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Acórdão
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Certificado digitalmente por: NAOR RIBEIRO DE MACEDO NETO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº. 1.655.061-1 2ª VARA CRIMINAL DE ARAPONGAS RECORRENTE: EDSON INÁCIO RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ RELATOR CONV.: NAOR R. DE MACEDO NETO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. INSURGÊNCIA DA DEFESA EM FACE DA DECISÃO DE PRONÚNCIA DO ACUSADO PELO CRIME DE TENTATIVA DE HOMICÍDIO. PLEITO DESCLASSIFICATÓRIO PARA O DELITO DE LESÃO CORPORAL DE NATUREZA LEVE. ACOLHIMENTO. LASTRO PROBATÓRIO SUFICIENTE PARA AFASTAR O ANIMUS NECANDI. RECURSO PROVIDO, COM A DECLARAÇÃO DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DO AGENTE PELA PRESCRIÇÃO. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Recurso em Sentido Estrito nº 1.655.061-1, da 2ª Vara Criminal de Arapongas, em que é recorrente Edson Inácio e recorrido Ministério Público do Estado do Paraná. Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pela defesa em face da r.decisão que pronunciou o réu Edson Inácio como incurso nas sanções do art. 121, caput c.c. art. 14, inc. II, ambos do Código Penal, tendo em vista os seguintes fatos assim descritos na denúncia: "Em 17 de dezembro de 2010, por volta das 02h, na residência situada na Rua Caracara Cancan, nº 77, Arapongas/PR, o denunciado EDSON INÁCIO, de forma consciente e voluntária e imbuído de inequívoco propósito de matar, utilizando-se de uma faca, desferiu 02 (dois) golpes contra a vítima CLEMENTE GALETE, atingindo-a no lado esquerdo do abdômen, na altura das costelas, causando-lhe lesões corporais de natureza leve, conforme laudo de f. 38. Após o primeiro golpe de faca, a vítima tentou segurar o denunciado para o lado de fora da casa, prendendo seu braço entre a porta e o batente, mas ele conseguiu invadir novamente o recinto e efetuar o segundo golpe de faca contra a vítima, que então pegou uma cadeira e com ela atingiu o denunciado por duas ou três vezes até que ele deixou a residência. O resultado morte, assim, não se consumou pela reação da vítima e pela pronta intervenção de terceiros que a encaminharam para atendimento médico." (mov. 1.1) Em suas razões, o nobre defensor pede a desclassificação do crime de tentativa de homicídio para lesão corporal de natureza leve, argumentando que o réu jamais teve intenção de matar a vítima, sendo certo que a decisão de pronúncia não encontra respaldo na prova coligida ao feito (mov. 24.1 págs. 201/202). O Ministério Público apresentou contrarrazões (mov. 27.1 págs. 206/211). Em sede de juízo de retratação foi mantida a decisão por seus próprios fundamentos (mov. 30.1 - pág. 215).
A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer do ilustrado Dr. Milton Riquelme de Macedo, manifestou-se pelo desprovimento do recurso (págs. 236/240-TJ). É o relatório. VOTO Insurge-se a defesa técnica contra a r.decisão judicial que pronunciou o réu Edson Inácio como incurso nas sanções do delito tipificado no art. 121, caput c.c. art. 14, inc. II, ambos do Código Penal. O pedido deduzido no recurso é de desclassificação, afastando do dolo homicida, para que o réu responda apenas pelo crime de lesão corporal de natureza leve. Razão assiste à defesa. Muito embora o animus do agente não deva ser avaliado com profundidade nesta fase do procedimento escalonado do júri, é certo que o juízo de admissibilidade da acusação deve estar amparado em lastro mínimo de provas, sob pena de se incorrer em flagrante e indevida injustiça. No caso, o quadro probatório não é suficiente para demonstrar o animus necandi na conduta do acusado, afastando, portanto, a competência do júri para o julgamento do feito. De acordo com o laudo pericial, foram constatadas as seguintes lesões: "cicatriz de ferimento cortante, medindo 15 mm no sétimo espaço inter-costal esquerdo linha hemi-clavicular esquerda; cicatriz de ferimento cortante, medindo 15 mm no sétimo espaço inter- costal esquerdo linha axilar anterior." Além disso, referida prova atestou que as lesões não resultaram em incapacidade, debilidade ou perigo de vida ao ofendido (mov. 1.8 pág. 63). Em juízo, a vítima Clemente Galete (companheiro da genitora do acusado) contou que no dia dos fatos estava dormindo quando o réu chegou chamando pela mãe; ao abrir a porta recebeu dois golpes de faca; para se defender utilizou uma cadeira; Edson sempre morou com o casal e nunca houve problema antes desse episódio; não sabe o motivo da agressão; não houve discussão; não sabe se Edson era usuário de bebida ou droga; nunca houve desavença anterior, era como se fosse um filho; atualmente está tudo bem, sem nenhum problema; quanto as lesões "não houve nada". (mídia anexa) Iracy Vieira Inácio, mãe do réu, declarou que na ocasião dos fatos seu filho chegou em casa alterado e agressivo; nunca antes ele apresentou tal espécie de comportamento; estamos todos bem agora, em família; Edson desferiu dois golpes contra Clemente; depois daquele fato nunca houve mais nada; afirmou que escondeu uma faca perigosa de Edson e pode ser por esse motivo que ele se alterou; Edson consumia bebidas e drogas; no dia ele estava agitado; ele é menino trabalhador e correto; ajuda em casa (mídia anexa). Por sua vez, o réu Edson Inácio, em juízo, confirmou o que havia dito na Delegacia no sentido de que no dia dos fatos estava bêbado, pegou uma faca e quando tentava levá-la seu padrasto interveio para segurá-lo, pelo que desferiu nele o golpe de faca, acertando-o na região da barriga. Acrescentou que jamais teve intenção de matar Clemente, atribuindo o fato a sua embriaguez (mídia anexa). O material cognitivo dos autos, portanto, não comprova o dolo homicida, vez que o acusado, mesmo portando uma faca e tendo desferido golpes contra a vítima, provocou apenas os ferimentos leves descritos no laudo pericial, que, nem de longe, autorizam a conclusão de que o intento do agente era o de matar. Assim, embora demonstrado que Edson Inácio agrediu a vítima, os elementos dos autos não são suficientes para sustentar uma decisão de pronúncia, na medida em que não demonstrado o animus necandi, de sorte que a imputação contida na denúncia deve ser desclassificada para a figura prevista no art. 129, caput, do Código Penal. Nesse sentido já decidiu esta Egrégia Câmara: "RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA LESÃO CORPORAL. INSURGÊNCIA MINISTERIAL. CONJUNTO PROBATÓRIO QUE NÃO AUTORIZA A PRONÚNCIA DO ACUSADO. INSUFICIÊNCIA DE PROVA ACERCA DO ANIMUS NECANDI. RECURSO DESPROVIDO." (TJPR - 1ª C.Criminal - RSE - 1396786- 3 Rel. Macedo Pacheco - Região Metropolitana de Londrina - Foro Central de Londrina -- J. 19.11.2015) E ainda: "RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - IRRESIGNAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO CONTRA A EXCLUSÃO DA QUALIFICADORA DO RECURSO QUE IMPOSSIBILITOU A DEFESA DA VÍTIMA - CONJUNTO PROBATÓRIO, CONTUDO, QUE NÃO AUTORIZA A PRONÚNCIA DO RÉU - AUSÊNCIA DE PROVA ACERCA DO ANIMUS NECANDI - CONCESSÃO DE ORDEM DE HABEAS CORPUS DE OFÍCIO - INTELIGÊNCIA DO ART. 654, § 2º, CPP - DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO DE TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO PARA O DE LESÃO CORPORAL LEVE - RECURSO JULGADO PREJUDICADO. Mesmo em recurso da acusação, visando a reforma da decisão de pronúncia, é possível a concessão de ordem de habeas corpus de ofício, desde que se constate a ocorrência de constrangimento ilegal, observado pelo encaminhamento do réu a julgamento pelo Tribunal do Júri, em cujo processo a prova exclui, peremptoriamente, o animus necandi." (TJPR - 1ª C.Criminal - RSE - 1262743-1 - Mamborê - Rel.: Des. Campos Marques - Unânime - J. 16.04.2015). Promovida a desclassificação para lesão corporal leve e, considerando a pena máxima cominada ao delito (1 ano), verifica-se que o prazo prescricional é de 04 (quatro) anos, consoante dispõe o art. 109, inc. V, do Código Penal. Assim, porque transcorridos mais de 04 (quatro) anos entre a data do recebimento da denúncia (03.08.2012 mov. 1.11, pág. 83) e a prolação da presente decisão, há que se reconhecer a prescrição da pretensão punitiva estatal, julgando-se extinta a punibilidade do réu, com fundamento no art. 107, inc. IV, do Código Penal. Por tais fundamentos, o voto é pelo provimento do recurso, com a declaração de extinção da punibilidade do agente. Ante o exposto, ACORDAM os integrantes da PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ, por unanimidade de votos, em dar provimento ao recurso, com a declaração de extinção da punibilidade do agente. Encaminhe-se cópia deste acórdão ao Juízo de origem. Presidiu o julgamento o Excelentíssimo Desembargador ANTONIO LOYOLA VIEIRA (com voto) e dele participou o Excelentíssimo Juiz de Direito Substituto em 2º Grau BENJAMIM ACACIO DE MOURA E COSTA. Curitiba, 08 de junho de 2017.
NAOR R. DE MACEDO NETO Relator convocado
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