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Acórdão
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Certificado digitalmente por: RUY ALVES HENRIQUES FILHO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADO DO PARANÁ HABEAS CORPUS CRIME Nº 1608408-1, DE FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA - 10ª VARA CRIMINAL Impetrante: MARCIA DE OLIVEIRA DE AMORIM Paciente: NATANAEL PEREIRA DA SILVA MIRANDA Órgão Julgador: 5ª Câmara Criminal Relator: Juiz Subst. 2ºGrau Ruy A. Henriques1 HABEAS CORPUS CRIME ARTIGO 35 E ARTIGO 33, CAPUT, AMBOS DA LEI Nº 11.343/2006, ARTIGO 218 DO CÓDIGO PENAL PETIÇÃO INICAL APÓCRIFA NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PREVISTOS NO ARTIGO 654, §1º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL NÃO CONHECIDO NECESSIDADE DE ANÁLISE DE OFÍCIO AUSÊNCIA DE DILIGÊNCIAS DA DEFESA QUE NÃO PODEM PREJUDICAR O PACIENTE PLEITO PELA CONCESSÃO DA ORDEM ANTE A FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO NA DECISÃO QUE DECRETOU A PRISÃO PREVENTIVA IMPOSSIBILIDADE NECESSIDADE DE RESGUARDAR A GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA MODUS OPERANDI REQUISITOS DA PREVENTIVA PRESENTES - INEXISTÊNCIA DE EVENTUAL ILEGALIDADE ORDEM NÃO CONHECIDA E DENEGADA DE OFÍCIO 1. (...) Não se pode conhecer do habeas corpus, em face da ausência de assinatura da impetrante na petição inicial (TJPR - 5ª C. Criminal - HCC - 1508168-0 - Joaquim Távora - rel.: Marcus Vinicius de Lacerda Costa - unânime - - j. 05.05.2016) 2. (...) Condições pessoais favoráveis, tais como primariedade, ocupação lícita e residência fixa, entre outras, não têm o condão de, por si sós, garantirem ao paciente a revogação da prisão preventiva, se há nos autos elementos hábeis a recomendar a manutenção de sua custódia cautelar, como in casu (precedentes). Habeas corpus não conhecido". (STJ, Quinta Turma. HC nº 341.552/SP. Relator:1 Em Substituição à Desª. Maria José de Toledo Marcondes Teixeira. Pt TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADO DO PARANÁ Habeas Corpus Crime nº 1.608.408-1 fls. 2 Ministro Felix Fischer. Julgado em 23/02/2016, VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus Crime nº 1608408-1, de Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - 10ª Vara Criminal, em que é Impetrante MARCIA DE OLIVEIRA DE AMORIM e Paciente NATANAEL PEREIRA DA SILVA MIRANDA.
I RELATÓRIO Trata-se de Habeas Corpus com pleito liminar impetrado por Marcia de Oliveira de Amorim, em favor do Paciente NATANAEL PEREIRA DA SILVA MIRANDA, dado suposto constrangimento ilegal emanado do Juízo de Direito da 10ªVara Criminal de Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba. A Impetrante alega e informa que: a) o Paciente foi preso pela prática, em tese, do delito previsto no artigo 35 e artigo 33, caput, ambos da Lei nº 11.343/2006, e artigo 218 do Código Penal, observada a regra do art. 69, do Código Penal; b) o Paciente é usuário de drogas e nunca exerceu traficância; c) há falta de fundamentação na decisão que indeferiu o pleito pela revogação da prisão preventiva; d) o acusado é primário, tem residência fixa e ocupação lícita; e) há o descumprimento do princípio da excepcionalidade da prisão processual. Pugna pela concessão de medida liminar com a imediata expedição de alvará de soltura.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADO DO PARANÁ Habeas Corpus Crime nº 1.608.408-1 fls. 3 Homologada a prisão em flagrante (mov. 7.1) dos autos Projudi nº 0022907-50.2016.8.16.0013. Realizada audiência de custódia e decretada a prisão preventiva (mov. 25.1). O pleito pelo relaxamento da prisão (mov. 1.1 dos autos Projudi nº 0024140-82.2016.8.16.0013) restou indeferido nos termos de decisão de mov. 13.1. A medida liminar foi indeferida (fls. 56/60). As informações foram prestadas (fls. 65/66). Nesta instância, a Douta Procuradoria de Justiça manifestou-se (fl. 70) pelo não conhecimento deste remédio constitucional. É o relatório. II - VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO: No caso em apreço, entendo que o writ não merece conhecimento. Da análise dos autos, desdobra-se a existência de vício cometido pela defesa. Note-se que a petição inicial (fls. 03/14) é apócrifa 2, assim, não merece ser conhecido o presente remédio heroico, vez que apresenta falha insanável, já que oportunizada fora a defesa (fls. 72) para que cessasse o referido defeito, qual seja, providenciar a assinatura da petição inicial.
2 (...) não se tem admitido que a petição do habeas corpus seja apócrifa, ou seja, sem assinatura (...) sob pena de não conhecimento do writ (LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. Vol. Único 2ª ed. 3ª tiragem ver. Ampl. E atual. Editora JusPodvim, 2014).
TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADO DO PARANÁ Habeas Corpus Crime nº 1.608.408-1 fls. 4 Conforme depreende-se do artigo 654, §1º, "c" Código de Processo Penal, qualquer pessoa poderá postular pela liberdade de locomoção em seu favor ou de outrem: "Art. 654. O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público. § 1º A petição de habeas corpus conterá: a) o nome da pessoa que sofre ou está ameaçada de sofrer violência ou coação e o de quem exercer a violência, coação ou ameaça; b) a declaração da espécie de constrangimento ou, em caso de simples ameaça de coação, as razões em que funda o seu temor; c) a assinatura do impetrante, ou de alguém a seu rogo, quando não souber ou não puder escrever, e a designação das respectivas residências" (Destaquei). A este respeito, cumpre mencionar comentário de Guilherme de Souza Nucci 3 ao citado dispositivo:
"Identificação do Impetrante: exige-se não somente a sua assinatura, mas também a indicação de sua residência, para quem não é advogado, que pode simplesmente apontar o seu número de inscrição na OAB e o endereço do escritório. Não se aceita impetração anônima, devendo ser indeferida in limine". Diante disso, embora o habeas corpus prescinda de formalismos, exige apenas que haja a assinatura do Impetrante.
3 (Código de Processo Penal Comentado. 9ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p. 654-655).
TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADO DO PARANÁ Habeas Corpus Crime nº 1.608.408-1 fls. 5 No caso em apreço, a Dra. Marcia de Oliveira Amorim (OAB/PR nº 81.736) nada alegou para justificar a referida falha, tampouco efetuou a sua correção. Segundo escólio de Julio Fabbrini Mirabete, "não pode ser conhecida, todavia, petição apócrifa, não assinada pelo impetrante e que não contenha qualquer autenticação" (Código de Processo Penal Interpretado, Editora Jurídico Atlas, 11ª edição, Editora RT). Nessa mesma linha, corrobora o entendimento jurisprudencial: HABEAS CORPUS - ALEGAÇÃO DE FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA NO DECRETO PRISIONAL E AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DA PRISÃO PREVENTIVA - PETIÇÃO INICIAL APÓCRIFA - NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PREVISTOS NO ARTIGO 654, § 1º, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - WRIT NÃO CONHECIDO. Não se pode conhecer do habeas corpus, em face da ausência de assinatura da impetrante na petição inicial (TJPR - 5ª C.Criminal - HCC - 1508168-0 - Joaquim Távora - Rel.: Marcus Vinicius de Lacerda Costa - Unânime - - J. 05.05.2016) (Grifo nosso).
Da mesma forma:
HABEAS CORPUS. (...) O writ não preenche requisito indispensável à sua propositura, previsto na alínea "c" do §1º do artigo 654 do Código de Processo Penal, que assim dispõe: "O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público.§ 1º. A petição de habeas corpus conterá: ...c) a assinatura do impetrante, ou de alguém a seu rogo, quando não souber ou não puder escrever, e a designação das respectivas residências."II. "O habeas corpus é ação cuja impetração, além de prescindir de rigores, independe de qualquer prazo. A falta de assinatura em sua inicial não impede ulterior impetração da ordem; ao contrário, basta que nova petição, assinada, seja apresentada, a qualquer tempo, para que seja posteriormente conhecido. Portanto, sanada a irregularidade, o direito alegado em favor do Paciente será apreciado." (STJ. RMS 32918/MS. Relatora Ministra LAURITA VAZ.Quinta Turma. Julgado em 17/04/2012)III. "HABEAS CORPUS. INICIAL DESPROVIDA DE ASSINATURA. PEDIDO APÓCRIFO.DESATENDIMENTO AOS REQUISITOS PREVISTOS NO ART. 654, §1º, "C", DO CPP.NÃO CONHECIMENTO DO W RIT.I - Ausente pressuposto processual indispensável à impetração, qual seja a assinatura do impetrante, imperioso o não conhecimento do writ." (TJMG. Habeas Corpus nº 1.0000.12.117243-1/000. Relator TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADO DO PARANÁ Habeas Corpus Crime nº 1.608.408-1 fls. 6 Des. Matheus Chaves Jardim. 2ª Câmara Criminal. Julgado em 29/11/2012) IV. Apesar destas considerações, mister se faz, de ofício, seja confirmada a liminar anteriormente deferida porquanto inconteste o alegado constrangimento ilegal sofrido pelo paciente, uma vez que, a decisão que decretou a prisão preventiva amparou- se unicamente na revelia. (TJPR - 2ª C.Criminal - HCC - 1030605-5 - Engenheiro Beltrão - Rel.: Lidio José Rotoli de Macedo - Unânime - - J. 18.07.2013)
E:
PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. FALTA DE ASSINATURA DO IMPETRANTE. FACULTADO LAPSO TEMPORAL PARA CORREÇÃO DA FALHA. INÉRCIA DO ADVOGADO. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ORDEM NÃO CONHECIDA (TJPR 5ª C. Criminal HCC 1300800-7 Rel.: Simone Cherem Fabrício de Melo Dec. Monocrática Dje 08/12/2014) (Grifo nosso). Diante de todo o exposto, muito embora o pedido não deve ser conhecido, merece ser analisado de ofício por este juízo, ante do fato de que a ausência de diligências que deveriam ser prestadas pela defesa não podem prejudicar o Paciente. Pois bem, da análise dos autos, tem-se que a defesa alega em síntese, que o Paciente não cometeu o delito em comento. Neste ponto, para se discutir e apurar a autoria do crime, é necessária a apreciação exauriente de provas, inviável por esta via constitucional que possui procedimento de rito célere, com objetivo de sanar coação ilegal ou ameaça contra o direito de locomoção do paciente, mas explícitas, o que não é o caso. Leciona Guilherme de Souza Nucci 4, sobre o tema: " A dúvida não beneficia o paciente, pois não se trata de processo- crime, em que se está julgando-o pela prática de crime; ao contrário, analisa-se a legalidade ou ilegalidade de um ato proferido por
4 (NUCCI, Guilherme de Souza. Habeas Corpus. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2014. p. 156)
TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADO DO PARANÁ Habeas Corpus Crime nº 1.608.408-1 fls. 7 autoridade, como regra. Em lugar da presunção de inocência do réu está-se diante da presunção de legalidade da ação de autoridade". Ainda, o exame de autoria delitiva não pode ser realizado no sumaríssimo procedimento do presente remédio constitucional, sendo este, inclusive, o entendimento sufragado pelo Superior Tribunal de Justiça: ""(...) O rito do habeas corpus pressupõe prova pré-constituída do direito alegado, devendo a parte demonstrar, de maneira inequívoca, por meio de documentos que evidenciem a pretensão aduzida, a existência do aventado constrangimento ilegal, ônus do qual não se desincumbiu a defesa (...)" (STJ - RHC 64.446/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 19/11/2015, DJe 26/11/2015) (Grifo nosso).
E:
"(...) O remédio heróico do habeas corpus - e, a fortiori, do seu consectário recursal - em sua estreita via, deve vir instruído com todas as provas pré- constituídas das sustentações feitas, já que não se admite dilação probatória (precedentes). (...)" (STJ - RHC 59.095/ES, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 03/11/2015, DJe 11/11/2015) (Grifo nosso). O que se está tentando discutir por esta estreita via é a autoria do crime, que deve ser apurado na demanda principal, não devendo, portanto, ser conhecido, nesta parte, o Habeas Corpus. Ainda, ressalta a Impetrante a necessidade de concessão da ordem ante a falta de fundamentação da decisão que decretou a prisão preventiva. A garantia constitucional consagrada pelo artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal impõe a qualquer juiz ou Tribunal que todas as decisões forenses devem ser fundamentadas, configurando, portanto, uma exigência do Estado Democrático de Direito, e assegurando o exercício de defesa.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADO DO PARANÁ Habeas Corpus Crime nº 1.608.408-1 fls. 8 O artigo 312 do Código de Processo Penal preceitua que a prisão preventiva poderá ser decretada quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria: "Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.
Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4o)". Ao lecionar sobre o tema, o doutrinador Eugênio Pacelli de Oliveira 5, ensina que a prisão preventiva é uma modalidade de prisão que se justifica quando houver a demonstração da necessidade de satisfazer a segregação cautelar. Dito isso, tem-se que a prisão preventiva consubstanciada no artigo 312 do referido Código poderá ser decretada quando presente o fumus comissi delicti e periculum in mora (periculum libertatis). Ainda, devido a excepcionalidade da prisão preventiva, o artigo 282, §6º do CPP preceitua que esta somente será decretada quando não for possível a sua substituição por medidas cautelares previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal. Cabe destacar que conforme construção doutrinária e jurisprudencial, o fumus comissi delicti é consubstanciado pela prova da materialidade e indícios suficientes de autoria, já o periculum libertatis tem como fundamento: a) garantia da ordem pública; b) garantia da ordem
5 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal / Eugênio Pacelli de Oliveira. 20. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2016.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADO DO PARANÁ Habeas Corpus Crime nº 1.608.408-1 fls. 9 econômica; c) garantia de aplicação da lei penal; d) conveniência da instrução criminal 6. Outrossim, como destaca NUCCI 7: "entende-se pela expressão [ordem pública] a necessidade de se manter a ordem na sociedade, que, via de regra, é abalada pela prática de um delito. Se este for grave, de particular repercussão, com reflexos negativos e traumáticos na vida de muitos, propiciando àqueles que tomam conhecimento de sua realização um forte sentimento de impunidade e de insegurança, cabe ao Judiciário determinar o recolhimento do agente". Não basta a fundamentação genérica a despeito dos argumentos para decretar a prisão, mas sim, elementos concretos aptos a embasar a medida excepcional. Dito isso, passo a destacar a decisão que decretou a segregação cautelar do acusado: "Compulsando os autos, verifica-se que a pretensão defensiva não merece ser acolhida. Nada obstante a manutenção da segregação cautelar dos indiciados constitua medida excepcional, no caso em comento ela não é só necessária, mas também indispensável. Primeiramente, em que pese não ser o momento oportuno para adentrar no mérito da causa, importa salientar estarem presentes os pressupostos da prisão preventiva, por restar comprovada a materialidade delitiva através consubstanciados nos documentos acostados nos autos de inquérito policial, sendo que já foram devidamente analisados e sustentados na audiência de custódia. Ressalta-se que os requisitos da segregação cautelar dos Requerentes ainda estão presentes, observando-se que o Juízo da audiência de custódia decretou a prisão preventiva na data de 14 de outubro de 2016, sendo que até o momento não ocorreram fatos capazes de ensejar a revogação da medida. Ademais, embora a defesa sustente que a prisão em flagrante dos indiciados foi ilegal, considerando os meios de investigação utilizado pelos policiais civis, convém ressaltar que o crime de tráfico de drogas é um crime permanente. Ora, sendo permanente o crime de tráfico nas hipóteses "guardar ou ter em depósito drogas para fins de comércio", a todo momento está presente o estado de flagrância,
6 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal volume único. 2ª ed. 3ª tiragem, ver. Amp. E atua. Editora Juspodvim, 2014 7 (in `Código de Processo Penal Comentado'. 12. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 668)
TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADO DO PARANÁ Habeas Corpus Crime nº 1.608.408-1 fls. 10 mesmo em caso do agente policial ter aguardado para prisão. (...) No mais, acerca da alegação de inexistência nos autos de autorização para a realização da ação controlada, à medida em que os policiais agiram desprovidos de qualquer autorização para que fizessem campana no local indicado nas denúncias anônimas, deixando de realizar a prisão em flagrante de eventuais traficantes. Não merece prosperar o pedido. (...) Diante da leitura do citado artigo de lei, pode-se concluir que não fora realizada, no caso dos autos, a denominada não atuação por parte da Polícia. Na hipótese de não atuação policial, há uma inércia da atividade da polícia, a qual aguarda o momento adequado para identificar e responsabilizar o maior número de integrantes de operações de tráfico e distribuição de drogas, não obstante já terem ocorrido situações que possibilitariam a prisão em flagrante. In casu, os policiais civis, após receberem informes anônimos no sentido de haveria indivíduos que realizavam o comércio de drogas na região da Rua São Francisco, realizaram o acompanhamento velado e à distância, a fim de confirmarem a procedência ou não das denúncias anônimas. Porém, conforme se constata nos autos de prisão em flagrante, em que pese o acompanhamento velado dos policiais civis, tal não se caracterizou em ação controlada, sendo importante mencionar que os indiciados foram, inclusive, abordados e presos pela ocorrência do crime de tráfico de drogas por estarem em posse das mesmas no momento. Portanto, não há que se falar na existência de nulidade na atuação policial e nem mesmo no presente processo, razão pela qual rejeito o pedido suscitado pela Defesa, estando a prisão complemente legal. Nesta esteira, conclui-se, no que toca os fundamentos da prisão cautelar, é imperioso reconhecer que o crime praticado, em tese, pelos indiciados, é extremamente grave e abala fortemente a ordem pública, na medida em que a sua conduta reveste-se de uma especial reprovabilidade, o que evidencia a necessidade de manutenção da segregação cautelar sendo certo que, diante do modus operandi utilizado pelos investigados, qual seja, em concurso de pessoas, em via pública, traficar substâncias ilícitas com a participação de menores de idade, justifica a prisão cautelar, evidenciando, assim, a potencialidade lesiva da infração, em tese, perpetrada. Exige-se, pois, para a prática de crimes desta natureza, atuação rigorosa e firme por parte do Poder Judiciário, de modo a se demonstrar que crimes tais serão devidamente apurados e combatidos. (...) Insta ponderar ainda que não há que se falar na aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, em razão da gravidade concreta do delito, circunstâncias e condições dos agentes, o que demonstra que tais medidas não se mostrariam suficientes para coibir a reiteração delitiva, isto porque é notável que em liberdade os indiciados voltaram a delinquir". Do que se extrai do decisium e das demais informações acostadas ao writ, observo que estão presentes os indícios de autoria e materialidade, consolidados no Auto de Prisão em Flagrante (mov. 1.1 e 1.2), TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADO DO PARANÁ Habeas Corpus Crime nº 1.608.408-1 fls. 11 Auto de Exibição e Apreensão (mov. 1.3), Termo de Depoimento (mov. 1.4), Termo de Interrogatório (mov. 1.5). Outrossim, a prisão que decretou a prisão preventiva foi mantida no pleito pela revogação da medida extrema: "Consta nos autos que, após diversas denúncias anônimas relatando tráfico de drogas na Rua São Francisco, Centro, em Curitiba, as equipes policiais realizaram filmagens de forma velada na rua denunciada durante aproximadamente 3 semanas. Durante as filmagens identificaram os responsáveis pela venda de drogas na referida rua. No dia 12/10/2016, a equipe realizou filmagens e assim conseguiu identificar as características físicas dos traficantes, repassou as informações para as outras equipes que realizaram abordagens aos suspeitos (Natanael Pereira da Silva Miranda, Gustavo Luiz Skora, Nicole Valporto de Sá, além dos menores T.B.F. G.R.E. e M.C.). Durante as filmagens ficou claro que os suspeitos deixavam as drogas armazenadas em seu poder, porém em mínimas quantidades e o restante da droga ficava no chão. As equipes da DENARC realizaram a abordagem aos suspeitos, que foram filmados vendendo droga e apreenderam 100 gramas de maconha, 134 pontos de LSD, meio grama de MD e R$706,00 na posse dos suspeitos e no chão, próximo ao local de abordagem. Nesse compasso, a materialidade e a autoria delitiva se restam satisfatoriamente demonstradas. A materialidade delitiva pode ser aferida pelo auto de apreensão de evento 1.3, onde consta a apreensão das substâncias ilícitas encontradas na posse dos autuados. A autoria, a seu turno, pode ser extraída, mormente pelo relato: " (...) que visando apurar denúncias anônimas de tráfico de drogas na Rua São Francisco, Centro, em Curitiba; Que a equipe conseguiu realizar filmagens identificar as características físicas dos traficantes, repassou as informações para outras equipes que realizaram abordagens aos suspeitos (Natanael Pereira da Silva Miranda, Gustavo Luiz Skora, Nicole Valporto de Sá, além dos menores Thaizy Bayer França, Guilherme Reis Egídio e Marlon Carvalho). Que durante a filmagem ficou claro que os suspeitos deixavam as drogas armazenadas em seu poder, porém em mínimas quantidades e o restante da droga ficava no chão, que as equipes da Denarc realizaram a abordagem aos suspeitos que foram filmados vendendo droga e apreenderam 100 gramas de maconha, 134 pontos de LSD, meio grama de MD e R$ 706,00 na posse dos suspeitos e no chão, próximo ao local da abordagem. Que na posse de Gustavo, foram encontrados 67 gramas de Maconha, além de R$ 320,00. Que na posse de Natanael foram encontrados R$ 174,00, além de uma porção de 20 gramas de maconha, encontradas próxima ao local onde foi abordado, no chão. Que na posse de C. (menor de idade) foram localizados 13 pontos de LSD e R$55,00. Que na posse de Marlon é namorado de Nicole. Que após a revista de Nicole e da menor T. que foram deixadas na sala separada dos TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADO DO PARANÁ Habeas Corpus Crime nº 1.608.408-1 fls. 12 demais detidos na Delegacia, foram localizados 121 pontos de LSD escondidos na janela da sala da Delegacia onde estavam detidas, droga esta dispensada por uma das duas antes da revista, Que Nicole, T. e M. (T. e M. menores de idade) foram filmados comercializando entorpecentes, restando demonstrado nas filmagens M. passando dinheiro para Nicole guardar, M. chamando Nicole que vai ao encontro dele levar uma porção de maconha que é fornecida para um usuário e T. recebendo drogas de M (...)". O requisito periculum libertatis, também se faz presente, conforme se demonstra. Para tanto, faz-se necessária a segregação cautelar dos investigados, a fim de se garantir a ordem pública. (...) Nesse primeiro momento o modus operandi utilizado pelos investigados, qual seja, em concurso de pessoas, em via pública, traficar substâncias ilícitas sem se intimidar com a prática do crime perante terceiros, evidencia considerável nível de ousadia e periculosidade dos indiciados, o que já justifica o decreto da custódia preventiva, sob o fundamento da garantia da ordem pública. (...) ainda, salienta- se a quantidade e variedade de substancia entorpecente encontrada na posse dos autuados, 20 gramas de maconha na posse de Natanael Pereira, 67 gramas de maconha com Gustavo Luiz Skora e 121micro pontos de LSD apreendidos com Nicole Valporto de Sá, substâncias altamente viciantes, ademais da forma como estavam armazenadas, vale dizer, embaladas para venda, revelando indícios da atividade ilícita de intensidade e vulto consideráveis, o que já justifica a custódia. (...) Outrossim, os delitos praticados pelos acautelados são graves e abalam fortemente a ordem pública, uma vez que são diretamente responsáveis pelo aumento da violência e da criminalidade nesta urbe, desencadeando, ainda, outros crimes como furtos e até mesmo homicídios, degradando ainda mais a nossa sociedade (...) Some-se a isto o fato de que a ordem pública se verá abalada com a soltura dos indiciados, pois denota-se dos elementos cotejados até o presente momento, que soltos, voltarão a praticar delitos, uma vez que se encontram desempregados e, ao que indica, fazem do crime meio de ganhar a vida. Nesses casos, a prisão cautelar justificada no resguardo da ordem pública visa prevenir a reprodução de fatos criminosos e acautelar o meio social, retirando do convívio da comunidade aquele que, diante de sua conduta, demonstra ser dotado de periculosidade. E diga-se, também, que não se trata de juízo de culpabilidade do agente e sim de periculosidade feito com base em dados empíricos e concretos do caso em análise. Por fim, tenho que não se faz suficiente a substituição da custódia preventiva por quaisquer das medidas cautelares diversas da prisão preventiva". Pois bem, conforme pode-se observar, as decisões supracitadas preenchem os requisitos previstos no artigo 312 do Código de Processo Penal, vez que presente o periculum libertatis, consubstanciado especialmente no modus operandi utilizado pelos acusados. TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADO DO PARANÁ Habeas Corpus Crime nº 1.608.408-1 fls. 13 Note-se que após o recebimento de diversas denúncias anônimas a autoridade policial realizou filmagens no local do suposto cometimento do delito, e que, após aproximadamente três semanas puderam identificar os suspeitos pela venda de material entorpecente. Não obstante, ainda no tocante ao modus operandi, tem- se que os acusados deixaram as drogas armazenadas em seu poder, sendo que uma quantidade mínima da droga era deixada no chão. Ademias, é de suma relevância destacar a expressiva quantidade de droga que foi apreendida com os investigados (aproximadamente oitenta e sete gramas de "maconha", cento e vinte um micro pontos de "LSD") além da elevada quantia em dinheiro (pouco menos de quinhentos reais). Oportuno se torna dizer que os investigados agiram em concurso de pessoas, em via pública para traficar substâncias entorpecentes com a participação de menores de idade, restando evidente a organização do grupo para a prática de infrações penais. Ainda, como pode-se observar, o tráfico não ocorreu de forma infrequente, mas sim, durante toda a investigação (três semanas), bem como o período anterior que supostamente se praticava o tráfico, tendo em vista as "denúncias" anônimas prestadas à autoridade policial. Dito isso, é de se ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça admite que a periculosidade do agente demonstrada pela gravidade em concreto justifica a medida extrema para o fim da garantia da ordem pública, especialmente pela quantidade de droga apreendida. Vejamos:
"HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DO RECURSO PRÓPRIO. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. (...) GRAVIDADE CONCRETA DOS FATOS; GRANDE QUANTIDADE DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE APREENDIDA; PERICULOSIDADE DO PACIENTE. IRRELEVÂNCIA DAS CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. INVIABILIDADE DAS MEDIDAS CAUTELARES DO ART. 319 DO CPP.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADO DO PARANÁ Habeas Corpus Crime nº 1.608.408-1 fls. 14 CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO. WRIT NÃO CONHECIDO. (...) 2. Caso em que o acusado foi preso em flagrante, portando 1 tijolo de maconha com 678g - circunstância que aponta para a gravidade concreta da conduta perpetrada e a periculosidade social do paciente. 3. A gravidade concreta dos fatos é fundamento idôneo para decretação da prisão preventiva (Precedentes). (...)"(HC 336.787/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 10/11/2015, DJe 17/11/2015).(Grifo nosso).
Nesse mesmo sentido:
"PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. PRISÃO. (...) CUSTÓDIA PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA E EXISTÊNCIA DE OUTROS PROCEDIMENTOS CRIMINAIS QUE ENVOLVEM OS PACIENTES. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. (...) 2. A teor do art. 312 do Código de Processo Penal, a prisão preventiva poderá ser decretada quando presentes o fumus comissi delicti, consubstanciado na prova da materialidade e na existência de indícios de autoria, bem como o periculum libertatis, fundado no risco de que o agente, em liberdade, possa criar à ordem pública/econômica, à instrução criminal ou à aplicação da lei penal. 3. No caso, a decisão do magistrado de primeiro grau encontra-se fundamentada na garantia da ordem pública, considerando a grande quantidade de droga apreendida (1,97kg de maconha) e os demais procedimentos criminais que envolvem os pacientes, circunstâncias que demonstram a gravidade concreta da conduta perpetrada e a periculosidade social dos agentes. 4. Recurso ordinário não provido". (RHC 64.184/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA, julgado em 19/11/2015, DJe 14/12/2015) (Grifo nosso). Não obstante, a defesa pugna pela concessão do remédio constitucional alegando em síntese, que o acusado apresenta boas condições, tais como primariedade (mov. 1.8 dos autos Projudi nº 0022907- 50.2016.8.16.0013, residência fixa (fls. 16) e ocupação lícita. Em que pese tais argumentos, entendo que o pleito não merece prosperar, isto porque, conforme reiterado entendimento doutrinário 8
8 Em relação ás condições pessoais do indivíduo, as de caráter favorável ao indivíduo ou acusado tais como primariedade, bons antecedentes, residência fixa, etc. não significam qualquer óbice para a decretação ou a manutenção do encarceramento cautelar, TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADO DO PARANÁ Habeas Corpus Crime nº 1.608.408-1 fls. 15 e jurisprudencial, somente é possível a concessão da ordem não tão somente quando presentes meras condições pessoais favoráveis, mas principalmente quando preenchidos os requisitos da revogação da prisão preventiva, o que não prepondera no caso em apreço, vez que já demonstrada de forma fundamentada a real necessidade de segregação cautelar de Natanael Pereira da Silva Miranda. Sobre o tema, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: "PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. NÃO CABIMENTO. EXTORSÃO E ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. ALEGADA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DECRETO PRISIONAL. SEGREGAÇÃO CAUTELAR DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. (...) - Condições pessoais favoráveis, tais como primariedade, ocupação lícita e residência fixa, entre outras, não têm o condão de, por si sós, garantirem ao paciente a revogação da prisão preventiva, se há nos autos elementos hábeis a recomendar a manutenção de sua custódia cautelar, como in casu (precedentes). Habeas corpus não conhecido". (STJ, Quinta Turma. HC nº 341.552/SP. Relator: Ministro Felix Fischer. Julgado em 23/02/2016, (grifo nosso).
E:
AÇÃO DE HABEAS CORPUS - ESTELIONADO TENTADO - CUSTÓDIA PREVENTIVA - FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO NÃO EVIDENCIADA - CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS - AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL - ORDEM DENEGADA. Justifica-se a necessidade de garantir a ordem pública, como forma de acautelar a sociedade, para evitar a reiteração da prática delitiva, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal.As condições pessoais favoráveis do acusado não impedem a prisão preventiva.Ordem conhecida e denegada. (TJPR - 5ª C.Criminal - HCC - 1580026-9 - Curitiba - Rel.: Jorge Wagih Massad - Unânime - - J. 06.10.2016) (Grifo nosso).
desde, é claro, que presentes os pressupostos legais e fáticos para a constrição provisória. No âmbito dos Tribunais Superiores, inclusive, tem sido reiterado o entendimento de que "eventuais condições pessoais favoráveis ao Recorrente tais como primariedade, bons antecedentes, endereço certo, família constituída ou profissão lícita não garantem o direito à revogação da custódia cautelar, quando presentes os requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal" (STJ, HC 21.989/CE, DJ 19.12.2007). (AVENA, Norberto. Processo Penal Esquematizado. 1ª Edição. Rio de Janeiro: Editora Método, 2009, p. 806-807)
TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADO DO PARANÁ Habeas Corpus Crime nº 1.608.408-1 fls. 16
Diante de todo o exposto, não conheço da presente ordem, e indefiro de ofício o presente remédio constitucional.
III DECISÃO: Diante do exposto, acordam os Desembargadores da 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade, em ordem não conhecida. Participaram da sessão e acompanharam o voto do Relator Excelentíssimos Senhores Desembargadores JORGE WAGIH MASSAD e LUIZ OSORIO MORAES PANZA.
Curitiba, 02 de março de 2017.
Ruy A. Henriques Juiz de Direito Substituto em 2º Grau Relator
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