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Acórdão
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Certificado digitalmente por: JOSE MAURICIO PINTO DE ALMEIDA APELAÇÃO CRIME Nº 1.696.209-7, DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA (11ª Vara Criminal). Apelantes: ELIO NOSSA MENDES, ROSANGELA BERNARDINO CAMARGO e HUMBERTO FUZETO. Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ. Relator: Des. JOSÉ MAURÍCIO PINTO DE ALMEIDA. APELAÇÃO CRIME. ORDEM TRIBUTÁRIA (ART. 1º, INCISOS I, II, E IV, DA LEI Nº 8.137/90, C.C. ART. 71 DO CP). OMISSÃO NA ESCRITURAÇÃO DE NOTAS FISCAIS NO LIVRO DE REGISTRO DE SAÍDA DE MERCADORIAS (LRSM), DEIXANDO DE DECLARÁ-LAS NAS GIAS/ICMS APRESENTADAS AO FISCO ESTADUAL. SUPRESSÃO/REDUÇÃO DE TRIBUTOS (ICMS). DOLO CARACTERIZADO PELO RECOLHIMENTO A MENOR DO EFETIVAMENTE DEVIDO. ARGUMENTO DE FORMA DE SUSPENSÃO DO FEITO, ANTE O PARCELAMENTO DO DÉBITO. FORMALIZAÇÃO DO PEDIDO APÓS O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. INVIABILIDADE. INTELIGÊNCIA DA LEI Nº 9.430/96 ALTERADA PELA LEI Nº 12.382/2011, EM SEU ARTIGO 83, § 2º. TESE RECHAÇADA. NO MÉRITO, PLEITO ABSOLUTÓRIO SOB O ARGUMENTO DE QUE ERAM APENAS SÓCIOS, PORÉM , NÃO PARTICIPAVAM DO GERENCIAMENTO DA EMPRESA (ROSÂNGELA E HUMBERTO). A PARTE FISCAL ERA DE RESPONSABILIDADE DO CORRÉU ELIO. JUSTIFICATIVA DE ERRO/FALHA OPERACIONAL, POR EVENTUAIS OMISSÕES QUANTO AO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. NÃO SE PODE RESPONSABILIZAR O SETOR CONTÁBIL PELOS RECOLHIMENTOS MENORES DO QUE O EFETIVAMENTE DEVIDO. ACUSADOS QUE, NA CONDIÇÃO DE SÓCIOS, GERENCIAVAM E ADMINISTRAVAM A EMPRESA, DETENTORES DO DOMÍNIO DOS FATOS, PORTANTO, NÃO PODEM ALEGAR DESCONHECIMENTO DE SUAS RESPONSABILIDADES. RESPONSABILIZAÇÃO TRIBUTÁRIA QUE INDEPENDE DA INTENÇÃO DO AGENTE OU DO RESPONSÁVEL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA QUE INDEPENDE DE DOLO OU CULPA. CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL QUE ADOTA O PRINCÍPIO DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA. EVIDENCIADA A SUPRESSÃO DA CARGA TRIBUTÁRIA COM O FIM DE AUFERIR LUCROS EM DETRIMENTO DOS COFRES PÚBLICOS. CONDENAÇÃO MEDIDA QUE SE IMPÕE. DOSIMETRIA. PLEITO DE APLICAÇÃO DA REPRIMENDA NO MÍNIMO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE. EXISTÊNCIA DA CONTINUIDADE DELITIVA. READEQUAÇÃO DA PENA-BASE, EIS QUE VALORADAS NEGATIVAMENTE AS CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. PREJUÍZO AO ERÁRIO QUE É INERENTE AO TIPO PENAL. REDIMENSIONAMENTO DA PENA-BASE AO MÍNIMO LEGAL. AUMENTOS DECORRENTE DA CONTINUIDADE DELITIVA MANTIDOS EM RAZÃO DA QUANTIDADE DE VEZES QUE INCORRERAM NA CONDUTA (1/2 E 2/3). READEQUAÇÃO DA PENA FINAL DE TODOS OS ACUSADOS. CONSEQUÊNCIA: ALTERAÇÃO DO REGIME PRISIONAL PARA O ABERTO EM RELAÇÃO À ACUSADA ROSÂNGELA (PRIMÁRIA), COM A SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS, PARA REDIMENSIONAR A PENA-BASE, E, CONSEQUENTEMENTE, A PENA FINAL, BEM ASSIM O REGIME PRISIONAL DE UM DELES. 1. É sabido que somente se suspende a pretensão punitiva estatal em crimes relacionados ao pagamento de tributos, quando o parcelamento ocorre antes do recebimento da denúncia criminal, a teor da Lei nº 9.430/96, alterada pela Lei nº 12.382/2011, no art. 83, § 2º. 2. Comprovado que omitiram na escrituração de notas fiscais as operações tributadas, suprimindo tributo (ICMS), configurada a atuação dolosa dos recorrentes, portanto, afasta-se a tese de erro ou falha operacional, eis que demonstradas a autoria e materialidade delitivas. 3. A responsabilidade por infrações tributárias é objetiva, ou seja, independe da comprovação de dolo ou culpa, e menos ainda da intenção do agente (art. 136 do CTN). 4. O dano ao erário levado em conta como consequências do crime é inerente ao tipo penal; assim, há de se extirpar o aumento da pena-base,e, consequentemente, redimensionar a pena final e o regime para o cumprimento da pena. I. Trata-se de apelação criminal interposta por ROSÂNGELA BERNARDINO CAMARGO, HUMBERTO FUZETO E
ELIO NOSSA MENDES, denunciados pelo ilustre representante do MINISTÉRIO PÚBLICO, que lhes imputou a prática, em tese, do delito descrito no artigo 1º, incisos I, II, e IV c.c art. 11, todos da Lei nº 8.137/90, em razão dos seguintes fatos narrados na denúncia: "1. DA CONSTITUIÇÃO E ADMINISTRAÇÃO DA EMPRESA
1.1 Durante o período entre 09 de
dezembro de 2011 e 18 de junho de 2013, os
denunciados ELIO NOSSA MENDES,
HUMBERTO FUZETO e ROSANGELA
BERNARDINO CAMARGO eram sócios
proprietários e administradores com
poderes de gerência da empresa FORTE
CASTELO EMPREENDIMENTOS LTDA.,
REGISTRADA no CNPJ Nº
09.388.532/0001-12 e no CAD/ICMS nº
90502611-98, localizada em Curitiba/PR.
Em 19 de junho de 2013 os denunciados
ELIO NOSSA MENDES E HUMBERTO
FUZETO venderam suas quotas para a
denunciada ROSANGELA
BERNARDINO CAMARGO, passando
ela a exercer de forma exclusiva a gerência
da sociedade empresarial.
1.2 A empresa tinha como objeto
social a incorporação de
empreendimentos imobiliários,
construção civil de edificações, projetos
arquitetônicos de edificação, estrutural,
hidráulico e prevenção de incêndios,
administração de obras, compra e venda
de imóveis próprios, aluguel de imóveis
próprios. Posteriormente, foi incorporado
ao objeto social atividades de comércio
varejista de material de construção.
2. DA FRAUDE TRIBUTÁRIA:
OMISSÃO NA ESCRITURAÇÃO DE
NOTAS FISCAIS NO LIVRO DE
REGISTRO DE SAÍDA DE
MERCADORIAS (LRSM) Auto de
Infração nº 6602958-1.
2.1. No período entre 09 de dezembro
de 2011 e 05 de julho de 2013, os
denunciados ELIO NOSSA MENDES,
HUMBERTO FUZETO e ROSANGELA
BERNARDINO CAMRAGO, na
qualidade de sócios proprietários e
administradores da empresa FORTE
CASTELO EMPREENDIMENTOS LTDA.,
obrigados, assim, ao gerenciamento e
cumprimento das obrigações relacionadas
ao fisco, objetivando criminosos
locupletamento mediante a redução da
carga tributária incidente sobre a
nominada pessoa jurídica, livres e
conscientemente, agindo mediante fraude
à fiscalização, suprimiram o pagamento
de tributo (imposto incidente sobre a
circulação de mercadorias e prestação de
serviços ICMS), mediante a omissão de
registro de operações tributadas nos
livros fiscais, golpes que levaram a cabo
da forma seguinte:
2.2. Durante o período de 09 de
dezembro de 2011 e 18 de junho de 2013, os
denunciados ELIO NOSSA MENDES,
HUMBERTO FUZETO E ROSANGELA
BERNARDINO CAMARGO (por 06
vezes) um aderindo a conduta delituosa
do outro, e no período entre 19 de junho e
05 de julho de 2013, somente a denunciada
ROSANGELA BERNARDINO
CAMARGO (por 2 vezes), suprimiram
tributo (imposto incidente sobre a
circulação de mercadorias e prestação de
serviços ICMS) ao omitirem o registro
de notas fiscais de saída de mercadorias
do LRSM (livro de registro de Saída de
Mercadorias), deixando consequentemente
de declará-las nas GIA's/ICMS
apresentadas ao fisco estadual,
propiciando, assim, a supressão do
pagamento do imposto devido ao Paraná.
2.3. Tais expedientes, simples na
aparência, porém eficientes em resultados,
propiciaram aos denunciados ELIO
NOSSA MENDES, HUMBERTO FUZETO
e ROSANGELA BERNARDINH
CAMARGO o indevido aproveitamento
de valores de ICMS, causando, em
consequência, prejuízos ao Estado do
Paraná.
Vide CD com cópia digitalizada dos PAF
(juntado às fls. 15):
- auto de infração fls. 02/03;
-demonstrativo fls. 07;
- notas fiscais 08/15;
- LRSM fls. 16/25;
- Relatório fls. 26/27
- Termo de Acordo de Parcelamento fls.
29.
2.4 Constatada a fraude, foi lavrado
contra a empresa o Auto de Infração nº
6602958-1.
2.5 O valor do imposto fraudado
originariamente é de R$ 165.078,54 (cento
e sessenta e cinco mil, setenta e oito reais
e cinquenta e quatro centavos). O valor
acrescido de juros moratórios e demais
encargos, considerada a data da inscrição
em dívida ativa (03/02/2015), atualizado
até a presente data totaliza R$ 284.932,08
(duzentos e oitenta e quatro mil,
novecentos e trinta e dois reais e oito
centavos), conforme extrato da SEFA de
fls. 22 dos autos" (mov. 5.2).
Julgada procedente a pretensão formulada na denúncia, a nobre julgadora de primeiro grau condenou ELIO NOSSA MENDES, HUMBERTO FUZETTO E ROSANGELA BERNARDINO CAMARGO, nas sanções do crime previsto no artigo 1º, incisos I, II, e IV, da Lei nº 8.137/90, c.c. artigo 71 do Código Penal. ELIO NOSSA MENDES e HUMBERTO FUZETTO obtiveram a mesma pena, as quais restaram estabelecidas em 03 (três) anos e 09 (nove) meses de reclusão, em regime aberto (mediante condições), além de 30 (trinta) dias-multa. Houve substituição da pena corporal por duas penas restritivas de direito, consistentes em prestação de serviços à comunidade, além de prestação pecuniária no valor de cem salários-mínimos. ROSANGELA BERNARDINO CAMARGO teve a pena estabelecida em 04 (quatro) anos e 02 (dois) meses de reclusão, em regime semiaberto, além de 33 (trinta e três) dias-multa.
ELIO NOSSA MENDES, HUMBERTO FUZETTO E ROSANGELA BERNARDINO CAMARGO apresentaram respectivamente recursos de apelação às (mov. 196.1, fls. 12/20vº e fls. 23/31vº), sustentando, em ressunta: a)-em sede preliminar, pugnam pela suspensão do feito ante o parcelamento do débito, pois a empresa Forte Castelo Empreendimentos Ltda. Aderiu, em 14/07/2016, ao programa de parcelamento, conforme extrato em anexo; b)-destacaram que vêm cumprimento com a obrigação quanto às parcelas, conforme extrato de parcelamento emitido pela CELEPAR, e, ainda assim, foi proferida sentença condenatória; c)-o parcelamento ocorreu antes da sentença condenatória, assim, deveria ter sido suspensa a pretensão punitiva estatal, portanto, requerem a suspensão do presente feito; d)-no mérito, pugnam pelas respectivas absolvições, pois, embora tenha constado como sócio da empresa no contrato social (Humberto), nunca teve poder de mando ou gestão;
e)-em relação a Rosangela e Elio, não restou comprovado que suprimiram tributo, tampouco eram responsáveis por inserir informações nos livros fiscais; f)- a condenação se deu exclusivamente por constarem como sócios da empresa, assim, na hipótese de recolhimento do tributo a menor, não há que se falar em responsabilização penal objetiva pelo cargo em que o agente ocupa, mas, sim, deve-se apurar quem efetivamente incorreu na espécie delitiva; g)-o consultor financeiro da empresa no período de 2013 a 2015 esclareceu que o procedimento de lançamento das informações tributárias era feito manualmente e que eventual omissão caracteriza falha operacional; h)-a mesma testemunha afirmou que, em nenhum momento, os apelantes solicitaram que funcionários deixassem de repassar informações com o fim de não pagar tributos; i)-o próprio auditor fiscal da Receita Federal, Sr. Leonel Dias dos Santos, afirmou que o setor de contabilidade centralizava todos os documentos;
j)-igualmente, o contador da empresa, o Sr. Erasto de Oliveira Lara, explicou como era feito o repasse das informações à Receita Federal, e que o sistema era preenchido manualmente pelos funcionários do setor contábil; l)- caso não sejam absolvidos, pugnam pela aplicação das penas no mínimo legal, retirando-se as respectivas valorações negativas que ensejaram o aumento da pena. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ apresentou contrarrazões recursais (mov.1.99.1), manifestando-se pela manutenção da r. sentença. Em parecer, às fls. 53/63, a douta PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA opinou pelo desprovimento dos recursos.
II. A- ARGUMENTO DE FORMA
Sustentam os recorrentes a adesão ao programa de parcelamento de débitos, em 14/07/2016, e, por isso, deveria o processo-crime ter sido suspenso. Aduzem, para tanto, que o parcelamento dos débitos é causa de suspensão da pretensão punitiva do Estado. Entretanto, não é caso. Somente se suspende a pretensão punitiva estatal em crimes relacionados ao pagamento de tributos, quando o parcelamento ocorre antes do recebimento da denúncia criminal, a teor do que preleciona a Lei nº 9.430/96, alterada pela Lei nº 12.382/2011, no art. 83, § 2º, in verbis: "Art. 83. (...)
§ 2o É suspensa a pretensão punitiva do
Estado referente aos crimes previstos no caput, durante o período em que
a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos
crimes estiver incluída no parcelamento, desde que o pedido de
parcelamento tenha sido formalizado antes do recebimento da denúncia criminal." (grifou-se).
Nesse sentido, já decidiu o C. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: "RECURSO EM HABEAS CORPUS. ART. 2º, II, DA LEI Nº 8.137/90.APLICABILIDADE DA LEI Nº 9.430/96. PARCELAMENTO DO DÉBITO POSTERIORMENTE AO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE SUSPENSÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO. 1. Não há que se afastar a incidência da Lei nº 9.430/96, alterada pela Lei nº 12.383/11, considerando-se a natureza do imposto versado - tributo estadual -, uma vez que a referida Lei dispõe expressamente acerca da parcelamento do crédito tributário, representação fiscal para fins penais, suspensão da pretensão punitiva do Estado e da prescrição criminal em relação aos delitos previstos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137/90 e art. 168- A e 337-A do Código Penal. 2. O novo parcelamento do débito tributário, realizado pelo recorrente em momento posterior ao recebimento da denúncia, não é apto a suspender a pretensão punitiva do Estado, por incidência do art. 83, § 2º da Lei nº 9.430/96. 3. Recurso em habeas corpus improvido". (RHC 68.857/SC, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA
TURMA, julgado em 07/06/2016, DJe 17/06/2016) (grifou-se).
A inicial acusatória foi recebida em 06 de outubro de 2015, a empresa Forte Castelo Empreendimentos Ltda. Aderiu, em 14 de julho de 2016, ao programa de parcelamento em relação aos débitos objetos deste processo-crime. Nesse quadro, não há que se falar em suspensão do feito. Eis que, a teor do §2º do art. 83 da Lei nº 12.382/2011, o parcelamento do débito se deu após o recebimento da denúncia. Desse modo, afasta-se o argumento de forma. B-DO MÉRITO. O pleito absolutório não merece guarida. Alegam, em suma, os recorrentes que, apesar de sócios da empresa, não participavam do gerenciamento (Rosangela e Humberto), e o responsável pela parte fiscal era o apelante Elio.
Asseveraram que eventual omissão nos registros de saída nos livros fiscais se deu por erro e falha no sistema operacional, pois eram realizados manualmente. Assim, rogam a absolvição por isenção de suas responsabilidades. Com o devido respeito, sem razão. Da documentação encartada nos autos, tais como a Portaria (mov. 4.2), o auto de infração Fiscal (mov. 4.3), o Processo Administrativo Fiscal - PAF's (movs. 4.8, 4.9, 4.10, 4.11), a certidão de dívida ativa (mov. 4.15), e, por fim, a prova oral colhida durante a instrução, constata-se, a toda evidência, a materialidade delitiva. Essa documentação é bastante a referendar a condenação imposta na sentença, bem como demonstram a ocorrência do crime descrito no art. 1º, inc. I, II e IV, da Lei nº 8.137/90. A autoria, por sua vez, também é extraída das provas constantes nos autos, mormente porque os apelantes, na qualidade de sócios-proprietários e administradores, suprimiram parte
do pagamento relacionado ao ICMS, ocasionando prejuízos ao Erário Estadual. Ao serem interrogados em Juízo, todos os recorrentes negaram a fraude fiscal, alegando problema operacional da empresa (erro de algum funcionário do setor contábil). Rosangela Bernardino Camargo, ao depor em Juízo, asseverou não ter ocorrido fraude na empresa. Entretanto, questionada sobre o não pagamento dos impostos devidos no período apresentado, manifestou seu direito constitucional de não responder. No tocante ao parcelamento dos tributos, questionada sobre o motivo de não ter sido pago, novamente se manteve silente. Indagada se tinha conhecimento do processo administrativo fiscal acerca do não recolhimento dos impostos, igualmente silenciou. Da mesma forma, se reservou ao direito de não responder se tinha conhecimento do lançamento em dívida ativa do imposto devido. Confirmou apenas e tão somente que vive maritalmente com Elio Nossa Mendes, de quem era assistente, cuidando de sua agenda, pagamentos pessoais e assuntos de seu
cotidiano. Afirmou que não comparecia à empresa em tempo integral, pois não tinha um expediente predeterminado, acrescentando, por outro lado, que eventualmente participava das reuniões. Não respondeu sobre o motivo de a empresa estar ativa e suas atividades suspensas, também sobre sua vida particular. ELIO NOSSA MENDES, ao ser interrogado em Juízo, disse que não compreendeu sobre a existência deste processo. Destacou que o comando da empresa era seu, e pediu que fosse ouvido Bento Miguel de Oliveira, residente em São Paulo, por ter sido ele o gerente financeiro e de contabilidade da empresa. Admitiu poder "ter havido falha no lançamento", porém, em qualquer intenção. Ao ser questionado sobre o parcelamento, disse que somente Bento Miguel de Oliveira saberia responder sobre essa parte financeira da empresa. No tocante ao processo administrativo fiscal, consignou que, na época, um escritório de advocacia tratava
desse assunto, responsáveis pela defesa, e, dentro da empresa, o processo ficava com ele. Contudo, as defesas não foram efetivadas no momento certo. Não teve conhecimento sobre o fim do processo administrativo, dele tomando conhecimento quando na esfera criminal, não obtendo resposta do escritório contratado. Ao ser questionado sobre o valor devido e possível solução para a liquidação, disse que a empresa ficou sem recursos em razão de trabalhos não recebidos, e tiveram de suspender as atividades no final de 2013 ou início de 2014. Questionado sobre o fato de Rosângela ter permanecido como única sócia, Elio informou que acabou ficando com a empresa de consultoria e com a fábrica (duas outras empresas das quais é responsável uma de fundição de alumínio e a outra de consultoria). Disse também que, a Humberto, coube a parte de consultoria, sendo que Rosangela acabou ficando na empresa. Como formavam um grupo, manteve assim. Afirmou que tem conhecimento do processo junto à área cível, e que estão sendo levantados os valores devidos, já que pretende pagar as dívidas da empresa. Frisou nunca ter intencionado sonegar imposto.
HUMBERTO FUZETO, perante o Juízo, afirmou que os fatos narrados na inicial acusatória não são verdadeiros. Pôs ênfase ao fato de não executar a parte de gerência da empresa, mas sim a relacionada com o cliente, gestão de projetos e contratos que eram desenvolvidos por Elio. Assegurou ter conhecimento da denúncia, porém, não a compreendeu, por não ter o domínio da parte técnica. Mas acredita que as pessoas que trabalham não fraudariam ou cometeriam crimes. Imagina ter ocorrido uma falha operacional. Ainda, afirmou que normalmente ocorriam reuniões de todos (sócios e contador) para tratar de questões técnicas da empresa e negócios. E o contador participava de algumas reuniões relacionadas a resultados de contratos. Humberto disse que não se lembra da lavratura do auto de infração, dele tendo ao ser notificado pelo meirinho. Desconhecia acerca dos débitos financeiros, pois tudo ficava sob o controle de Elio, e não tinha conhecimento sobre as finanças. Seu foco era voltado para o resultado com o cliente. Em 2012, a empresa sentiu a crise, mas, em 2014, a situação ficou mais grave. Os sócios se reuniam para discutir
sobre a empresa, mas não falavam acerca de pagamentos de impostos, incumbência que ficava ao encargo de Elio. Ao ser questionado pelo Juízo sobre o momento de encerramento da empresa, disse que ocorreu após o término de uma obra no Estado da Bahia, no ano de 2013. Decidiram suspender as atividades, pois não estava interessante o mercado relacionado à construção civil. O Juízo indagou sobre o fim da sociedade e a manutenção de Rosângela como única sócia, quando disse que, para ele, não havia mais interesse sem resultados positivos, além de discordar quanto à estratégia do projeto em si. Destacou, por fim, que a crise causou prejuízos na empresa, culminando com a demissão de funcionários para cortar gastos. Informou que a cota societária é igual para os três. Apesar de os denunciados negarem a autoria delitiva no sentido de fraudar o fisco sob o argumento de falha operacional do setor contábil da empresa, tal fato não elide a conduta criminosa. Ponha-se em destaque o testemunho do Auditor-Fiscal Estadual Leonel Dias dos Santos, que relatou em
Juízo terem sido os fatos motivados por uma ordem de serviço através de denúncia automática do sistema, e, no caso, foi apontado um cancelamento de uma nota fiscal após sua emissão. O sistema emite automaticamente itens a serem verificados, e foi possível constatar que existiam notas de saída e, entre elas, algumas não registradas no livro de registro próprio. Ao ser indagado pelo Ministério Público se a testemunha sabia se os réus tentaram adimplir o fisco, disse que sim, confirmando que, na época da autuação, mantinha contato com os advogados dos sócios da empresa. Contou que os orientou a realizar o pagamento, o qual se deu em parcelas. Entretanto, não pagaram em sua totalidade. Frisou que a Empresa Forte Castelo Ltda. ainda se encontra ativa no sistema, mas não soube informar se ainda em atividade. Afirmou que nunca manteve contato com os denunciados, por ser procedimento simples e corriqueiro. Normalmente, o contato é com o contador, e somente conversavam com os proprietários em caso de necessidade de colher assinaturas, o que podia ser substituído por procuração.
Explicou que, primeiramente, é feita a busca dos dados da empresa e, com as informações captadas, entram em contato com o contador para solucionar e informar o que fora pedido. Quando não atendido, era realizada a notificação. Destacou que pediu algumas notas de saída e entrada e o livro de registro de saída. Realizou a auditoria por amostragem e constatou oito faltas de registro de saída. Quem lhe entregou os documentos foi a contadora Alexandra. Consignou, ainda, que não houve defensor e nem apresentação de defesa prévia no procedimento administrativo fiscal (PAF). Relatou ser normal o contribuinte não apresentar argumentos para fazer sua defesa. Também informou que, atualmente, o livro é eletrônico, e que o próprio sistema aponta as falhas, sendo mais fácil a identificação. Explicitou que a nota apresentada é emitida pela Receita Estadual, e deve ser registrada no livro de saída, o que é de responsabilidade da empresa. Assim, se o contribuinte não realiza o pagamento do imposto, mas é notificado para que o faça. Ao ser questionado pela defesa, disse que, em 2012, foram registradas 306 notas e, dentre essas, somente 4 não
registradas (imposto sonegado). Em 2013, deixaram de registrar 4 notas, nos dias 10 de janeiro, 14 de junho, 03 e 05 de julho. Confirmou que todo e qualquer erro que aparecer ao fisco é de responsabilidade da empresa, pois a Receita não tem como distinguir quem cometeu a falha. Por sua vez, a testemunha Erasto de Oliveira Lara, que na época foi contador da empresa, relatou que o processo de informações à Receita Estadual é feito de forma eletrônica, acrescentando que, a partir do momento em que é emitida uma nota, ela tem que ser informada no sistema e transmitida à Receita. Relatou que a Receita Estadual identifica uma omissão no momento em que não é enviada a informação correta, assim, exemplificou que, quando se emite uma nota de venda de mercadorias, automaticamente já está no banco de dados da Receita Estadual. Explicou que é obrigação cadastrar a nota em que se realizou a venda, transmitindo ao sistema próprio da Receita Estadual. Tal sistema é, na realidade, um programa gratuito fornecido pelo Governo do Estado ("emissor de nota fiscal"). Porém, todos os comércios contratam outras empresas para fazer o controle
de notas emitidas, estoques e tudo relacionado. O programa é gratuito somente para emitir nota, não faz o controle de estoque. Assim, a partir das informações nesse programa, ele vai para a Receita e as informações vão para o cliente. A nota fiscal é emitida, sendo "alimentada" por outro sistema contábil, sistema fiscal, chamado de Domínios Sistemas. Nesse sistema, são lançadas todas as notas de saída, bem assim de entrada, com um resumo que gera um arquivo para encaminhar à Receita Estadual. Afirmou que nunca recebeu ordem para omitir qualquer lançamento ou nota. Se houve falha na emissão, é de Marcos (responsável pela alimentação do sistema Sênior e emissão de notas) e Dirceu. Trabalhou na empresa de 2009 até dezembro 2013. Disse também que, quando foi apresentado o problema de recolhimento pela empresa, chegou a resolver com a Receita, inclusive negociado o parcelamento do imposto. Entretanto, nada sabia sobre omissão de nota, mas os proprietários tinham conhecimento do parcelamento realizado. A testemunha de defesa Celso Luiz Pontara, funcionário da empresa, responsável pela parte de projetos e
administrativa, trabalhou lá na época dos fatos. Ao ser questionado sobre as funções de cada um deles, informou que Humberto acompanhava as operações e os trabalhos, mas quem dava as ordens era Élio. E Rosângela era sua assistente. Humberto cuidava mais da parte operacional e Élio, da gerência. Não soube informar sobre o auto de infração. Por fim, a testemunha ouvida por carta precatória, Bento Miguel de Oliveira, foi consultor na empresa no período de abril de 2013 até setembro de 2015. Relatou a existência de diversos problemas fiscais em relação a atrasos no pagamento de impostos. Trata-se de um grupo de cinco empresas, todas com os mesmos sócios, dentre elas a Forte Castelo. Disse que foi contratado para realizar a reestruturação da Empresa Forte Castelo. Relatou que o processo administrativo era feito manualmente, assim como a emissão de nota. Também o registro da nota de saída era manual. O gerente fiscal era Erasto e o responsável pela gerência era Elio. Não acompanhou o processo administrativo fiscal, porém teve conhecimento de que houve o parcelamento, e que cinco ou seis parcelas foram adimplidas.
Consignou, por fim, que a falta de registro narrada na denúncia é uma mera falha operacional (mov. 110.1). É fato incontroverso que houve a sonegação do ICMS por parte da Empresa Forte Castelo Ltda., em que pese os sócios responsáveis negarem a autoria delitiva, tentando apontar falha operacional, sem indicar quem efetivamente deixou de lançar informação no livro de saída da empresa. Contudo, dos elementos colhidos nos autos, é certo que os sócios-proprietários tinham conhecimento das operações de incidência tributária. De acordo com o contrato social, a administração da sociedade cabia aos três denunciados (mov. 4.12 e 4.13). Da mesma forma, as deliberações da empresa eram realizadas em conjunto, portanto, não há possibilidade de isentá-los de suas responsabilidades. Nesse aspecto, merece destaque a manifestação da PROMOTORA DE JUSTIÇA EM PRIMEIRO GRAU,
DRA. CLEONICE APARECIDA MARIANO QUINTEIRO, por ocasião das contrarrazões recursais: "(...) Percebe-se, durante toda da instrução
processual, a clara tentativa de apenas esquivarem-se dos delitos
praticados. Rosângela e Humberto apontaram Elio como administrador
responsável pela pessoa jurídica. O sócio Elio, por sua vez, afirma que
Bento Miguel, era quem atendia pelo setor financeiro da empresa,
entretanto, esse declara que Erasto de Oliveira era o contador
responsável pela referida empresa. Por fim, a testemunha Erasto afirma
que o sistema de lançamento de notas é passível de falhas e que, se essas
ocorreram, os encarregados eram Marcos e Dirceu.
A cadeia de acusações chega a dois
funcionários que sequer foram arrolados pela defesa como testemunhas.
Ora, seria mito cômodo colocar a responsabilidade em alguém que não se
encontra presente. Entretanto, certo é que o benefício dos ilícitos dirige-
se exclusivamente aos sócios.
Nesse sentido, é certa a constatação feita pelo
magistrado:
`É evidente que a única beneficiária com a
supressão tributária é a sociedade, de modo que não se justifica a
alegação de mera falha operacional, fundamentalmente em razão de
que ficou claro que o registro de saída de mercadorias era feito
manualmente'.
Beira o despropósito imaginar que pessoas
não investidas dos poderes de gestão pudessem, ao arrepio daqueles que
estão à frente do negócio, deliberar, sozinhos, pelo locupletamento ilícito
simplesmente para agradar os superiores.
Com efeito, o depoimento prestado pelo
auditor-fiscal foi claro e preciso, confirmando todas as informações
colhidas ao longo do Procedimento Administrativo Fiscal, não trazendo
nenhuma dúvida de que o crime ocorreu, tem-se, também, que o valor do
imposto fraudado é de R$ 165.078,54 (cento e sessenta e cinco mil,
setenta e oito reais e cinquenta e quatro centavos), cuja atualização até a
data da denúncia chegou a R$ 284,932,08 (duzentos e oitenta e quatro
mil, novecentos e trinta e dois reais e oito centavos).
Cumpre esclarecer que o bem jurídico
tutelado pelo tipo penal descrito é constituído pelas finanças do Estado,
pois sem os recursos advindos da tributação seria inviável ao Poder
Público realizar os seus objetivos fundamentais.
(...)
Nos crimes tributários, assim como em
muitos crimes econômicos, pune-se a conduta ainda que ela, por si só,
não seja capaz de causar substancial lesão ao bem jurídico, pois se tem o
entendimento que se trata de delitos de acumulação, onde a impunidade
geraria condutas reiteradas, que somadas, lesariam de forma grava o bem
jurídico.
Portanto, a relevância penal e a lesão ao bem
jurídico tutelado pelas condutas dos recorrentes restaram cristalinas,
fazendo-se necessária e justificada a repressão estatal por meio da norma
penal.
Ademais, sabe-se que o delito previsto no
artigo 1º, inciso I, II e IV da Lei nº 8.137/1990 exige um elemento
subjetivo, é dizer, o dolo específico do agente, consubstanciado na
vontade consciente dirigida para o evento supressão ou redução do
tributo.
(...)
A configuração do dolo específico, no caso,
restou demonstrada pela omissão de registros de operações tributadas
nos livros fiscais, deixaram de registrar notas fiscais de saída de
mercadorias no Livro Registro de Saída de Mercadorias, pois pretendiam
se isentar dos tributos" (mov. 199.1) Ora, a responsabilidade por infrações tributárias é objetiva, ou seja, independe da comprovação de dolo ou culpa, e menos ainda da intenção do agente (art. 136 do CTN).
Não é crível que os acusados tenham cometido reiteradamente falhas operacionais, especialmente porque dispunham de setor contábil, bem assim de escritório de advocacia para lidar com as questões tributárias. Assim, comprovado que omitiram na escrituração de notas fiscais as operações tributadas, suprimindo tributo (ICMS), configurada a atuação dolosa dos recorrentes. Daí por que se afasta a tese de erro ou falha operacional, eis que demonstradas a autoria e materialidade delitivas. Nessa senda, já decidiu esta 2ª CÂMARA CRIMINAL: "APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ART. 1º, INCS I, II, E IV, C/C ART. 11, AMBOS DA LEI 8.137/90. CONDENAÇÃO. PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA. PROCESSO CRIMINAL QUE NÃO É A SEDE ADEQUADA PARA A VERIFICAÇÃO DA REGULARIDADE DA CONSTITUIÇÃO DO LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO.DÉBITO INSCRITO EM DÍVIDA ATIVA. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA
DEVIDAMENTE AFERIDO. PROVAS QUE DEMONSTRAM SER O RÉU O EFETIVO RESPONSÁVEL PELA INFRAÇÃO TRIBUTÁRIA. APELANTE QUE FIGURA COMO SÓCIO ADMINISTRADOR DA SOCIEDADE NO CONTRATO SOCIAL E DETINHA DE FATO O PODER DE GESTÃO DA SOCIEDADE. VENDA SEM NOTA FISCAL.CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA SEM FORMALIZAÇÃO. AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO TRIBUTÁRIO MEDIANTE FRAUDE. AUTORIA E MATERIALIDADE BEM DELINEADA. REDUÇÃO TRIBUTÁRIA VERIFICADA DE MODO INEQUÍVOCO. PRESUNÇÃO DE VENDA SEM NOTA OU SUBFATURADAS. ART. 51, INC. I, DA LEI ESTADUAL Nº 11.580/96. CONDUTA TIPIFICADA COMO CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. CONDENAÇÃO QUE SE MANTÉM. DOSIMETRIA DA PENA. PENA- BASE. REDUÇÃO PARA O MÍNIMO LEGAL DE DOIS ANOS. SUBSTITUIÇÃO POR APENAS UMA PENA RESTRITIVA DE DIREITO, CONSISTENTE EM PRESTAÇAO
PECUNIÁRIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO". (TJPR - 2ª C.Criminal - AC - 1609934- 0 - Curitiba - Rel.: Laertes Ferreira Gomes - Unânime - J. 10.08.2017)(sublinhou-se).
"CRIME TRIBUTÁRIO - FRAUDE- ART. 1º, INCISOS I, II E IV, TODOS DA LEI Nº 8.137/90, (CALÇAMENTO DE NOTAS), POR 747 (SETECENTOS E QUARENTA E SETE) VEZES, DE FORMA CONTINUADA (ARTIGO 71 DO CP) - AUTORIA E MATERIALIDADE FARTAMENTE DEMONSTRADAS - PROVAS QUE DEMONSTRAM SER O RÉU O EFETIVO RESPONSÁVEL PELAS INFRAÇÕES TRIBUTÁRIAS- APELANTE QUE FIGURA COMO SÓCIO ADMINISTRADOR DA SOCIEDADE NO CONTRATO SOCIAL E DETINHA DE FATO O PODER DE GESTÃO DA SOCIEDADE - PESSOA QUE POSSUI O DOMÍNIO DE FATO E É O RESPONSÁVEL PELA ADMINISTRAÇÃO. ART.11 DA LEI 8.137/90.DOLO EVIDENCIADO PELO
CONJUNTO PROBATÓRIO COLHIDO. PENA DE MULTA QUE DEVE SER READEQUADA DE OFÍCIO EM ATENDIMENTO AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE - RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO, E DE OFÍCIO READEQUADA A PENA DE MULTA". (TJPR - 2ª C.Criminal - AC - 1590200- 8 - Região Metropolitana de Maringá - Foro Regional de Mandaguari - Rel.: José Carlos Dalacqua - Unânime - J. 09.02.2017) (grifou-se).
De tudo que se analisou, restam evidenciadas a autoria e materialidade delitivas, daí dever ser mantida a condenação sentencial. NO TOCANTE À DOSIMETRIA DA PENA,
pretendem os recorrentes a diminuição da reprimenda corporal ao mínimo legal. Foram condenados pela prática do delito previsto no artigo 1º, incisos I, II e IV, da Lei nº 8.137/90, c.c. artigo 71 do Código Penal.
Não merece guarida a fixação da pena ao mínimo legal, em razão da continuidade delitiva. Entretanto, ao valorar negativamente as consequências do crime para todos os condenados, assim fundamentou o Magistrado a quo: "(...) "As consequências financeiras não
foram minoradas, pois, apesar da ação da Receita Estadual, não foram
integralmente pagos os impostos, causando danos ao Erário, razões pelas
quais imponho um acréscimo de 06 meses de reclusão e 10 dias-multa". Logo, a pena-base restou estabelecida acima do mínimo legal, ou seja: em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão, além de 20 (vinte) dias-multa. Tal entendimento, no entanto, não pode prevalecer, pois o prejuízo e danos ao Erário é inerente ao tipo penal, não podendo aqui ser utilizado para o aumento da pena-base. Destarte, é necessário redimensionar o aumento indevido da pena-base, mantendo-a no mínimo legal, qual seja: em 02 (dois) anos de reclusão, mantendo-se os mesmos dias-
multa (20), evitando-se a "reformatio in pejus" com a adoção do sistema desta Câmara (24 dias-multa, de forma proporcional à reprimenda corporal). Ou seja: em atenção ao princípio da proporcionalidade, e conforme entendimento adotado por esta egrégia 2ª CÂMARA CRIMINAL no voto vencedor quanto a essa matéria, de relatoria do Excelentíssimo Desembargador VALTER RESSEL na apelação criminal nº 877.368-21, aplicar-se-ia um dia-multa a cada mês de condenação.
Não subsistem circunstâncias agravantes ou atenuantes e nem causas de aumento ou diminuição. Mas, constatou-se a continuidade delitiva por seis vezes em relação aos réus Elio e Humberto, mantém-se o aumento de ½ na pena, o que resulta em aumento de 12 (doze) meses, assim, a pena final para ambos será de 03 (três) anos de reclusão e a multa aplicada em sentença, inalterada. Em relação à acusada Rosângela, igualmente, deve ser readequada a reprimenda corporal, estabelecendo-se a pena base no mínimo legal, qual seja: em 02 (dois) anos de reclusão, além da multa fixada em sentença, inalterada, de acordo com O CRITÉRIO VALTER RESSEL antes explicitado. Não se verificaram circunstâncias agravantes ou atenuantes, tampouco causas de diminuição da pena. Ao analisar a continuidade delitiva, verificou-se o cometimento de 8 (oito) vezes, assim, o aumento da
equivocada e, ainda, com ofensa ao princípio da isonomia: situações desiguais tratadas igualmente".
pena alcançou o patamar máximo em 2/3 da pena (fl. 37 sentença), assim, a pena definitiva para a acusada Rosângela Bernardino Camargo deve ser readequada em 03 (três anos) e 04 (quatro) meses, além da multa fixada em sentença. Por conseguinte, com a alteração da reprimenda corporal em relação a Rosângela, deve-se readequar o regime prisional para o aberto, eis que sua pena restou fixada abaixo de 04 (quatro) anos, além de ser ela primária. Com a alteração do regime prisional para o aberto, impõem-se as mesmas condições ao regime aberto aplicadas em sentença aos demais réus: 1) permanecer em sua residência todos os dias entre as 22:00 horas e as 06:00 horas do dia seguinte, bem assim nos dias de folga, finais de semana e feriados; 2) não se ausentar da cidade sem autorização judicial; 3) comparecer em juízo mensalmente para justificar suas atividades e 4) como condição especial, o integral pagamento do tributo devido, ainda que de forma parcelada, em prazo não superior ao da pena. Também é de se substituir a pena corporal por penas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no montante de 100 (cem)
salários-mínimos, montante a ser revertido em favor do Erário Estadual, como forma de parcial pagamento do tributo devido. Em conclusão, mantém-se a condenação imposta em sentença, porém é de se dar parcial provimento aos recursos tão somente para readequar a reprimenda corporal, com o estabelecimento do regime prisional aberto em relação a Rosângela. Assim, restaram alteradas as penas definitivas: a) ELIO NOSSA MENDES: pena readequada para 03 (três) anos de reclusão, em regime inicial aberto, além da multa fixada em sentença; b)- HUMBERTO FUZETO: pena readequada para 03 (três) anos de reclusão, em regime inicial aberto, além da multa estabelecida em sentença. c)-ROSÂNGELA BERNARDINO CAMARGO: pena readequada para 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial aberto, além de 40 (quarenta) dias-multa.
Por derradeiro, é de se determinar, após esgotados os recursos ordinários nesta instância, se houver e desde que não protelatórios, o início da execução provisória das penas impostas aos apelantes Elio Nossa Mendes, Humberto Fuzeto e Rosângela Bernardino Camargo, segundo o novo entendimento do Excelso Pretório nas Ações Declaratórias Constitucionais 43 e 44, em 05 de outubro de 2016, confirmado no Recurso Extraordinário com Agravo nº 964246, em que, inclusive, se reconheceu a repercussão geral da matéria, em que o art. 283 do Código de Processo Penal não impede o início da execução da pena, após condenação em segunda instância. Ante o exposto, é de se dar parcial provimento aos recursos para redimensionar a pena final e, consequentemente, o regime prisional de um dos condenados (Rosângela Bernardino Camargo).
III.
Diante do exposto, ACORDAM os Magistrados integrantes da Segunda Câmara Criminal do egrégio Tribunal de Justiça do Paraná, à unanimidade de votos, em dar parcial provimento aos recursos, para redimensionar a pena base estabelecida, e consequentemente, o regime prisional de um dos condenados (Rosângela Bernardino Camargo).
Deliberou também o Colegiado: a)-pela comunicação, oportunamente ao Juízo de Direito de 1º Grau, para a formalização dos processos de execução provisória, a quem deverão ser encaminhadas as peças processuais necessárias; b)-pela imediata remessa de cópia deste acórdão, via Mensageiro, ao prolator da sentença, DR. JOSÉ DANIEL TOALDO.
Presidiu o julgamento o Excelentíssimo Desembargador JOSÉ MAURÍCIO PINTO DE ALMEIDA, com voto, e dele participaram o eminente Juiz de Direito Substituto em Segundo Grau MARCEL GUIMARÃES ROTOLI DE MACEDO e o Excelentíssimo Desembargador JOSÉ CARLOS DALACQUA. Curitiba, 08 de fevereiro de 2018.
José Maurício Pinto de Almeida Relator
-- 1 "O réu não pediu a redução do número de dias-multa e para fixá-lo o magistrado sentenciante valeu-se da `mesma lógica' adotada pelo Código Penal, que, ao prever para a pena pecuniária um mínimo de 10 e um máximo de 360 dias-multa e para a pena corporal o máximo de 30 anos de reclusão, está a indicar que o número de dias-multa deve corresponder ao número de meses da condenação corporal (30 anos x 12 meses = 360 meses = 360 dias- multa). Trata-se de um critério lógico e que não deixa de atender a recomendação geral, da doutrina e da jurisprudência, no sentido de que também para a fixação da quantidade de dias-multa devem ser levadas em conta as circunstancias judiciais (art. 59 do CP), na medida em que, em se mantendo uma correspondência dos dias-multa com o número de meses da pena corporal, estar-se-á considerando tais circunstâncias, posto que elas são consideradas na fixação da pena corporal. E com maior margem de acerto e de justiça, do que simplesmente fixar o número de dias- multa sempre no seu patamar mínimo (10 dias), para qualquer tipo de crime apenado cumulativamente com a pena de multa, independentemente de sua gravidade, sempre que for fixada a pena corporal no seu patamar mínimo. Crimes graves como o de roubo ou de extorsão, por exemplo, com penas mínimas de 04 anos de reclusão, teriam o mesmo número de dias-multa (10 dias) que crimes leves como o de furto simples ou de apropriação indébita, que têm penas corporais mínimas de 01 ano de reclusão. Tais situações incoerentes e iníquas com certeza não concorrerão com o critério adotado pela sentença recorrida, pois teriam os dias-multa fixados de modo coerente, isonômico e justo em 48 e 12 dias respectivamente. O princípio da proporcionalidade que é utilizado como argumento por aqueles que entendem que o número de dias-multa deve ser sempre o mínimo legal (10 dias) toda vez que for aplicada pena corporal no mínimo legal, independentemente da gravidade do crime e da pena mínima prevista em abstrato, revela-se inadequadamente aplicado, quando aplicado nesses termos, data vênia, eis que esse princípio quer resguardar um equilíbrio entre a quantidade da pena e a gravidade do delito praticado. E não se terá esse equilíbrio se, nos exemplos de crimes graves e leves retro citados, sempre forem aplicados números de dias-multa iguais, para uns e para outros, toda vez que a pena corporal respectiva for aplicada no mínimo legal, penas corporais essas em quantitativos bastante desiguais (48 versus 12 meses). Aplicação
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