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Acórdão
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Certificado digitalmente por: LUIZ HENRIQUE MIRANDA
PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado do Paraná Estado do Paraná Agravo de instrumento n. 1.626.415-4 Origem: 4ª Vara Cível de Maringá Agravante: Kátia Regina Schmeiske Agravado: Julio Cesar de Sena Órgão julgador: 13ª Câmara Cível Relator: Juiz de Direito Substituto em 2º Grau LUIZ HENRIQUE MIRANDA (em substituição ao Desembargador ATHOS PEREIRA JORGE JUNIOR) AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO POR TÍTULO EXTRAJUDICIAL. NÃO REALIZAÇÃO DA CITAÇÃO NA FORMA DO ARTIGO 240, § 2º, DO CPC/2015 (CORRESPONDENTE AO ARTIGO 219, §§ 1º E 4º DO CPC/73). DEMORA IMPUTÁVEL AO CREDOR, E NÃO AO MECANISMO DA JUSTIÇA. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 106 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PRESCRIÇÃO RECONHECIDA, COM EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO. DESCABIMENTO DE MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. RELATÓRIO Agravo de instrumento n. 1.626.415-4 Página 1 / 10 Tribunal de Justiça do Estado do Paraná Estado do Paraná
Trata-se de agravo de instrumento manejado contra decisão proferida nos autos da ação de execução por título extrajudicial movida pelo Agravado contra a Agravante (autos n. 0032107-79.2010.8.16.0017). Pela referida decisão (fls. 246/247, complementada às fls. 291), o Juízo a quo rejeitou a exceção de pré-executividade apresentada pela Agravante, na qual esta alegou a prescrição do direito do Agravado de cobrar a dívida pela via executiva. Em suas razões recursais, diz a Agravante que o Agravado não foi diligente e a citação não foi realizada dentro do prazo e na forma determinada pelo artigo 240 do CPC, razão pela qual não houve interrupção da prescrição. Esclarece que a citação sequer foi realizada, tendo comparecido espontaneamente ao processo em 08/08/16. Em continuação, aduz que o Agravado demonstrou grande desídia, notadamente devido à falta de preparo da carta precatória, ao descaso no cumprimento desta e à demora para realizar diversos atos processuais. Aduz que o Agravado é culpado pela demora na citação, devendo ser reconhecida a prescrição quinquenal, nos termos do artigo 206, § 5º, I, do CC. Assevera que não há qualquer prova de que sabia da execução, devendo ser declarado o não cumprimento do disposto no artigo 240, § 1º e § 2º, e, em consequência, reconhecida a prescrição da pretensão executória. Não houve pedido de liminar. O Agravado apresentou contrarrazões (fls. 209/218). Agravo de instrumento n. 1.626.415-4 Página 2 / 10 Tribunal de Justiça do Estado do Paraná Estado do Paraná
É o relatório.
VOTO
Conheço do recurso, que é tempestivo, adequado à espécie e veio corretamente instruído. A exceção de pré-executividade, como é cediço, presta-se à discussão e obtenção de decisão sobre questões de ordem pública, que, além de serem passíveis de conhecimento ex officio, possam ser elucidadas com base nos argumentos das partes, em confronto com a lei e, eventualmente, com prova documental de conteúdo incontroverso. Atualmente, a doutrina e a jurisprudência têm dado aplicação mais ampla ao instituto, transcendendo as questões de ordem pública, para conhecer das matérias que sejam passíveis de apreciação de plano pelo juiz, isto é, sem dilação probatória. Em geral, portanto, podem ser alegadas "quaisquer objeções processuais, bem como as defesas materiais que o juiz possa conhecer de ofício (como prescrição e decadência) e ainda aquelas que puderem se provadas de plano" (MARINONI, Luiz Guilherme. ARENHART, Sergio Cruz. Curso de Processo Civil: Execução. 2ª Ed. São Paulo: RT, 2008. Vol. 3. p. 315). Desta feita, ao contrário do que afirma o Agravado, é patente a possibilidade de arguição da prescrição Agravo de instrumento n. 1.626.415-4 Página 3 / 10 Tribunal de Justiça do Estado do Paraná Estado do Paraná
por intermédio da exceção de pré-executividade, mostrando-se adequada a via eleita pela Agravante. Cumpre ressaltar que a prescrição é matéria de ordem pública, podendo ser apreciada a qualquer tempo e grau de jurisdição, inclusive de ofício pelo juiz, não havendo que se falar, destarte, em necessidade de interposição de embargos para o conhecimento da matéria. Quanto ao mérito, insurge-se a Agravante contra a decisão que rejeitou a exceção de pré-executividade e não reconheceu a ocorrência de prescrição. Com razão. O artigo 219, § 2º do CPC/73, correspondente ao artigo 240, §2º e §3º, do CPC/2015, é taxativo ao dizer que a parte não será prejudicada quando a demora na citação for imputável exclusivamente ao serviço judiciário, entendimento do qual não discrepa a jurisprudência, tanto que o Superior Tribunal de Justiça já o sumulou, nestes termos: "proposta a ação no prazo fixado para o seu exercício, a demora na citação, por motivos inerentes ao mecanismo da Justiça, não justifica o acolhimento da arguição de prescrição ou decadência" (Súmula n. 106 do STJ). Destarte, ainda que ultrapassados os prazos previstos nos artigos citados, a citação produzirá o efeito interruptivo da prescrição, contanto que a demora na sua efetivação não decorra de culpa do autor ou exequente, exclusiva ou concorrente ao da máquina judiciária. Agravo de instrumento n. 1.626.415-4 Página 4 / 10 Tribunal de Justiça do Estado do Paraná Estado do Paraná
Na espécie, porém, da análise dos documentos juntados aos autos, verifica-se que a demora na realização da citação decorreu da desídia do Agravado, não tendo o Judiciário contribuído exclusiva e diretamente para isso. Colhe-se dos autos que a execução foi proposta em 01/12/10 (fls. 23), haja vista o inadimplemento, pela Agravante, de três notas promissórias. Frustrada a primeira tentativa de citação da Agravante (fls. 45), o Agravado requereu, em 15/06/11, a expedição de carta precatória para a cidade de Curitiba (fls. 49/50), sendo que esta, em 27/11/11, ainda não havia sido retirada pela parte interessada (fls. 56). Ou seja, cinco meses se passaram até que o Agravado praticasse um ato de sua exclusiva responsabilidade, que independia de sua provocação. Na sequência, há informação de que a carta precatória foi devolvida pelo Juízo Deprecado por falta de preparo das custas de distribuição e ausência de procuração (fls. 82/84). Intimado o Agravado para se manifestar sobre o retorno da carta precatória (fls. 94, 96 e 97), não houve manifestação, tendo os autos sido enviados ao arquivo provisório em 30/08/12. Em 22/07/13 o Agravado peticionou, pleiteando a expedição de nova carta precatória, o que foi deferido. Porém, após diversos pedidos de dilação do prazo para a comprovação de sua distribuição, em 19/04/14, o Agravado requereu a expedição de nova carta, haja vista a ocorrência de Agravo de instrumento n. 1.626.415-4 Página 5 / 10 Tribunal de Justiça do Estado do Paraná Estado do Paraná
"imprevistos" (fls. 122). Referida carta só foi distribuída em 25/06/14 (fls. 130); não obstante, a diligência não foi exitosa (fls. 138). Com o retorno da precatória, o Agravado foi intimado para dar andamento ao feito, tendo pleiteado diversas vezes pela dilação do prazo, sinalizando sobre a possível celebração de acordo entre as partes. Após, o feito foi encaminhado ao arquivo provisório, tendo de lá saído tão somente em razão do comparecimento espontâneo da Agravante e interposição de exceção de pré-executividade. Como se vê, a demora na realização da citação não se deu em razão de motivos inerentes ao mecanismo da Justiça, mas sim pela desídia do Agravado, que deixou de promover com presteza os provimentos que lhe competiam, notadamente os relativos ao regular processamento da carta precatória. Ademais, não há notícia de que o Agravado diligenciou eficazmente na busca do endereço da citanda. Para a interrupção da prescrição, consoante estabelece o artigo 240 e parágrafos do CPC, é imprescindível a citação válida do executado ou, ainda, a tomada providências necessárias para este fim. Como afirmam Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero (in Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo, 2008, p. 224/225): "[...] Incumbe à parte promover a citação do demandado nos 10 (dez) dias subsequentes ao despacho que a ordenar. Não sendo citado o réu, o juiz prorrogará o prazo até o máximo de 90 (noventa) dias. Agravo de instrumento n. 1.626.415-4 Página 6 / 10 Tribunal de Justiça do Estado do Paraná Estado do Paraná
Não há necessidade de requerimento da parte para prorrogação. Não se efetuando a citação nos prazos mencionados, haver-se-á por não interrompida a prescrição, impondo-se o reconhecimento, em sendo o caso, da prescrição, porquanto ao valor da segurança jurídica repugna a indefinição na solução dos conflitos [...].". No caso, como se viu, a demora na realização da citação deve ser debitada ao Agravado, o que autoriza o afastamento da Súmula 106 do Superior Tribunal de Justiça e o reconhecimento de que a prescrição não foi interrompida. Assim, como entre a data do vencimento das notas promissórias (janeiro a maio de 2008) e o dia 08/08/16 (data do comparecimento espontâneo da Agravante), já havia decorrido prazo muito superior ao de três anos previsto no artigo 77 c/c artigo 70, da Lei Uniforme (Decreto nº 57.663/1966), é de se reconhecer que pretensão executiva do Agravado foi fulminada pela prescrição. É da jurisprudência desta Corte:
APELAÇÃO CÍVEL - EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL - NOTA PROMISSÓRIA - PRAZO PRESCRICIONAL DE TRÊS ANOS - INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO QUE RETROAGE À DATA DA PROPOSITURA DA AÇÃO, SOMENTE SE EFETIVADA A CITAÇÃO VÁLIDA NO PRAZO 10 (DEZ) DIAS SUBSEQUENTES AO DESPACHO QUE A ORDENAR, PRORROGÁVEL PARA, NO MÁXIMO, 90 DIAS - INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 219, §2º E §4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 - HIPÓTESE NÃO VERIFICADA NA ESPÉCIE - DEMORA QUE NÃO PODE SER
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IMPUTADA EXCLUSIVAMENTE AO MECANISMO DA JUSTIÇA - INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 106 DO STJ - PRESCRIÇÃO - SENTENÇA MANTIDA.RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Apelação Cível nº 1.568.312-6 - 13ª Câmara Cível 2 (TJPR - 13ª C.Cível - AC - 1568312-6 - Curitiba - Rel.: Athos Pereira Jorge Junior - Rel.Desig. p/ o Acórdão: Josély Dittrich Ribas - Por maioria - - J. 23.11.2016)
EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CONTRATO DE HONORÁRIOS. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO VÁLIDA. NÃO INTERRUPÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. ART. 219 §§ 2º e 4º, CPC. MOROSIDADE NÃO ATRIBUÍVEL AOS MECANISMOS DA JUSTIÇA. NEGLIGÊNCIA DOS EXEQUENTES EM RELAÇÃO AO OFÍCIO ENVIADO AO CONSULADO DO LÍBANO. PRESCRIÇÃO MANTIDA. EXTINÇÃO DO PROCESSO. Nos termos do artigo 219 do Código de Processo Civil, a prescrição é interrompida pela citação válida, retroagindo à data da propositura da ação. No entanto, não ocorrendo a citação válida nos prazos dos §§ 1º a 5º do referido dispositivo, não há que se falar em interrupção da prescrição. Aliás, na data em que transcorreu o prazo da prescrição, os autores não se empenharam na citação do devedor nos dez dias subsequentes, nem providenciaram a prorrogação desse prazo nos 90 dias subsequentes, como prevê o §3º, do art. 219, do CPC.APELAÇÃO NÃO PROVIDA. (TJPR - 15ª C.Cível - AC - 1595314-7 - Curitiba - Rel.: Hayton Lee Swain Filho - Unânime - - J. 14.12.2016)
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Ressalte-se que, não se tratando de prescrição intercorrente, mas de prescrição da pretensão executiva, não há a necessidade de intimação pessoal do credor como condição para a fluência do prazo prescricional. Desta feita, estando caracterizada a desídia do Agravado e considerando que a prescrição não foi interrompida, deve ser extinto o processo, com fulcro no artigo 487, II, do CPC, cabendo àquele pagar as custas processuais e os honorários ao advogado da Agravante, aos quais se dá o valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais), em atenção ao zelo do profissional, ao trabalho realizado, ao local de sua prestação, à natureza, tempo de duração e conteúdo econômico atual da causa (R$ 60.251,20, correspondente ao valor original dela R$ 39.587,12 corrigido desde 11/2010 até 01/2017 com base no IPC-A (IBGE), além das circunstâncias em que se deu o encerramento do processo. Em arremate, deve ser indeferido o pedido do Agravado de aplicação de multa por litigância de má-fé, eis que não restou configurada qualquer prática prevista no artigo 80 do CPC. Posto isso, voto pelo conhecimento e provimento do recurso, reconhecendo a prescrição e julgando extinta a execução, com imputação dos ônus sucumbenciais ao Agravado.
DISPOSITIVO
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Acordam os membros da 13ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer e dar provimento ao recurso. O julgamento foi presidido pela Desembargadora JOSÉLY DITTRICH RIBAS (com voto), dele participando o Desembargador FRANCISCO EDUARDO GONZAGA DE OLIVEIRA. Curitiba, 29 de março de 2017.
Luiz Henrique Miranda Juiz de Direito Substituto em 2º Grau
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