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Acórdão
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Certificado digitalmente por: PAULO EDISON DE MACEDO PACHECO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº. 1.611.031-5 VARA CRIMINAL DA COMARCA DE CASTRO RECORRENTE: LUIZ GONZAGA DA SILVA MELLO RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ RELATOR: MACEDO PACHECO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO. PROVA DA MATERIALIDADE E INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA. PRETENDIDA DESPRONÚNCIA. IMPROCEDÊNCIA. PROVAS COLHIDAS NO INQUÉRITO POLICIAL E EM JUÍZO QUE APONTAM O ACUSADO COMO POSSÍVEL AUTOR DO DELITO. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 413, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ADMISSIBILIDADE DOS INDÍCIOS COLHIDOS NA FASE EXTRAJUDICIAL PARA FUNDAMENTAR A DECISÃO DE PRONÚNCIA. DECISÃO QUE NÃO DEMANDA JUÍZO DE CERTEZA E SIM DE PROBABILIDADE. QUALIFICADORAS DO MEIO CRUEL, POR TRAIÇÃO E DISSIMULAÇÃO. EXISTÊNCIA DE VERTENTE PROBATÓRIA A AMPARAR SUAS INCLUSÕES NA PRONÚNCIA. SUPRESSÃO SOMENTE VIÁVEL QUANDO EMERGE A TODA EVIDÊNCIA E DE FORMA INEQUÍVOCA DA PROVA CARREADA AOS AUTOS AS SUAS NÃO OCORRÊNCIAS. RECURSO DESPROVIDO. 1. Existindo prova da materialidade e indícios suficientes da autoria, é de rigor o encaminhamento do réu a julgamento pelo Tribunal do Júri, ficando o exame aprofundado do conjunto probatório a cargo do Conselho de Sentença. 2. Conforme o entendimento jurisprudencial dos Tribunais Superiores, nada obsta que a pronúncia se fundamente em elementos colhidos durante a fase policial. 3. A exclusão das qualificadoras constantes na denúncia somente podem ser afastadas pelo juiz na pronúncia se existir prova cabal nos autos de suas não ocorrências, havendo dúvida, devem ser mantidas, sob pena de usurpação de competência do Tribunal do Júri. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Recurso em Sentido Estrito nº 1.611.031-5, da Vara Criminal da Comarca de Castro em que é recorrente Luiz Gonzaga da Silva Mello e recorrido o Ministério Público do Estado do Paraná. Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo réu Luiz Gonzaga da Silva Mello contra a r. decisão da Drª Erika Watanabe que o pronunciou como incurso nas sanções do art. 121, §2º, incs. III e IV, do Código Penal, para que seja submetido a julgamento popular. Narra a denúncia: "Entre a noite do dia 08 e madrugada do dia 09 de fevereiro de 2011, em horário não especificado nos autos, na Rua Marechal Deodoro, Vila Rio Branco, nesta cidade e Comarca de Castro/PR, o denunciado LUIZ GONZAGA DA SILVA MELLO, com vontade livre e consciente, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, por motivo até agora ignorado, matou a vítima Dhieynifer Lisa Marcondes,
utilizando-se, para tanto, de objeto contundente, com o qual desferiu vários golpes contra a cabeça da vítima, causando- lhe as lesões descritas no laudo de exame de necropsia de fls. 48, que foram a causa eficiente de sua morte. De acordo com os autos, o crime foi praticado mediante tortura, pois o denunciado efetuou sucessivos golpes na vítima, de modo que lhe impingiu maior sofrimento até a morte, já que utilizou instrumento contundente, resultando em várias esquimoses (sic) na face, nariz e lábio superior, hematomas em todo o couro cabeludo e hemorragia no cerebelo, ainda, foi constatada escoriações do lado esquerdo abaixo de seu seio, decorrendo a morte de traumatismo crânio encefálico. Finalmente, o crime foi praticado à traição e mediante dissimulação, isso porque, a vítima possuía um relacionamento amoroso com o denunciado, e estudava no período noturno, sendo certo que, durante a semana, Luiz buscava Dhieynifer com sua motocicleta azul, após os estudos dela, e no dia dos fatos, fingindo querer apenas novo encontro com a vítima, Luiz procedeu da mesma maneira, mas, na verdade, sua intenção era matá-la, e assim o fez. A vítima foi enganada e mantida em erro, pois efetivamente acreditava que naquela noite haveria apenas um novo encontro amoroso com o denunciado, tanto é que, às 16h44min do dia 08/02/11, enviou mensagem SMS para Luiz com os dizeres "Vamos nos ver hj?", e às 21h28min, outro recado dizendo "Na hora que eu sai eu t ligo" (fls. 55-IP)." (fls. 02/04).
Nas razões, a defesa do réu sustenta a fragilidade dos indícios acerca da autoria, alegando que não existem testemunhas presenciais do homicídio, pois a acusação somente imputou a conduta ao acusado em razão deste manter um relacionamento amoroso com a vítima e pelo fato de ter aceitado uma carona na motocicleta do denunciado, o que não se revelariam indicativos suficientes para a sua pronúncia. Afirma que as mensagens de texto enviadas pela ofendida ao acusado são de conteúdo ameno, não indicando o réu como o autor do ilícito, além do que a prova testemunhal demonstrou que o denunciado compareceu ao velório da vítima, demonstrando abalo emocional com a sua morte. Aduz que os testemunhos de defesa no sentido de que o acusado passou o dia dos fatos em sua residência foram desconsiderados pela Magistrada. Ainda, pede a exclusão das qualificadoras do meio cruel, sustentando a ausência de indicativos de que o acusado pretendesse torturar a ofendida, bem como da traição e dissimulação, uma vez que teria sido a vítima que teria marcado o encontro amoroso com o acusado. Requer, pois, a despronúncia ou ainda, a exclusão das qualificadoras, sob a alegação de que são manifestamente improcedentes (fls. 199/201). O Ministério Público apresentou contrarrazões (fls. 209/221). Em sede de juízo de retratação foi mantida a decisão por seus próprios fundamentos (fls. 223). A douta Procuradoria Geral de Justiça, em parecer do zeloso Dr. Alfredo Nelson da Silva Baki, manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 237). É o relatório.
Sustenta a defesa a ausência de indícios de autoria aptos para pronunciar o réu, propugnando pela sua despronuncia. Ainda, requer a exclusão das qualificadoras do meio cruel, da traição e dissimulação. Não assiste razão ao recorrente. Com efeito, as decisões de pronúncia são revestidas do simples juízo de probabilidade, em que o magistrado verifica apenas a viabilidade da acusação a partir da constatação da materialidade do crime e de indícios suficientes de autoria (art. 413, CPP). As dúvidas quanto às circunstâncias do fato legitimam a pronúncia para que as incertezas sejam dirimidas pelos jurados, sobretudo a fim de não usurpar a competência constitucional que lhes é afeta. Nesse sentido leciona Eugênio Pacelli, conforme se extrai do trecho a seguir transcrito da obra Curso de Processo Penal, Editora Atlas, 16ª edição, 2012, página 723: "Não se pode perder de vista que a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida é do Tribunal do Júri, conforme exigência e garantia constitucional. Por isso, só excepcionalmente é que tal competência poderá ser afastada. Na fase da pronúncia, o que se faz é unicamente o encaminhamento regular do processo ao órgão jurisdicional competente, pela inexistência das hipóteses de absolvição sumária e de desclassificação. Essas duas decisões, como visto, exigem a afirmação judicial de certeza total quanto aos fatos e à autoria por isso são excepcionais."
No caso, a materialidade fática restou demonstrada pelo Boletim de Ocorrência (fls. 09), auto de exibição e apreensão (fls. 18,33 e 40), laudo de necropsia (fls. 37), laudo de exame de local de morte (fls. 42/47), e laudo de exame em dispositivos móveis (fls. 55/64). De igual modo, a prova produzida no feito confere suporte idôneo acerca dos indícios de autoria, legitimando a pronúncia. Na fase extrajudicial, a testemunha Josué Romão afirmou: "Que era amigo e vizinho da vítima; que costumava ver a vítima com um rapaz que tinha uma moto azul; que esse rapaz trabalhava junto com o padrasto da vítima e por isso frequentava a residência deles, pois faziam churrascos aos finais de semana; que quando o declarante retornava do trabalho, à tarde, sempre via o rapaz com a moto esperando a vítima, sendo que ela chegava, subia na moto e ambos saíam dalí; que esse local fica perto de onde Dieynifer foi encontrada morta; que na noite dos fatos (08/02/2011) lembra de ter visto o motoqueiro no mesmo lugar, aproximadamente 50 metros de distância, esperando pela vítima e, da mesma forma, ela subiu na moto e foram em direção ao local do crime; que Dieynifer era "bem fechadona", quieta e o declarante nunca viu a vítima com outro rapaz; que melhor esclarecendo, o depoente informa que na noite do dia 08 viu Dieynifer subindo na moto azul, há aproximadamente 50 metros de onde ela foi encontrada morta e o condutor da motocicleta a levou em direção ao local onde ela foi encontrada morta; que apresentada a fotografia de Luiz Gonzaga da Silva Mello, o declarante reconhece sem sombra
de dúvida, que é o mesmo rapaz que sempre esperava pela vítima com a motocicleta azul." (fls. 81). (Sic). A testemunha Josué Romão afirmou em Juízo que viu a vítima andando na motocicleta do réu por ao menos 4 (quatro) ocasiões, inclusive 2 (dois) dias antes dos fatos; que sabia do relacionamento entre ambos. (fls. 150 e mídia digital, fls. 151). A informante Odlara Aparecida da Rosa, mãe da vítima, afirmou em Juízo que soube do relacionamento de sua filha com o réu somente após o crime; que o réu frequentava sua residência pois era amigo de seu marido, que soube por um vizinho que sua filha foi vista pela última vez antes de ser morta em uma motocicleta azul, semelhante à de propriedade do acusado. (fls. 148 e mídia digital, fls. 151). A testemunha Maria Rosa de Jesus afirmou na fase judicial que a ofendida lhe confidenciou que gostava muito do réu e estava feliz por ter um encontro com ele, apesar do mesmo "fazer muita coisa errada". (fls.147 e mídia digital, fls. 151). As testemunhas Evelin da Silva Ferreira e Edlin da Silva Ferreira confirmaram que a vítima mantinha um relacionamento amoroso com o acusado. (fls. 158 e 159, e mídia digital, fls. 151). O informante Anderson Marcondes, pai da vítima, quando ouvido em Juízo alegou que soube através de terceiros dos fatos; que a pessoa de Josué lhe falou que viu Dhieynifer com o réu um dia antes do crime; que não sabe o motivo que teria levado o réu a matar sua filha. (fls. 157 e mídia digital, fls. 151).
As informantes Katia Regina Blos e Kelly Regina Blos Mello, esposa e filha do acusado, afirmaram que o réu permaneceu em casa nos dias dos fatos, contudo não souberam precisar que dia o crime teria ocorrido. (fls. 160/161 e mídia digital, fls. 151). Na fase extrajudicial, o acusado afirmou: "(...) que em relação a Dhieynifer, o declarante afirma que eram bastante amigos pois a conhecia desde criança; que não havia um relacionamento mais íntimo entre o declarante e a menina Dhieynifer, havendo apenas uma duas vezes que teriam ido até lanchonete e o parque Lacustre conversarem, mas se falavam umas duas ou três vezes por semana por telefone, sendo que Dhieynifer sempre dava um toque no celular do declarante e, às vezes, o declarante retornava as ligações para ela, porém não era nada às escondidas, sendo de conhecimento dos pais de Dhieynifer esses contatos; que pelas 06:15 hs do dia em que Dhieynifer foi encontrada morta, o declarante recebeu ligação de Leandro preocupado por Dhieynifer não ter retornado da escola e por isso Leandro não iria trabalhar com o declarante; (...) que receu (sic) o último telefonema de Dhieynifer na terça-feira, à tarde, pelas 18;00 hs e que Dhieynifer estava alegre ao telefone dizendo que ia voltar a estudar, e isto teria sido entre 17:00 hs e 18:00 hs do dia 08/02/11, e o declarante estava no serviço em Ponta Grossa, no CPL da Batavo, para onde o declarante se deslocou no ônibus da empresa Selmer fretado para transporte dos trabalhadores; (...)." (fls. 36). Sic.
Quando interrogado em Juízo o réu negou a prática delitiva, afirmando que `ficou com a vítima por duas vezes; se encontrou com a ofendida somente por duas vezes, uma em um bar e outra no parque, não se recordando de datas; que conversavam por telefone com frequência, mas no dia dos fatos não respondeu às mensagens da vítima pois já havia ido dormir; que permaneceu em sua casa durante todo o dia dos fatos; que possui uma motocicleta azul; que não conhece a pessoa de José Romão e não sabe o motivo deste o estar incriminando falsamente. (fls. 164 e mídia digital, fls. 151). Como visto, o acusado Luiz Gonzada primeiro afirmou na fase extrajudicial que não mantinha um relacionamento íntimo com a vítima e que não se encontrava na Comarca de Castro no dia dos fatos. Em Juízo, afirmou que manteve um curto relacionamento com a vítima, e que no dia dos fatos não saiu de sua residência. Já as demais testemunhas de acusação confirmaram que o réu mantinha relacionamento com a ofendida, tendo a testemunha Josué Romão afirmado que presenciou o acusado buscar a ofendida em sua residência por, ao menos, 4 (quatro) oportunidades, sendo que esta testemunha, quando ouvido na fase extrajudicial, declarou que presenciou o réu buscando a vítima na noite do crime, no que se dirigiram para o local onde esta foi encontrada morta, além de ter reconhecido por fotografia o acusado como o condutor da motocicleta. Desta feita, confrontando todo conjunto probatório, se pode concluir que há indícios suficientes a apontar o acusado como sendo o possível autor do homicídio, uma vez que a versão da defesa de negativa de autoria não se mostrou plena e indubitável, sobretudo porque desencontros na versão do réu em Juízo daquela prestada no primeiro interrogatório na fase extrajudicial, bem como a testemunha Josué Romão confirmou, também na delegacia, que o denunciado teria buscado a vítima na noite dos fatos, se dirigindo com ela para a direção onde o corpo da ofendida foi localizado.
Ainda, verifica-se inconsistências entre o alegado pelo réu em seu primeiro depoimento com o laudo pericial efetuado no telefone celular da vítima (fls. 55), que confirmou que esta mandou duas mensagens ao acusado na tarde e noite do dia 08/02/2011, ou seja, horas antes do crime, combinando de se encontrar com o acusado, sendo que o conteúdo das mensagens e o horário em que foram enviadas (16:44 e 21:28 hrs) diferem do alegado pelo réu em seu depoimento. Assim, as provas até agora colhidas não podem conduzir a um Juízo de despronúncia diante dos indícios de autoria e prova da materialidade, ressaltando-se que não se está a afirmar, de modo categórico, que o réu tenha praticado o crime homicídio, mas, sim, que há indícios de autoria suficientes para a pronúncia. A propósito, vale transcrever: "Somente quando evidente a inexistência de crime ou a ausência de indícios de autoria, em decorrência de circunstâncias demonstradas de plano e estreme de dúvidas, tão-somente assim, o Julgador pode deixar de pronunciar o acusado." (STJ, 5ª T., HC nº 70.016/DF, Rel. Min. GILSON DIPP, DJU 12.03.2007). Além disso, cumpre destacar que a jurisprudência dos Tribunais Superiores admite a validade de indícios de autoria decorrente dos depoimentos coletados no inquérito policial para a pronúncia, uma vez que não se está a falar em condenação, mas somente em admissibilidade da acusação para a submissão do réu à Julgamento pelo Tribunal do Júri, não havendo no caso qualquer ofensa a preceitos constitucionais ou ao disposto no art. 155 do Código de Processo Penal.
Nesse sentido: "(...) Conforme a jurisprudência do STF "ofende a garantia constitucional do contraditório fundar-se a condenação exclusivamente em testemunhos prestados no inquérito policial, sob o pretexto de não se haver provado, em juízo, que tivessem sido obtidos mediante coação" (RE 287658, 1ª T, 16.9.03, Pertence, DJ 10.3.03). 2. O caso, porém, é de pronúncia, para a qual contenta-se o art. 408, CPP com a existência do crime "e de indícios de que o réu seja o seu autor". 3. Aí - segundo o entendimento sedimentado - indícios de autoria não têm o sentido de prova indiciária - que pode bastar à condenação - mas, sim, de elementos bastantes a fundar suspeita contra o denunciado. 4. Para esse fim de suportar a pronúncia - decisão de efeitos meramente processuais -, o testemunho no inquérito desmentido em juízo pode ser suficiente, sobretudo se a retratação é expressamente vinculada à acusação de tortura sofrida pelo declarante e não se ofereceu sequer traço de plausibilidade da alegação: aí, a reinquirição da testemunha no plenário do Júri e outras provas que ali se produzam podem ser relevantes". (STF, 1ª T., HC 83542/PE, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE. J: 09/03/2004). "AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA NÃO INFIRMADOS. SÚMULA 182/STJ. PRONÚNCIA LASTREADA EM ELEMENTOS COLHIDOS NO INQUÉRITO POLICIAL. POSSIBILIDADE. 1.Não tendo o agravante infirmado os fundamentos da decisão agravada, aplica-se, na hipótese, o óbice da Súmula nº 182/STJ. 2. O entendimento desta Corte Superior vem se firmando no sentido de que a sentença de pronúncia pode se valer de elementos probatórios colhidos na fase inquisitorial, por não configurar juízo de certeza.
Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento". (STJ, 5ª T., AgRg no AREsp 83.363/MG, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Julgado em 28/02/2012, DJe 14/03/2012). Desta feita, sendo a decisão de pronúncia mero juízo de admissibilidade, que não possui cunho condenatório e, por ocasião do Júri, as provas produzidas na fase inquisitorial poderão ser renovadas, cabe aos jurados a avaliação do mérito da causa. Deste modo, infere-se que o conjunto probatório é apto a demonstrar a materialidade e indícios suficientes de autoria que legitimam a decisão de pronúncia. Assim sendo, incumbirá ao Conselho de Sentença, por força de sua competência constitucional, apreciar a alegação de ausência de provas quanto à autoria, dirimindo eventuais dúvidas. A jurisprudência não discrepa: "PRONÚNCIA - HOMICÍDIO QUALIFICADO - CONCURSO DE AGENTES - INDÍCIOS SUFICIENTES DE PARTICIPAÇÃO NA PRÁTICA DELITUOSA - APRECIAÇÃO AFETA AO TRIBUNAL DO JÚRI. Para a pronúncia do acusado não se exige a certeza da autoria ou da participação, porém a existência de indícios, cabendo ao Júri resolver eventuais conflitos probatórios. Recurso desprovido". (TJPR, 1ª Câmara Criminal, RSE nº 555.791-1, Rel. Des. TELMO CHEREM, Julgado em 21.05.2009). Também inviável o pedido de exclusão das qualificadoras tipificadas nos incs. III e IV, do §2º, do art. 121, do Código Penal, porquanto não se afiguram como manifestamente improcedentes.
Muito embora a perícia técnica tenha negado o quesito relativo ao meio cruel (fls. 37), tem-se que a prova técnica evidencia, em tese, que foram desferidos vários golpes com objeto contundente sobre o corpo da vítima, atingindo especialmente sua face e seu crânio. Assim, vislumbra-se que a ação supostamente perpetrada, in casu, denota uma violência exacerbada dos atos executórios, capaz de revelar a eventual intenção de aumentar o sofrimento da ofendida. A referida qualificadora, pois, deve ser mantida, para que o Conselho de Sentença sobre ela decida, mediante a valoração subjetiva da prova, até porque os jurados não ficam adstritos ao laudo pericial, podendo, inclusive, rejeitá-lo. Sobre o tema é a orientação dominante do Superior Tribunal de Justiça: "(...) 2. A exclusão de qualificadoras na decisão de pronúncia somente é cabível quando manifestamente improcedente ou descabida, o que não é o caso dos autos, nos termos do próprio acórdão impugnado. 3. A existência de dúvidas razoáveis quanto ao pleito da acusação deve ser dirimida pelo Conselho de Sentença. 4. Agravo regimental não provido" (AgRg no REsp n. 1.156.770/RS, Sexta Turma, Rel. Min. ROGERIO SCHIETTI CRUZ, DJe de 20/2/2015). Da mesma forma a qualificadora da traição ou dissimulação deve subsistir, pois analisando os autos há elementos que apontam que o recorrente pode ter agido à traição ou de forma dissimulada, o que impossibilitou a defesa da vítima, ou seja, ela acreditava estar se dirigindo para um encontro combinado com o réu, com o qual mantinha relacionamento e, portanto, nele confiava.
Neste sentido:
"PENAL E PROCESSUAL PENAL RECURSOS EM SENTIDO ESTRITO. PRONÚNCIA. HOMICÍDIO QUALIFICADO. DESPRONÚNCIA. INDÍCIOS SUFICIENTES DE PARTICIPAÇÃO NOS FATOS NARRADOS NA DENÚNCIA. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. LEGÍTIMA DEFESA. AUSÊNCIA DE PROVA CABAL. EXCLUSÃO DA QUALIFICADORA DA TRAIÇÃO. INDÍCIOS SUFICIENTES. RECURSOS DESPROVIDOS. ............................................................................................................... ............................................................................................................... ....................................... Por fim, o pedido de exclusão da qualificadora da traição, também, não merece prosperar, existindo indícios de que os réus ludibriaram a vítima, convidando-a para entrar no carro para irem tomar cerveja, e, ao chegarem em local ermo, pararam o carro, fingindo que iriam urinar, desferindo dois disparos na nuca da vítima." (TJPR, 1ª C.Criminal, RSE nº 506.766-7, Rel.: MÁRIO HELTON JORGE, Unânime, J. 20.11.2008).
Assim, devem ser mantidas as qualificadoras do meio cruel e da traição ou dissimulação. Por tais fundamentos, o voto é pelo desprovimento do recurso. Ante o exposto, ACORDAM os Magistrados integrantes da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso.
Participaram do Julgamento o Desembargador Telmo Cherem e Antonio Loyola Vieira.
Curitiba, 30 de março de 2017.
Macedo Pacheco Relator
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