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Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.
CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO - JUÍZO CRIMINAL ESTADUAL E JUIZADO CRIMINAL ESPECIAL - CRIME DE USO DE ENTORPECENTE - ART. 16, DA LEI N.º 6.368/76 - ADVENTO DA LEI N.º 10.259/01 - AMPLIAÇÃO DO CONCEITO DE INFRAÇÃO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO - PENA MÁXIMA NÃO SUPERIOR A DOIS ANOS - REGOVAÇÃO QUE ALCANÇA A CLÁUSULA EXCEPTIVA DA PARTE FINAL DO ART. 61, DA LEI N.º 9.099/95 - DELITO SUJEITO A PROCEDIMENTO ESPECIAL - IRRELEVÂNCIA, FACE O SILÊNCIO DA LEI - INEXISTÊNCIA DE AÇÃO PENAL INSTAURADA NO JUÍZO COMUM - CONCLUSÃO DE PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO - COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL PARA O PROCESSAMENTO E JULGAMENTO DO FEITO - CONFLITO IMPROCEDENTE. A norma contida no art. 2º, § único, da Lei n.º 10.259/01, deu novo conceito à menor potência, ficando excluída a restrição aos crimes com rito especial contida no art. 61, "in fine", da Lei n.º 9.099/95. O art. 25, da Lei n.º 10.259/01, veda a remessa de autos ajuizados na Justiça comum aos Juizados Especiais Criminais, até a data da sua instalação. Ficou consolidado o entendimento de que o recebimento da denúncia ou da queixa crime constitui o ato representativo da instauração da demanda, determinando, assim, a competência jurisdicional pelo princípio da "perpetuatio jurisdictionis", sendo certo, por outro lado, que a mencionada regra não apresenta aplicação à espécie dos autos, porquanto inexiste qualquer demanda ajuizada, mas sim tão somente mero procedimento investigatório concluído.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Conflito Negativo de Jurisdição n.º 241.140-9, de Londrina, em que é Suscitante o Juízo de Direito do Juizado Especial de Criminal de Londrina e Suscitado o Juiz de Direito da 3ª Vara Criminal de Londrina. Versam os presente autos sobre procedimento investigatório instaurado mediante Auto de Prisão em flagrante de Wilson Camargo Gomes, porque, portava consigo, uma trouxinha do vegetal Cannabis Sativa Lineu, conhecida vulgarmente por "maconha", e, também, com um invólucro de substância esbranquiçada com aparência de pasta base de "cocaína" delito previsto no artigo 16 da Lei n.º 6368/76. Em data de 30 de julho de 2003, o Juiz de Direito diante da jurisprudência do Tribunal de Alçada já consolidada, declinou da competência do Juízo comum para o processamento e julgamento do fato versado no Inquérito Policial n.º 121/2003, determinando a sua remessa ao Juizado Especial Criminal de Londrina. Já, o Juiz de Direito do Juizado Especial Criminal, para o qual o feito foi distribuído, suscitou conflito negativo de jurisdição, a fim de que este Tribunal de Alçada declare o Juízo da 3ª Vara Criminal de Londrina como sendo o competente para julgar a correlata ação. A douta Procuradoria Geral de Justiça em parecer da lavra do eminente Procurador de Justiça José Júlio Amaral Cleto, opinou no sentido de ser julgado improcedente o presente conflito suscitado pelo Juizado Especial Criminal de Londrina. É o relatório. Trata a espécie de procedimento inquisitório instaurado pelo cometimento, em tese, do delito de tóxico previsto no artigo 16, da Lei n.º 6.368/76, a que se comina pena privativa de liberdade não superior a dois anos. Considerando o advento da Lei n.º 10.259/2001, em vigor desde 14 de janeiro de 2002, que ampliou o conceito de infração de menor poder ofensivo (art. 2º, parágrafo único), o Dr. Juiz de Direito da 3.ª Vara Criminal da Comarca de Londrina determinou a remessa dos autos para o Juizado Especial Criminal da mesma Comarca, sob o pressuposto de ser ele o competente para ao seu processamento, com base na jurisprudência consolidada deste Tribunal de Alçada do Paraná. Por sua vez, o Dr. Juiz de Direito do citado Juizado Especial Criminal, ao entendimento de que o art. 61 da Lei nº 9.009/95 não foi derrogado, suscitou conflito negativo de jurisdição, com remessa dos autos a este Tribunal. Não obstante o fato objeto da persecução investigatória tenha ocorrido antes do advento da Lei dos Juizados Especiais Federais, é questão assente, a extensão incondicionada da lei nova mais benéfica, em face da regra inserta no artigo 5º, inciso XL da Constituição Federal. De outra sorte, impossível se imaginar, no ordenamento jurídico-penal brasileiro, a convivência simultânea de legislações distinguindo autores de um mesmo delito, dependendo deste atentar contra os interesses da União ou não. Neste aspecto, vale transcrever trecho da decisão constante do Acórdão da lavra do eminente Juiz Airvaldo Stella Alves, nos autos de Conflito de Jurisdição n.º 199.500-0, de Ponta Grossa: "Inadmissível, por exemplo, aceitar que o mesmo delito, dependendo de atentar contra o interesse da União ou não, venha a receber tratamento diferenciado no direito penal. Sabendo-se, ao contrário, que o legislador geralmente dispensa maior cuidado com atitudes que ferem interesses federais, parece ilógico, admitir, por exemplo, que o sujeito que desacate um Juiz Federal tenha direito aos benefícios dos Juizados Especiais e aquela que ofender um policial civil não faça jus aos mesmos favores legais." Em conclusão, tem-se que o conceito de infração penal de menor potencial ofensivo, previsto no art. 61 da Lei n.º 9.099/95, foi ampliado com o advento da Lei n.º 10.259/2001 (art. 2º, parágrafo único), que dispõe sobre a instituição dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal, que é mais benéfica ao agente. Quanto a questão de competência, propriamente dita, o artigo 25 da lei em comento, prescreve a não remessa aos Juizados Especiais das "demandas ajuizadas" na Justiça comum, até a data da sua instalação. É cediço que será a denúncia (ação penal pública) ou a queixa crime (ação penal privada), recebida pela autoridade judiciária, o ato representativo da instauração da demanda judicial. Neste sentido: "É competente o Juizado Especial Criminal para processar e julgar os crimes cuja pena máxima cominada não seja superior a dois anos, ainda que ocorridos antes do advento da Lei nº 10.259/01, desde que já não esteja em trâmite o respectivo processo criminal no juízo comum" (TAPR - Conflito de Jurisdição nº 199.566-8 - 1º Gr. Câm. Crim. - Rel. Juiz Eduardo Sarrão). "CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. PORTE ILEGAL DE ARMA, PENA MÁXIMA COMINADA DE 02 ANOS. LEI 10.259/01. AMPLIAÇÃO DA DEFINIÇÃO DE MENOR OFENSIVIDADE SOCIAL. FEITOS PENDENTES. COMPETÊNCIA JURISDICIONAL QUE SE FIRMA PELA AJUIZAMENTO DA DEMANDA. PROCESSO AINDA EM FASE INQUISITORIAL. COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITANTE" (TAPR - Conflito de Jurisdição nº 199.525-7 - 2º Gr. Câm. Crim. - Rel. Juiz Luiz Zarpelon). Por isso, a regra acima não se aplica à hipótese em discussão pela inexistência, até então, de qualquer "demanda" mas apenas de um procedimento inquisitório concluído. Tem-se assim, de forma inequívoca, que a competência jurisdicional, a teor da Lei Federal dos Juizados Especiais (art. 25, Lei n.º 10.259/01) é, efetivamente, o ajuizamento da demanda, inocorrente no caso em exame. Demais disso, oportuno não olvidar, que a competência para o julgamento das matérias atribuídas aos Juizados Especiais está definida no artigo 98, inciso I da Constituição Federal: "I - juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau;". (grifo nosso) Por tudo isso, não procede este Conflito Negativo de Jurisdição, argüido pelo Juizado Especial Criminal da Comarca de Londrina para declará-lo competente para o processamento e julgamento do feito, ainda não ajuizado, objeto deste incidente, conforme, inclusive, entendimento já externado pelos grupos de Câmaras Criminais deste Tribunal. Por fim, não há que se falar em pena máxima superior à dois anos, face a possibilidade de combinar o artigo 16, com a causa de aumento prevista no artigo 18, da Lei n.º 6.368/76, uma vez que, esse aumento só tem lugar quando se trata de condenação por crime de tráfico de entorpecentes estabelecido no artigo 12, da mencionada lei e não pelo delito de uso. Registre-se que na votação do presente conflito, dissentiu da maioria o eminente Juiz de Alçada Lauro Augusto Fabrício de Melo, relator originário, para julgá-lo procedente, declarando, na espécie, como competente o Juízo suscitado da 3ª Vara Criminal de Londrina, entendendo que o artigo 2º, parágrafo único, a Lei n.º 10.259/01, não teria derrogado a parte final do artigo 61, da Lei n.º 9.099/95, exceptuando, desse modo, os feito de procedimento especial, entre os quais se incluiria o artigo 16, da Lei n.º 6.368/76. Diante do exposto, meu voto é no sentido de ser julgado improcedente o Conflito Negativo de Jurisdição, suscitado pelo Juízo de Direito do Juizado Especial Criminal de Londrina, o que enseja declará-lo competente para o processamento e julgamento do feito em análise. ACORDAM, os Juizes integrantes do Segundo Grupo de Câmaras Criminais do Tribunal de Alçada do Paraná, por maioria de voto, em julgar improcedente o conflito, declarando competente o Juizado Especial Criminal de Londrina, ora suscitante, nos termos do voto do Juiz Relator designado, vencido o relator originário Juiz Lauro Augusto Fabrício de Melo. Participaram do julgamento os Senhores Juizes RAFAEL AUGUSTO CASETARI, Presidente, LÍDIO RÓTOLI DE MACEDO, LAURO AUGUSTO FABRÍCIO DE MELO (vencido), MARCUS VINÍCIUS DE LACERDA COSTA, RONALD JUAREZ MORO, LAERTES FERREIRA GOMES. Curitiba, 10 de dezembro de 2003. ANTONIO LOYOLA VIEIRA - Relator desig.
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