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Acórdão
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Certificado digitalmente por: CLAYTON COUTINHO DE CAMARGO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº. 1.584.715- 7, DO FORO REGIONAL DE PINHAIS DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA VARA CRIMINAL. RECORRENTES: DOUGLAS AUGUSTO BASTOS, WELINGTON MIQUEIAS BASTOS e RENO JOSE BASTOS. RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ. RELATOR: DES. CLAYTON CAMARGO. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO DECISÃO DE PRONÚNCIA RECURSO DA DEFESA VISANDO ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA RECONHECIMENTO DE EXCLUDENTE DE ILICITUDE CABIMENTO EQUÍVOCO PLENAMENTE JUSTIFICÁVEL LEGÍTIMA DEFESA PUTATIVA CONFIGURADA CONJUNTO PROBATÓRIO QUE REVELA DE FORMA SUFICIENTE QUE OS ACUSADOS AGIRAM ACREDITANDO ESTAREM AMPARADOS PELA EXCLUDENTTE DE ILICITUDE DECISÃO REFORMADA PARA ABSOLVER OS RÉUS RECURSO PROVIDO. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Recurso em Sentido Estrito nº 1.584.715-7, do Foro Regional de Pinhais da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Vara Criminal, em que são Recorrentes DOUGLAS AUGUSTO BASTOS, WELINGTON MIQUEIAS BASTOS e RENO JOSE BASTOS e Recorrido MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ.
1. Trata-se de Recurso em Sentido Estrito em face da decisão (mov. 114.1) que pronunciou os Réus DOUGLAS AUGUSTO BASTOS, WELINGTON MIQUEIAS BASTOS e RENO JOSE BASTOS como incurso no crime previsto no artigo 121, §2º, inciso IV, c/c artigo 14, inciso II, artigo 29 e artigo 69, todos do Código Penal (tentativa de homicídio qualificado por recurso que dificultou a defesa da vítima em concurso de pessoas e concurso material), submetendo-os a julgamento perante o egrégio Tribunal do Júri. Os fatos foram narrados na denúncia nos seguintes termos (mov. 1.2): "Em data de 11 de fevereiro de 2011, por volta das 23h00min, em via pública, na Rua Araguari, próximo ao nº 107, bairro Weisópolis, neste município e foro regional de Pinhais, os denunciados DOUGLAS AUGUSTO BASTOS, WELINGTON MIQUEIAS BASTOS e RENO JOSE BASTOS, agindo através de atos de livre vontade e ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, dirigindo-a para o o fim delituoso, previamente combinados entre si e agindo mediante a clara divisão de tarefas, munidos de armas de fogo (apreendidas, v. Autos de Apreensão de fls. 19,23 e 26), sem possibilitar qualquer atitude defensiva das vítimas, disparam tiros em direção às pessoas de Aline Beatriz Ferreira, Bruno Aurélio Fukuoka e Jéferson Irineu Fukuoka, a quais se encontravam no veículo GM/Corsa, cor branca, placa AIE 0454, causando no menor Jéferson as lesões de natureza grave, descritas no Laudo de Exame de Lesões Corporais nº 15648/2011, de fl. 127. Os denunciados somente não lograram êxito na causação da morte das vítimas, por causa de circunstâncias alheias as suas vontades, eis que o condutor do veículo conseguiu se evadir do local, e, assim, impedir as realização de novos disparos e procurar socorro."
Em suas razões recursais (mov. 143.1), alega a defesa que os Réus nunca tiveram intenção de atingir as vítimas e que a conduta dos Réus está amparada pela legítima defesa putativa, pois se encontravam em clara situação de erro causada pelas circunstâncias do fato, ou seja, houve falsa percepção da realidade. Sustenta que, caso não seja reconhecida a descriminante putativa, deve ser desclassificado o delito de tentativa de homicídio qualificado para lesão corporal. Pugna pelo provimento do recurso, para absolver os Recorrentes ou, subsidiariamente, para que seja desclassificado o delito de tentativa de homicídio qualificado para lesão corporal.
O Ministério Público apresentou contrarrazões (mov. 149.1), pugnando pelo desprovimento do recurso.
Em juízo de retratação, a decisão recorrida foi mantida (mov. 152.1).
A douta Procuradoria Geral de Justiça, através de pronunciamento subscrito pelo eminente Procurador de Justiça Carlos Alberto Baptista, opinou pelo desprovimento do recurso, com exclusão, de ofício, da referência ao concurso material (fls. 12/37). É o relatório. 2. O presente recurso deve ser conhecido, pois preenche os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade recursal.
A presente insurgência recursal se refere à decisão que pronunciou os Réus DOUGLAS AUGUSTO BASTOS, WELINGTON MIQUEIAS BASTOS e RENO JOSE BASTOS como incursos no crime previsto no artigo 121, §2º, inciso IV, c/c artigo 14, inciso II, artigo 29 e artigo 69, todos do Código Penal (tentativa de homicídio qualificado por recurso que dificultou a defesa da vítima em concurso de pessoas e concurso material), submetendo-os a julgamento perante o egrégio Tribunal do Júri.
Sustentam os Recorrentes que agiram amparados pela legítima defesa putativa e, por isso, pugnam pela absolvição sumária. Alternativamente, requerem a desclassificação do delito de tentativa de homicídio qualificado para lesão corporal.
A materialidade e a autoria dos fatos descritos na denúncia restaram demonstradas pelo conjunto probatório dos autos.
Depreende-se dos autos que os acusados são policiais militares e no dia dos fatos a casa dos Réus foi alvo de disparos de arma de fogo e ameaças proferidas por indivíduos em um veículo branco, sendo que em razão disso os vizinhos contataram a Polícia e foi feito um patrulhamento no local, sem êxito. Ocorre que, mais tarde, no mesmo dia, os Réus avistaram um veículo branco passando em baixa velocidade várias vezes diante de sua residência, permanecendo parado na esquina da rua, motivo pelo qual os Réus resolveram averiguar a situação, mas ao se aproximarem do veículo e dar voz de abordagem o mesmo arrancou bruscamente, o que ensejou os disparos realizados pelos Réus no intuito de parar o veículo, ressaltando que somente após os fatos vieram saber que se tratou de um engano.
A versão dos fatos apresentada pelos Réus é consistente e está corroborada pelos depoimentos das vítimas, que confirmaram que os acusados se aproximaram do veículo e falaram para saírem, que imaginaram se tratar de um assalto e arrancaram com o veículo, momento em que foram realizados os disparos.
A testemunha Valdinei José Ferreira, vizinho dos acusados, afirmou que sua residência também foi atingida por pedras alguns momentos antes da suposta tentativa de homicídio e acionou a Polícia.
A testemunha Cláudio da Silva, policial militar, narrou que no dia dos fatos recebeu as ocorrências de pedras atiradas no telhado da residência e de disparos de arma de fogo, que foi até o local dos fatos e os acusados informaram que o veículo suspeito tinha se evadido.
A testemunha Adirley Wittkowski, policial militar, relatou que no dia dos fatos foi contatado por um dos acusados acerca de investidas contra a residência dele, que a equipe policial foi até o local e não acharam suspeitos, que posteriormente o acusado disse que havia avistado um veículo branco suspeito e solicitou reforço policial, que posteriormente o acusado disse que haviam tentado fazer a abordagem do veículo, mas o mesmo tinha se evadido. Nos termos do disposto no artigo 415 do Código de Processo Penal, caberá absolvição sumária quando: "I provada a inexistência do fato; II provado não ser ele autor ou partícipe do fato; III o fato não constituir infração penal; IV demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime." Para que seja acolhida a tese de legítima defesa, portanto, deve haver a comprovação da presença dos requisitos de referida excludente de ilicitude.
No caso, ao contrário do consignado na decisão recorrida, a tese de legítima defesa encontra amparo nos elementos probatórios dos autos, pois existe comprovação plena de que os disparos de arma de fogo desferidos pelos acusados visavam repelir suposta agressão e impedir eventual fuga dos suspeitos.
Com efeito, restou suficientemente demonstrado que os acusados realizaram os disparos de arma de fogo com o único intuito se impedir a fuga daqueles que imaginavam ser os autores de ameaças e tiros contra sua residência momentos antes dos fatos, sem saber que na verdade se tratava de pessoa conhecida e que não tinha relação com a ocorrência anterior.
Tal engano está plenamente justificado diante das investidas realizadas contra a residência dos acusados por indivíduos que por ali transitaram com veículo semelhante ao das vítimas, bem como pelo fato de que as vítimas passaram diversas vezes pelo local em atitude reputada suspeita e se evadiram rapidamente quando realizada a tentativa de abordagem, criando a falsa percepção de que eram os mesmos indivíduos de antes e de que seriam feitos disparos contra a residência dos acusados e seus ocupantes.
Portanto, não há dúvida de que os acusados não tinham intenção de matar ou lesionar as vítimas e de que os fatos decorreram de erro escusável, plenamente justificado pelas circunstãncias, que fez supor situação de fato que, se verdadeira, tornaria a ação legítima.
Logo, não se constata a ocorrência de dolo ou culpa, revelando o conjunto probatório dos autos que os acusados agiram acreditando estarem amparados pela legítima defesa.
Assim, é cabível o reconhecimento da excludente de ilicitude, impondo-se a absolvição sumária do acusado, nos termos do disposto no artigo 20, §1º, do Código Penal e no artigo 415, inciso IV, do Código de Processo Penal.
Nesse sentido, é o entendimento manifestado pela colenda 1ª Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça:
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - HOMICÍDIO CONSUMADO E HOMICÍDIO TENTADO - ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA - ACOLHIMENTO - CONJUNTO PROBATÓRIO DEMONSTRA QUE O RECORRENTE AGIU ACREDITANDO ESTAR AMPARADO PELAS EXCLUDENTES DE ILICITUDE DA LEGÍTIMA DEFESA E DO ESTRITO CUMPRIMENTO DE DEVER LEGAL - ERRO DE TIPO INEVITÁVEL (ART. 20, §1º, PRIMEIRA PARTE, CP) - PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE HOMICÍDIO CULPOSO PREJUDICADO - RECURSO PROVIDO, PARA O FIM DE ABSOLVER SUMARIAMENTE O ACUSADO, NOS TERMOS DO ART. 415, INC. IV, CP. (TJPR - 1ª C.Criminal - RSE nº 1599737-6 - Rel.: Antonio Loyola Vieira - DJ. 22.02.2017)
Destarte, deve ser dado provimento ao recurso para absolver sumariamente os Réus. 3. Ex positis:
ACORDAM os integrantes da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento ao recurso.
Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Des. ANTONIO LOYOLA VIEIRA (sem voto) e dele participou o Exmo. Sr. Des. MIGUEL KFOURI NETO e o Exmo. Sr. Des. PAULO MACEDO PACHECO, ambos acompanhando o Relator.
Curitiba,23 de março de 2017 Des. CLAYTON CAMARGO Relator
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