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Acórdão
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Certificado digitalmente por: JOSE JOAQUIM GUIMARAES DA COSTA AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1.022.672-1 FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA 13ª VARA CÍVEL AGRAVANTE: CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASIL - CASSI AGRAVADA: LORILENE SÁ GOMES RELATOR: DES. J.J. GUIMARÃES DA COSTA AGRAVO DE INSTRUMENTO. MEDIDA CAUTELAR INOMINADA. DEFERIMENTO LIMINAR DETERMINANDO A LIBERAÇÃO DE TRATAMENTO DOMICILIAR, DENOMINADO "HOME CARE", SOB PENA DE MULTA. FORMAL INCONFORMISMO. MEDIDA EXTRAPOLA OS LIMITES CONTRATUAIS. INCONGRUIDADE. SERVIÇO CONSTITUI DESDOBRAMENTO DO TRATAMENTO HOSPITALAR CONTRATUALMENTE PREVISTO. PRESENÇA DE INDICAÇÃO E REAL NECESSIDADE DO TRATAMENTO, SOLICITAÇÃO E CONSENTIMENTO DA PACIENTE E SEUS FAMILIARES, INEXISTÊNCIA DE DESEQUILÍBRIO CONTRATUAL. PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO. PRECINDIBILIDADE. PRESENÇA DE PRESSUPOSTOS À CONCESSÃO DA MEDIDA ACAUTELATÓRIA. DECISÃO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de agravo de instrumento nº 1.022.672-1, provenientes da 13ª Vara da Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, em que figuram como agravante a Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil - Cassi e agravada Lolirene Sá Gomes.
RELATÓRIO Cuida-se de expediente recursal oposto frente à r. decisão de fls. 144-TJ, datada de 17.01.2013, em que, nos autos nº 64182-88.2011.8.16.001, de medida cautelar inominada, promovida por Lorilene Sá Gomes, em desfavor de Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil - CASSI, foi deferida liminar para determinar que a agravante liberasse tratamento domiciliar, denominado "home care", à agravada, sob pena de multa no valor de R$1.000,00 (um mil reais), in verbis: "A ré admite na contestação que há previsão contratual para o custeio de atendimento domiciliar (`home care'), prescrito pelo médico assistente como indispensável à saúde e ao bem- estar da autora (fl. 30), mas afirma que a situação da demandante não exige cuidados nesse grau. Para isso, apresentou o `laudo' de fls. 112/117. No entanto, não parece que a argumentação de fl. 112 e a escolha aparentemente arbitrária de duas situações na tabela de fls. 114/116 possa ser contraposta à indicação médica, também não havendo evidência de que o procedimento adotado pela ré para negar o atendimento domiciliar tenha respaldo no contrato. Nada a respeito se vê no regulamento de fls.17/29 e também nada trouxe a ré com a contestação que demonstrasse a submissão das partes, em razão do contrato, à tabela de avaliação da ABEMID. Por ora, parece mais do que suficiente a indicação pelo médico assistente, do que se extrai com segurança tanto o fumus boni iuris quanto o pericilum in mora. Este último, aliás, ocorre imediatamente da indicação de que a autora, restrita ao leito, necessita de cuidados continuados de enfermagem para alimentação e higiene. (...) Presentes, portanto, os requisitos legais, defiro liminarmente a medida cautelar para determinar à ré CASSI que, no prazo de 05 dias, sob pena de incorrer em multa de R$1.000,00 (mil reais) por dia de atraso, autorize e garanta a cobertura, à autora Lorilene Sá Gomes, de internação/tratamento domiciliar, no sistema `home care', em seu endereço residencial". Inconformada, relata a agravante, em suas razões recursais de fls. 04/10, que a agravada ajuizou a presente medida cautelar objetivando compelir a liberação da cobertura para tratamento denominado "home care", visto que teve diagnosticada doença de Alzheimer e, diante da fragilidade de sua saúde e do risco de infecção, seu médico assistente recomendou a internação em ambiente domiciliar. Aduz que o pedido liminar foi acolhido pelo magistrado singular, determinando-se a imediata liberação e implantação do tratamento à agravada, sob pena de multa diária de R$1.000,00 (um mil reais). Afirma que deu imediato cumprimento à ordem e encaminhou equipe médica para a residência da agravada, acentuando, porém, que a r. decisão hostilizada revela-se equivocada, uma vez que não pode ser compelida a prestar tal atendimento à pessoa que não preenche os requisitos contratuais, de forma a extrapolar os limites de cobertura. Assevera que inexiste nos autos indicação médica para o internamento da agravada, seja em regime hospitalar, seja em regime domiciliar, mas tão somente recomendação de cuidados especiais para mobilização no leito e no auxílio para alimentação e higiene. Ressalta que para adoção do regime "home care", é necessária a expressa prescrição do médico responsável, com exposição de motivos claros para substituição do ambiente hospitalar, fazendo constar, inclusive, a especificação detalhada do local do tratamento e de todos os serviços, além dos equipamentos necessários, o que não se vislumbra no caso vertente. Sobreleva estar ausente o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, todavia, caso conclua-se pela manutenção da liminar, necessária a prestação de caução, a fim de garantir a efetividade em caso de reversão da medida em decisão final. Ambiciona a atribuição de efeito suspensivo, para o fim de sustar os efeitos da decisão recorrida e o provimento final do recurso, para o fim de ser revogada a liminar concedida. Às fls.149/153-TJ, o agravo deixou de ser conhecido, em decisão monocrática, em face de sua extemporaneidade. Interpostos embargos de declaração às fls. 158/159-TJ, os mesmos foram acolhidos, eis que demonstrado o equívoco da decisão de publicação elaborada pelo juízo de origem, reconhecendo-se, consequentemente, a tempestividade do agravo, determinando-se o retorno dos autos para apreciação do pleito de efeito suspensivo. Por novo equívoco, foi determinada a remessa dos autos à seção de baixa de processos cíveis, sendo remetidos ao juízo de origem, em 10.09.2013 (fls. 173-TJ), retornando a este relator somente em 28.04.2016. Em cognição vestibular (fls. 180/182-TJ), foi determinado o processamento do agravo de instrumento e recebido unicamente no efeito devolutivo. A agravada apresentou contrarrazões, as quais se fazem presentes às fls. 190/198-TJ, pugnado pela manutenção da ordem liminar concedida. Após, vieram os autos conclusos. É o relatório. VOTO Mostram-se presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, intrínsecos (legitimidade, interesse, cabimento e inexistência de fato impeditivo e extintivo) e extrínsecos (tempestividade e regularidade formal), como condição irretorquível ao conhecimento do recurso. Cabe esclarecer que já se encontra em vigor o Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) e, embora as leis de natureza processual se apliquem de imediato aos processos em curso, a decisão recorrida foi proferida e publicada antes da sua vigência, precisamente em 19.02.2013, comportando, em consonância com o artigo 14 do NCPC, uma análise sob a égide do antigo CPC (Lei nº 5.869/73). Pois bem. Inicialmente, insta pontuar que as partes não divergem acerca da cobertura para o tratamento domiciliar à agravada, cingindo-se o inconformismo da operadora de saúde à alegação da ausência dos pressupostos para a medida acautelatória. A questão posta é de fácil resolução e não demanda maiores esforços. E em que pesem as razões expostas no recurso em análise, verifica-se que a decisão monocrática revela-se irrepreensível, não comportando reforma. Infere-se do documento de fls. 68-TJ, prescrito pelo médico assistente, a necessidade da concessão do atendimento domiciliar "home care", indispensável à saúde e ao bem-estar da agravada, diante de seu estado de dependência e imobilidade motora e risco de contrair doenças e infecção hospitalar. Veja-se: "Atesto para os devidos fins que a paciente LORILENE SÁ GOMES, 69 anos, está em acompanhamento neurológico, sob meus cuidados desde agosto de 2006, com diagnóstico de Doença de Alzheimer [cid G30], em estágio acentuado, com comprometimento cognitivo grave. Devido as limitações cognitivas e motoras (segundário a fratura de bacia) a paciente encontra-se restrita ao leito e necessitando de cuidados continuados (24hrs) de enfermagem como mobilização no leito e auxílio para alimentação e higiene pessoal". No mesmo sentido o documento de fls. 69-TJ que não deixa dúvida da presença do periculum in mora. Igualmente, está evidenciado o fumus boni iuris pois é incontroverso de que a agravada é beneficiária do plano de saúde, demonstrando a existência de atestado e declaração médica que justificam o tratamento domiciliar. Ademais, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que, ainda que, em contrato de plano de saúde, exista cláusula que vede de forma absoluta o custeio do serviço de "home care", a operadora do plano será obrigada a custeá-lo em substituição à internação hospitalar contratualmente prevista, desde cumpridos os seguintes requisitos: a) tenha havido indicação desse tratamento pelo médico assistente; b) exista real necessidade do atendimento domiciliar, com verificação do quadro clínico do paciente; c) a residência possua condições estruturais para fazer o tratamento domiciliar; d) haja solicitação da família do paciente; e) o paciente concorde com o tratamento domiciliar; f) não ocorra uma afetação do equilíbrio contratual em prejuízo do plano de saúde (STJ. 3ª Turma. REsp 1.378.707-RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 26/5/2015 e REsp 1.537.301-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 18/8/2015). Nesse contexto, vislumbram-se preenchidos os requisitos ensejadores à medida pleiteada, visto que há atestado do médico assistente (fls. 68-TJ), do qual se percebe a restrição da agravada ao leito e sua dependência total de terceiros, justificando a real necessidade de tratamento "home care"; a solicitação da família, a explícita pretensão de medida cautelar formulada pela própria agravante em receber tal serviço e, como bem demonstrado nos autos, que o tratamento hospitalar seria mais dispendioso do que o serviço de "home care", afastando-se, portanto, a hipótese de desequilíbrio contratual (fls. 70/98-TJ). Por derradeiro, cumpre esclarecer que a ausência de prestação de caução arguida pela recorrente poderá inviabilizar a manutenção do tratamento domiciliar, porque o custo do tratamento a ser utilizado como parâmetro para fins de caução é elevado, como bem registrou a recorrida em sua peça exordial (fls. 42-TJ); consequentemente, não se afigura razoável a exigência de caução diante da situação fática apresentada. Nesse sentido: "PLANO DE SAÚDE - AIDS - CLÁUSULA - RESTRIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE IN CASU - ANTERIOR ATENDIMENTO PELA MESMA MOLÉSTIA - MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FORÇA OBRIGATÓRIA DO CONTRATO EM FACE DAS NORMAS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - DECISÃO FUNDAMENTADA, QUE SE MANTÉM, ENFRENTANDO OS REQUISITOS LEGAIS A TANTO EXIGIDOS - DESPROVIMENTO DO AGRAVO. (...) 3. Dispensa-se a caução quando a própria parte aponta para mera dificuldade, não impossibilidade de eventual devolução das quantias despendidas pela UNIMED. 4. `A exigência da irreversibilidade inserta no § 2º do art. 273 do CPC não pode ser levada ao extremo, sob pena de o novel instituto da tutela antecipatória não cumprir a excelsa missão a que se destina' (STJ - 2ª T., RESP 144.656-ES, Rel. Min. ADHEMAR MACIEL)" (TAPR, 9ª C.Cív., AI nº 0243120-5, Ac. 3575, Rel. ANTONIO RENATO STRAPASSON, Julg.: 04/11/2003). Ressalta-se que a saúde é direito constitucionalmente assegurado, elencado entre aqueles de maior importância para o ser humano, individualmente e para a sociedade. E, sendo permitida à iniciativa privada, que pode explorá-la com objetivo de lucro, deve oferecer, em contrapartida, serviço adequado, de qualidade, que assegure a saúde daquele que contrata o serviço, mantendo-se o respeito às normas constitucionais. Irrepreensível, pois, a sentença monocrática. Destarte, voto pelo não provimento ao agravo de instrumento, mantendo-se incólume a decisão monocrática. DISPOSITIVO ACORDAM os Desembargadores integrantes da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator. Participaram do julgamento os Excelentíssimos Desembargadores Luis Sérgio Swiech (Presidente com voto) e Luiz Cezar Nicolau. Curitiba, 16 de fevereiro de 2017. J.J. Guimarães da Costa Desembargador Relator
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