicologia, psicopedagogia, hidroterapia, equoterapia e terapia ocupacional, todos disponibilizados na Neurokids. (...). " (fl. 122) (transcrição conforme original)
"(...). Para obter ganhos em seu desenvolvimento neuropsicomotor e social, como melhora da motricidade ampla e fina, noção temporal e especial melhora do equilíbrio dinâmico, evitando quedas, controle de força muscular, além de melhor convívio social, facilitando e melhorando seu desempenho escolar, entre outros objetivos, é necessário a intervenção intensiva terapêutica em diversas áreas, entre elas o tratamento intensivo com o protocolo PediaSuit. (...). Conclusão A introdução concomitante das terapias, conforme descrição abaixo, facilitarão o seu desenvolvimento tendo em vista que o paciente necessita realizar as mesmas, em função do seu atraso neuropsicomotor global, acarretando assim diversas intercorrências clínicas, devido à ausência de tratamentos adequados para a sua melhoria tônica, postural, sensorial, perceptiva, respiratória e motora. O atendimento terapêutico deve levar em conta sempre as etapas do DPM normal, e utilizar vários tipos de estimulação sensitiva e sensorial. Por se tratar de patologias de origem Neurológico a falta das terapias de Fisioterapia motora, Fonoaudiologia, Terapia Ocupacional, entre outras, são de grande relevância, e deverão ser realizadas também nos intervalos do Pediasuit para a sua manutenção, e evitar assim as involuções dos ganhos obtidos na terapia intensiva do Pediasuit. (...).
Face ao exposto e de acordo com as condições físico-motoras-sensoriais-sociais do paciente em questão, visando intensificar o seu desenvolvimento neuropsicomotor, independência e melhoria na sua qualidade de vida são indicados para início imediato e urgente por período que se fizer necessário as terapias a seguir: (...) (fl. 125-TJ) (Transcrição conforme original) Portanto, vejo presente à prova inequívoca, apta a convencer sobre a plausibilidade do direito invocado. O fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação decorre da própria progressividade da doença, que podem acarretar regressão do desenvolvimento neuropsicomotor do paciente, sendo que a urgência do tratamento é visível e, resta óbvio, que a demora na solução definitiva da lide, poderia causar danos temporários e/ou permanentes nas funções diárias do agravado.
Assim, indiscutivelmente, se faz necessária uma atitude urgente, a fim de preservar a saúde do segurado. Qualquer burocracia no atendimento das necessidades médicas do agravado poderá importar em prejuízo a sua vida e saúde. Só isso já seria suficiente para manter a liminar na forma como deferida, pois evidente o receio de dano irreparável.
No mesmo sentido:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - INSURGÊNCIA DA RÉ - TERAPIAS MULTIDISCIPLINARES - PARALISIA CEREBRAL (LEUCOMALÁCEA PERIVENTRICULAR) - TERAPIAS QUE VISAM RETARDAR OU POSTERGAR A EVOLUÇÃO DO QUADRO - REQUISITOS DO ART. 273, I, DO
CPC (ART. 300 DO NOVO CPC) PRESENTES - DESNECESSIDADE DE PREVISÃO NO ROL DE PROCEDIMENTOS DA ANS - CONTRATO QUE PREVÊ AS TERAPIAS - AUSÊNCIA DE PROVA DE EXCLUSÃO ESPECÍFICA NESTE MOMENTO PROCESSUAL - INTERPRETAÇÃO FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO, NESTA FASE PROCESSUAL, DA CIÊNCIA DA GENITORA DO AGRAVADO A RESPEITO DA PRÉ-EXISTÊNCIA DA DOENÇA - IMPOSSIBILIDADE DE DETERMINAR A CONCESSÃO DOS TRAMENTOS (PEDIASUIT, FISIOTERAPIA COM THERA TOGS E ORTESE THERA TOGS) - REFORMATIO IN PEJUS - DECISÃO MANTIDA. Recurso conhecido e desprovido. (TJPR - 8ª C.Cível - AI - 1355166-5 - Curitiba - Rel.: Themis Furquim Cortes - Unânime - - J. 02.06.2016) A propósito, conveniente destacar as considerações de Medina:
"A cognição, face a urgência, é sumária não apenas quanto à existência do direito que se visa proteger, mas, também, quanto ao próprio perigo. Aqui, entram em jogo, dentre outros fatores, saber se é mesmo provável que o dano poderá vir a acontecer caso não concedida a medida, se sua ocorrência é iminente, se a lesão é pouco grave ou se seus efeitos são irreversíveis, se o bem que o autor pretende proteger tem primazia sobre aquele defendido pelo réu (o que envolve questão atinente à importância do bem jurídico, como se diz infra) etc. Ao analisar se há urgência, assim, não restringe-se o magistrado a verificar se algo pode vir acontecer muito em breve. Visto de outro modo, o termo "urgência" deve ser tomado em sentido amplo5". Por todo o exposto, verifica-se que o plano de saúde deve liberar os tratamentos solicitados pelo médico, necessários ao
5 Medina, José Miguel Garcia. Novo Código de Processo Civil Comentado (livro eletrônico): com remissões e notas comparativas ao CPC/1973. 1. ed. São Paulo: Editora Revista dos tribunais, 2015, p. 291
desenvolvimento neuropsicomotor do menor segurado.
Diante do exposto, VOTO por CONHECER o recurso e NEGAR-LHE PROVIMENTO, mantendo a decisão agravada, nos termos deste voto.
ACORDAM os Membros integrantes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade de votos, em CONHECER o recurso e NEGAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto do Relator.
Participaram do julgamento os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Vilma Régia Ramos de Rezende (presidente sem voto), Domingos José Perfetto e Coimbra de Moura.
Curitiba, 10 de novembro de 2016.
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