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Certificado digitalmente por: MARCEL GUIMARAES ROTOLI DE MACEDO
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Estado do Paraná APELAÇÃO CRIME Nº 1.553.667-3 JUÍZO ÚNICO DA COMARCA DE ENGENHEIRO BELTRÃO APELANTE: FUSSAO HOSHINO APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ RELATOR: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU DR. MARCEL GUIMARÃES ROTOLI DE MACEDO EM SUBSTITUIÇÃO AO DESEMBARGADOR ROBERTO DE VICENTE APELAÇÃO CRIME. DIREITO AMBIENTAL. ARTIGO 56, DA LEI 9605/98, ARTIGO 15 DA LEI 7802/89 C/C ARTIGOS 69, DO CP, 8º DO DECRETO 4074/2000 E 556 DO DECRETO 4543/2002. AGROTÓXICO ILEGAL E ARMAZENAMENTO EM DESACORDO COM AS EXIGENCIAS LEGAIS E REGULAMENTARES. CONDENAÇÃO. RECURSO DA DEFESA. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. ARGUMENTO DE QUE ADQUIRIU O AGROTÓXICO DE FORMA LEGAL E QUE AS SUBSTÂNCIAS ATIVAS SÃO PERMITIDAS NO BRASIL. MERA IRREGULARIDADE ADMINISTRATIVA PELA FALTA DE REGISTRO JUNTO AO MINISTÉRIO DA AGRICULTURA E MEIO AMBIENTE. ALEGAÇÃO DE QUE NÃO TINHA CIENCIA DA ILICITUDE, EIS QUE NÃO SABIA DA ORIGEM POR MEIO DE CONTRABANDO. IMPOSSIBILIDADE. AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE COMPROVADOS. AGROTÓXICO DE ORIGEM CHINESA E COMERCIALIZADO PELO PARAGUAI. ACUSADO QUE ERA AGRICULTOR E TEM O DEVER DE UTILIZAR PRODUTOS HERBICIDAS/PESTICIDAS DEVIDAMENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA Estado do Paraná Apelação Crime nº 1.553.667-3 REGISTRADOS PERANTE OS MINISTÉRIOS DA AGRICULTURA E MEIO AMBIENTE E DA SAÚDE. RISCO AMBIENTAL PRESUMIDO ANTE A AUSÊNCIA DE REGISTRO EM TERRITORIO NACIONAL. ALEGADO DESCONHECIMENTO DE PROIBIÇÃO QUE NÃO EXCLUI A RESPONSABILIDADE CRIMINAL. CONDENAÇÃO MANTIDA. REQUERIMENTO MINISTERIAL PELO RECONHECIMENTO DA EXTINÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO. POSSIBILIDADE. OCORRENCIA DE PRESCRIÇÃO. DECURSO DE PRAZO SUPERIOR A 4 ANOS ENTRE O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA E A SENTENÇA CONDENATÓRIA. ANÁLISE DA PRESCRIÇÃO PARA CADA PENA INDIVIDUALIZADA. RECONHECIMENTO DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO E, DE OFÍCIO, RECONHECIDA A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELA OCORRENCIA DA PRESCRIÇÃO RETROATIVA.
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Crime nº 1.553.667-3 do Juízo Único de Engenheiro Beltrão, em que é apelante Fussao Hoshino e apelado Ministério Público do Estado do Paraná.
I RELATÓRIO
O Ministério Público do Estado do Paraná ofereceu denúncia em face de Fussao Hoshino em razão da prática dos seguintes fatos
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Apelação Crime nº 1.553.667-3 delituosos, previstos nos artigos 56, caput, da lei 9.605/98, 15 da Lei 7802/89 c/c artigos 69 do CP, 8º do Decreto 4074/2000 e 556 do Decreto 4543/2002:
"No dia 15 (quinze) de novembro de 2005 (terça-feira), por volta das 17h:15min, contatou-se que o ora denunciado FUSSAO HOSHINO havia usado e tinha em depósito, em sua propriedade rural, denominada "Sítio Trevo", localizada neste Município e Comarca de Engenheiro Beltrão-PR, várias embalagens dos agrotóxicos ilegais Chloryl 25 WP (dorimuron ethil) e Meturon 60 WP (metsufuron methil), pois de origem estrangeira, em desacordo com a determinação legal e/ou regulamentar os quais foram apreendidos, sendo: 1) 4 (quatro) embalagens cheias e 17 (dezessete) vazias em pó 0,1 kg; 2) 06 (seis) embalagens cheias e 04 (quatro) vazias em pó 0,01 kg lacre nº 0003044 (Termo de Apreensão e Depósito nº 362746 C)."
Auto de Infração Ambiental fls. 07/09. A denúncia foi recebida em 19/02/2009, à fl. 16. O réu foi citado (13/03/2009 fl. 22-verso), e apresentou resposta à acusação (fl. 25/27). Audiência realizada via carta precatória, em 09/04/2013 fls. 118/119, foi ouvida uma testemunha arrolada pela acusação e em 15/05/2013 fls. 173/174, foi ouvida uma testemunha arrolada pela acusação. Em 21/11/2013, às fls. 182/184, foi ouvida uma testemunha arrolada pela defesa e procedido ao interrogatório do acusado. O Ministério Público apresentou alegações finais às fls. 191/207, pugnando pela procedência da denúncia e condenação do acusado. A defesa apresentou alegações finais às fls. 212/219, pleiteando a improcedência da denúncia e absolvição do acusado, alegando que
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Apelação Crime nº 1.553.667-3 os produtos foram adquiridos legalmente, que seus componentes são de uso permitido no Brasil; que ocorreu apenas uma irregularidade administrativa pela ausência de registro do produto junto ao Ministério da Agricultura e Meio Ambiente; afirma que adquiriu os agrotóxicos de boa-fé, não sabendo que possuía origem ilícita (contrabando), que apenas pensou que poderiam não ter o princípio ativo adequado (falsificado) e eficaz; alegou que as embalagens são descartadas de forma adequada, porém guarda as embalagens para juntar uma quantidade e legar até o local correto. Alternativamente pugnou pelo reconhecimento do delito na modalidade culposa, previsto no artigo 56, §3º, eis que agiu sem dolo. E, por fim, pela aplicação da pena no mínimo legal. O Magistrado singular, em decisão de fls. 220/231, publicada em 05/03/2015, julgou procedente a denúncia, condenando o acusado Fassao Hoshino como incurso nas sanções previstas nos artigos 56, caput, da lei 9.605/98, 15 da Lei 7802/89 c/c artigos 69 do CP, 8º do Decreto 4074/2000 e 556 do Decreto 4543/2002, a pena de 3 anos de reclusão e pagamento de 20 dias-multa, em regime aberto. Inconformado, o acusado interpôs recurso de apelação à fl. 234, com razões às fls. 240/250, pleiteando a reforma da decisão requerendo a absolvição, arguindo que os produtos foram adquiridos legalmente, que seus componentes são de uso permitido no Brasil; que ocorreu apenas uma irregularidade administrativa pela ausência de registro do produto junto ao Ministério da Agricultura e Meio Ambiente; afirma que adquiriu os agrotóxicos de boa-fé, não sabendo que possuía origem ilícita (contrabando), que apenas pensou que poderiam não ter o princípio ativo adequado (falsificado) e eficaz; alegou que as embalagens são descartadas de forma adequada, porém guarda as embalagens para juntar uma quantidade e legar até o local correto. Contrarrazões pelo Ministério Público às fls. 251/257, pugnando pelo desprovimento do recurso. A d. Procuradoria-Geral de Justiça (Dr. Ricardo Pires de Albuquerque Maranhão), em seu parecer de fls. 264/267, opinou pelo
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Apelação Crime nº 1.553.667-3 reconhecimento da extinção da pretensão punitiva pela ocorrência da prescrição e julgar prejudicado o mérito recursal. É, em suma, o relatório.
II VOTO
Conheço do recurso, eis que presentes os pressupostos de admissibilidade.
Da absolvição
A defesa pleiteou a reforma da decisão requerendo a absolvição, arguindo que os produtos foram adquiridos legalmente, que seus componentes são de uso permitido no Brasil; que ocorreu apenas uma irregularidade administrativa pela ausência de registro do produto junto ao Ministério da Agricultura e Meio Ambiente; afirma que adquiriu os agrotóxicos de boa-fé, não sabendo que possuía origem ilícita (contrabando), que apenas pensou que poderiam não ter o princípio ativo adequado (falsificado) e eficaz; alegou que as embalagens são descartadas de forma adequada, porém guarda as embalagens para juntar uma quantidade e legar até o local correto. Sem razão, no entanto. A Materialidade do delito restou devidamente comprovada através do Auto de Infração Ambiental de fls. 07/09. A autoria, por sua vez, é certa e recai sobre o acusado, vejamos: O acusado Fussao Hoshino, em seu interrogatório em juízo, afirmou que: "confessa ter adquirido os produtos apreendidos em sua propriedade, porém, afirma não saber que os mesmos eram contrabandeados, e que por tal razão comprou em pouca quantidade; que reafirma não saber que os produtos eram contrabandeados; que não procurou orientação de um
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Apelação Crime nº 1.553.667-3 engenheiro agrônomo; que foi um vendedor que o ofereceu, e acabou comprando pela insistência do mesmo; que comprou pouca quantidade; e aplicou apenas em uma parte da lavoura, por achar o produto barato; que o vendedor insistia de duas a três vezes em cada semana, e por isto acabou comprando; que com relação às embalagens vazias, que geralmente são entregues à COAMO, sendo que costuma reunir determinado número de embalagens para devolvê-las de uma só vez."(fl. 184). O funcionário do IBAMA João Antônio de Almeida, responsável pela lavratura do Auto de Infração Ambiental nº 246014D, em seu depoimento de fl. 173, afirmou que "todos os anos o IBAMA promove uma operação denominada Agrotóxico, que visa combater o ingresso de produtos agrotóxicos estrangeiros no país, em descordo com a legislação local; que em 2005 trabalhou na referida operação na Cidade de Engenheiro Beltrão; que se recorda que chegou vistoriaram a propriedade do acusado em busca de indícios de agrotóxicos; que, ao verem a lavoura limpa, indagaram o acusado sobre qual produto teria sido utilizado para limpá-la; que, pelo tamanho da propriedade, concluíram que o acusado teria feito uso de outro produto que não o autorizado, e, ao revistarem o local, encontraram os agrotóxicos provenientes do Paraguai; que não se recorda se o Acusado estava na propriedade; que lavraram o Auto de Infração respectivo; que as embalagens de agrotóxicos foram apreendidas e armazenadas em depósito até o término do processo; que não se recorda de quem o acusado adquiriu o produto; que não se recorda se foi o acusado, ou seus funcionários que acompanharam a vistoria, mas afirma que quem os acompanhou admitiu que as embalagens encontravam-se na propriedade pois o produto fora utilizado; que não se recorda se já registrou outra infração em nome do acusado." O também funcionário do IBAMA, Sebastião Ferreira Canavarro Filho, em seu depoimento em juízo de fl. 118, afirmou que "não se lembra, especificamente, quanto à infração praticada pelo acusado, mas se recordo que, todos os anos, eram realizadas duas operações, uma após a safra
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Apelação Crime nº 1.553.667-3 de soja; e uma após a plantio de inverno, que consistiam na verificação dos depósitos de agrotóxicos da propriedade e demais balcões para averiguarem se estava tudo correto; o Chloryl é utilizado em cultura de soja, e o Meturon, de trigo; que temos o princípio ativo de ambos os produtos em agrotóxicos legais, registrados no Ministério do Meio Ambiente, mas os que foram apreendidos na propriedade do acusado eram ilegais, de origem chinesa, contrabandeados pelo Paraguai; que foram realizadas pesquisas destes agrotóxicos, pelo próprio IBAMA, e constatou-se que eles possuem compostos ativos, além dos princípios ativos, não identificados; que os de origem chinesa, inclusive, eram fabricados com refugo industrial, potencialmente nocivos ao meio ambiente e à saúde humana; que haviam 04 embalagens cheias e 17 vazias, caracterizando o depósito e a utilização; que supõe que os vazios de Meturon foram utilizados na cultura de trigo; que não pode avaliar qual a dimensão da área utilizada, pois, além do agrotóxico puro, costuma-se utilizá-lo em mesclas com outros produtos; que não se recorda se haviam rios ou córregos próximo à propriedade." As condutas imputadas ao acusado estão previstas nos artigos 56, caput, da Lei 9605/98 e 15 da Lei 7802/89, que prevê, in verbis:
"Art. 56. Produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos:"
"Art. 15. Aquele que produzir, comercializar, transportar, aplicar, prestar serviço, der destinação a resíduos e embalagens vazias de agrotóxicos, seus componentes e afins, em descumprimento às exigências estabelecidas na
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Apelação Crime nº 1.553.667-3 legislação pertinente estará sujeito à pena de reclusão, de dois a quatro anos, além de multa."
Os delitos descritos nos respectivos dispositivos possuem como bem jurídico a ser tutelado a saúde pública, tendo em vista que a comercialização de produtos desprovidos de registro junto ao Ministério da Agricultura e Meio Ambiente, seja produto importado ou nacional, traz risco iminente e grave ao meio ambiente, à saúde dos agricultores e dos consumidores, e também pode trazer prejuízo material, se for ineficaz. Pois bem. Os produtos apreendidos, conforme o Auto de Infração Ambiental de fls. 07/09, foram: - Chloryl 25WP 4 embalagens cheias e 17 embalagens vazias (100g em pó cada embalagem); - Meturon 60WP 6 embalagens cheias e 4 embalagens vazias (100g em pó cada embalagem). No Brasil, qualquer produto herbicida, agrotóxico ou similares, somente podem ser utilizados e comercializados se devidamente registrados no órgão federal, no caso o Ministério da Agricultura e Meio Ambiente e Ministério da Saúde, dentro das diretrizes e regulamentações pertinentes a este setor. Tantos os produtos de origem nacional quanto estrangeira devem passar por esta regularização e autorização, passando por rigorosos testes biológicos e agronômicos, sob avaliação e autorização dos respectivos Ministérios. Sobre as regulamentações do uso e comercialização de agrotóxicos, temos diversos dispositivos legais:
- Leis 4074/2000, em seu artigo 8º, dispõe:
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Apelação Crime nº 1.553.667-3 "Os agrotóxicos, seus componentes e afins só poderão ser produzidos, manipulados, importados, exportados, comercializados e utilizados no território nacional se previamente registrados no órgão federal competente, atendidas as diretrizes e exigências dos órgãos federais responsáveis pelos setores da agricultura, saúde e meio ambiente."
- Decreto 4543/02, artigo 556 (revogado pelo Decreto 6759/2009 em seu artigo 619):
"Art. 556 Os Agrotóxicos, seus componentes e afins, só poderão ser importados ou exportados, se previamente registrados em órgão federal, de acordo com as diretrizes e as exigências dos órgãos federais responsáveis pelos setores da saúde, do meio ambiente e da agricultura. Art. 619. Os agrotóxicos, seus componentes e afins só poderão ser importados ou exportados se previamente registrados em órgão federal, de acordo com as diretrizes e as exigências dos órgãos federais responsáveis pelos setores da saúde, do meio ambiente e da agricultura (Lei no 7.802, de 11 de julho de 1989, art. 3o, caput)."
- Lei 7802/89, artigo 3º:
"Os agrotóxicos, seus componentes e afins, de acordo com definição do artigo 2º desta Lei, só poderão ser produzidos, exportados, importados, comercializados e utilizados, se previamente registrados em órgão federal, de acordo com as diretrizes e exigências dos órgãos federais responsáveis
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Apelação Crime nº 1.553.667-3 pelos setores da saúde, do meio ambiente e da agricultura."
- e artigo 7º:
"Art. 7°. Para serem vendidos ou expostos à venda em todo o território nacional, os agrotóxicos e afins ficam obrigados a exibir rótulos próprios, redigidos em português, que contenham, entre outros, os seguintes dados: I indicações para a identificação do produto (...); II instruções para a utilização (...); III informações relativas aos perigos potenciais (...); IV - recomendação para que o usuário leia o rótulo antes de utilizar o produto. §1º. Os textos e símbolos impressos nos rótulos serão claramente visíveis e facilmente legíveis em condições normais e por pessoas comuns."
O alegado desconhecimento da proibição de uso de agrotóxicos estrangeiros não regulamentados não encontra respaldo nos autos, tendo em vista que se trata de indivíduo agricultor, que lida com defensores agrícolas de forma corriqueira, deve ter conhecimento do uso e recomendações do uso de pesticidas, tendo em vista ser proprietário de Sítio produtor de cultivos (ainda que não tenha sido especificado nos autos qual), e, ainda mais relevante, sabia da possibilidade de existir alguma irregularidade na aquisição do produto apreendido, pela relevante diferença de preço, tanto que, nas palavras do próprio "não tinha conhecimento sobre a eficiência desse produto e não quis arriscar a área total" (fl. 12) e "que comprou pouca quantidade, e aplicou apenas em uma parte da lavoura por achar o produto barato".
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Apelação Crime nº 1.553.667-3 É dever do apelado, como agricultor, conhecer os diversos tipos de pesticidas/herbicidas, saber de seus benefícios e malefícios, bem como de suas permissões e restrições, não podendo se esquivar da responsabilidade criminal alegando desconhecimento da lei. Nesse sentido:
"APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE DESTINAÇÃO DE RESÍDUOS E EMBALAGENS DE AGROTÓXICOS EM DESACORDO COM A EXIGÊNCIA ESTABELECIDA NA LEI (ART. 15, DA LEI 7.802/89). - ILICITUDE. - OCORRÊNCIA. - ALEGADO DESCONHECIMENTO DE PROIBIÇÃO LEGAL QUE NÃO ELIDE A RESPONSABILIDADE CRIMINAL. - RÉU AGRICULTOR. - NECESSÁRIA CONDENAÇÃO. - SENTENÇA REFORMADA. - RECURSO PROVIDO. "Em que pese à alegação de desconhecimento do uso proibido do agrotóxico em questão, esta não encontra guarida, haja vista ser o apelado agricultor e, portanto acobertado pelo dever de conhecer os diversos defensores agrícolas, contando de forma privilegiada com informações acerca dos males e benefícios, bem como da permissão ou proibição de uso"." (TJPR - 2ª C.Criminal - AC - 650287-4 - Palotina - Rel.: José Laurindo de Souza Netto - Unânime - - J. 24.06.2010)
E mais, ao contrário do que alega a defesa, a ausência de registro prévio de um agrotóxico perante os órgãos competentes não se trata de mera irregularidade administrativa ou embaraço burocrático. O registro dos referidos produtos consiste na segurança de que o mesmo segue diretrizes e recomendações estatais visando a preservação
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Apelação Crime nº 1.553.667-3 da saúde dos agricultores e funcionários que manipulam os agrotóxicos, bem como o consumidor final, também protegendo o meio ambiente (avaliação de impacto ambiental, acúmulo e dispersão no solo e na água, dentre outros), bem como às diretrizes determinadas para a agricultura. Ou seja, deve ser testado e aprovado não somente por mero procedimento administrativo, mas por questão de segurança e saúde, sendo obrigação do agricultor utilizar produtos aprovados e autorizados. A lesividade de produtos desta natureza, se não devidamente registrados e aprovados é presumida, em razão da necessidade de procedimentos rigorosos a que um agrotóxico deve se submeter para que seja considerado apto ao uso em plantações, a fim de preservar o equilíbrio ambiental e à saúde humana. Importante ressaltar que não importa que um dos componentes ativos do produto sejam comercializados no país, pois não fez prova de quais outras substâncias estariam nele contida, bem como não houve prova de que os componentes do produto não seriam danosos ao meio ambiente. Nesse sentido: "APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME AMBIENTAL. COMÉRCIO E TRANSPORTE DE AGROTÓXICOS NÃO REGISTRADOS NO PAÍS. ART. 15 DA LEI 7.802/89. AGENTE QUE TRANSPORTAVA E COMERCIALIZAVA AGROTÓXICO PROVENIENTE DO PARAGUAI. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. CONFISSÃO ALIADA À PROVA TESTEMUNHAL. RELATÓRIO TÉCNICO QUE ATESTOU A NATUREZA DO AGROTÓXICO APREENDIDO E AUSÊNCIA DE SEU REGISTRO NO TERRITÓRIO NACIONAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. CRIME QUE TUTELA A INCOLUMIDADE DA SAÚDE PÚBLICA E DO MEIO
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Apelação Crime nº 1.553.667-3 AMBIENTE. INAPLICABILIDADE. ALEGAÇÃO DE QUE A NORMA PENAL SOMENTE INCIDIRIA PARA A PRÁTICA DO CRIME EM LARGA ESCALA. IMPROCEDÊNCIA. ASPECTO QUE TEM RELEVÂNCIA PARA FINS DE DOSIMETRIA DA PENA, TÃO SOMENTE. DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME AMBIENTAL PARA O CRIME DE CONTRABANDO (ART. 334, CP). TUTELA DE BENS JURÍDICOS DIVERSOS. APLICABILIDADE DO PRIMEIRO, NO CASO EM TELA. DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME AMBIENTAL PARA FORMA TENTADA. CHEQUE DO COMPRADOR NÃO DESCONTADO, EM VIRTUDE DO FLAGRANTE E APREENSÃO. CRIME QUE SE CONSUMOU COM O TRANSPORTE E A COMERCIALIZAÇÃO, SENDO IRRELEVANTE O AUFERIMENTO DA VANTAGEM ECONÔMICA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. A norma do art. 15 - combinada com a do art. 3º - da Lei 7802/89 tutela a incolumidade do meio ambiente bem como da saúde dos agricultores e dos consumidores, impondo o controle estatal prévio sobre os agrotóxicos que circulam, são comercializados e aplicados no País. 2. O registro prévio de um agrotóxico no órgão estatal não se constitui em mero entrave burocrático visando a proteger e privilegiar algumas multinacionais. Consiste, isto sim em atestado de que o produto foi analisado pela autoridade e segue as diretrizes e exigências estatais visando à preservação da saúde dos manipuladores dos agrotóxicos e dos consumidores finais assim como à conservação do meio ambiente (avaliando o impacto da administração de um determinado produto na fauna e flora locais, bem como
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Apelação Crime nº 1.553.667-3 o eventual acúmulo e dispersão no solo e na água). 3. Não há que se falar, na aplicação do princípio da insignificância quando os valores tutelados pela norma não têm caráter patrimonial e sim a conservação da incolumidade da vida, da saúde e do meio ambiente." (TJPR - 2ª C.Criminal - AC - 472891-8 - Mamborê - Rel.: Lilian Romero - Unânime - - J. 02.04.2009)
"APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME AMBIENTAL. TRANSPORTE DE AGROTÓXICOS NÃO REGISTRADOS NO PAÍS. (ART.15 DA LEI 7.802/89). AGENTE QUE TRANSPORTAVA AGROTÓXICO PROVENIENTE DO PARAGUAI.MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS.RELATÓRIO TÉCNICO QUE ATESTOU A NATUREZA DO AGROTÓXICO APREENDIDO E AUSÊNCIA DE SEU REGISTRO NO TERRITÓRIO NACIONAL. ART. 334 DO CÓDIGO PENAL E LEI Nº 7.802/89. BENS JURÍDICOS TUTELADOS DISTINTOS. LEI 9.605/98 E LEI 7.802/89.CONFLITO APARENTE DE NORMAS. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.1. (...) o bem jurídico tutelado pelo artigo 334, do Código Penal difere daquele descrito no artigo 15, da lei 7.802/89. O primeiro visa resguardar tão somente as políticas de comércio exterior, enquanto que este visa proteger a saúde pública, revelando a clara distinção entre ambos.1 Em substituição ao Des. Lídio José Rotoli de Macedo. 22. Evidencio que a conduta ilícita de `transportar' agrotóxicos no território nacional em desacordo com as regras legais, subsume-se tanto à figura típica do artigo 15
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Apelação Crime nº 1.553.667-3 da Lei 7.802/89 quanto do artigo 56 da Lei 9.605/98, configurando um autêntico conflito aparente de normas resolvido em favor desta modalidade delitiva pelo princípio da especialidade." (TJPR - 2ª C.Criminal - AC - 1149672-7 - Clevelândia - Rel.: Maria Roseli Guiessmann - Unânime - - J. 03.07.2014)
Assim, não se pode falar em absolvição, devendo ser mantida a sentença condenatória.
Da prescrição
A d. Procuradoria-Geral de Justiça, em seu parecer de fls. 264/267 pugnou pelo reconhecimento, de ofício, da extinção da pretensão punitiva do estado pela ocorrência da prescrição retroativa. E com razão. Conforme se observa nos autos, o acusado Fussao Hoshino foi condenado pela prática dos delitos previstos nos artigos 56, caput da Lei 9605/98 e artigo 15 da Lei 7802/89, em concurso material, a pena de 3 anos de reclusão. Porém, conforme dispõe o artigo 119 do Código Penal, para fins de extinção da punibilidade, no caso de concurso de crimes, deve ser considerada cada pena, de forma isolada. "Art. 119 - No caso de concurso de crimes, a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um, isoladamente."
Assim, ou seja, considerando que a pena foi estabelecida em um total de 3 anos de reclusão, sendo 1 ano de reclusão para o primeiro
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Apelação Crime nº 1.553.667-3 delito e 2 anos de reclusão para o segundo delito, procede-se à análise do prazo prescricional de forma individual. E em conformidade com o artigo 109, inciso V, do Código Penal, o prazo prescricional é de 4 anos para delitos com pena é igual a um ano ou, sendo superior, não exceda a dois anos. Considerando que os fatos ocorreram em 15/11/2005, a denúncia foi recebida em 19/02/2009 e a sentença condenatória foi publicada em 05/03/2015, sendo que nesse último período não houve nenhuma causa interruptiva e transcorreu aproximadamente 6 anos e 1 mês, houve o preenchimento do requisito temporal para reconhecimento da extinção da punibilidade do acusado Fussao Hoshino, com fulcro nos artigos 109, inciso V, 110, §1º, e 119, todos do Código Penal. Ante o exposto, voto em negar provimento ao recurso e, de ofício, decretar a extinção da punibilidade do acusado Fussao Hoshino em face da ocorrência da prescrição retroativa.
III DECISÃO
ACORDAM os Magistrados integrantes da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao recurso, reconhecendo de ofício a extinção da punibilidade pela ocorrência da prescrição retroativa da pretensão punitiva. Presidiu o julgamento o Desembargador Luís Carlos Xavier, sem voto, e dele participaram os Desembargadores José Carlos Dalacqua e Laertes Ferreira Gomes.
Curitiba, 20 de abril de 2017.
MARCEL GUIMARÃES ROTOLI DE MACEDO Relator Convocado
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