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Acórdão
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Certificado digitalmente por: FERNANDO PAULINO DA SILVA WOLFF FILHO ESTADO DO PARANÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento n.º 1617231-9, da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba. Agravante : Península Internacional S/A Em Recuperação Judicial. Adm. Jud. : Guimarães e Bordinhão Advogados Associados. Relator : Des. Fernando Paulino da Silva Wolff Filho. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL APROVADO E HOMOLOGADO EM PRIMEIRO GRAU. CLÁUSULA DO PLANO PREVENDO A SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DAS GARANTIAS E SUA LIBERAÇÃO CASO QUITADOS OS DÉBITOS GARANTIDOS PELA RECUPERANDA. MANIFESTACÃO DE VON- TADE SOBERANA DOS CREDORES QUE NÃO PODE SOFRER INTERFERÊNCIA JUDICIAL, TANTO MAIS SE NÃO VIOLA QUAL- QUER DISPOSIÇÃO LEGAL, ALÉM DE ENCONTRAR ABRIGO NO DISPOSITIVO QUE FACULTA AO CREDOR A SUPRESSÃO DA GARANTIA (ART. 50, § 1º, DA LEI Nº 11.101/05). QUESTÃO QUE NÃO FOI ANALISADA À LUZ DA INTERPRETAÇÃO ABS- TRATA DA LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA, MAS SIM A PARTIR DA DELIBERAÇÃO DOS CREDORES EM ASSEMBLEIA-GERAL. EN- TENDIMENTO DO STJ NO LEADING CASE (RECURSO ESPECIAL Nº 1.333.349/SP), NO SENTIDO DE QUE A APROVAÇÃO DO PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL NÃO AFETA AS GARANTIAS. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 49, § 1º, 59 E 61, § 2º, DA LEI Nº 11.101/05 QUE CONDUZ À CONCLUSÃO DIVERSA, OU SEJA, QUE A APROVAÇÃO DO PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL SUSPENDE A EXIGIBILIDADE DAS GARANTIAS ATÉ QUE SEJAM CUMPRIDAS AS CONDIÇÕES DO PLANO, MAS AS PRESERVANDO. TERMO § 2º, QUE PRESSUPÕE QUE ELAS SÃO ANTERIORMENTE AFETADAS. NA LEI NÃO SE PRESUMEM PALAVRAS INÚTEIS. VERBA CUM EFFECTU SUNT ACCIPIENDA. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO. I. Ao deliberarem pela suspensão da exigibilidade e posterior liberação das garantias, mas apenas se quitados os débitos, os credores manifestaram soberanamente sua vontade, sem que dela se possa extrair qualquer indício de ilegalidade; muito ao contrário, já que observaram a regra legal específica da recuperação judicial que, a despeito da novação dos créditos, assegura a preservação da garantia para a hipótese de descumprimento do Plano de Recuperação Judicial, diferentemente da novação civil, que de regra extingue as garantias. II. A ratio da Lei nº 11.101/05 é suspender a exigibilidade das garantias caso aprovado o Plano de Recuperação Judicial e operada a novacão das dívidas, mas as preservando para o caso de descumprimento do plano, em plena consonância com a previsão do art. 49, § 1º, que estabelece a conservação dos direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso. III. Se a lei prevê a reconstituição das garantias nas condições originalmente contratadas caso o Plano de Recuperacão Judicial seja descumprido e convolada a recuperação judicial em falência (art. 61, § 2º, da Lei nº 11.101/05), é porque ela pressupõe que, em momento anterior, as garantias de algum modo foram afetadas. E esse momento é justamente a aprovação do plano, que implica a novação sob condição resolutiva, suspendendo a exigibilidade das garantias no período de cumprimento do plano pela empresa recuperanda, a fim de que sejam TRIBUNAL DE JUSTIÇA prestigiadas as condições aprovadas no plano, geralmente mais benéficas. IV. Não fossem as garantias afetadas quando aprovado e homologado o plano, o legislador não preveria expressamente sua reconstituição na hipótese em que convolada a recuperação judicial em falência, já que a lei, como se sabe, não contém palavras inúteis (verba cum effectu sunt accipienda). V. Em resumo, uma vez aprovado o Plano de Recuperação Judicial, com condições geralmente distintas das originalmente contratadas (e favoráveis à recuperanda), suspende-se a exigibilidade das garantias, até porque não é justo nem jurídico que o coobrigado e/ou garantidor seja cobrado por quantias e em condições diversas daquelas acordadas no plano. Vistos, etc. Neste agravo de instrumento, interposto com requerimento de efeito suspensivo, a recuperanda pretende a reforma da decisão proferida na ação de recuperação judicial nº 0001967-67.2015.8.16.0185 por meio da qual a Juíza de Direito Substituta, Dra. Diele Denardin Zydek, homologou o Plano de Recuperação Judicial aprovado pela Assembleia-Geral de Credores e, de consequência, concedeu a recuperação judicial pleiteada pela recuperanda, ora agravada (mov. 5671). Em suas razões recursais (mov. 6116), a recuperanda, ora agravante, sustenta, em síntese, que: a) é cabível o agravo de instrumento contra a 11.101/05 c/c art. 1015, XIII, do NCPC; b) o recurso se volta especificamente em relação à parte da decisão que anulou as cláusulas 7.6, 7.6.1, 7.7 e 7.7.1; c) a decisão agravada não representa a vontade da maioria dos credores, tampouco a melhor interpretação das normas aplicáveis; d) os direitos creditórios detidos pelos credores são absolutamente disponíveis, podendo ele sobrestar o seu direito de cobrá-los dos garantidores, conforme previsto no Plano de Recuperação Judicial (PRJ); e) a aprovação do plano e a concessão da recuperação judicial vincula todos os credores a ele, mesmo aqueles que votaram contrariamente à sua aprovação; f) não há que se falar em ilegalidade das cláusulas que suspendem as garantias, uma vez que elas não preveem a sua imediata liberação, mas sim a mera suspensão de sua exigibilidade; g) conforme consta nas cláusulas 7.6 e 7.7 do PRJ, a extinção/liberação das garantias somente ocorrerá com a quitação das obrigações previstas no PRJ; h) a despeito do disposto na súmula nº 581 do STJ, recentemente a Corte Superior se posicionou pela possibilidade de supressão das garantias, desde que haja expressa previsão no PRJ, conforme acórdão publicado em 10/10/2016; i) o PRJ consiste em um acordo de vontades relativo a direitos disponíveis, aplicando-se a ele o princípio da autonomia da vontade; j) alternativamente, caso vencida a tese de plena validade das referidas cláusulas do PRJ, deve-se considerar que a sua anulação deve atingir apenas os credores que ressalvaram sua discordância em relação a elas; e k) estão presentes os requisitos autorizadores da atribuição de efeito suspensivo ao recurso. Intimados, os credores interessados ofereceram suas contrarrazões (protocolos nº 201700067010, 201700064841, 201700064551, 201700064402, 201700064037, 201700052621, 201700051200 e 201700044255), bem como se manifestou a administradora judicial (protocolo nº 201700066676). Conclusos para julgamento, os autos foram incluídos em pauta. É o relatório.
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Voto I Preliminarmente, em se tratando de decisão homologatória do Plano de Recuperação Judicial (PRJ), assento o cabimento do presente agravo de instrumento, seja porque o inconformismo versa sobre o mérito da questão (art. 1015, II, do NCPC) - ponto específico do PRJ -, seja porque às ações de falência e recuperação judicial aplica-se, por inequívoca simetria (não submissão da controvérsia, de regra, ao exame do Tribunal em sede de apelação, conforme art. 100 da Lei nº 11.101/05), o disposto no art. 1015, parágrafo único, do NCPC, segundo o qual "também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário". II No mérito, agravante tem razão. Isso porque, como bem observou a recuperanda, já há decisão desta Câmara, em acórdão de minha lavra, reconhecendo a soberania da Assembleia-Geral de Credores e respectiva validade da cláusula que suspende a exigibilidade do crédito face aos garantidores. A propósito, confira-se a ementa do julgado: RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DECISÃO QUE HOMOLOGA O PLANO. POSSIBILIDADE DE CONTROLE JUDICIAL DA LEGALIDADE DAS DISPOSIÇÕES DO PLANO. ENUNCIADO Nº 44 DA 1ª JORNADA DE DIREITO COMERCIAL. ALEGAÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DO PRAZO DE 30 DIAS PREVISTO PARA ANÁLISE E OFERECIMENTO DE EVENTUAIS OBJEÇÕES (ART.55 DA LEI Nº 11.101/05). REJEIÇÃO. ALTERAÇÕES NO PLANO ORIGINAL EM RAZÃO DAS DELIBERAÇÕES NA ASSEMBLEIA-GERAL DE CREDORES. DESNECESSIDADE DE CONCESSÃO DE NOVO PRAZO DE 30 DIAS A CADA EXPRESSAMENTE ADMITIDA PELA LEI COMO MEIO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL (ART. 50, I, DA LEI Nº 11.101/05).APROVAÇÃO DO DESÁGIO PELOS CREDORES SEGUNDO OS CRITÉRIOS MÍNIMOS EXIGIDOS POR LEI (ART. 58, §1º, I A III DA LEI Nº 11.101/05). DIREITOS PATRIMONIAIS DISPONÍVEIS DOS CREDORES. POSSIBILIDADE DE A EMPRESA INVESTIDORA (ADQUIRENTE DA TOTALIDADE DAS AÇÕES DAS RECUPERANDAS) CONTESTAR EVENTUAIS CRÉDITOS NÃO HABILITADOS, NA FORMA ASSEGURADA ÀS PRÓPRIAS RECUPERANDAS. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DAS GARANTIAS. POSSIBILIDADE. NOVAÇÃO SOB CONDIÇÃO RESOLUTIVA. ARTS. 49, §1º, 59 E 61, §2º, DA LEI Nº 11.101/05. EXONERAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES DOS ADMINISTRADORES, DIRETORES E ACIONISTAS POR ATOS DE GESTÃO. ILEGALIDADE. RESPONSABILIDADE PREVISTA EM LEI (LEI DAS SOCIEDADES ANÔMIMAS) POR ATOS DE GESTÃO FRAUDULENTOS OU CONTRÁRIOS À LEI QUE NÃO PODE SER SUPLANTADA POR DECLARAÇÃO DE VONTADE PREVISTA NO PLANO. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO (TJPR - 17ª C.Cível - AI - 1207219- 2 - Araucária - Rel.: Fernando Paulino da Silva Wolff Filho - Unânime - - J. 04.03.2015). Mas não é só. Recentemente, em virtude de recurso especial interposto por credor insatisfeito contra tal decisão justamente na parte que versava sobre as garantias, os autos retornaram para o exercício do juízo de retratação previsto no art. 1030, II, do NCPC, ocasião em que me debruçando e aprofundando sobre essa questão, reafirmei o entendimento, por acórdão assim fundamentado, no que aqui interessa: TRIBUNAL DE JUSTIÇA
"O acórdão recorrido, todavia, não comporta a reforma pretendida pelo agravante. Isso porque a suspensão da exigibilidade e posterior liberação das garantias, desde que quitados os valores assumidos pela recuperanda no PRJ, foi objeto de decisão soberana da Assembleia-Geral de Credores (AGC), vale dizer, os próprios credores anuíram com a proposta, manifestação de vontade que não pode ser desconsiderada, até porque, como se explicou no acórdão recorrido, ela não viola qualquer disposição legal, além de encontrar abrigo no art. 50, § 1º, da Lei nº 11.101/05, que confere ao credor a prerrogativa de suprimir a garantia de que é titular. Ora, ao prever a mera suspensão da exigibilidade e condicionar a liberação das garantias à quitação dos débitos assumidos pela recuperanda, o PRJ está claramente em conformidade com as disposições do art. 59 da Lei nº 11.101/05, que prevê a novação sob condição resolutiva, e do art. 49, § 1º da mesma Lei, segundo o qual "os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso", já que, uma vez operada a novação sob condição resolutiva, a exigibilidade das garantias ficará meramente suspensa, mantendo-as hígidas, no entanto. A propósito, no próprio acórdão paradigma o Min. Relator alertou para a diferença que existe entre a novação civil e a novação ocorrida no âmbito da recuperação judicial, destacando que na segunda espécie as garantias não são afetadas, in verbis: "Com efeito, percebe-se de logo que a novação prevista na lei civil é bem diversa daquela disciplinada na Lei n. 11.101/2005. Se a novação civil faz, como regra, extinguir as garantias da dívida, inclusive as reais prestadas por terceiros estranhos ao pacto (art. 364 do Código Civil), a novação decorrente do plano de recuperação traz, como regra, ao reverso, a manutenção das garantias (art. 59, caput, da Lei n. 11.101/2005), as quais só serão suprimidas ou substituídas "mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia", por ocasião da alienação do bem gravado (art. 50, § 1º). Por outro lado, a novação específica da recuperação desfaz-se na hipótese
direitos e garantias nas condições originalmente contratadas" (art. 61, § 2º). Logo, ao deliberarem pela suspensão da exigibilidade e posterior liberação das garantias, mas apenas se quitados os débitos, os credores manifestaram soberanamente sua vontade e sem que dela se possa extrair qualquer indício de ilegalidade; muito ao contrário, já que observaram a regra legal específica da recuperação judicial que, a despeito da novação dos créditos, assegura a preservação da garantia para a hipótese de descumprimento do PRJ, diferentemente da novação civil, que, como se viu, de regra extingue as garantias. Em suma, o acórdão recorrido não negou vigência às disposições legais ventiladas no recurso especial, tampouco contraria o entendimento firmado pelo STJ no leading case, já que, no caso, a suspensão da exigibilidade das garantias é cláusula do próprio Plano de Recuperação Judicial. Situação diversa seria caso se estivesse discutindo nos autos o prosseguimento de ações e execuções contra garantidores em hipótese na qual o PRJ não versasse sobre esse assunto, caso em que se poderia cogitar na aplicação do entendimento do STJ, firmado à luz de sua interpretação abstrata dos dispositivos legais em questão, ou seja, sem o exame concreto da manifestação de vontade dos credores em sentido diverso, a exemplo do caso dos autos. II Ainda que assim não fosse, ou seja, mesmo que superado o fato de que a questão foi analisada pelo Colegiado à luz da soberania da decisão da AGC e da inexistência de vício de ilegalidade que justificasse a interferência judicial naquilo que fora deliberado pelos credores, entendo, com todo o respeito, que o entendimento firmado pelo STJ no leading case não reflete a melhor interpretação dos dispositivos aplicáveis. Veja-se que o próprio Min. Relator, como adiantado acima, minuciosamente diferenciou a novação civil da novação prevista no art. 59 da Lei nº 11.101/05, concluindo que, na segunda hipótese, diferentemente da primeira, a novação não acarreta a extinção automática das garantias. Se não as extingue, parece evidente que a ratio da Lei nº 11.101/05 é suspender a exigibilidade das garantias caso aprovado o PRJ e operada a novacão das dívidas em condições geralmente mais benéficas à recuperanda, mas as preservando para o caso de descumprimento do PRJ, em plena consonância com a previsão do art. 49, § 1º, que estabelece a conservação dos direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso.
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O caso dos autos é exemplo claro disso, uma vez que os credores abriram mão de percentual considerável dos seus créditos (vide tópico sobre a legalidade do deságio reconhecida noa acórdão recorrido), não fazendo qualquer sentido que eles possam prosseguir com a cobrança dos valores originalmente contratados face aos coobrigados, os quais, nessa hipótese, seriam cobrados em quantia superior e em condições diversas das acordadas no PRJ, já que o título que embasaria a cobrança evidentemente não seria o PRJ, mas sim o originalmente firmado pelos coobrigados/garantidores. Para arrematar, penso que o art. 61, § 2º dirime qualquer dúvida sobre a questão, pois estabelece que, uma vez convolada a recuperação judicial em falência, os credores terão reconstituídos seus direitos e garantias nas condições originalmente contratadas. Ora, se a lei prevê a reconstituição das garantias nas condições originalmente contratadas caso o PRJ seja descumprido e convolada a recuperação judicial em falência, é porque ela pressupõe que, em momento anterior, as garantias de algum modo foram afetadas. E esse momento é justamente a aprovação do PRJ, que implica a novação sob condição resolutiva, suspendendo a exigibilidade das garantias no período de cumprimento do plano pela empresa recuperanda, a fim de que sejam prestigiadas as condições aprovadas no plano, geralmente mais benéficas. Caso preservado o entendimento segundo o qual o deferimento da recuperação judicial e subsequente aprovação e homologação do PRJ não atinge as garantias e coobrigados, estar-se-ia fazendo letra morta o mencionado art. 61, § 2º, da Lei nº 11.101/05, que textualmente reconhece a afetação das garantias ao prever sua reconstituição caso venha a ser decretada a falência. Não houvesse tal afetação, por óbvio que o legislador não preveria expressamente sua reconstituição, já que a lei, como se sabe, não contém palavras inúteis (verba cum effectu sunt accipienda, ou seja, as palavras devem ser compreendidas como tendo alguma eficácia). Não se presumem, na lei, palavras inúteis (Carlos Maximiliano, Hermenêutica e Aplicação do Direito, 8a. ed., Freitas Bastos, 1965, p. 262). Assim, a meu sentir, uma vez aprovado o PRJ, com condições geralmente distintas das originalmente contratadas (e favoráveis à recuperanda), suspende-se a exigibilidade das garantias, até porque não é justo nem jurídico que o coobrigado seja cobrado por quantias e em condições diversas daquelas acordadas no PRJ". Ao referido acórdão desta Câmara foi conferida a seguinte ementa: RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL APROVADO E HOMOLOGADO EM PRIMEIRO GRAU. CLÁUSULA DO PLANO PREVENDO A SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DAS GARANTIAS E SUA LIBERAÇÃO CASO QUITADOS OS DÉBITOS GARANTIDOS PELA RECUPERANDA. MANIFESTACÃO DE VONTADE SOBERANA DOS CREDORES QUE NÃO PODE SOFRER INTERFERÊNCIA JUDICIAL, TANTO MAIS SE NÃO VIOLA QUALQUER DISPOSIÇÃO LEGAL, ALÉM DE ENCONTRAR ABRIGO NO DISPOSITIVO QUE FACULTA AO CREDOR A SUPRESSÃO DA GARANTIA (ART. 50, § 1º, DA LEI Nº 11.101/05). QUESTÃO QUE NÃO FOI ANALISADA À LUZ DA INTERPRETAÇÃO ABSTRATA DA LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA, MAS SIM A PARTIR DA DELIBERAÇÃO DOS CREDORES EM ASSEMBLEIA-GERAL. ENTENDIMENTO DO STJ NO LEADING CASE (RECURSO ESPECIAL Nº 1.333.349/SP), NO SENTIDO DE QUE A APROVAÇÃO DO PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL NÃO AFETA AS GARANTIAS. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 49, § 1º, 59 E 61, § 2º, DA LEI Nº 11.101/05 QUE CONDUZ À CONCLUSÃO DIVERSA, OU SEJA, QUE A APROVAÇÃO DO PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL SUSPENDE A EXIGIBILIDADE DAS GARANTIAS ATÉ QUE SEJAM CUMPRIDAS AS CONDIÇÕES DO PLANO, MAS AS PRESERVANDO. TERMO "RECONSTITUIÇÃO DAS GARANTIAS" PREVISTO NO ART.61, § 2º, QUE PRESSUPÕE QUE ELAS SÃO ANTERIORMENTE AFETADAS. NA LEI NÃO SE PRESUMEM PALAVRAS INÚTEIS. VERBA CUM EFFECTU SUNT ACCIPIENDA. ACÓRDÃO MANTIDO EM TODOS OS SEUS TERMOS. I. Ao deliberarem pela suspensão da exigibilidade e posterior liberação das garantias, mas apenas se quitados os débitos, TRIBUNAL DE JUSTIÇA
os credores manifestaram soberanamente sua vontade, sem que dela se possa extrair qualquer indício de ilegalidade; muito ao contrário, já que observaram a regra legal específica da recuperação judicial que, a despeito da novação dos créditos, assegura a preservação da garantia para a hipótese de descumprimento do Plano de Recuperação Judicial, diferentemente da novação civil, que de regra extingue as garantias. II. O acórdão recorrido não negou vigência às disposições legais ventiladas no recurso especial, tampouco contraria o entendimento firmado pelo STJ no leading case, já que, no caso, a suspensão da exigibilidade das garantias é cláusula do próprio Plano de Recuperação Judicial, tendo a questão sido analisada sob o enfoque da soberania da vontade manifestada pelos credores. III. A ratio da Lei nº 11.101/05 é suspender a exigibilidade das garantias caso aprovado o Plano de Recuperação Judicial e operada a novacão das dívidas, mas as preservando para o caso de descumprimento do plano, em plena consonância com a previsão do art. 49, § 1º, que estabelece a conservação dos direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso. IV. Se a lei prevê a reconstituição das garantias nas condições originalmente contratadas caso o Plano de Recuperacão Judicial seja descumprido e convolada a recuperação judicial em falência (art. 61, § 2º, da Lei nº 11.101/05), é porque ela pressupõe que, em momento anterior, as garantias de algum modo foram afetadas. E esse momento é justamente a aprovação do plano, que implica a novação sob condição resolutiva, suspendendo a exigibilidade das garantias no período de cumprimento do plano pela empresa recuperanda, a fim de que sejam mais benéficas. V. Não fossem as garantias afetadas quando aprovado e homologado o plano, o legislador não preveria expressamente sua reconstituição na hipótese em que convolada a recuperação judicial em falência, já que a lei, como se sabe, não contém palavras inúteis (verba cum effectu sunt accipienda). VI. Em resumo, uma vez aprovado o Plano de Recuperação Judicial, com condições geralmente distintas das originalmente contratadas (e favoráveis à recuperanda), suspende-se a exigibilidade das garantias, até porque não é justo nem jurídico que o coobrigado e/ou garantidor seja cobrado por quantias e em condições diversas daquelas acordadas no plano. (TJPR - 17ª C.Cível - AI - 1207219-2 - Araucária - Rel.: Fernando Paulino da Silva Wolff Filho - Unânime - - J. 14.12.2016). Essa compreensão, frise-se, foi recentemente adotada pelo próprio Superior Tribunal de Justiça no âmbito do RESp 1.532.943/MT, conforme bem assinalado pela agravante ao transcrever a ementa do julgado em suas razões recursais (o que aqui deixo de fazer por brevidade e economia processuais). Nesse cenário, não decidiu com acerto desta feita a juíza de direito, uma vez que as cláusulas em questão refletem a vontade dos credores e não colidem com qualquer previsão legal. Posto isso, DOU PROVIMENTO ao recurso, para julgar válidas as cláusulas do PRJ que suspenderam a exigibilidade das garantias prestadas por terceiros, vinculando-as ao cumprimento pela recuperanda do PRJ. Descumprido o PRJ pela recuperanda, poderão os credores acionar os devedores TRIBUNAL DE JUSTIÇA
solidários/garantidores. Dispositivo Acordam os integrantes da Décima Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade de votos, em DAR PROVIMENTO ao agravo de instrumento, nos termos do voto do relator. Curitiba, junho de 2017. Des. Fernando Paulino da Silva Wolff Filho Relator
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