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Acórdão
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Certificado digitalmente por: MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.613.973-6, DO FORO REGIONAL DE SÃO JOSÉ DOS PINHAIS DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA - VARA DA FAZENDA PÚBLICA APELANTE: CELSO FELISBERTO APELADO: MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DOS PINHAIS RELATORA: DESEMBARGADORA MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL Nº 147/2013, EXPEDIDO PELA SECRETARIA DO MEIO AMBIENTE DO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DOS PINHAIS, RELATANDO DIVERSAS INTERVENÇÕES NA ÁREA (SERRA DO MAR, MORRO DO MEIO, BR 277, KM 53,8) PERTENCENTE AO BIOMA DA MATA ATLÂNTICA, COMO SUPRESSÃO DE VEGETAÇÃO NATIVA EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (APP), EXTRAÇÃO DE MINERAIS, ENTRE OUTRAS. SENTENÇA QUE JULGOU A INICIAL PROCEDENTE, CONDENANDO A PARTE AUTORA PARA QUE SE ABSTIVESSE DE REALIZAR INTERVENÇÕES EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE, RECUPERASSE A ÁREA DEGRADADA E PAGASSE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL AMBIENTAL, ARBITRADA EM 500.000,00 (QUINHENTOS MIL REAIS). PEDIDO DE INGRESSO DOS NOVOS POSSUIDORES NO POLO PASSIVO DA DEMANDA, PARA QUE SE RESPONSABILIZEM PELOS SEUS ATOS DE FORMA SOLIDÁRIA. NÃO ACOLHIMENTO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DOS INFRATORES POR CONDUTAS LESIVAS AO MEIO AMBIENTE (ART. 225, §3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E ART. 14, §1º, DA LEI Nº 6.938/1981). EM VISTORIA LOCAL, VERIFICOU-SE DIVERSAS INTERVENÇÕES, ENVOLVENDO SUPRESSÃO DE VEGETAÇÃO NATIVA EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (APP) AO LONGO DE RIOS E CÓRREGOS, TERRAPLANAGEM E EXTRAÇÃO MINERAL, OCASIONANDO ASSOREAMENTO EM DETERMINADOS PONTOS DAS APP'S. DE ACORDO COM JURISPRUDÊNCIA UNÍSSONA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ), EM AÇÕES CIVIS PÚBLICAS VERSANDO SOBRE DANO AMBIENTAL, A PARTE AUTORA PODERÁ ESCOLHER CONTRA QUEM MOVERÁ A DEMANDA, TRATANDO-SE DE LITISCONSÓRCIO FACULTATIVO. ADEMAIS, O ALARGAMENTO DO POLO PASSIVO APENAS ACARRETARIA MAIOR DEMORA PROCESSUAL, EM PREJUÍZO AO MEIO AMBIENTE E À EFICÁCIA DAS MEDIDAS QUE DEVEM SER ADOTADAS PELO PODER JUDICIÁRIO. REDUÇÃO DO VALOR ARBITRADO EM SENTENÇA A TÍTULO DE INDENIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. EXISTÊNCIA, IN CASU, DE DANO MORAL COLETIVO, CONSIDERANDO O LUCRO OBTIDO COM A VENDA DOS IMÓVEIS E A RETIRADA DE VEGETAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE, TOTALMENTE DESPROVIDA DE LICENÇAS E AUTORIZAÇÕES. NESTE CONTEXTO, AS AGRESSÕES AO MEIO AMBIENTE ATINGEM A UM NÚMERO INDETERMINADO DE PESSOAS, AFRONTANDO VALORES MORAIS COMUNITÁRIOS, SENDO PRESINDÍVEL A COMPROVAÇÃO DE DOR, SOFRIMENTO, OU ABALO PSICOLÓGICO, SEGUNDO A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. CRITÉRIOS INAPLICÁVEIS PARA VIOLAÇÕES DE DIREITOS TRANSINDIVIDUAIS, COMO O DIREITO A UM MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO. O VALOR REFERENTE À CONDENAÇÃO POR DANOS MORAIS COLETIVOS DEVE SER MANTIDO, TENDO EM VISTA A GRAVIDADE DA CONDUTA PERPETRADA PELO APELANTE, QUE REITERADAMENTE, CONTINUA REALIZANDO INTERVENÇÕES (OU PERMITINDO QUE ACONTEÇAM) NA ÁREA INDICADA PELA SECRETARIA MUNICIPAL DE MEIO AMBIENTE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1.613.973-6, do Foro Regional de São José dos Pinhais da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, Vara da Fazenda Pública, em que é Apelante Celso Felisberto e Apelado Município de São José dos Pinhais.
Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto por Celso Felisberto em face da sentença de mov. 59.1, proferida nos autos de Ação Civil Pública nº 0001029-34.2015.8.16.0036, que julgou a inicial procedente para que: a) a parte ré se abstenha de promover qualquer intervenção em área de preservação permanente (APP) sem a devida autorização do órgão competente; b) o réu recupere a área degradada mediante elaboração de projeto de recuperação e sua efetiva execução, nos termos da Instrução Normativa nº 04/2011; c) condenar a parte ré a pagar a quantia de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) a título de dano moral ambiental. A inicial veio acompanhada dos documentos de mov. 1.2/1.13. Em seguida, a parte autora promoveu a emenda da inicial (mov. 16.1), acrescentando fundamentos jurídicos em relação aos pedidos formulados. Acolhida a referida emenda, foi deferida a tutela antecipada, determinando-se que o requerido se abstenha de efetuar nova supressão de vegetação, movimentação do solo, parcelamento do solo ou extração de mineral sem a devida autorização da licença prévia dos órgãos competentes (mov. 18.1). O Município de São José dos Pinhais, por sua vez, requereu a expedição de carta de citação para o endereço indicado na petição inicial (mov. 23.1). A parte ré compareceu aos autos (mov. 32.1) solicitando a dilação do prazo, pedido que restou indeferido (mov. 36.1).
Ato contínuo, Celso Felisberto apresentou Contestação (mov. 37.1), ocasião na qual realizou os seguintes questionamentos: i) a ilegitimidade para figurar no polo passivo da demanda; ii) o chamamento ao processo dos demais possuidores legítimos para responder a tal ação de danos; iii) a existência de bis in idem em relação às multas aplicadas. A referida contestação foi impugnada (mov. 41.1). Diante do despacho de mov. 42.1, o ente municipal requereu a produção de prova pericial, com o intuito de comprovar o dano ambiental, bem como a prova documental (mov. 46.1). Noutro giro, a parte ré reiterou o pedido de chamamento do processo para que houvesse responsabilidade de forma solidária (mov. 48.1). Em primeira instância, o Ministério Público manifestou- se (mov. 52.1) no seguinte sentido: i) contrariamente ao chamamento ao processo dos adquirentes das frações do imóvel; ii) pela intimação destes adquirentes, para que tenham conhecimento da ação, bem como do cumprimento da liminar deferida; iii) a juntada de informações fornecidas pela Polícia Ambiental; iv) a realização de nova vistoria na localidade pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente de São José dos Pinhais. Transcorreu o prazo sem manifestação da parte autora (mov. 57.1) acerca dos documentos acostados pelo órgão ministerial. Em sentença (mov. 59.1), a inicial foi julgada procedente, para que a parte autora: i) se abstenha de promover qualquer intervenção em área de preservação permanente (APP) localizada no km 53,8
da BR 277, sem a devida autorização do órgão competente; ii) recupere a área degradada mediante elaboração de projeto de recuperação e sua efetiva execução, nos termos da Instrução Normativa nº 04/2011; iii) seja condenada à indenização por dano moral ambiental, na quantia de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), revertida ao Fundo Municipal do Meio Ambiente. Além disso, o requerido foi condenado ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios do patrono da parte contrária, fixados no valor total de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Inconformado, Celso Felisberto interpôs recurso de Apelação (mov. 66.1), fundamentando suas razões recursais sobre os seguintes argumentos: i) o indeferimento total do pedido do apelado; ii) o chamamento dos novos possuidores, no sentido de responderem a ação e se responsabilizarem por seus atos de forma solidária; iii) a reavaliação do valor arbitrado em primeiro grau a título de indenização por dano moral ambiental. A Municipalidade apresentou (mov. 71.1) relatório de vistoria atual do imóvel, ressaltando que o requerido vem descumprindo a tutela antecipada concedida (mov. 71.2). O recurso foi recebido no efeito meramente devolutivo (mov. 73.1). Foram ofertadas contrarrazões (mov. 77.1). Atuando como custos legis, o Ministério Público opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso interposto, mantendo-se integralmente a sentença (mov. 80.1).
Foi expedido Mandado de Constatação (mov. 83.1), no qual a Oficiala de Justiça lavrou Auto de Constatação. No mov. 84.2, Celso Felisberto formulou pedido de ponderação a respeito da decisão, que restou indeferido (mov. 86.1). A douta Procuradoria de Justiça manifestou-se através de parecer ministerial (fls. 12/14, autos físicos), opinando pelo conhecimento e desprovimento do recurso interposto. É o relatório. Voto. Observados os pressupostos de admissibilidade, conheço o recurso. Cuida-se de recurso de Apelação Cível interposto por Celso Felisberto em face da sentença de mov. 59.1, que, em apertada síntese, julgou a inicial procedente, condenando a parte autora para que se abstivesse de realizar intervenções em área de preservação permanente, recuperasse a área degradada e pagasse indenização por dano moral ambiental. Extrai-se dos autos que o Município de São José dos Pinhais ajuizou Ação Civil Pública em face de Celso Felisberto, considerando que no final de 2013, recebeu denúncia de que o requerido estaria promovendo degradação ambiental na Serra do Mar, no local denominado Morro do Meio, BR 277, km 53,8. A Secretaria Municipal do Meio Ambiente constatou diversas
intervenções e irregularidades no imóvel. Desse modo, a área foi embargada, com a lavratura de Auto de Infração. Da responsabilidade pelo dano ambiental Em suas razões recursais, o Apelante alega que há muitos anos tenta, judicialmente, ter para si a propriedade da área, embora exista a necessidade de trânsito em julgado da decisão, bem como o deferimento da anotação no registro de imóveis, para que a propriedade plena seja atingida. Menciona que no momento é apenas detentor da posse, adquirindo-a via contrato particular de direitos possessórios há muitos anos. Defende que por se tratar de pessoa humilde, acabou alienando pedaços de sua posse, para poder angariar dinheiro, sendo uma parte delas destinada ao profissional que cuida do processo de usucapião. Informa que o loteamento imputado pelo Apelado se deu apenas "via piquete", e via contrato particular de compra e venda de direitos, tão somente possessórios. De acordo com a linha de raciocínio adotada, se houve desmatamento e reviro de solo por parte do Apelante, deve responder apenas pelos seus atos, executados em seu terreno, e não naqueles em que estão localizados os novos possuidores. Afirma que não seria justo imputar todas as infrações ao recorrente, na medida em que juntou todos os contratos, demonstrando quem são e que deveriam vir à lide para responderem, cada qual pela sua quota parte e pelo suposto crime ambiental, de forma solidária. Assim, requer que seja permitido o ingresso dos novos
possuidores no polo passivo da demanda, no sentido de responderem a ação e se responsabilizarem pelos seus atos de forma solidária. Contudo, não obstante o esforço argumentativo do recorrente, o seu pedido não merece acolhimento. A responsabilidade por danos causados ao meio ambiente é matéria que goza de status constitucional: o art. 225, §3º, da Constituição Federal (CF) dispõe que as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. Embora a Constituição não tenha definido se o regime de responsabilidade é objetivo ou subjetivo, a lei o estipulou como objetivo, conforme se depreende do art. 14, §1º, da Lei nº 6.938/1981:
Art 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores: [...] § 1º - Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente. A título de reforço argumentativo, confira-se as lições doutrinárias de Fiorillo:
"Como foi destacado, a responsabilidade civil pelos danos
causados ao meio ambiente é do tipo objetiva, [...] sem exigir qualquer elemento subjetivo para a configuração da responsabilidade civil. Como já salientado, o art. 14, §1º da Lei n. 6.938/81 foi recepcionado pela Constituição, ao prever a responsabilidade objetiva pelos danos causados ao meio ambiente e também a terceiros. Além disso, a responsabilidade civil pelos danos ambientais é solidária, conforme aplicação do art. 3º, I, da Carta Magna".1 No caso em apreço, trata-se de Ação Civil Pública movida pelo Município de São José dos Pinhais em face de Celso Felisberto, em virtude do Auto de Infração Ambiental nº 147/2013 (mov. 1.4 e seguintes). Em vistoria local (imóvel endereçado na BR 277, Km 53,8), verificou-se diversas intervenções, envolvendo supressão de vegetação nativa em Área de Preservação Permanente (APP) ao longo de rios e córregos, terraplanagem, extração mineral, ocasionando assoreamento em determinados pontos das APP's. Consta, ainda, que o parcelamento do imóvel em chácaras menores está provocando a degradação ambiental, acarretando inclusive na contaminação do solo e da água ante a ausência de tratamento de esgoto. Ressalta-se que a região descrita (fazenda de aproximadamente 550,36 hectares mov. 1.4, fls. 04), posteriormente embargada (Termo de Embargo nº 076, mov. 1.8, fls. 13) faz parte da Mata Atlântica, considerada enquanto patrimônio nacional (art. 225, §4º, CF). O referido auto de infração (mov. 1.8, fls. 12) veio acompanhado de uma série de imagens, nas quais é possível observar os danos causados na área em destaque (mov. 1.5, fls. 07, mov. 1.6, mov. 1.7). A infração cometida consistiu no cometimento da
1FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 10. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 62.
conduta prevista no art. 34 do Decreto Municipal nº 1.097/2012, qual seja: "destruir ou danificar florestas ou demais formas de vegetação natural ou utilizá- las com infringência das normas de proteção em área considerada de preservação permanente, sem autorização do órgão competente, quando exigível, ou em desacordo com a obtida multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), por hectare ou fração". A decisão em âmbito administrativo (mov. 1.9, fls. 17/18 e mov. 1.10, fls. 19) condenou o infrator ao pagamento de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Mesmo depois de regularmente notificado, não houve qualquer manifestação por parte do autuado (mov. 1.11). Ocorre que, sabendo de todos os trâmites administrativos referentes à infração ambiental, a Municipalidade entendeu pelo ajuizamento da demanda tão somente em face de Celso Felisberto. Ora, sabe- se que, de acordo com jurisprudência uníssona do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Ações Civis Públicas versando sobre dano ambiental, a parte autora poderá escolher contra quem moverá a demanda, tratando-se de litisconsórcio facultativo. Neste sentido:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR DANO AMBIENTAL (DEMOLIÇÃO DE POUSADA). CÔNJUGE DO CAUSADOR DO DANO. INCLUSÃO NA LIDE COMO TERCEIRO INTERESSADO. WRIT CONTRA DECISÃO JUDICIAL PASSADA EM JULGADO. TERATOLOGIA OU ILEGALIDADE. INEXISTÊNCIA. LITISCONSÓRCIO PASSIVO. DIREITO À FORMAÇÃO. AUSÊNCIA. (...) 7. Não há irregularidade ou nulidade no fato de apenas um dos cônjuges figurar no polo passivo da referida ação, visto
que, em se tratando de ação civil pública voltada ao ressarcimento de danos ambientais ou urbanísticos, a regra é a fixação do litisconsórcio passivo facultativo, abrindo-se ao autor a possibilidade de demandar qualquer um deles, isoladamente ou em conjunto, pelo todo (AgRg no AREsp 548.908/DF, Rel. Ministro Herman Benjamin, SEGUNDA TURMA, DJe 30/06/2015). 8. Agravo interno desprovido. (AgInt no RMS 44.553/MA, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/09/2016, DJe 20/10/2016) grifo nosso.
AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSUAL CIVIL. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. ART. 47 DO CPC. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. DESNECESSIDADE. SÚMULA 83/STJ. LITISCONSÓRCIO AFASTADO PELA CORTE DE ORIGEM. REEXAME DE PROVAS. INVIABILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7 DO STJ. 1. Em casos de dano ambiental, como regra, o litisconsórcio será facultativo. Precedentes. Súmula 83/STJ. (...) Agravo regimental improvido. (AgRg no AREsp 846.381/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/03/2016, DJe 17/03/2016) grifo nosso.
PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LOTEAMENTO IRREGULAR. ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL. SERRA DO MAR. MATA ATLÂNTICA. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. NÃO- OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO DOS ADQUIRENTES DOS LOTES. LITISCONSÓRCIO PASSIVO FACULTATIVO. NULIDADE INEXISTENTE. 1. Não ofende o art. 535, II, do CPC, decisões em que o Tribunal de origem decide, fundamentadamente, as questões essenciais ao julgamento da lide. 2. Há litisconsórcio passivo facultativo, nas ações civis públicas por dano ambiental em loteamento irregular, entre os responsáveis primários pelos atos ilícitos, os terceiros adquirentes de lotes e seus ocupantes, em razão da responsabilidade solidária por dano ambiental. Precedentes. 3. Recurso especial não provido. (REsp 1328874/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/06/2013, DJe 05/08/2013) grifo nosso.
De mais a mais, observe-se que o alargamento do polo passivo (incluindo os 77 compradores dos desmembramentos do imóvel, conforme contratos juntados nos movimentos 48.2 48.78) apenas acarretaria maior demora processual, em prejuízo ao meio ambiente e à eficácia das medidas que devem ser adotadas pelo Poder Judiciário, no sentido de cessar os danos ambientais. Do valor da multa atribuída Em seguida, o suplicante destaca que fez uma carteira de recebimento que lhe pudesse assegurar um rendimento mensal para a sua subsistência, decorrente da venda de áreas menores. Neste contexto, aponta que nem a área total da propriedade vale o quantum imposto a título de multa, sendo impossível arcar com esta quantia, ainda que fossem chamados solidariamente à lide todos os novos possuidores. Desta forma, entende que o valor deve ser reavaliado, e consequentemente, reduzido. Todavia, não se mostra possível o pleito de minoração, pelas razões apresentadas na sequência. Veja-se que o magistrado a quo condenou o réu, ora Apelante, na quantia total de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), fixada a título de dano moral coletivo. Na ocasião, anotou que a conduta do requerido gerou degradação ambiental quanto à vegetação primária e ao corte e extração mineral irregular às margens do rio Pequeno, no qual há captação de água para consumo humano. Ademais, apontou como critério de fixação da indenização o
lucro auferido nos contratos de compra e venda. De acordo com o art. 13 da Lei da Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85 LACP), havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado reverterá a um fundo gerido por um Conselho Federal ou por Conselhos Estaduais. Os recursos deste fundo são destinados à reconstituição dos bens lesados, conforme anotado por Lílian Alves Araújo:
"Sendo a Ação Civil Pública um instrumento de defesa de interesses ou direitos difusos ou coletivos, ao autor não cabe interesse material à indenização a ser paga pelo réu em face do dano que provocou, ao contrário do que ocorre nas ações indenizatórias entre particulares, em que o autor requer para si o valor da indenização. Em razão disto, a indenização pelo dano causado postulada pela Ação Civil Pública deverá ser revertido a um fundo especial, destinado à reconstituição dos bens lesados".2 No caso concreto, a demanda foi ajuizada em virtude da constatação de danos causados ao meio ambiente, nos termos do art. 1º, I, da LACP. Se o meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito de todos (art. 225, caput, CF), as violações perpetuadas contra ele podem gerar danos morais coletivos. Nas palavras de Egon Bockmann Moreira [et. al.]:
"Logo, o dano moral coletivo é resultante da agressão a valores morais comunitários, coletivos e/ou difusos, se e quando a agressão sofrida transcenda as fronteiras do meramente individual [...]. Não se trata de mero somatório de danos individuais, mas sim de outra camada a coletiva relativa aos danos morais"3 (grifo nosso).
2 ARAÚJO, Lílian Alves. Ação Civil Pública Ambiental. 2. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 34. 3 MOREIRA, Egon Bockmann; BAGATIN, Andreia Cristina; ARENHART, Sérgio Cruz; FERRARO, Marcella Pereira. Comentários à Lei de Ação Civil Pública: revisitada, artigo por artigo, à luz do Novo CPC e Temas Atuais. São Paulo: RT, 2016, p. 88.
No mesmo sentido, imperiosa a menção da jurisprudência do STJ, destacando que o dano moral coletivo decorre da afronta ao direito constitucional do meio ambiente ecologicamente balanceado, prescindindo de dor ou padecimento para sua configuração, já que se trata de direito transindividual. Sendo assim, confira-se o primoroso julgado, oriundo da corte superior supracitada:
PROCESSO CIVIL E AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ORDEM URBANÍSTICA. LOTEAMENTO RURAL CLANDESTINO. ILEGALIDADES E IRREGULARIDADES DEMONSTRADAS. OMISSÃO DO PODER PÚBLICO MUNICIPAL. DANO AO MEIO AMBIENTE CONFIGURADO. DANO MORAL COLETIVO. 1. Recurso especial em que se discute a ocorrência de dano moral coletivo em razão de dano ambiental decorrente de parcelamento irregular do solo urbanístico, que, além de invadir Área de Preservação Ambiental Permanente, submeteu os moradores da região a condições precárias de sobrevivência. 2. Hipótese em que o Tribunal de origem determinou as medidas específicas para reparar e prevenir os danos ambientais, mediante a regularização do loteamento, mas negou provimento ao pedido de ressarcimento de dano moral coletivo. 3. A reparação ambiental deve ser plena. A condenação a recuperar a área danificada não afasta o dever de indenizar, alcançando o dano moral coletivo e o dano residual. Nesse sentido: REsp 1.180.078/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 28/02/2012. 4. "O dano moral coletivo, assim entendido o que é transindividual e atinge uma classe específica ou não de pessoas, é passível de comprovação pela presença de prejuízo à imagem e à moral coletiva dos indivíduos enquanto síntese das individualidades percebidas como segmento, derivado de uma mesma relação jurídica-base. (...) O dano extrapatrimonial coletivo prescinde da comprovação de dor, de sofrimento e de abalo psicológico, suscetíveis de apreciação na esfera do indivíduo, mas inaplicável aos interesses difusos e
coletivos" (REsp 1.057.274/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/12/2009, DJe 26/02/2010.). 5. No caso, o dano moral coletivo surge diretamente da ofensa ao direito ao meio ambiente equilibrado. Em determinadas hipóteses, reconhece-se que o dano moral decorre da simples violação do bem jurídico tutelado, sendo configurado pela ofensa aos valores da pessoa humana. Prescinde-se, no caso, da dor ou padecimento (que são consequência ou resultado da violação). Nesse sentido: REsp 1.245.550/MG, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 16/04/2015. Recurso especial provido. (REsp 1410698/MG, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/06/2015, DJe 30/06/2015) grifo nosso. In casu, uma série de critérios fundamentam a indenização por danos morais coletivos, no patamar estabelecido em primeiro grau. Em primeiro lugar, note-se que o recorrente cedeu o direito de posse a terceiros, mesmo sem ainda deter a propriedade do imóvel, como se verifica dos documentos acostados no mov. 48.2/48.78. Foram celebrados 77 (setenta e sete) contratos de compra e venda, com uma média de preço de 30 (trinta) mil reais, em cada instrumento contratual, totalizando mais de dois milhões de reais. Isto significa que a indenização arbitrada em primeira instância corresponde a menos de um quarto dos lucros auferidos com as transações realizadas pelo Apelante, que ocasionaram a retirada de vegetação em Área de Preservação Permanente, totalmente desprovida de licenças e autorizações. A conduta de desmembramento irregular do imóvel foi responsável por multiplicar os danos ambientais, conforme indicam os relatórios que acompanharam o processo administrativo ambiental (mov. 1.4/1.12). Para além deste argumento, mesmo depois de concedida a antecipação de tutela (mov. 18.1), a Polícia Ambiental informou que as infrações na área indicada persistiam (mov. 52.2/52.4). Nesta inspeção,
foram listadas pelo menos 40 (quarenta) casas; também foi verificado o dreno de nascente para abastecimento de tanques, a extração de saibro e a abertura de estradas. Após prolatada a sentença (mov. 59.1), foi anexado aos autos o Relatório Técnico nº 55/2015 (mov. 71.2), elaborado pela Secretaria de Meio Ambiente do Município de São José dos Pinhais. Neste documento, registrou-se a realização de vistoria em 9 de dezembro de 2015, na qual foi apurada a continuidade das intervenções: i) novas casas estão sendo construídas em Áreas de Preservação Permanente, próximas aos cursos d'água e encostas; ii) corte de barrando para a retirada de terra; iii) aterro que resulta na destruição da vegetação nativa; iv) corte de vegetação sub-bosque; v) represamento de córregos para a formação de tanques; vi) placas anunciando a venda de lotes. Evidente, portanto, que há descaso em relação às decisões proferidas pelo Poder Judiciário, especialmente por parte do suplicante, descumprimento que caracteriza ato atentatório à dignidade da justiça, nos termos do art. 77, IV, §2º, do Código de Processo Civil (CPC-2015). Segundo já apontado neste voto, a conduta de venda de lotes, dos quais sequer era proprietário, foi responsável por multiplicar e intensificar os danos ambientais, como bem demonstram os relatórios da Polícia Ambiental e da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, confeccionados após o deferimento da liminar e a prolação da sentença, respetivamente. Ademais, consta do processo administrativo ambiental (mov. 1.4) que a região na qual o imóvel se encontra faz parte da Mata Atlântica, considerada como patrimônio nacional (art. 225, §4º, CF), isto é, status que
extrapola os limites regionais diante da preocupação constitucional de que esses biomas não sejam degradados.4 Em adição aos fundamentos até então apresentados, a douta Procuradoria de Justiça afirmou, oportunamente, que o quantum arbitrado está em consonância com o tamanho da propriedade em questão:
"No que tange ao valor atribuído à multa, a mesma é proporcional ao tamanho da propriedade, 550,35 há, e condiz com a conduta do Apelante, que demonstrou resistência no cumprimento das determinações a ele impostas, seja por meio do Termo de Embargo lavrado pelo Município, seja pela liminar concedida nestes Autos, oportunidade em que foi fixada multa diária pelo descumprimento no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) e mesmo assim não houve cumprimento" (fls. 14, autos físicos, grifo nosso). Por todas essas razões, e considerando a gravidade da conduta perpetrada pelo Apelante, que reiteradamente, continua realizando intervenções (ou permitindo que elas aconteçam) na área indicada pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, entendo que o valor fixado a título de indenização por danos morais coletivos deve ser mantido. Diante de todo o exposto, voto pelo conhecimento e desprovimento do recurso interposto.
4MACHADO, Paulo Afonso Leme. Comentário ao art. 225, §4º. In: CANOTILHO, J. J. Gomes...[et. al.]. Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013, p. 2111.
DECISÃO Acordam os Desembargadores da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso de Apelação Cível, nos termos do voto desta Relatora. Participaram da sessão e acompanharam o voto da Relatora os Excelentíssimos Senhores Desembargadores ABRAHAM LINCOLN CALIXTO, Presidente, sem voto, ASTRID MARANHÃO DE CARVALHO RUTHES e a Juíza Substituta de Segundo Grau CRISTIANE SANTOS LEITE. Curitiba, 07 de abril de 2017.
MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA Desembargadora Relatora
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