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Acórdão
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Certificado digitalmente por: CRISTIANE SANTOS LEITE APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO Nº 1602596-2, DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE PARANAGUÁ NÚMERO UNIFICADO: 0011019-95.2014.8.16.0129 APELANTE : MUNICÍPIO DE PARANAGUÁ APELADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ RELATOR : DES CARGO VAGO (DESª LÉLIA SAMARDÃ GIACOMET) REL. SUBST. : JUÍZA CRISTIANE SANTOS LEITE APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER. REGULARIZAÇÃO E CORRETA IMPLANTAÇÃO DO PORTAL DA TRANSPARÊNCIA NO MUNICÍPIO. INSERÇÃO DE DADOS FALTANTES COM ATUALIZAÇÃO EM TEMPO REAL. LEI Nº 12.527/2011. LEI COMPLEMENTAR Nº 131/2009. PROVA INCONTROVERSA. OBRIGAÇÃO DE FAZER COMPROVADA. COMINAÇÃO DE MULTA. VIABILIDADE. HIPÓTESE EM QUE NÃO SE APLICA À PESSOA DO PREFEITO. REFORMA DA SENTENÇA NESTE PONTO. REDUÇÃO DO VALOR DA ASTREINTE EM REMESSA NECESSÁRIA. OBSERVAÇÃO A PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA EM REEXAME NECESSÁRIO. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível e Reexame Necessário nº 1602596-2, da Vara da Fazenda Pública da Comarca de Paranaguá, em que é Apelante MUNICÍPIO DE PARANAGUÁ e Apelado MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ. I RELATÓRIO Trata-se de reexame necessário e recurso de apelação cível interposto em face da r. sentença proferida nos autos de "Ação Civil Pública para Cominação de Obrigação de Fazer e não Fazer" sob nº 0011019-95.2014.8.16.0129, ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Paraná em face do Município de Paranaguá. O Ministério Público, na exordial, expôs em síntese, que conforme restou apurado pela 4ª Promotoria de Justiça da Comarca de Paranaguá no Inquérito Civil n.º MPPR 0103.13.000226-6, o Município de Paranaguá não estaria efetivando adequadamente a política de transparência de seus atos por meio das informações e atualizações que são disponibilizadas em seu "Portal de Transparência", hospedado na página eletrônica da Prefeitura Municipal (http://www.paranagua.pr.gov.br), o que obsta o acesso a dados alusivos à gestão administrativa, financeira e orçamentária, e, por conseguinte, impede o controle da gestão pública pela população. Narrou que encaminhou ao Município de Paranaguá, Recomendação Administrativa n.º 05/2013 com o fito de que este disponibilizasse e gerenciasse em seu "Portal da Transparência", no prazo de 60 (sessenta) dias, uma série de informações públicas, de caráter geral e também relacionadas a pessoal e orçamento. Relatou, que findo o prazo concedido, não foram efetuadas as adequações necessárias, bem como não houve interesse em prestar quaisquer esclarecimentos, mesmo diante de solicitação, razão pela qual houve a necessidade de ajuizamento da demanda judicial para imposição de obrigação de fazer. Diante disso, o Ministério Público alegou, em síntese, que o fato do Município de Paranaguá não disponibilizar de forma adequada as informações em seu "Portal de Transparência", contraria aos princípios constitucionais da forma republicana de governo, cidadania e publicidade (artigo 1º e artigo 37, caput, da Constituição Federal), bem como das regras da Lei Complementar n.º 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal) e da Lei n.º 12.527/2011 (Lei do Acesso à Informação). Requereu: a) a concessão de liminar, para que fosse determinado ao Município de Paranaguá, no prazo de 60 (sessenta) dias, implementar de forma adequada e regular na internet o "Portal da Transparência", com gerenciamento constante, de acordo com as exigências legais em vigor, bem como o serviço de acesso às informações públicas ao cidadão, e, determinado, ainda, a obrigação de não fazer consistente em não mais se omitir em prestar informações, dados e esclarecimentos que lhe sejam dirigidos pela população; b) no mérito, pela confirmação da liminar, condenando o Município de Paranaguá: b.1) na obrigação de fazer consistente em disponibilizar em sua página eletrônica do "Portal da Transparência", no prazo de 60 (sessenta) dias, as informações e dados exigidos pela legislação em vigor, inclusive Lei Complementar n.º 101/2000 e Lei n.º 12.527/2011, nos moldes apontados na Recomendação Administrativa n.º 05/2013 e nas certidões de constatação do Ministério Público, bem como realizar o gerenciamento, alimentação e atualização mensais do respectivo portal, sem prejuízo de outras disposições legais que venham a entrar em vigor no curso da lide ou após ela; b.2) na obrigação de fazer consistente em criar, no prazo de 60 (sessenta) dias, o serviço de acesso a informações públicas ao cidadão, com protocolo único, em local e condições apropriadas, visando a atender e orientar o público quanto ao acesso a informações, bem como informar sobre a tramitação de documentos e protocolizar requerimentos de acesso a informações, conforme determina o artigo 9ª, inciso I, da Lei n.º 12.527/2011; b.3) na obrigação de não fazer consistente em não mais se omitir em prestar informações, dados e esclarecimentos que lhe sejam dirigidos pela população, na forma do artigo 10 e seguintes Lei n.º 12.527/2011, devendo em caso de negativa de acesso fazê-lo de forma fundamentada e por escrito, mediante ciência à parte interessada. Juntou documentos (mov.1.2). Foi proferida a decisão que indeferiu o pedido de antecipação de tutela (mov.7.1). O Município de Paranaguá apresentou contestação (mov.17.1), arguindo, em preliminar, falta de interesse de agir. No mérito, alegou em síntese, que: a) se abstém de fornecer determinadas informações, em razão dos preceitos éticos impostos, sendo ato legítimo alicerçado, pela Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso X; b) a preservação da intimidade e da vida privada é corolário da dignidade humana, não podendo ser devassada por quem quer que seja, exceto, e nos restritos casos de outorga judicial; c) o requerimento está alicerçado por questões genéricas, baseados em alegações, conjecturas ou suposições sem a apuração devida, não se vislumbra uma urgência, especificidade ou tampouco que a negativa ou não disponibilização de algum dado, de fato, é proteção a publicidade e transparência dos atos em detrimento da intimidade do indivíduo; d) a Municipalidade age em consonância aos princípios administrativos legais e tem como escopo o dever estatal de garantir a publicidade de seus atos, o que, efetivamente corresponde o direito do administrado ter ciência da tramitação de processos administrativos em que tenha a condição de interessado, ter vista dos autos, obter cópia de documento neles contidos e conhecer as decisões proferidas, em consonância com o artigo 3º, inciso II, da Lei nº 9.784/99; e) entende-se como desnecessária e altamente dispendiosa, a criação de um sistema de "Serviço de Acesso à Informações Públicas ao Cidadão", visto que as informações já se encontram disponíveis via "Portal da Transparência"; f) determinadas informações, por ventura ou descuido do administrador podem não estar contidas na imensa gama de dados e informações disponibilizados no sítio eletrônico do Município, todavia, é deveras desarrazoado e desproporcional a imposição de multas no presente caso. O Ministério Público impugnou a contestação (mov.20.1). Em seguida, o Ministério Público manifestou-se pela produção de prova consistente na realização de vistoria no "Portal de Transparência" do Município de Paranaguá (mov.25.1). O Município de Paranaguá, manifestou-se pela produção de prova oral (mov.28.1). Em decisão saneadora (mov.33.1) foi deferida a produção de prova documental e oral, esta consistente na inquirição de testemunhas. O Ministério Público interpôs agravo retido contra a decisão saneadora, pois não houve deferimento da produção da prova consistente na vistoria postulada (mov.39.1).
Na sequência, houve realização de audiência de instrução e julgamento, onde o MM. Juiz proferiu decisão se retratando e acolhendo o recurso de agravo retido, revogando a decisão saneadora, entendendo pela dispensa da prova oral, e, deferindo o pedido de inspeção na internet do "Portal de Transparência", no site do Município de Paranaguá (mov.69.1). Em seguida, foi realizada a inspeção (mov.76.1). As partes apresentaram alegações finais (mov.79.1 e 83.1). Proferida a sentença (mov.85.1), o juízo singular entendeu que restou efetivamente comprovado que o Município de Paranaguá se encontrava em flagrante desacordo com as normas constitucionais e infraconstitucionais, não efetivando o direito à informação, resguardado constitucionalmente e já legislado sua regulamentação. Julgou procedentes os pedidos formulados na petição inicial, nos seguintes termos do dispositivo: "Isto posto, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial e decreto a extinção do processo com resolução de mérito, na forma do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil e determino que o requerido MUNICÍPIO DE PARANAGUÁ providencie a disponibilização, no prazo de 30 (trinta) dias, através de implementação, alimentação regular e gerenciamento técnico e mensal na internet do Portal da Transparência, conforme itens específicos requeridos na inicial, bem como, se abstenha de omitir informações, dados e esclarecimentos, que lhe sejam dirigidos pela população, na forma da lei. Em face do princípio da sucumbência, condeno o requerido ao adimplemento das custas e despesas processuais, com fundamento nos artigos 19 e 20 do Código de Processo Civil. Sem condenação ao pagamento de honorários advocatícios, por figurar o Ministério Público no polo ativo da lide. Sentença sujeita a duplo grau de jurisdição, a teor do disposto no art. 475, I, do Código de Processo Civil." O Ministério Público opôs embargos de declaração, argumentando que houve omissão na sentença, pois não houve fixação de multa para o caso de não cumprimento pelo Município de Paranaguá da obrigação de fazer a que foi condenado. Determinou-se a intimação do Município de Paranaguá, para se manifestar com relação aos embargos opostos, ante os efeitos infringentes (mov.93.1). O Município de Paranaguá, interpôs recurso de apelação (mov. 96.1), alegando em síntese, que: a) jamais deixou de cumprir os princípios que norteiam a Administração Pública; b) a administração pública, desde à época do ingresso da presente demanda, com zelo e exação aos princípios do direito que lhe são caros, atuou de forma a cumprir o disposto na legislação vigente, a fim de assegurar o direito do cidadão em ter acesso às informações da municipalidade, em consonância ao princípio da supremacia do interesse público, moralidade e publicidade; c) a administração pública, ao contrário do exposto na decisão guerreada, promoveu, com a moralidade que lhe é intrínseca, as devidas modificações no sítio eletrônico da municipalidade de forma a atender o princípio da publicidade; d) na inspeção judicial realizada, é possível denotar que a municipalidade não se descurou da responsabilidade de apresentar informações aos munícipes, visto que tem como premissa que a transparência. Por fim, pugnou pelo conhecimento e provimento do recurso. Em seguida, o Município de Paranaguá apresentou contrarrazões aos embargos de declaração (mov. 97.1). Os embargos de declaração foram acolhidos, sendo sanada a omissão, nos seguintes termos (mov.103.1): "(...) Dessa forma, necessário que a multa coercitiva seja aplicada diretamente à pessoa física do Senhor Prefeito Municipal de Paranaguá, sob pena de total e absoluta ineficácia e, pior, descumprimento de ordem judicial. (...) 3. Em sendo assim, a fim de sanar o equívoco, acolho os embargos declaratórios, para fazer constar na sentença que vai imposta multa diária no valor de R$ 1.000,00, para o caso de descumprimento da medida, eis que decorre do poder geral de cautela para assegurar o efetivo cumprimento da determinação judicial. 4. Destarte, acolho os embargos de declaração. (...)"
Foram apresentadas as contrarrazões ao recurso de apelação (mov.109.1). O Município de Paranaguá ratificou as razões do seu apelo, bem como insurgiu-se em relação a multa, argumentando que adotou todas as medidas legais a fim de cumprir as exigências do Ministério Público do Estado do Paraná, e, sobretudo, da Lei nº 12527/2011, rechaçado, portanto, cominação de multa. Além disso, argumentou que a multa, deve ser suportada pela pessoa jurídica ré, e não pessoalmente pelo Prefeito. O Ministério Publico apresentou contrarrazões, tendo em vista a ratificação da apelação com a insurgência em relação multa (mov.125.1). A douta Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do apelo (fls.46/51). É a breve exposição. II - VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO: II.a) Direito intertemporal: Adoto o sistema do isolamento dos atos processuais, segundo o qual se aplica a lei nova de imediato aos processos em curso, devendo ser respeitados os atos processuais já realizados e seus efeitos. Com efeito, cada lei rege os atos praticados sob seu império: tempus regit actum.
Nesse sentido, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:. "PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PRAZO PARA OFERECIMENTO DE IMPUGNAÇÃO. TERMO INICIAL. DATA DO DEPÓSITO JUDICIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 NÃO CONFIGURADA. 1. Não ocorre violação ao art. 535 do CPC quando o Juízo, embora deforma sucinta, aprecia fundamentadamente todas as questões relevantes ao deslinde do feito. Precedentes. 2. No que tange à eficácia da lei processual no tempo, o direito processual civil orienta-se pela regra do isolamento dos atos processuais, segundo a qual a lei nova é aplicada aos atos pendentes, tão logo entre em vigor, respeitados os atos já praticados e seus efeitos, nos termos do art. 1.211 do CPC (princípio do tempus regit actum). Precedentes. 3. A realização do depósito judicial do valor exequendo consubstancia penhora automática, independente da lavratura do respectivo termo e consequente intimação, iniciando-se a partir de então o cômputo do prazo para a apresentação de impugnação ao cumprimento de sentença. Precedentes.4. Recurso provido". Grifei. (T4 Resp 965475 SP 2007/0151677-0, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, j. em 21/06/2012, DJe 01/08/2012).
O recurso de apelação foi interposto no dia que passou a viger o Código de Processo Civil/2015. Contudo, foi interposto contra sentença proferida antes da vigência do novo CPC, bem como fundamentou-se no Código de Processo Civil de 1973 (Lei nº. 5.869 de 11/01/1973). Assim, os requisitos de admissibilidade do recurso, os quais passarei a analisar a seguir serão apreciados com base no Código de Processo Civil de 1973. Do mesmo modo, a admissibilidade do reexame necessário será apreciada com base no Código de Processo Civil de 1973. Saliento que em relação aos chamados pela doutrina de direitos processuais materiais (institutos que contemplam características tanto da lei processual como material), aplicar-se-á a legislação civil (direito material), posto que o processo seria considerado como o próprio direito material (refere-se a própria vida dos sujeitos e suas relações entre si e com os bens da vida). Exemplo: normas que versem sobre competência, prova, coisa julgada, exercício do direito de ação/recurso, responsabilidade patrimonial. II.b) Juízo de Admissibilidade Presentes os requisitos intrínsecos de admissibilidade (cabimento; interesse recursal; legitimidade para recorrer; inexistência de fato extintivo do direito de recorrer) e extrínsecos (tempestividade; regularidade formal, preparo), razão pela qual conheço do apelo e do reexame necessário. II.c) Análise das razões recursais
Trata-se de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público Estadual em face do Município de Paranaguá, a fim de que este regularize e promova a correta implantação do Portal da Transparência, previsto na Lei nº 12.527/2011 e na Lei Complementar nº 131/2009, assegurando que nele estejam inseridos e atualizados, em tempo real, os dados faltantes previstos nos mencionados diplomas legais. O Ministério Público para o fim de verificar o cumprimento do princípio da transparência administrativa e diante dos referidos diplomas legais, instaurou Inquérito Civil n.º MPPR 0103.13.000226-6 e no curso da investigação expediu recomendação para que fosse demonstrada a efetiva implantação do Portal da Transparência, principalmente, quanto as seguintes informações (mov.1.2):
Com efeito, analisando os autos, constata-se através a inspeção realizada pelo MM. Juiz a quo (mov.76.1), no dia 11 de dezembro de 2015, que efetivamente o Apelante não implantou corretamente o Portal da Transparência, conforme previsto na Lei nº 12.527/2011 e na Lei Complementar nº 131/2009, assegurando que nele estejam inseridos e atualizados, em tempo real os dados recomendados pelo Ministério Público. Vejamos:
A Constituição Federal é clara em seu art.5º, inc. XXXIII, quanto à possibilidade da prestação de informações dos órgãos públicos, preservando-se apenas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança e à sociedade: " Art. 5º. (...) XXXIII todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestados no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado." Restou incontroversa na inspeção, que os dados inseridos no Portal de Transparência do site do Município de Paranaguá, são genéricos e omissos, desatendendo à legislação de regência, a qual prevê o mínimo a ser disponibilizado, inexistindo limite, esclareça-se, quanto ao máximo de informações a ser divulgada, devendo ser esclarecido, ademais, que o a concretude aos princípios da publicidade (art. 37, da CF) e do direito fundamental à informação (art. 5º, inc. XIV, da CF) se dá por meio da ampla transparência da gestão pública. Conforme, bem ponderou o douto Procurador de Justiça, os argumentos do Apelante de que teria adequado o acesso as informações não são suficientes para desconstituir a r. sentença. Importante ponderar, que a publicidade na Administração Pública é a regra, sendo exceção o sigilo, conforme trecho do acórdão proferido quando do julgamento dos Agravos Regimentais nº 3902/SP, em 09/06/2011, pelo Tribunal Pleno do STF, "a prevalência do princípio da publicidade administrativa outra coisa não é senão um dos mais altaneiros modos de concretizar a República enquanto forma de governo. Se, por um lado, há um necessário modo republicano de administrar o Estado brasileiro, de outra parte é a cidadania mesma que tem o direito de ver o seu Estado republicanamente administrado. O 'como' se administra a coisa pública a preponderar sobre o "quem" administra falaria Norberto Bobbio -, e o fato é que esse modo público de gerir a máquina estatal é elemento conceitual da nossa República. O olho e a pálpebra da nossa fisionomia constitucional republicana." Ademais, a alegação de que cumpriu todas as medidas necessárias para implementação do Portal da Transparência, será analisada quando do cumprimento da sentença. Por tais razões, não comporta reforma a sentença, quanto à ausência do cumprimento adequado da obrigação do Apelante em regularizar e promover a correta implantação do Portal da Transparência, conforme estabelece a Lei nº 12.527/2011 e na Lei Complementar nº 131/2009, assegurando que nele estejam inseridos e atualizados os dados, em tempo real.
De outro lado, com relação à multa imposta, não assiste razão ao Apelante quanto a impossibilidade de sua fixação. Contudo, no tocante a imposição da astreinte na pessoa do Sr. Prefeito Municipal, verifico que a sentença deve ser reformada. Quanto à multa cominada, como astreinte, é admissível, no escopo de agregar eficácia à obrigação de fazer ou de não fazer imposta à Administração. Cuida-se, a rigor, de medida útil ao cumprimento específico da obrigação expressa no julgado, como mero efeito ou consequência de inadmissível desrespeito ao comando judicial, que tem amparo jurídico em nosso sistema. De outro lado, a cominação de astreintes, em alguns casos, pode ser direcionada não apenas ao ente estatal, mas também pessoalmente às autoridades ou aos agentes responsáveis pelo cumprimento das determinações judiciais. Neste sentido: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. REVISÃO DE PENSÃO. DEFERIMENTO DE LIMINAR. MULTA DIÁRIA DIRECIONADA À AUTORIDADE IMPETRADA. POSSIBILIDADE. 1. A questão nos autos indaga saber se pode a multa cominatória ser direcionada ao agente público que figura como impetrado na ação mandamental. 2. Segundo o Tribunal de origem, "a imposição da multa pessoal cominada ao Presidente do RIOPREVIDENCIA, vez que em consonância com o parágrafo único do art. 14 do CPC, [...] tem por finalidade reprimir embaraços a efetivação do provimento judicial" 3. A cominação de astreintes pode ser direcionada não apenas ao ente estatal, mas também pessoalmente às autoridades ou aos agentes responsáveis pelo cumprimento das determinações judiciais. (Precedente: REsp 1111562/RN, da relatoria do Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, publicado em 18/09/2009). 4. Agravo regimental não provido. (STJ - AgRg no AREsp 472.750/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe 09.06.2014). (grifei) Observe-se que o Superior Tribunal de Justiça admite a responsabilização pessoal quando a autoridade pública causa embaraço ao cumprimento da ordem judicial. No caso em apreço, embora houve o descumprimento do ente público de uma obrigação a ele inerente, não se constata demonstração de resistência ou descumprimento da obrigação por parte efetivamente do Sr. Prefeito, em especial, de alguma ordem judicial. Isso porque, ainda não se buscou o cumprimento da medida obtida judicialmente, de modo que não se pode dizer que o Sr. Prefeito, tenha causado algum embaraço no cumprimento de ordem judicial. Assim sendo, ao menos para o momento, considero aplicável o seguinte entendimento jurisprudencial: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ATERRO SANITÁRIO. CONCESSÃO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA DESTINADA A COMPELIR OS MUNICÍPIOS DEMANDADOS A CUMPRIR COM AS EXIGÊNCIAS AMBIENTAIS CONSOLIDADAS NA LEI 12.305/2010 (LEI DE RESÍDUOS SÓLIDOS). IRREGULARIDADES CONSTADAS POR MEIO DE INQUÉRITO CIVIL. VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES DEMONSTRADA. INEXISTÊNCIA DE EVIDÊNCIA SOBRE A ALEGADA DESATIVAÇÃO DO ATERRO. PRAZO CONCEDIDO PARA A OBTENÇÃO DE LICENÇA AMBIENTAL E CUMPRIMENTO DE OUTRAS OBRIGAÇÕES QUE SE MOSTRA RAZOÁVEL. INEXISTÊNCIA DE PROVA SOBRE ÓBICE FINANCEIRO OU ORÇAMENTÁRIO. ASTREINTES QUE, NO CASO, NÃO PODEM SER APLICADAS PESSOALMENTE AO PREFEITO MUNICIPAL. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJPR - 4ª C.Cível - AI - 1417595-4 - Rel.: MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA - Unânime - J. 10.05.2016). (grifei)
Por tal razão, neste ponto, merece acolhimento as razões do apelo do Município, até porque a questão não foi iniciada na atual gestão, devendo a multa ser aplicada ao ente público. Importante destacar que, inobstante a presente exclusão da multa cominatória pessoal, não fica descartada sua futura imposição pelo Juízo a quo, perante o qual tramitará o cumprimento da decisão, em caso de desatendimento, sem motivo justificado, do que decidido, acaso tal descumprimento possa ser imputado à desídia ou à negligência do Chefe do Poder Executivo, consoante já referida jurisprudência do STJ, sem prejuízo de demais sanções previstas em lei. Por fim, em sede de reexame necessário a r. sentença merece ser reformada no tocante ao valor da multa fixada em R$ 1.000,00 (mil reais) por dia, para o caso de descumprimento da medida. Forçoso, todavia, reduzir o valor desta multa cominada, para R$ 100,00 (cem reais) por dia, limitada à R$ 10.000,00 (dez mil reais) que atende com razoabilidade e proporcionalidade ao seu fim, considerando o cômputo a partir de 30 (dias) após o trânsito em julgada desta decisão. II.d) Conclusão Ante ao exposto, voto no sentido de conhecer e dar parcial provimento ao recurso de apelação, reformando parcialmente a r. sentença para aplicar a multa ao ente público, e, em sede de reexame necessário reformar parcialmente a r. sentença para reduzir o valor da astreinte fixada, nos termos do voto.
III - DECISÃO: Diante do exposto, acordam os Desembargadores da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação, e, em sede de reexame necessário, REFORMAR PARCIALMENTE a sentença, nos termos do voto da Relatora. Participaram da sessão e acompanharam o voto da Relatora as Excelentíssimas Senhoras Desembargadoras REGINA AFONSO PORTES (Presidente da Sessão) e MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA. Curitiba, 08 de maio de 2.018. Juíza Subst. 2º G. CRISTIANE SANTOS LEITE Relatora
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